segunda-feira, 30 de junho de 2008

BELEZA NÃO É “UM POR TODOS, TODOS POR UM”

Acho um erro acreditar que só um tipo de mulher, de uma certa idade, com um só tipo de cabelo e de corpo, pode ser considerada bonita, como se o que é bonito pra uma pessoa é o mesmo pra todas. Claro que existe uma tentativa de padronização de beleza. A mídia faz de tudo pra instituir uma beleza universal, e a gente cai direitinho. Aí vemos que praticamente todas as americanas negras alisam o cabelo. Que tantas mulheres orientais fazem cirurgia plástica pra ocidentalizar os olhos. E que inúmeras mulheres no mundo passam fome e arriscam dietas pra atingir um peso impossível. Em Unbearable Weight, Susan Bordo conta como, na Nigéria, o padrão de beleza costumava ser mais cheinho. Mulher magra era vista como mulher desnutrida. A Nigéria sempre mandava pra concursos como Miss Universo representantes que o país via como mulheres belas. E, nessas competições, as nigerianas sempre se davam mal. Eram eliminadas rapidinho. Até que um dia foi escolhida uma moça mais clara e muito mais magra pra representar a Nigéria. Ou seja, uma que em nada representava as mulheres nigerianas, mas enfim. Essa moça venceu o Miss Mundo. E a mídia local fez tanto auê em cima desse título que, em pouco tempo, todas as nigerianas queriam ser como a miss. Demorou, mas o país finalmente percebeu que magreza era in. A partir daí a Nigéria começou a registrar bons índices de anorexia e bulimia.

Mais de dez anos atrás, eu tive uma agência de casamento. Sério. Eu apresentava pessoas com características comuns para que elas pudessem namorar e, um dia, se tudo corresse bem, casar. Isso é assunto prum outro post. No momento eu só queria dizer que, uma vez, conversei com uma senhora que, pros meus padrões (mais intolerantes na época), me pareceu tenebrosa. Tadinha, nem lembro da mulher, só que ela me causou uma péssima impressão. Uma impressão tão ruim que, quando ela foi embora sem se tornar minha cliente (estava lá só pedindo informações), eu até me senti aliviada, porque eu havia encucado com uma questão como “Pra quem vou apresentar essa ogra?”. Só que a agência ficava na minha casa e, bem no momento em que essa mulher estava saindo, entrou um senhor. E você precisava ver as faíscas. Os olhares que os dois trocaram. A porta fechou e a primeira coisa que o homem me perguntou foi: “Quem é ela?! Eu quero conhecê-la! Ela é linda!”. Ele também não virou meu cliente (é, eu não fiquei milionária com a agência), então não sei se aquele romance à primeira vista continuou. Mas a lição que aprendi foi inesquecível: beleza é algo subjetivo. Depende da visão de cada um, do momento, de expectativas, de tanta coisa. Mais um motivo pra não nos deixarmos afetar pelos trezentos outdoors e anúncios de revista que vemos todo dia. Aquela imagem é só um pedaço de papel alterado por computador. No dia a dia, a gente não apenas vê pessoas, como também as cheiramos, ouvimos, sentimos uma vibração, e às vezes até as tocamos. Beleza é muito mais do que os olhos vêem (e cada par de olhos vê algo diferente, lógico). Ou seja: quem morreu e me nomeou Deus pra eu decretar que aquela mulher não teria chance de encontrar alguém?

Eu sou gorda, baixinha, e já passei da idade de ser considerada bonita. Portanto, eu me surpreendia quando fazia o estágio de Pedagogia e dava aula pra crianças de primeira à quarta série e toda semana recebia um bilhete ou um elogio de alguma das minhas aluninhas. Era “Professora, você é tão bonita!” pra cá, “Você é linda” pra lá. Eu agradecia, mas, por um lado, queria dizer pras meninas não se concentrarem tanto na aparência física (nem na minha nem na delas). Por outro, eu pensava: “Tolinhas! Elas ainda não foram condicionadas a saber o que é e não é bonito”. Naqueles tempos eu não percebia que talvez elas me achassem bonita porque, de repente, eu lembrava a mãe delas. Com trinta e poucos anos, eu podia perfeitamente ser mãe de uma garotinha de 8. E aposto que as mães delas provavelmente tinham mais semelhanças físicas comigo que com a Giselle Bundchen.

Existem pouquíssimas coisas realmente universais no mundo, mas uma delas deve ser uma criança achar que sua mãe é bela. Acho que todas passamos por essa fase com nossas mães. Na nossa opinião, elas eram as mulheres mais lindas do mundo. E a gente achava muito estranho que elas se achassem horrendas. Era bizarro vê-las reclamar em frente ao espelho, fazer dieta após dieta, chorar por não caber numa roupa, passar tanto tempo no cabeleireiro, fazer cirurgia plástica. Como que aqueles símbolos da perfeição podiam se considerar tão erradas? Com o tempo a gente foi crescendo, encrencando com nosso próprio corpo, e vendo que sim, nossas mães tinham razão: elas não eram bonitas como se deve ser. Nossa devoção a elas não durou muito. Já com os primeiros sinais da puberdade nosso pensamento mudou do “Quero ser como ela quando crescer” para o “Será que vou ser como ela quando crescer? Deus me livre!”. Não sei como essa transição acontece, ou porquê. Mas o papai continua sendo bonito pra sempre, não?

Uma vez, não faz tanto tempo atrás, uma amiga foi até à esquina com um amiguinho nosso de uns oito anos (filho de uma outra amiga), e voltou revoltada. Isso porque ela perguntou ao fofo, “Qual a amiga mais bonita da sua mãe?”, e escutou a resposta errada quando o menino disse: “A Lola!”. Juro que entendo sua revolta (de brincadeira). Afinal, ela é mais alta, muito mais magra, e mais jovem que eu. Em suma, ela é linda, dessas mulheres que atraem muitos olhares mesmo. E ainda assim o meu amiguinho fiel me elegeu a mais linda – certamente porque eu havia ensinado pôquer pra ele (naquele momento, se ele tivesse que escolher a mais inteligente, divertida e maravilhosa, eu também ficaria com os títulos). Faz parte. Beleza é também atração, e atração é causada por uma série de fatores. Tudo bem que alguns dias depois o fofinho me disse na cara que eu era feia e gorda. Seus avós tinham lhe falado que gente gorda era feia. Bom, eu sou gorda, sem dúvida, mas não me considero feia. Não vejo como sinônimos gordura e feiúra, nem gordura e pé na cova, nem gordura e desleixo moral, nem gordura e falta de vontade, nem gordura e preguiça, nem gordura e burrice. Mas naquele dia eu vi um menininho querido lutando entre o que ele achava bonito (eu, entre outras coisas) e entre o que a sociedade achava bonito. Falei pra ele que a gente considera bonitos cães e gatos de todas as raças, cores e tamanhos, mas, em se tratando de pessoas, costuma ver beleza em um só um tipo. E que eu achava isso um tanto limitado, estúpido até. Não sei se ele mudou de opinião, ou se continua mudando de opinião todo santo dia.

Mas por que estou escrevendo essas linhas tortas? Não é pra que alguém deixe de me achar feia, olhe por um outro ângulo, e descubra a minha beleza. Alguém me avaliar pela aparência física é meio irrelevante pra mim. Não estou num concurso de miss. Ok, eu sou mulher, e desde criancinha aprendi que o determinante mesmo pro meu sucesso na vida seria a minha beleza. Mas estou tentando me livrar desta sina, e se você quiser minha dica, ei-la: não espere até os 40 anos pra achar que tá tudo legal com você. Comece agora. Um outro conselho, já que é de graça: não tem problema você não achar bonita uma mulher gorda (a menos que seja você a mulher gorda). Eu não acho bonito homem de bigode. O que eu não faço é falar que ninguém nunca vai considerar bonito um homem de bigode, e que um homem de bigode está fadado a morrer logo - e sozinho. Demorou, mas eu aprendi que beleza é subjetiva.

Outros artigos relacionados a mito da beleza e aceitação do corpo: aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

domingo, 29 de junho de 2008

VELHARIAS PRA SE DIVERTIR NO DOMINGÃO, ANTES QUE A VIDA ACABE

Sabe quem é esse menino? Dica: ele fez ponta em Apocalyse Now

Se você tá achando o domingo meio paradão, ou tá jogado em frente ao sofá assistindo às atrocidades do pior dia da semana da televisão brasileira, deixe-me recomendar alguns textos meus e vídeos alheios que vão tomar muito do seu tempo. Encontrei mais crônicas antigas, que eu não via há quase uma década, perdidas na internet. Em muitos casos, nem me lembrava de tê-las escrito. Por exemplo, tem esta de 1999 comemorando os vinte anos do grande clássico que é Apocalypse Now, do Coppola (inclusive, no post sobre o resultado da enquete do melhor diretor americano vivo, esqueci de apontar mais um bom motivo pra votar no homem – ele nasceu em Detroit). O artigo prova que tem vezes que vale a pena perder as coisas (não é que perdi meus textos pré-2000 por ser totalmente desorganizada, mas por um vírus no meu computador). Quando escrevi sobre Apocalypse Now Redux, três anos depois, eu já não me lembrava de lhufas que havia falado no texto anterior. Agora, relendo os dois artigos, vejo que há pouquíssima repetição entre um e outro. Se eu tivesse lido o artigo de 99 antes de escrever a crítica de 2002, imagino que teria sido diferente. Se bem que, em 99, eu ainda não havia lido o livro do Joseph Conrad, Coração das Trevas, nem visto o documentário sobre as filmagens apocalíticas do clássico, dirigido pela mulher do Coppola, Eleanor (veja um trecho onde o Martin Sheen, pai do Charlie e do Emilio Estevez, mostra como estava tão bêbado que quebrou um espelho de verdade, sem querer).

Naquela época, não sei porquê, eu redigia vários textos “comemorativos”. Quer dizer, eu sei porquê: porque o jornal os publicava. Hoje só querem saber de lançamentos fresquinhos. Então, em 99, redigi um artigo sobre o centenário do nascimento do Hitchcock. Lá você pode conferir quais filmes eu considero os melhores do mestre do suspense. Tá na ordem e, de lambuja, ainda acrescentei fotos legais. Pena que não haja foto tão boa, com tanto movimento, quanto a que peguei de Pacto Sinistro. Daquela magnífica cena do carrossel, sabe? (e, se não sabe, tá aqui. Mas veja a obra inteira).

Em 99 também escrevi sobre o Monty Python, mais especificamente sobre o que considero o filme mais consistente deles, A Vida de Brian. Só que é com profundo pesar no coração que confesso que, uma década atrás, eu tinha memórias muito mais felizes tanto do Monty Python como do TV Pirata. Faz uns dois ou três anos, peguei os dvds do TV Pirata pra ver... e ri de pouca coisa. Tive que usar o fast-forward pra conseguir assistir tudo. E olha que na década de 80 eu era a maior fã deles. Não sei se o humor do grupo ficou datado ou quem ficou datada fui eu. E o mesmo aconteceu com Monty Python em Busca do Cálice Sagrado. Não que eu já tenha considerado essa comédia um supra-sumo, mas certamente gostava muito mais. Recentemente comprei o dvd por uns 15 reais, e tudo que eu e o maridão podemos dizer é: doa-se um dvd usado apenas uma vez. O filme não se sustenta. Somente duas gags funcionam bem, e dá pra vê-las no YouTube. Uma é um esquete clássico do humor inglês, a do cavaleiro negro. O Rei Artur vê um bravo guerreiro vencer uma luta e o convida para ser parte de sua corte em Camelot. O cavaleiro não apenas recusa como não deixa que Artur passe. Eles lutam, Artur lhe corta um braço, mas o cavaleiro não se dá por vencido: “É só um arranhãozinho”. Eu adoro os diálogos: “O que você vai fazer, sangrar em cima de mim?” e “Tudo bem, vamos considerar isso um empate”. Veja a cena aqui (sem legendas). Outra é a do coelho assassino, bem humor negro mesmo. Aqui.

E este clipe é do Sentido da Vida e chama-se “Todo Esperma é Sagrado”. Ele dificilmente poderia ser feito hoje sem causar uma cruzada religiosa da direita cristã americana. Não tanto por gozar dos católicos (e de todas as religiões), que têm muitos filhos por acreditarem que “every sperm is sacred”, e que Deus não perdoa um espermatozóide desperdiçado, mas principalmente por fazer crianças cantarem a palavra “esperma”. Impensável atualmente.

Sempre achei A Vida de Brian a melhor comédia do Monty Python. Ela não se faz só de esquetes colocados juntos; tem uma história mais inteligente, e 100% sacrilégica, claro. Não vou repetir porque já tá tudo no meu artigo de 99. Só queria indicar o vídeo do final do filme, em que vários carinhas prestes a morrer crucificados começam a cantar “Olhe Sempre pro Lado Bom da Vida”. É irônico e meigo ao mesmo tempo (aviso: a melodia vai se instalar na sua mente pelas próximas semanas). E é um dos meus hinos pessoais do otimismo, junto com a música “We Can Work it Out” dos meus amados Beatles. As duas canções dizem que dá pra vencer as adversidades ou, pelo menos, ver o lado bom de toda situação, a metade do copo cheio. Sei que sou uma Polyanna, mas acredito nisso. E as músicas dizem, acima de tudo, que a gente não vai viver pra sempre, então por que não se divertir começando agorinha mesmo?Não sei quem faz o cavaleiro negro do Monty Python. Só sei que não é o Harrison Ford...

sábado, 28 de junho de 2008

ESTADOS UNIDOS SEM PETRÓLEO, MUNDO SEM PAZ

Quem diria, o Bill O'Reilly, um dos maiores representantes do conservadorismo americano, apresentador-mor da Fox News, escrevendo uma coisa dessas? Num artigo chamado “Oil and Trouble” (“Petróleo e Problemas”), ele menciona o Brasil como exemplo do que o governo americano deveria ter feito e não fez: “Todos os presidentes nos últimos 50 anos desprezaram energia alternativa. Enquanto o Brasil enfocou veículos-flex que operam usando em sua maior parte alcóol de cana de açúcar, nossos presidentes e congressistas levaram comitivas ao Oriente Médio para abraçar sheiks árabes do petróleo”. E, no final, pede: “O congresso precisa exigir por lei que os fabricantes de carros e caminhões comecem a produzir um grande número de veículos-flex. Assim que esta lei for passada, postos de gasolina devem começar a instalar bombas de alcóol. O congresso também precisa baixar impostos do alcóol como combustível para que países como o Brasil possam vendê-lo para nós. Nós simplesmente temos que nos distanciar do cartel do petróleo. É um assunto de segurança nacional” (minha tradução).

Esse artigo é parecido com a plataforma do candidato republicano, John McCain (embora McCain adapte seu discurso ao que seus eleitores desejam ouvir). A julgar pelos quase dois mil comentários deixados por leitores na coluna do O'Reilly, os conservadores não estão felizes com essas soluções paliativas. Pra começar, por serem de direita, acham que governo (mesmo governos de direita, como o do Bush) só atrapalha, e não toleram qualquer crítica às empresas privadas – neste caso, às petrolíferas americanas. “É claro que elas devem ter lucro”, reclama um leitor indignado. Outro insiste: “Não precisamos de alternativas pro petróleo”.

A maior parte repete os slogans de um abaixo-assinado orquestrado pelo ultra-conservador Newt Gingrich, chamado “Drill here, drill now, pay less” (“Perfure aqui, perfure agora, pague menos”). Essa petição quer que os EUA comecem a explorar petróleo imediatamente no Alasca, no Texas e até na Califórnia, apesar dos sérios riscos ambientais. A culpa por não haver mais poços em solo americano é dos “ambientalistas fascistas”. Ou seja, nada de reduzir o consumo ou importar alcóol do Brasil. Porque acabar com a crise do petróleo se faz assim, por decreto. Gingrich escreve num artigo:“governos são criados para assegurar aos cidadãos os direitos dados por Deus, não para dar-lhes seus direitos. No dia 4 de julho, vamos todos recordar o que Ronald Reagan nos disse - que somos uma nação com um governo, não o contrário”.

Quando esse discurso aflora, vem à tona toda uma conversa golpista que a gente pensava não combinar com a mentalidade americana (a menos que fosse pra apoiar golpes de Estado em outros países). Por exemplo, entre os comentaristas do artigo do O'Reilly, há vários que dizem “Temos que fechar o congresso e o senado dos EUA”.

Ann Coulter, outro símbolo da direita, tem uma sugestão mais rápida pra resolver a crise: “Vamos invadir os países deles, matar todos os seus líderes e forçá-los a se converter ao Cristianismo”. Ela vem repetindo esse mantra desde 11 de Setembro, mas com o alto preço do petróleo uma idéia fascista dessas ganha força, como se vê entre os leitores do O'Reilly: “Deveríamos jogar uma bomba nuclear [nos árabes] e depois pegar todo o petróleo”. Ou: “Precisamos parar com toda a ajuda ao exterior. Vamos deixar que eles comam areia e bebam petróleo. Aí vão baixar os preços”.

Esses comentários são representativos do complexo de superioridade que muitos (mas não todos) americanos sofrem. É uma visão de que o mundo é que tem que se adaptar a eles, e nunca o contrário, já que mudar qualquer coisa no American way of life equivale a dizer pros terroristas “vocês ganharam”.

Com o preço do galão a 4 dólares, muita gente está deixando o carro em casa e pegando transporte coletivo. O problema é que a América não é um país que investe em ônibus e metrô. Toda vez que há congestionamentos, a solução é simples: construir novas estradas. Nunca incentivar o pessoal a andar de ônibus. Não é só aqui em Detroit que o transporte coletivo é ruim. Estivemos em Chicago e Washington e sentimos a mesma coisa (em Nova York praticamente só andamos em Manhattan). Tem pouco ônibus que vai até os subúrbios, onde mora a maior parte da população. As linhas e os horários são limitadíssimos. Agora, quando mais se precisa do transporte coletivo, ele vem sendo cortado. Afinal, o custo da gasolina não aumentou apenas para os carrões que circulam – aumentou para os ônibus também. Um ótimo documentário que vi, The End of Suburbia (sobre o qual preciso escrever mais), estima que, com a crise do petróleo, que veio pra ficar, os subúrbios americanos terão de ser abandonados. Não haverá como as pessoas chegarem nesses bairros mais afastados. O resultado será bilhões de dólares jogados ao lixo. Todo o investimento de décadas feito nos subúrbios (geralmente só gente mais pobre mora no centro) pode ir pro ralo. E o que teremos em breve, por todo o país, é o que vemos em Detroit: casas e prédios abandonados, às traças, caindo aos pedaços. Se os EUA não criarem alternativas ao petróleo, esse cenário parece inevitável.

sexta-feira, 27 de junho de 2008

CRÍTICA: AGENTE 86 / Permissão para matar o agente 86

Steve Carell e Anne Hathaway, se divertindo muito mais do que eu

Ai, não gostei nadinha de Agente 86, mas pelo menos não fui a única. Um crítico chamou a comédia de “The Spy who Bored Me” (“O espião me me chateou”, num trocadilho com o 007 The Spy who Loved Me). Outro disse que o filme não nos faz tirar o sapato e ligar pra casa, pra recomendá-lo pro pessoal. Um fã da série reclamou da decepção que o treco lhe causou: “é como esperar um novo álbum dos Beatles e receber um da Yoko Ono”. Mas, sei lá, vamos admitir: tem coisas que parecem fofinhas pra gente porque nos lembram da nossa infância. Mas elas não eram tão maravilhosas assim. É o caso de Speed Racer, e da série de TV que inspirou Agente 86. Eu nem me lembrava que era da autoria do Mel Brooks, mas ela tinha claque. Tá, Seinfeld também tinha, e deve ser por isso que não posso considerá-la um supra-sumo. Claques são uma ofensa a minha inteligência, ou pelo menos ao meu senso de humor. Elas indicam que eu devo rir naquele exato momento. Se eu achar engraçado eu rio sozinha, ora!

Agente 86, o filme, não tem claque, mas é como se tivesse. As piadinhas são telegrafadas (e as melhores estão no trailer, que cri-critiquei aqui). Havia um carinha na sessão que fui que eu convidaria pra ser parte da minha platéia-teste, se eu fizesse uma comédia. Ele ria de praticamente tudo. Bala de paintball na calça? Hahaha. Steve Carrell se auto-flagelando no banheiro do avião? Huhuhu. Casal de agentes dando de cara num muro? Ióióió. Mas nem com esse sonho de espectador todas as gags funcionaram. Na do Steve segurando o ator que fez o produtor de Borat e simulando um ato sexual, o sujeito não riu. E olha que Agente 86 é a espécie de produto que perde o amigo, mas não perde a piada. Faz de tudo pra arrancar uma gargalhada da platéia. Tipo: o personagem do Dwayne Johnson bater com o nariz na parede. Não tem nada a ver com ele. A gente espera que o Steve, sim, dê com a cara na porta, não o Dwayne. E aproveitando que estou falando do The Rock, nunca pensei que iria dizer uma coisa assim na minha vida inteira, mas gostei dele. Acho que ele leva jeito como ator cômico, e seu rosto é uma graça (seu corpo também não é de se jogar fora, claro, pra quem gosta de músculos). Sua primeira aparição, em câmera lenta, todo charmoso, é um código pra que a gente o ache gostoso, já que movimentos em câmera lenta objetificando o corpo são reservados a mulheres. E aí ele bate na parede.

Um dos inúmeros problemas desta comédia é que ela precisa se decidir: o Agente 86 é um super carinha bem-treinado e competente a serviço do governo americano (como ele aparenta ser na paródia à Armadilha, Missão Impossível e quetais – quando ele tem que passar por uma sala cheia de raios infravermelhos), ou um trapalhão incapaz? Difícil ser ambos. O filme às vezes tenta levar a trama de espionagem a sério, o que é uma estupidez. Isso de encher a tela de legendas como “Washington DC 22:00 horas” é cansativo e não serve a propósito nenhum, fora remeter a Ultimato Bourne. Mas sabe, os russos só continuam sendo inimigos número 1 dos americanos em Hollywood. Ainda que Agente mencione Coréia do Norte e nossa vizinha Venezuela como vilãs, a encrenca é mesmo russa (soviética, até!). Por outro lado, é legal que eles tenham filmado em tantos lugares e desperdiçado bem os 80 mihões de dólares que custou o negócio. Quando apareceu a Praça Vermelha em Moscou, por exemplo, eu não me contive e sussurrei pro maridão: “eu já escorreguei aí!”. Mas no fundo a comédia é como todas as portas que se abrem na entrada da organização ultra-secreta: um monte de engenhocas que não dão em nada.

E, além de homofóbico, o filme é também gordofóbico. Há várias conversas sobre o terror dos carboidratos, que são pintados como uma ameaça muito mais séria que qualquer bomba atômica. Steve, como o agente 86, mostra várias vezes uma foto sua de quando estava acima do peso (e há flashbacks em que ele, gordo, não consegue superar obstáculos, e vai mal nos treinamentos – porque não existe chance no mundo de um gordo ser atlético). Ele tem pesadelos em que volta a ser gordo, e come qualquer alimento como um desesperado. Aprendemos duas verdades indiscutíveis sobre gordos – que são fisicamente incapazes, e que comem demais. Ainda bem que o filme martela isso, já que a gente podia esquecer. E há tambem uma cena em que uma russa gorda numa padaria sugere transar com Steve, e ele recusa, assustado. Ele pega uma gorda pra dançar, numa espécie de competição em que a Anne Hathaway ganha fácil. Sobre a personagem da Anne, ficamos sabendo que ela passou por uma cirurgia plástica que lhe deu novas feições e nova identidade, pra que ninguém reconhecesse a versão antiga. Então por que a gênia carrega com ela uma foto de como era antes? O mundo livre tá na mão desses superdotados intelectualmente?

Como eu já disse, quem se sai melhor é o Dwayne. Mas gostei do Alan Arkin na maior parte das cenas. O pobre Terence Stamp tá completamente desperdiçado. James Caan surge uns dois minutos como presidente americano (sempre um papel ingrato) e parece estar se divertindo. E acho que o Bill Murray tem uma pontinha não creditada que – bom, só vou dizer que compreendo perfeitamente que não seja creditada, pra não manchar sua carreira. Vai que a gente o confunde com o velhinho Creed do The Office americano (foto)?

O clímax do filme se dá no auditório Disney Hall, na Califórnia. Quando surgiu na tela aquela construção pavorosa, eu pedi: “Por favor, Deus, permita que os terroristas a explodam”. Aquilo sim é um atentato à humanidade. Mas Agente 86 não fica muito atrás.


Selecionei dois trechinhos da série Agente 86 na TV, aqui e aqui. No YouTube tem muito mais.

ROBÔ E CAROLINA DIECKMANN ENTRE AS ESTRÉIAS DA SEMANA

Como ontem escrevi demais, hoje vou ser bem sucinta (sei o que você está pensando: “pago pra ver”). Ainda estou devendo a crítica de Agente 86, que sai hoje.

Aqui nos EUA neste final de semana há basicamente duas estréias: Wall-E, que chega hoje ao Brasil também (cri-critiquei o trailer aqui), e Wanted (Procurado; leia a cri-crítica do trailer). Procurado tava marcado pra estrear simultaneamente no Brasil, mas o lançamento foi adiado pra 22 de agosto. Acho que vou dar um pulo no cinema e ver os dois filmes, se bem que nenhum deles me entusiasma muito.

No Brasil, quem toma quase todas as salas deve ser o desenho animado da Pixar Wall-E, seguido por Jogo de Amor em Las Vegas. Não tenho a menor intenção de ver a comédia romântica com a Cameron Diaz (já cri-critiquei o trailer, e foi muito). Porém, por incrível que pareça, o filme segue indo bem nas bilheterias americanas. Já arrecadou 80 milhões de dólares, número alto pra um chick flick (ou seja, mulheres como público-alvo). Sex and the City ultrapassou os 130 mi, e é o recordista absoluto no gênero “filmes para mulheres”.

Outro que chega é A Força da Amizade (Bonneville), com excelentes atrizes como a Jessica Lange, Kathy Bates e Joan Allen. O Metacritic deu apenas nota 46. É uma produção independente que pouca gente viu.

O filme de época franco-italiano A Última Amante, o espanhol Caótica Ana, e o francês Lady Jane também estréiam, além de Amar Não Tem Preço. Eu tinha falado do lançamento dele, mas pelo jeito foi adiado. Chega hoje. Talvez o principal entre os filmes de distribuição limitada que você deve conferir é o nacional Onde Andará Dulce Veiga, com Maitê Proença e Carolina Dieckmann. Ok, eu também não gosto nada da Carolina, mas a direção é do Guilherme de Almeida Prado, do lindo A Dama do Cine Shanghai. Quem sabe um bom diretor dê jeito numa atriz medíocre?

quinta-feira, 26 de junho de 2008

RESULTADO DA ENQUETE – MAIOR DIRETOR AMERICANO VIVO

Não falei que ia ser dureza escolher o maior diretor americano vivo? Primeiro que houve gente que ousou reclamar da enquete: como assim, maior diretor vivo? O sujeito pode estar vivo e não estar ativo! E depois, cadê o Almodóvar e o Ridley Scott? Respondendo ao primeiro queixoso, eu pensei em fazer uma pesquisa pra eleger o maior diretor em atividade. Mas aí, dessa lista que proporcionei, o único que ficaria de fora seria o Coppola (quer dizer... não). E certamente o Almodóvar merece uma enquete só dele (o Ridley Scott não dá pra comparar, dá?), mas nenhum dos dois é americano. Outra enorme dificuldade é que esqueci de incluir gente importante na lista, como o Tim Burton e o George Lucas. E, por que não, se o Paul Thomas Anderson entrou, que tal o Alexander Payne (Eleição, Sideways), o Wes Anderson (Excêntricos Tenembauns, Rushmore), o Todd Solondz (Felicidade, Bem-Vindos à Casa de Bonecas), o John Singleton (Os Donos da Rua, Duro Aprendizado), o George Romero (A Noite dos Mortos-Vivos, Madrugada dos Mortos), o Philip Kaufman (A Insustentável Leveza do Ser, Invasores de Corpos), o Michael Mann (Colateral, O Informante), o David Fincher (Zodíaco, Fight Club) e até o Michael Moore (documentarista não conta?) e o M. Night Shyamalan (que nasceu na Índia mas viveu toda sua vida nos EUA, e ninguém poderia dizer que ele é um diretor indiano, não americano)? Eu esqueci dessa gente. E esqueci não por não gostar deles, mas por achar que eles ainda são muito jovens e, embora cada um tenha feito um filme excelente, não estão nem de longe no mesmo patamar dos diretores na lista.

89 pessoas votaram na enquete, e e disputa esteve acirrada desde o início. Na lanterna ficaram Spike Lee (do brilhante Faça a Coisa Certa, sua única obra-prima até agora), e Sidney Lumet. Sidney está velhinho – ontem fez 84 anos -, mas continua na ativa. Acabou de quase ser indicado ao Oscar por Antes que o Diabo Saiba que Você Está Morto. Seus grandes filmes incluem Doze Homens e Uma Sentença (o de 1957, com Henry Fonda; um dos melhores filmes de júri já feitos), Um Dia de Cão, O Veredito, Rede de Intrigas e, na minha modesta opinião, O Peso de um Passado (de 88, e que tem a melhor atuação do River Phoenix). Mas este último não sei se mais alguém além de mim considera um grande filme. Só sei que eu choro baldes todas as vezes que assisto.

3% votaram no David Lynch. Eu gosto dele, mas jamais a ponto de considerá-lo um dos grandes, porque ele é muito irregular. Tem quem veja Veludo Azul como o grande filme dos anos 80 (eu não). Prefiro O Homem Elefante (foto). Gosto de Cidade dos Sonhos (apesar de não ter entendido muita coisa), de História Real, de Coração Selvagem, e do Twin Peaks feito pra TV. Mas todos esses filmes juntos não têm o peso de um Taxi Driver, por exemplo.

Com 4% cada um vêm Brian de Palma e Francis Ford Coppola. Olha, o De Palma ter tão poucos votos eu até entendo. Quais suas obras-primas? Carrie (talvez), Os Intocáveis, e Um Tiro na Noite? É pouco. Mas o Coppola merecia votação mais expressiva, gente. Ele fez A Conversação, O Poderoso Chefão 1 e 2, Apocalypse Now, e O Selvagem da Motocicleta (foto) que eu adoro. Três desses filmes geralmente recebem destaque nas listas dos melhores filmes de todos os tempos. E coitado, ele tá em atividade (ano passado dirigiu Youth Without Youth), mas tem caído tanto que todo mundo prefere fingir que ele se aposentou. Ele foi talvez o maior diretor americano logo no ano que muitos consideram a maior década do cinema americano, a de 70. É hiper importante.

5% votaram nos irmãos Coen. É cedo ainda. Apesar da alta qualidade de O Homem que Não Estava Lá, Barton Fink, Ajuste Final, Arizona Nunca Mais (foto) e Onde os Fracos Não Têm Vez (não faço parte da legião de fãs do seu primeiro filme, Gosto de Sangue, e nem do cultuado O Grande Lebowski), pra mim eles só têm uma obra-prima até agora, Fargo. Eles são jovens (54 anos) e talvez, daqui a vinte anos, numa outra enquete, eles possam ficar no topo.

Aí chega o Tarantino, com 7%, que saiu na frente mas empacou no meio. O cara é excelente, e só pode negar quem não gosta do seu estilo (que não é pra todo mundo, e que tem mais a ver com diálogos longos e às vezes desconexos que com violência). Senão, vejamos: qualquer um que dirigiu um dos melhores filmes dos anos 90 (Pulp Fiction) merece ser considerado. Mas Taranta fez mais. Cães de Aluguel é uma estréia pra ninguém botar defeito. Eu amo Jackie Brown (foto), embora saiba que não está no mesmo patamar. Tanto o Volume I quanto o II de Kill Bill são incríveis. As besteirinhas que ele fez pra Grande Hotel e Sin City não contam (e mesmo o maridão, que adora CSI, achou fraco o episódio dirigido pelo Taranta). E À Prova de Morte nem dá pra considerar um longa, se bem que eu acho a melhor parte de Grindhouse, disparado. Gente, é muito filme bom, ainda mais pra quem só tem 45 anos.

Com 8%, é a vez do Clint Eastwood, que já dirigiu quase trinta filmes. Mas aí é que tá o problema: alguém consegue citar de cabeça mais de três ou cinco? Pra cada Pontes de Madison (que gosto muito; foto) ele entrega um Cowboys do Espaço. Tem quem babe por Bird, Meia-Noite no Jardim do Bem e do Mal, e Cartas de Iwo Jima. Eu não. Eu só babo mesmo por Imperdoáveis.

Surpreendentemente, pra mim, Paul Thomas Anderson ficou com 10%, em quarto lugar. Hoje é seu aniversário, tá fazendo 38 anos. E tem cinco longas até agora: Jogada de Risco, Boogie Nights, Magnólia (foto), Embriagado de Amor, e Sangue Negro. Todos filmes respeitáveis, talvez com exceção do veículo pro Adam Sandler, Embriagado. Mas gente, não dá pra compará-lo a um Coppola. Nem a um Taranta, né? Não ainda.

Martin Scorsese ficou em terceiro, com 12%. É um desses monstros sagrados do cinema. Eu não sou tão fã de Touro Indomável ou de Os Bons Companheiros, mas adoro Taxi Driver, e outros que parece que só eu adoro, como A Cor do Dinheiro e O Rei da Comédia (foto). E Infiltrados? Pra mim é um senhor filme (não posso dizer o mesmo de Cabo do Medo ou A Era da Inocência, pelos quais não nutro nenhum carinho).

O segundo lugar na enquete, com 16%, ficou com o Spielberg. Por mim tá muito bem merecido. Já falei dele aqui e aqui.

E em primeirão, com apenas dois votos na frente do Spielberg: Woody Allen. Ele é um fênomeno mesmo. 73 anos, mais de quarenta filmes, dos quais pelo menos oito são obras-primas. Recentemente vi em DVD Scoop-O Grande Furo e O Sonho de Cassandra (foto), e gostei muito dos dois. Ele pode não atrair público, mas continua fazendo bons filmes. Na base do um por ano. Ah, quem dera o Kubrick tivesse sido assim tão produtivo!

ACHADOS E PERDIDOS, PERGUNTAS E RESPOSTAS

Pode perguntar o que quiser, que se eu souber responder, eu respondo. Como você pode ver, ainda não tenho um título pra esta minha nova seção de “Pergunte a Lolinha”. Então mande sugestões, perguntas, cabeçalhos pro blog, bombons de chocolate (sem licor, por favor)...

Lola, flor, me mande uma lista das coisas que você gosta (ou dos fotógrafos que você admira, ou o espírito que você quer dar ao blog) que eu tento fazer um cabeçalho legal pra você, ok? Suzana

Decidi responder a Suzana neste espaço pra que talvez mais gente se anime a fazer um cabeçalho pro meu bloguinho. Quem me conhece do Lost Art sabe que lá eu tinha um – bom, não sei se era um cabeçalho, mas era uma página de abertura – bem legal. Foi meu irmão que fez. Ele pegou uma foto antiga que tinha, alguma foto de uma sala de cinema, e fez a montagem. Só que, fora ele não me autorizar a ficar com o cabeçalho que ele havia criado (eu também não pedi), o meu bloguinho de agora não é apenas sobre cinema. Claro que esta é uma parte importantíssima na minha vida. No entanto, quem acompanha todos os posts sabe que eu tô escrevendo sobre muitos assuntos, como feminismo, política, aceitação do corpo, consumo, animais, maridão... e cinema.A Ju me enviou um banner muito fofo que fez. Gostei e agradeço de coração, mas tá um pouquinho sem movimento. Talvez tenha que usar alguma foto minha como pano de fundo. Não tenho certeza. Mas, pra quem quiser tentar, todas as fotos minhas que tenho, no momento, estão no orkut. Ou aqui no blog. Desculpem, sei que este não foi um briefing muito específico, mas é que também não sei ao certo o que quero. Só quero um cabeçalho chamativo, dinâmico e bonito que faça as pessoas ficarem no blog, pra que possamos viver felizes para sempre. Só.

Me diga uma coisa, do que irá sentir falta dos USA? E quais os lugares que você visitou por aí?” Cavaca
Sobre as coisas que irei sentir falta, vou fazer um post mais pra frente (junto com as coisas que não irei sentir falta). Já tava nos meus planos. Os lugares que visitei por aqui não foram muitos. Fui a Washington DC, Chicago (foto) e Nova York. Escrevi sobre essas experiências aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

Uma pergunta de cunho pessoal: considerando seu relativo desprezo aos EUA, por que, no meio de tantos idiomas existentes, você foi logo escolher aprender e lecionar a língua inglesa? Sei que outros países falam inglês além dos Estados Unidos, mas a Inglaterra também não é flor que se cheire. Sem falar que as demais nações que falam inglês são todas colonizadas por eles, inclusive a Austrália. Existe aí uma certa relação de amor e ódio, hein?” Zero Cool

Como diria Jack o Estripador, vamos... pular os clichês: eu não tenho desprezo pelos EUA. Gosto daqui e gosto da imensa maioria dos americanos, embora algumas ações do país sejam deploráveis (tipo essa mania de invadir outras nações, sabe?). E gosto muito do idioma inglês, que considero mais fácil que outras línguas. Isso dos verbos não mudarem, de não haver listas e mais listas de conjugação verbal (só existe um verbo com dois passados, e é o to be, que tem was e were), facilita demais a vida das pessoas que querem aprender inglês. Assim como a falta de gênero das palavras. É só the table, não a mesa ou o mesa (repare como isso é terrivelmente complicado pra quem tá tentando aprender português). Okay, tem as preposições, que eu odeio e quero que morram. E tem a grafia das palavras (spelling), que não é nada fácil, mas ao menos eles não usam acentuação. E há todo um vocabulário extenso, e sons alienígenas como o famigerado th. Porém, no geral, acho que devemos agradecer que a China ainda não domina o mundo e não precisamos todos aprender chinês. Inglês é uma língua bastante simples. E mesmo pra quem não gosta de inglês, aprender ou não a língua meio que deixou de ser uma opção já faz um tempinho. Hoje, 70% das pessoas que falam inglês não são falantes nativos do inglês. O que não quer dizer que devemos abandonar a nossa querida língua portuguesa, de jeito nenhum. Mas o que há de errado em saber falar mais de uma? Sei lá, ser monoglota é algo tão, tão... americano.

Também não sei se tive muita opção. Meus pais me puseram pra aprender inglês aos oito ou nove anos. E em seguida me puseram pra estudar numa escola americana em São Paulo, e lá tudo era em inglês. Décadas depois, quando tive que rever matemática básica pra ensinar crianças no meu estágio da Pedagogia, suei pra aprender matemática brasileira. Em inglês é diferente. Até a barrinha de divisão nas operações fica do outro lado.

Mas quanto a minha decisão de lecionar inglês... Aconteceu há uma década, mais ou menos. Lá estava eu, meio desorientada da vida em Joinville, quando considerei um desperdício não usar meu inglês pra absolutamente nada. Então decidi dar algumas poucas aulas de inglês como bico. E rapidamente descobri que dar aula não é bico em nenhum sentido. Comecei a ver que a única capacitação que tinha pra dar aula de inglês era saber bem inglês, e que só isso não era suficiente. Fiz cursos, fui a congressos, me envolvi totalmente, e tentei usar cinema e literatura pra ensinar inglês. E, desde o comecinho, sempre gostei muito de dar aula. Só não é um bico.

A primeira parte da seção de perguntas tá aqui.