Meu querido Flávio Moreira me enviou um artigo que ele traduziu. Foi publicado no jornal britânico Independent e escrito por Kashmira Gander.
Como a gente sabe, falar abertamente sobre as dificuldades da maternidade ainda é um tabu. Dois anos atrás, eu publiquei um guest post de uma leitora que afirmava odiar ser mãe. Foi uma enorme polêmica nesta sociedade de maternidade compulsória que raramente aceita discutir depressão pós-parto (que não é o tema do artigo da Gander).
Da dor do parto até ensinar uma criança a como navegar em nosso mundo bagunçado, ser mãe é um trabalho duro e implacável que transforma a vida da mulher da noite para o dia.
Ainda assim, falar abertamente sobre as dificuldades da maternidade ainda é um tabu, e admitir que se arrepende por ter tido filhos é considerado passar dos limites. Um estudo preliminar feito com 23 mães pela socióloga Orna Donath, da Universidade Ben-Gurion, em Israel, recentemente desencadeou um debate feroz ao destacar que um número desconhecido de mães se arrependeu de dar à luz, e tentava distinguir entre ambivalência e puro arrependimento.
Para as mulheres que lutam para lidar com sentimentos de arrependimento, a internet é um refúgio onde elas podem falar anonimamente sobre questões como mudanças de estilo de vida a dinheiro. A página do Facebook "Eu me arrependo de ter tido filhos" está cheia de tais relatos.
"Amo meus filhos. Odeio minha vida". |
Uma mãe (que não trabalha fora) de uma criança de 7 anos de idade e de um de 4 escreveu que ela tem "grandes arrependimentos”. "Eu os amo, mas não sou feliz. Eles tiraram toda a minha liberdade, não posso ter um emprego, meu marido mal ganha o suficiente para as férias. Eu era comissária de bordo, livre como um pássaro antes de ter filhos. Agora só faço os intermináveis trabalhos domésticos".
Outra mãe escreveu sobre como ela está tendo dificuldades com sua filha de três anos que não dorme. Descrevendo um incidente em que ela vomitou de stress depois que sua filha só dormiu por duas horas, ela disse: “Nós não temos vida. Meu marido ajuda muito, mas mesmo ele está perto de desabar. Não temos família ou amigos. Nenhuma rede de apoio. O que eu faço?”
No site Mumsnet uma mulher desesperada escreveu: "Eu amava a minha antiga vida. Meu marido queria muito um filho e eu adiei isso por muito tempo, só por saber que não é minha vocação. Eu cedi depois de muitas discussões, pensando que eu iria me ajustar".
"Sinto que minha maravilhosa vida foi virada de cabeça para baixo. Ainda não me sinto uma mãe. Sinto tanta falta da minha antiga vida que me dá vontade de sair de casa e abandonar meu marido e meu filho".
Alguém que postou pensamentos semelhantes terminou com o apelo: "Por favor, não me odeiem, é o que estou querendo dizer. Eu na verdade me considero uma pessoa bastante carinhosa".
Outras mães escreveram como seu arrependimento se resume ao pai de seu filho. Uma dessas mulheres escreveu no site de perguntas e respostas Quora que ela queria ter um bebê "desesperadamente", mas, em parte, achou a maternidade dura quando percebeu que seu marido tornou-se um "mentiroso compulsivo, abusivo e controlador".
"Ainda sinto muita culpa porque me arrependo de ser mãe. Não porque eu falhei, mas porque não quero ser uma mãe. Não consigo explicar por que eu me sinto assim, eu só sinto".
Robin Simon, professora de Sociologia na Universidade de Wake Forest, especializada em efeitos sobre a saúde mental de pais e mães, diz que é difícil admitir tais emoções porque elas "desafiam as normas sociais sobre a santidade da maternidade".
Arabella Russell, conselheira na instituição beneficente Relate, que fornece aconselhamento para casais, diz que há uma visão comum de que ter um bebê será "fantástico", mas que a realidade "pode ser um choque para o sistema".
“É completamente normal sentir-se arrependida, estressada, cansada, entediada e frustrada", diz ela, acrescentando que a aparência de que outras mulheres estão levando a maternidade "como sopa no mel" pode ser enganadora, já que as pessoas se sentem culpadas por admitir seus verdadeiros sentimentos.
"Se você está achando difícil ser mãe, não se reprima. É muito importante ser capaz de falar com seu parceiro ou um membro da família sobre isso", salienta Russell. Conversar em fóruns de internet, inclusive Mumsnet e Netmums e usar serviços como o Relate, também pode ajudar.
Ela aconselha outros pais ou membros da família que estão preocupados com o bem-estar de uma mulher para incentivá-la a discutir seus sentimentos, para que ela veja que as emoções que está sentindo não são anormais.
Tenha cuidado para não julgá-las, pois estes são sentimentos muito difíceis e podem fazer as pessoas sentirem-se culpadas. Se isso persistir e falar sobre isso não aliviar a mãe depois de um tempo, você pode sugerir que ela vá ao médico. Entretanto, cuidado com sinais de depressão pós-parto, que é uma questão diferente e precisa ser tratada".