É mais ou menos sobre a máfia irlandesa. Sai New York, New York, cenário tradicional dos filmes do Marty, entra Boston. Há dois policiais, o Matt Damon e o Leonardo DiCaprio, e um ultra-vilão, o Jack Nicholson, lembrando um Vinicius de Moraes versão malvada. No começo até me preocupei, porque confundi o Matt e o Leo. Ambos são loiros e lindinhos. Mas essa confusão é proposital: os dois precisam ser iguais e opostos ao mesmo tempo. Tem também o Mark Wahlberg (“Planeta dos Macacos”), que eu nem reconheci. Todo o elenco tá ótimo, inclusive uma atriz desconhecida (Vera Farmiga) e nada bonita que se envolve com os loirinhos. Acho que até o fato d’ela ser toda torta dá esperança às espectadoras: um dia, o Leo e o Matt podem ser nossos.
Então, o personagem do Jack é um poço de maldades, e tem as falas mais espirituosas. Ele é um ator maravilhoso e a gente só espera que ele seja sempre assim. Claro que ele está à vontade, faz suas gracinhas, como quando imita um rato. Indicá-lo pro Oscar será super óbvio. Quero ver é indicarem o Leo, que carrega a trama. Pra mim, é mostra da inteligência do Scorsese escolher o Leo pra ser seu novo De Niro. É o terceiro filme consecutivo com ele, e o Leo melhora a cada vez. Chega uma hora em que ele conta como é fazer companhia a um psicopata: seu coração bate a mil por hora, morrendo de medo, mas suas mãos nunca tremem. Porque, se tremerem, verão que está mentindo, que seu papel é pura ficção. Acho que o Leo transmite isso perfeitamente. E mesmo quando ele tem que mentir, e mente mal, ele está arrasador. Ok, o Jack tá bárbaro, o Mark idem, mas um é mau, o outro nervosinho, respectivamente, o tempo todo. Os papéis do Leo e do Matt são muito mais complexos.
Tem várias coisas instigantes no filme, a começar pelo roteiro de William Monahan, de “Cruzada” (acredite se quiser, trata-se de uma refilmagem de “Conflitos Internos”, produção chinesa de 2002). “Infiltrados” enfoca os nossos vários papéis do dia a dia. Pra cada grupinho interpretamos um personagem. Atuamos de uma maneira pro chefe, outra pro nosso amor, outra pro cachorrinho. Até aí tudo bem, quero ver é fingir ser um criminoso pra se infiltrar na máfia. Talvez por isso a primeira metade seja superior à segunda. O fim é meio frouxo e a cena final não tem sutileza alguma, mas o ritmo é excelente. Tem gente que acha “Taxi Driver” e “Touro Indomável” chatos, por exemplo. Aqui não há tempo perdido. A única cena que eu tiraria seria a de sexo. Não que “Os Infiltrados” vire “Os Infiltarados”, mas a cena pára o filme. Tudo bem, dá pra entender por que ela tá lá: pra fazer um contraponto ao outro sujeito, que é impotente. É até bom que mostrem a moça transando com só um dos carinhas, porque a omissão fala um monte sobre a sexualidade de cada um. Mas corta o ritmo. E uma das minhas cenas preferidas é quando um liga pro outro, e nenhum tem coragem de sequer dizer “Alô?”. Só não entendi quando um cidadão é seguido. Se alguém sabe com quem ele tá se encontrando, é caixão pra eles. Aí ele diz o nome do outro pelo celular?! Isso é serviço de inteligência?
Este é o melhor momento do Martin Scorsese desde, vejamos, “Cassino”. Acho melhor que “Os Bons Companheiros”, mas não sou a maior fã deste filme. Pelo jeito tem dois riscos pro Marty não receber seu merecido e atrasadérrimo Oscar: a) o Clint Eastwood ganhar dele de novo; e b) algumas cenas de “Infiltrados” serem parecidas demais com o original, dizem. Se for verdade, por que dar a estatueta dourada ao Marty, e não ao diretor chinês que ninguém no mundo fora a mãe dele conhece? Opa, a formulação da minha pergunta já fornece a resposta. Foi sem querer.
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