domingo, 31 de dezembro de 2006

CRÍTICA: FILHOS DA ESPERANÇA / Que esperança?

Sem aviso prévio, dois dos melhores filmes de 2006 tiveram uma passagem meteórica por Joinville. Duvido que continuem em cartaz, porque seria bom demais pra ser verdade. Quem viu, viu, quem não viu deve vê-los assim que saírem em DVD. Estou falando de “Volver” e de “Filhos da Esperança”. Sobre o primeiro, nenhuma novidade. Tudo que o Almodóvar faz é amplamente aguardado. As expectativas são altas pra quem praticamente fez cinco obras-primas consecutivas. Mas e pro Alfonso Cuarón, diretor de “Filhos”, alguém dava alguma coisa? Tá certo que o mexicano fez o ótimo “E Sua Mãe Também”, e tem quem adore “Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban (não esta que vos fala), mas esse não é o melhor dos currículos. E de repente aparece “Filhos”, forte candidato ao Oscar de fotografia, que os críticos americanos chamam de “Blade Runner” do século 21. Um filmão.

Tem uma palavra que nem sei se existe em português: distopia. É o contrário da utopia. Utopia é o sonho de um mundo ideal, e distopia é “Admirável Mundo Novo”, “1984”, “Laranja Mecânica”, “Blade Runner”, e este “Filhos”, entre outros. São cenários de um futuro sombrio. Como eu adoro distopias e histórias sobre fim do mundo, sou suspeita pra elogiar “Filhos”. Só posso dizer que o troço é de uma angústia só e me deixou na beira da cadeira durante toda a projeção, sofrendo pacas. Quando veio um momento comovente, lá pelo fim, eu compareci. Dizer que chorei é covardia. Eu tive convulsões. Foi breve, mas doloroso.

“Filhos”, baseado num romance de uma tal de P. D. James, mostra o que será da gente em 2027. O filme não capricha nas tecnologias futuristas, ao contrário de “Minority Report” (que eu gosto muito). O mundo é um inferno, ponto, e nesse contexto não faz a menor diferença ter TV de plasma ou celulares de última geração. Alguns países e continentes (África, pra variar, e parte dos EUA) foram dizimados por guerras, inclusive nucleares. Na Inglaterra, imigrantes ilegais são mandados para campos de concentração. E, pra piorar, as mulheres não conseguem mais ter filhos. O último bebê nasceu há dezoito anos e é argentino, veja só onde fomos parar (imagina o futuro da humanidade depender de um argentino). Essa celebridade mundial morre e o pessoal de Londres enche as ruas com fotos e flores, como fizeram na época do acidente fatal da Lady Di. Cães e gatos são tratados como filhos. Os outros animais são queimados em estradas. Logo logo, assim que todo mundo morrer, a humanidade acaba. Pra mim, uma das imagens que fica é a do Davi de Michelangelo sem a parte inferior da perna. Mas tem que olhar rápido, porque o filme transborda de informação.

Nesse caos ainda somos presenteados com um elenco de primeira, como o Clive Owen, Julianne Moore, Michael Caine, e bons atores que nunca ouvi falar, com três nomes ainda por cima, só pra carreira não decolar. O impressionante é que a câmera nervosa enfoca um herói no meio de um tiroteio que nem pensa em pegar em armas, o que é muito diferente do que a gente tá acostumada a ver. De qualquer modo, fica a reflexão: se já nos comportamos desse jeito abominável hoje, sabendo que atrás vem gente, imagine se soubéssemos que a humanidade acaba aqui. Eu quase saí da sessão com vontade de fazer um filho. Quase.

Eu e o maridão não temos nem queremos filhos, um pouco por hedonismo e preguiça, outro pouco porque já tem gente demais no mundo, e mais um pouco por não querer deixar pra ninguém o legado da nossa miséria, como já escrevia Machado de Assis um século atrás. Sem falar que sinto cada vez mais que a humanidade é o vírus da Terra, como dizem em “Matrix”, e que a gente tá seriamente acabando com o planeta. E acabando mesmo, finito. Do jeito que está, e após ver “Uma Verdade Inconveniente”, tenho minhas dúvidas se ficará alguma herança pros netinhos. Existem comunidades que defendem a idéia do ser humano parar de se reproduzir, deixar a humanidade acabar, e aí começar tudo de novo, pra ver se dá certo dessa vez. Eu não chego a tanto, mas não consigo ver distopia como ficção científica. Pra mim é a realidade batendo à nossa porta, e salve-se quem puder.

PIOR FILME DE TODOS OS TEMPOS PARA SE ASSISTIR NO REVEILLON

Se você achou a crônica de Filhos da Esperança um péssimo meio de começar o ano, acompanhe minha história de reveillon. Descobri o pior filme de todos os tempos pra se assistir durante a passagem de ano. É “Johnny Vai à Guerra”, do Dalton Trumbo, de 71, sobre um rapaz sem braços, pernas, olhos, boca, nada, confinado a uma cama num hospital militar. Uma grande novidade pra ele é quando a enfermeira-chefe manda deixar a janela sempre aberta. Assim ele consegue detectar dia e noite e começa a medir o tempo. Ao completar um ano, ele quer comemorar, mas não sabe se é ano novo lá fora. Outro fato marcante ocorre quando uma enfermeira boazinha escreve “Feliz Natal”, letra por letra, no seu peito. Eu chorei baldes, óbvio. Depois fiquei pensando se a humanidade também não tá assim como o rapaz, incomunicável, quase em coma, esperando o fim, e celebrando reveillon e outros ritos de passagem só pra medir o tempo, por falta do que fazer. Ok, este é o texto mais deprê que você vai ler de mim em 2007. Prometo.

sexta-feira, 1 de dezembro de 2006

VAMOS AOS CHUTES

Aqui vão alguns dos meus palpites pro Oscar. Pra melhor filme, a Academia deve ir mesmo de “Brokeback Mountain”. Pode ser polêmico e tal, mas não consigo imaginar outro (talvez “Crash”?). Aliás, pras quatro primeiras categorias o favoritismo é grande. Ang Lee pra diretor, Philip Seymour Hoffman pra ator, Reese Witherspoon pra atriz. O Oscar tem ido pra atrizes bem jovens nos últimos anos. Duvido que a Felicity Huffman tenha alguma chance. Qualquer outro vencedor nessas quatro categorias será zebra pra mim.

Pra ator coadjuvante as coisas complicam. Talvez o Paul Giamatti seja o favorito. Seria uma espécie de compensação por ele ter sido esquecido por “Sideways” no ano passado, e ele é um ator respeitado. Mas, pelo que entendi, ele faz um treinador de boxe, e o Morgan Freeman acabou de fazer o mesmo papel em “Menina de Ouro”. Então eu vou de George Clooney, já que o prêmio de coadjuvante pode ser a única estatueta que leve na noite. Fora isso, ele não engordou não sei quantos quilos pro papel? O páreo vai ser duro aqui.

Pra atriz coadjuvante a Rachel Weisz é favoritíssima. É onde “O Jardineiro Fiel” tem mais chances.

Roteiro original: todo mundo tá apostando em “Crash”, inclusive eu. “Boa Noite e Boa Sorte” é a segunda opção, pois seria uma forma de premiar o George Clooney. “Syriana” é muito confuso; a Academia não gostou do último Woody Allen, “Ponto Final”, e que diabos é “A Lula e a Baleia”?

Roteiro adaptado: em geral, melhor filme leva melhor roteiro, daí “Brokeback Mountain”. Mas eu não descartaria totalmente “O Jardineiro Fiel”. O livro que gerou esse filme é o mais conceituado entre os cinco indicados. E “Capote” é amado pelos críticos americanos.

Fotografia: ish, não sei. Por mim eu escolheria o “Batman”, mas acho que “Memórias de uma Gueixa” e “Brokeback” estão um pouco na frente. “Gueixa” porque é o tipo de filme em que pouca coisa presta além da fotografia, “Brokeback” porque vai ganhar melhor filme. Mas depende de quantas estatuetas serão dadas pro drama do Ang Lee. “Boa Noite” é em branco e preto, todo mundo fuma no filme, e quando o pessoal fuma a fumacinha faz um belo contraste. “A Lista de Schindler” não ganhou?

Direção de Arte: se houver justiça vai pra “King Kong”. Afinal, eles recriam a Nova York nos anos 30 e uma baita selva. “Memórias de uma Gueixa” só recria uma vila japonesa, e quem sabe o outro filme de época, “Orgulho e Preconceito”, divida os votos com “Gueixa”. “Boa Noite” é todo dentro de um estúdio e tem montes de close-ups, nem prestei atenção na direção de arte.

Figurino: tem todos aqueles quimonos de seda em “Memórias de uma Gueixa”. Acho que leva. “A Fantástica Fábrica de Chocolate” é o mais moderninho entre os cinco indicados, mas só me lembro da roupa do Johnny Depp (aliás, como não indicaram o filme pra maquiagem? Ele tá a cara do Michael Jackson).

Edição: olha o nome do filme, “Crash”. Ainda não vi, mas com esse título parece favorito pra montagem. Se “Munique” não sair com as mãos abanando, leva esse.

Maquiagem: ué, o leão de “Crônicas de Nárnia” não foi gerado por computador? O mérito de “Nárnia” foi ter deixado a Tilda Swinton com cara de bruxa, mas convenhamos que não deve ter sido difícil. Eu apostei em “Nárnia”, mas com muitas reservas. A maquiagem de “Star Wars” deve ser melhor. E a de “A Luta pela Esperança” deve ser a mais realista, então não sei.

Som: nessa categoria costuma ganhar o filme mais barulhento, por isso “King Kong”. Só não sei se “Guerra dos Mundos” tira votos dele. “Johnny e June” é um musical, logo a mixagem de som é ótima (“Chicago” recebeu a estatueta nesse quesito em 2003; “Ray” em 2004). Mas “Kong” se destaca.

Edição de Som: não entendi o que “Memórias de uma Gueixa” tá fazendo aqui. Vou de “King Kong” mesmo.

Efeitos Visuais: “King Kong”, né? Pobre Spielberg. Nenhuma estatueta pra enfeitar a ladeira desta vez, e olha que dois filmes dele concorrem.

Trilha Sonora: pode ser que “Memórias de uma Gueixa” esteja um pouquinho na frente. Mas a trilha é do John Williams, que já foi indicado 45 vezes (todo santo ano sem falta) e ganhou cinco. E a de “Munique” também é dele. Os votantes devem ficar divididos. E também, gente, como que um filminho tão meia-boca como “Gueixa” pode levar tantos prêmios? A trilha de “Brokeback” parece ter uns três acordes e é assinada por um argentino. De repente o favoritismo do filme conte pro argentino ganhar essa.

Canção Original: não conheço nenhuma. Votei na de “Ritmo de um Sonho” porque tem gigolô no título. Deve ser a mais bonitinha. De qualquer modo, graças a Deus que só foram indicadas três este ano. Só três números musicais pra aturar!

Animação: tanto “A Noiva-Cadáver” quanto “Wallace e Gromit” usam a mesma técnica de fotografar massinha de modelar. Ambos receberam excelentes críticas. Qualquer um dos dois pode levar. Eu chutei o “Wallace” mas torço pra “Noiva”.

Filme Estrangeiro: parece que tá entre os dois concorrentes do Terceiro Mundo, “Paradise Now” da Palestina e “Tsotsi” da África do Sul. “Paradise” é mais elogiado, mas também é bem mais polêmico, e os votantes judeus podem não querer premiar palestinos falando de homens-bomba. Se “Tsotsi” tiver criança na história, ganha.

Seja o que Alá quiser...