terça-feira, 31 de julho de 2018

MARIA DO ROSÁRIO SE DEFENDE CONTRA O CANDIDATO DO ÓDIO

Ontem Bolsonaro falou um monte de besteiras e mentiras no Roda Viva, entre elas que os portugueses não pisaram na África (alguém conta pra ele sobre Moçambique e Angola?), que eram os negros que escravizaram os negros, e que a principal causa da mortalidade infantil são os prematuros e as grávidas que não fazem higiene bucal. 
Mais uma vez, defendeu a ditadura militar e o torturador Brilhante Ustra (cujo método de tortura envolvia ratos nas vaginas das mulheres, o que hoje é visto como estupro). Aquilo que os reaças que o chamam de "mito" estão cansados de saber.
E, mais uma vez, comprovando que sua principal bandeira não é a questão da segurança, do combate à corrupção, ou da família, e sim o ódio à esquerda, ele atacou covardemente a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS). Sempre com as mesmas fake news, ele disse que a deputada e ex-ministra dos Direitos Humanos defendeu Champinha (o que simplesmente não é verdade; ser contra a redução da maioridade penal não é defender marginais), e que ele respondeu a ela "Você não merece ser estuprada" depois que ela o chamou de estuprador. 
É mentira que ela o chamou de estuprador no embate que tiveram em 2003 (ele sim a chamou de vagabunda), quinze anos atrás, quando ambos, lado a lado, eram entrevistados por diferentes equipes. É mentira que a reação agressiva dele foi "no calor do momento". 
Tanto que ele repetiu o insulto (uma ofensa a todas as mulheres) onze anos depois, na Câmara dos Deputados, e em seguida numa entrevista para uma revista. Ele nunca se arrependeu do que disse, nunca pediu desculpas. Agora, em campanha, vê que não consegue conquistar o voto das mulheres. Por que será?
Reproduzo aqui o curto texto que Maria do Rosário publicou na sua página no Facebook:
venci processo judicial contra Bolsonaro no STJ por unanimidade.
Mesmo condenado por danos morais, ele continua mentindo, me agredindo e agredindo todas as mulheres.
Existem dois processos contra ele no Superior Tribunal Federal por afirmar que há mulheres que merecem ser estupradas.
Jamais defendi Champinha ou qualquer estuprador. Nem os da ditadura que ele defendeu nesse programa, dizendo que repetiria seus crimes, nem os de hoje.
Esse é o manto sob o qual ele se esconde por usar palavras abomináveis contra as mulheres. Mas vai pagar. Com a derrota e na justiça.
Não me calarei diante do ódio. Defendo direitos humanos, trabalhei para a comissão da verdade. Defendo as crianças, as mulheres, LGBT’s, negros e negras, indígenas, pessoas com deficiência, pobres, sem-terra, sem-teto e aprovei leis importantes para o Brasil. E esse cara, o que fez?
Nada.

segunda-feira, 30 de julho de 2018

PIMENTA NOS ZOIOS DOS OUTROS NÃO É REFRESCO

Assim como tantxs de vcs (imagino!), eu nunca tinha ouvido falar do jovem YouTuber Everson Zoio. Mas ele é popular: os inscritos do seu canal já estão chegando aos 10 milhões. 
E por que estamos falando desse rapaz agora? É que circulou um vídeo em que ele conta como "transou" com uma ex-namorada enquanto ela estava dormindo, depois d'ela ter dito pra ele que estava cansada e não queria transar. No vocabulário de qualquer pessoa minimamente sensata: estupro. 
Felizmente, isso teve uma repercussão enorme, com a grande maioria da internet condenando o YouTuber. A Polícia Civil de MG (onde mora o cidadão) já está investigando o caso. Diante disso, Zoio fez um vídeo se dizendo arrependido, explicando que o estupro nunca aconteceu, que foi uma "atitude imatura, piada sem graça" que ele inventou, "porque homem é assim, homem sempre aumenta a história". Segundo ele, ele contou o caso num vídeo de 2015 e depois para uma outra turma de YouTubers em 2016: "Na época não era esse tal de politicamente correto como é hoje, hoje você nem pode mais contar uma piada".
Independente do estupro ter ocorrido ou não, o vídeo e toda essa história só comprovam o que nós feministas falamos há tanto tempo sobre a existência e força da cultura do estupro. Cultura do estupro é justamente isso -- é um cara achar que transar com uma mulher sem o consentimento dela não é nada de mais, não é estupro (aliás, é divertido, motivo de piada e riso). Pra quem acha que cultura de estupro é mimimi de feminista, pense: naquele vídeo do Zoio com os outros três caras, nenhum deles parou de rir pra dizer: "Peraí, Zoio, mas o que você tá narrando é um estupro, e isso é crime, não é engraçado". Tenho certeza que todos eles ficaram revoltados não com o estupro contado (ou inventado), mas com o "politicamente correto" que está fazendo muita gente chamá-los de babacas. 
Isso tudo lembra bastante o caso do Alexandre Frota narrando o estupro de uma mãe de santo num programa de TV do Rafinha Bastos (ele mesmo que já contou "piada" sobre como estuprador de mulher feia não merece cadeia, merece um abraço). Foi parecido. Durante o programa, nem Rafinha, nem ninguém no auditório ou na produção lamentou a "piada" ou a entendeu como um estupro. O caso só chamou a atenção um ano depois de passar na TV. Confrontado, Frota disse que havia inventado aquilo, que era só uma piada. Diferente de Zoio, porém, ele nunca pediu desculpas. Pelo contrário: processou quem o chamou de estuprador
Republico aqui o texto que Eliana Coelho escreveu no seu FB. Eu não sabia quando li o texto, mas Eliana é uma das minhas alunas queridas e super competentes na pós! Ela é feminista, socióloga, e doutoranda em Sociologia na UFC. 
Recentemente, um youtuber que responde pela alcunha de Everson  Zoio fez um vídeo. Nele, a criatura conta "causos" engraçados da sua vida. 
A história que rendeu muitas risadas dos parças que estavam com ele no vídeo foi a seguinte: a namorada dele dormindo com ele, ele com vontade de transar, e ela já dormindo (lê-se desacordada, olhos fechados,vulnerável), ele não aguentou porque estava de "pau duro", e tentou penetrar sua namorada enquanto esta dormia. E como é sabido de todos, homens não podem controlar suas ereções e se o órgão levanta, obrigatoriamente tem que enfiar em algum lugar. 
Lógico, né, gente? Homens estão mais perto do animalesco e por isso não podem ficar sem transar quando ficam com tesão. Todos do vídeo riram da historia e ponto. Só uma história engraçada, gente. Qual é o drama? Mimimi, né? Pois é. NÃO É NÃO. É a naturalização da pratica da primazia do desejo do homem sobre o da mulher em uma relação não consentida  OU SEJA, CULTURA DO  ESTUPRO. 
Se você não acha nojento isso, sendo homem ou mulher, precisa rever suas ideias. O estupro é toda relação sexual não consentida, mesmo que não ocorra violência física, entendeu? 
Embebedar, coagir, chantagear, ameaçar, etc também são contextos onde estupros acontecem.
O rapaz agora está dizendo que a historia foi inventada para fazer rir. Aí eu me pergunto: POR QUE A HISTÓRIA DE UM ESTUPRO É ENGRAÇADA? Lembro do fatídico programa do Rafinha Bastos em que o energúmeno do Alexandre Frota descreveu uma ocasião engraçada que viveu quando ele estuprou uma mãe de santo. Que hilária essa história, né, cara? NÃO. NÃO É NÃO. 
Resolvi escrever textão sobre isso porque no Twitter vi a postagem do Murilo, do canal Muro Pequeno (canal que eu amo), dizendo que não tinha costume de falar sobre youtubers que fazem merda para não dar mais ibope, só que sobre esse, ele ia falar. Fui uma das pessoas que pediu que ele falasse sobre respondendo ao seu tweet, como outras pessoas  também. 
Fora o fato de que um professor de cinema chamado Rodrigo (não sabia nem quem era até essa manhã) foi acusado de assédio sexual por 13 alunas de uma escola de cinema que ele era professor. Vi postagens sobre isso e uma delas de um cara que sigo e admiro (Pablo Villaça) comentando sobre de forma ética mas imparcial. O cara era amigo dele e sempre fora gentil com ele. Por que eu coloquei um "MAS"? Homens assediadores/ estupradores não o são 24 horas. Não são  personagens de séries de investigação. São homens reais,com diversos papéis e muitas dimensões diferentes. 
Ele pode ser a pessoa mais gentil do mundo e mesmo assim ser assediador. O rapaz pode ser o parça mais humilde do rolê e tentar (e/ou) estuprar uma mina. Ele pode ser o diácono mais solícito da igreja e toda vez que se deitar para dormir, obrigar a esposa a ter relações com ele (ou seja, estuprar ela). O cara pode ser o marxista mais boa praça do partido e estuprar. 
Quando se fala de CULTURA DE ESTUPRO é disso que significa: o desejo do macho ser suprido acima de qualquer coisa.
Mais do que imparcialidade nesses casos eu esperava mais crédito às palavras das mulheres. Parece que sempre que as mulheres falam em coletivo, rola a ideia do filme As Bruxas de Salem na cabeça dos caras. Não pode ser verdade que meu amigo seja isso não. É  conspiração das bruxas, mulheres histéricas e mal amadas. 
Não estou dizendo que não se deva ter cuidado com linchamentos. Mas quando se pergunta se tem lugar dos homens no feminismo, sempre respondo: lógico que tem. "Topa ser o chato da sua turminha de homens ao invés de tentar silenciar as mulheres no movimento ou nos lugares onde você tem poder? Difícil, né? Pois é." Mudar essa cultura precisa disso, mais do que seu amigo assediador precisa da sua cumplicidade.
Para mudar isso (essa cultura), precisa mudar a forma que se socializam as crianças. Parar de dizer aos filhos "guardem suas cabritas que os bodes estão soltos". Essa expressão eu escutei muito na infância. Não, as mulheres não são cabritas e os homens não são bodes. Somos humanos que reproduzimos cultura, mas que também temos potência para mudá-la.

domingo, 29 de julho de 2018

CULTURA DO ESTUPRO NUM SÓ DESENHO

Mais sobre este caso do YouTuber que "contou uma piada de estupro" amanhã (aqui). 
Por enquanto, fiquem com o excelente e ilustrativo cartum da Duda, do Rabiscos sobre a Vida. Talvez desenhando o pessoal entenda o que é cultura de estupro...

sexta-feira, 27 de julho de 2018

HOMENS CRESCIDOS CHORAMINGAM PORQUE A NOVA SHE-RA NÃO É SEXY O BASTANTE

Meu querido Flavio Moreira, colaborador habitual do bloguinho, traduziu este texto publicado por Justin Rosario no Daily Blanter. E ainda comentou:
"Só posso me masturbar com
memórias da minha infância,
parte 347" (Lembra do Scooby?)
"Acho que vale a pena lembrar que, tanto no original quanto na dublagem em português, She-Ra invocava a 'honra de Greyskull' em sua transformação, enquanto He-Man bradava 'pelos poderes de Greyskull'. É uma escolha de palavras nada sutil, pois a mulher precisa ser a 'guardiã da honra' enquanto o homem detém 'os poderes' (o fato de estar no plural também é muito significativo). Em inglês, apesar do desenho ter por título She-Ra: The Princess of Power (A Princesa do Poder), ela também grita 'For the honor of Greyskull' (pela honra de Greyskull)".
O novo vale dos male tears (lágrimas masculinas)
"A nova She-Ra parece o
Tom Holland"
Eu não deveria estar escrevendo isso. Não posso acreditar que estou escrevendo isso. Por que, em nome de tudo que é mais sagrado, estou escrevendo isso? Homens crescidos estão tomando as redes sociais para dar chilique porque a personagem-título no reboot do incrível desenho dos anos 80 que foi She-Ra parece mais jovem e não um objeto de masturbação.
Sério, eu não estou inventando isso:
"O ultraje em relação à nova She-Ra parece estar relacionado [...] à ideia de que ela não é bonita, que ela supostamente tem quer ser bonita e sexy e que alguém destruiu o que antes era uma mulher linda e sexy. Algumas pessoas acreditam que a She-Ra reimaginada é desprezível".
Costumo ouvir o podcast de Anita Sarkeesian, Feminist Frequency. É útil para ter a perspectiva feminista sobre meios de comunicação de massa e cultura pop. E mesmo que elas tenham um gosto terrível para filmes, e que seus erros em relação à cultura geek me façam chorar às vezes, suas discussões sobre a cultura tóxica do fanboy (sobre o significado do termo e seu uso, veja este link) são iluminadoras.
O novo design de She-Ra, como babacas
que querem ver meninas menores de
idade sexy acham que o novo design
parece, como babacas querem que o
novo design de She-Ra se pareça
Sarkeesian foi uma das vítimas primárias (e “vítima” é a palavra certa a se usar) do Gamer Gate, que foi uma campanha massiva de abuso online executada pelo proto-alt-right [na época o ainda insipiente movimento de extremíssima direita dos EUA]. Desde então, ela tem lançado uma luz brilhante sobre os bebês chorões racistas, sexistas e entitled que acreditam ser os guardiões de toda a cultura geek.
É claro que eles têm um ódio visceral por ela. Mas esse novo surto em relação à She-Ra é apenas parte da mesma coisa. Eles são os mesmos joões-ninguém que piraram na batatinha porque Star Wars: O Despertar da Força tem um negro e uma mulher branca como protagonistas. 
Eles espumaram porque a personagem Rose Tico em O Último Jedi (não estou brincando) não usava maquiagem nem roupas que acentuassem suas curvas. A atriz Kelly Marie Tran de fato é bem atraente e possui curvas para exibir. Mas seu personagem é uma mecânica que trabalha nas entranhas de uma nave espacial. Quantos encanadores você conhece que ficam sexy no meio de seu dia de trabalho?
Ah, e eles ficaram ofendidos por ela ser asiática, porque de alguma forma isso é importante.
"Netflix claramente está com medo
que She-Ra seja uma mulher linda.
Óbvio. Veja como ela pode ser
assustadora"
Fanboys tóxicos são casos perdidos que ainda não engoliram a ideia de que mulheres e pessoas de cor também leem quadrinhos, jogam vídeo games e assistem filmes de ficção científica. A indústria do entretenimento finalmente se deu conta desse enorme e inexplorado público e começou a satisfazer os gostos dele também. Foi isso que provocou uma fúria branca abrasadora (ênfase em “branca”). Para eles todo esse universo geek pertence a eles e, como crianças mimadas, eles não querem dividi-lo.
O reboot de She-Ra é o exemplo perfeito. Está sendo lançado com um público bastante específico em mente: garotas jovens. Como qualquer programa dedicado a jovens garotas, as principais personagens terão idades mais próximas às delas para que haja mais identificação.
Ainda assim, homens adultos estão furiosos que um programa que não é para eles não satisfaça seus caprichos sexuais. Por quê? Porque She-Ra faz parte da cultura geek e a cultura geek “pertence” a eles.
Deus nos proteja se eles tivessem dado a She-Ra outra etnia!
"Lésbica masculina re-imagina She-Ra
como uma lésbica masculina. O total
egoísmo disso é espantoso"
Esse sentimento de “entitlement” é o que tem levado pessoas brancas a chamar a polícia para pessoas negras cuidando de sua própria vida em espaços públicos. Foi o que as levou a votar em um nacionalista branco imbecil. E é o que está levando-os a se comportar como babacas por causa de um desenho animado para crianças. É tudo parte do mesmo detestável sentimento branco (principalmente masculino) de que merecem tudo e qualquer coisa.
Pelo amor de Deus, gente! Se controlem!

quinta-feira, 26 de julho de 2018

LÍDER DO PCdoB NA CÂMARA PEDE UNIDADE PARA A ESQUERDA

Faltam pouco mais de dois meses pras eleições, e até agora o cenário não mudou: Lula continua sendo o líder isolado nas pesquisas, e os golpistas não deixarão que ele deixe a prisão ou se candidate (não deixam nem que ele dê entrevista!). 
Os próximos dias serão decisivos, com várias convenções partidárias oficializando seus candidatos, definindo alianças e vices. O único fato novo não deveria ser surpresa pra ninguém: a direita se uniu em torno de Alckmin, isolando Bolsonaro na extrema direita, sem alianças, sem tempo de TV. Alckmin terá todo o dinheiro e tempo do mundo para tentar enganar a população e fingir que o projeto de Temer não é o mesmo do PSDB. Vai ser muita cara de pau o tucano se apresentar como oposição ao governo golpista. Mas cara de pau eles têm de sobra.
Com Lula tão forte nas pesquisas, mostrando que ele tem poder para transferir voto para o candidato que indicar, duvido que o PT abra mão de ser o cabeça de chapa. Resta saber quem irá indicar: Haddad? Jacques Wagner? E também quando indicar. Assim que for lançado, a mídia cairá em cima. E não permitirão que Lula faça campanha. Espero que ele tenha gravado vários vídeos antes de ser preso. 
Se e quando essa candidatura do PT for oficializada, os outros partidos de esquerda terão que decidir o que fazer. Psol seguirá com Boulos, mas e o PCdoB? Seguirá com a candidatura de Manuela D'Ávila (que, assim como todos os demais candidatos, não cresceu)? Ou seria melhor aproveitar este enorme talento e lançá-la como candidata ao Senado ou ao governo do Rio Grande do Sul?
E Ciro? E Marina? O cenário segue totalmente aberto. 
Publico abaixo o texto do deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), que também é líder do partido na Câmara dos Deputados. 
Hora de jogar para ganhar: Unidade já!
João Amazonas e Lula em 1989
“A unidade é a bandeira da esperança". A célebre frase de João Amazonas, dirigente histórico do PCdoB, encerra mais do que uma diretriz a ser perseguida ao fazer política. Ela condensa o aprendizado histórico do partido mais antigo do país, o único a sobreviver a duas ditaduras abertas, a participar dos processos de redemocratização de 1946 e 1985, do mais longo ciclo de governos progressistas do país, o primeiro a alertar que as classes dominantes engendravam um golpe travestido de impeachment contra a presidenta Dilma.
Essa rica experiência de 96 anos ininterruptos de atuação, que vai da luta armada à conquista de governos eleitos, da clandestinidade à vida partidária legal e ativa, da atuação permanente em movimentos sociais ao embate parlamentar, ensinou o PCdoB a lutar, sem hegemonismos, dogmas e esquematismos, de acordo com a exigência do momento político. Afinal, a melhor tática é sempre aquela que atende a um requisito básico: aproximar do objetivo a ser atingido, de acordo com a situação concreta.
Foi esse o guia político do PCdoB quando, depois da memorável campanha das “Diretas” -– em que tínhamos multidões nas ruas e mesmo assim não alcançamos a aprovação da emenda Dante de Oliveira --, buscamos a formação de uma ampla frente que logrou derrotar a ditadura com seu próprio instrumento, o Colégio Eleitoral. Não cedemos à tentação de “marcar posição” quando o que estava em jogo era a abertura democrática do país.
Também foi buscando o objetivo de vencer e mudar o Brasil que defendemos a ampliação da aliança, em 2002, quando a chapa Lula - José Alencar representou o pacto dos setores interessados no desenvolvimento nacional, na valorização do trabalho e da produção. Fomos vitoriosos, mas não foram poucos os que, à época, criticaram a política frentista.
Pois bem, chegamos às portas das eleições de 2018 em um dos momentos mais graves e complexos da história brasileira. O golpe consumado em 2016, em suma, significou uma nova pactuação das elites para isolar o campo progressista e por fim ao ciclo aberto em 2002. A base econômica desse pacto diz que os direitos assegurados pela Constituição de 88 não cabem no orçamento, que as leis trabalhistas e previdenciárias não se aplicam mais e assegura ainda mais a hegemonia do capital internacional ante ao nacional, das finanças sobre a produção, do capital sobre o trabalho.
E mais: indo além até do controle dos artífices políticos do golpe parlamentar, a nova hegemonia que tenta se impor implica numa reconfiguração do Estado Democrático Direito, com a hipertrofia do poder judiciário, que, ao fim e o cabo, liquida as próprias garantias constitucionais que deveria resguardar, levando o país à beira de um estado de exceção.
O arbítrio virou o novo normal no Brasil. É isso que explica a prisão sem provas de Lula, em meio a um processo eivado de atropelos. É isso que garante que um juiz descumpra ordem superior impunemente, que dá poderes à magistrada responsável pela execução penal para impedir Lula de ser entrevistado. É o estado de exceção que impede que o maior líder político do país esteja livre e, ao que tudo indica, impedirá que tenha assegurado seu direito de participar das eleições. Não se quebra a base da democracia de um país das dimensões do Brasil para não ir até as últimas consequências.
Diante de situação tão grave era de se esperar que as forças políticas comprometidas com a nação brasileira estivessem rendidas e impossibilitadas de vislumbrar quaisquer chances nas eleições de outubro. Ocorre que o fracasso e a desmoralização do governo Michel Temer proporcionam uma chance de reverter o quadro.
O povo, ludibriado pela campanha pró-impeachment, se depara com uma realidade trágica: a economia não voltou a crescer, o desemprego aumentou, os direitos trabalhistas foram retirados, os investimentos em saúde e educação foram congelados e a desagregação do tecido social é visível nas grandes cidades. Esse povo não quer Temer e nada que se pareça com ele.
As pesquisas de opinião mostram que é possível colocar um freio à marcha da insensatez que engolfou o país, é possível galvanizar as esperanças e chegar ao segundo turno da eleição com uma candidatura ancorada no interesse nacional. Novamente, a história nos coloca diante de um dilema tático: unificar amplas forças para lutar pela vitória ou manter a fragmentação atual (ou no máximo montar uma articulação da Esquerda), correndo o risco de dar de bandeja a eleição aos conservadores?
Enquanto na chamada “Esquerda” se viu grande indisposição em unir amplos setores para construir uma saída para a grave crise brasileira, os conservadores agiram. Alckmin polariza partidos que noutro momento foram base de governos petistas, se consolida como a candidatura mais forte da direita e será a inquestionável herdeira do programa do governo Michel Temer. O cenário se completa com a candidatura fantoche de Henrique Meirelles, que cumpre o papel de atrair a rejeição de Temer e tirar do ex-governador paulista o ônus de defender a continuidade de um governo odiado pelo povo.
Qual seria a resposta das esquerdas? Conforme apontou o XIV Congresso do PCdoB, o necessário seria construir uma frente ampla em defesa da nação brasileira, da democracia e dos direitos dos trabalhadores.
É possível vencer as eleições e derrotar nas urnas o programa antinacional, antipopular e antissocial das elites. Para somar a este projeto, a candidatura própria do PCdoB, que tem cumprido enorme papel e ajudado sobremaneira a dar visibilidade ao Partido, não será óbice.
Mas será necessária uma mesa de diálogo em que todos tenham a disposição sincera de buscar unir forças pelo país. Não é hora de marcar posição nem de alimentar ilusões vãs, é hora de jogar para ganhar. O Brasil depende de nós.
Temos pouco tempo.