Não sei se vocês lembram, uns meses atrás, de dois blogs que foram amplamente denunciados (de um jeito meio errado, porque eles foram divulgados à exaustão -- tem que denunciar sem divulgar). Eles mostravam fotos e vídeos de caras que, além de bolinarem mulheres dentro de ônibus, filmavam e fotografavam o abuso.
O abuso de passageiras no transporte público é um enorme problema. É revoltante que alguém tenha que passar por isso. Em alguns países são reservados vagões de metrô para mulheres, assim como no Rio, que destina vagões de trem e metrô exclusivos nos horários de maior movimento. Mas, sem fiscalização, eles não funcionam, e qualquer um entra.
É ridículo que tenha que haver uma segregação desse tipo porque o machismo determina que o corpo da mulher é público. Uma mulher sozinha é vista como uma mulher disponível. Igualmente absurdo é que programas de TV considerem um pesadelo desses uma fonte de humor.
A G. me enviou este relato revoltante. Fiquei orgulhosa dela, porque ela fez o que muita gente deixa passar. Mas fica a pergunta: o que fazer?Pego a mesma linha de ônibus três vezes por semana e, praticamente, atravesso a cidade dentro dele. O transporte público em São Paulo, como todos sabem, deixa muito a desejar e, mesmo no meio da tarde, horário em que costumo tomar o coletivo, ele segue cheio até o ponto final no terminal.
O caso é que, alguns dias atrás, presenciei uma situação horrível!
No meio das pessoas, um homem ejaculou, sem pudor nenhum, na perna de uma moça que estava sentada ao meu lado! Isso mesmo, ele ejaculou! Não tenho palavras para descrever quão indignada fiquei. Tanto ela, como eu, não tivemos uma reação imediata. Na verdade, demoramos um pouco para entender o que havia acontecido; tempo suficiente para o tarado deixar o ônibus correndo e fugir. Na ocasião, ofereci-me para acompanhar a moça até a delegacia mais próxima e fazer uma queixa, mas ela estava muito transtornada e só queria voltar pra casa o mais rápido possível. Eu não insisti.
Lembro que fiquei muito mal no trabalho, pensei em ir até a delegacia sozinha, mas me faltaram forças. Acabei deixando a história de lado, um pouco por acreditar que nada mais poderia ser feito. Acontece que voltei a encontrar o mesmo maníaco no ônibus. Gelei e me arrependi muito de não ter feito nada. Eu estava sentada e ele parou do meu lado, com o casaco enrolado no braço, escondendo a mão, na altura da cintura, exatamente como na primeira vez que o vi. Foi terrível! Pensei em pegar o telefone e chamar a polícia, mas como iria ligar com o tarado tão próximo? Minha reação foi virar de lado, em direção a ele e encará-lo nos olhos, descaradamente. Ele percebeu que eu o havia reconhecido e desceu no ponto seguinte. Fiquei aliviada momentaneamente, mas sei que esse tarado deve ter pegado o ônibus seguinte e agredido outra mulher!
Para minha surpresa, eu não fui a única a reconhecê-lo. A senhora que estava sentada ao meu lado também se lembrou dele e me contou um episódio parecido, no qual ele ejaculava em uma menina que estava dormindo. Isso quer dizer que é uma violência frequente! Conversei com várias outras mulheres dentro do ônibus, descrevi-o fisicamente para que, a partir de então, todas ficassem mais atentas. Desci do ônibus com a certeza de que devia procurar ajuda e denunciá-lo. Eis que começa outra novela...
Por sugestão de uma das passageiras, liguei para o disque-denúncia (181), número que aparece gigante atrás de todos os ônibus municipais da cidade. Falei com a atendente, que antes mesmo de ouvir minha história, disse que não poderia fazer nada para me ajudar. Eu retruquei perguntando qual era, então, a utilidade do disque-denúncia. Segundo ela, serve para tráfico de drogas, pirataria, maus tratos contra animais, idosos, crianças... E violência contra a mulher? Não, para isso tem o 180, foi o que ela sugeriu.
180 é o telefone da Secretaria de Políticas para as Mulheres, que trata de violência doméstica. Bem, não custava tentar.
De cara, também, a atendente desconversou e pediu para que eu acionasse a polícia civil, telefone 197. Tentei umas cinco vezes e todas as ligações caíram. Então, resolvi ligar para a prefeitura e falar com a SPTrans, liguei 156. A resposta foi: “Você tem que ligar é para a polícia militar, tirar uma foto do suspeito e fazer boletim de ocorrência”.
Lola, socorro! Que burocracia absurda é essa? É por isso que milhares e milhares de maníacos continuam se aproveitando de nós! O caminho da justiça é tortuosíssimo, me sinto completamente só e desprotegida, de mãos atadas mesmo.
No ônibus, as mulheres falaram que eu devia ter gritado, pedido para o motorista fechar as portas e chamado bastante atenção para que o depravado tomasse uma surra dos outros homens do coletivo e, assim, aprendesse a lição. Já me sugeriram que carregasse minha própria “arma”, no caso um canivete suíço. Medo de São Paulo e da violência em que a cidade está submersa. Será mesmo que justiça só com as próprias mãos? Claro que não, não acredito nisso.
No dia seguinte, ainda passei numa delegacia de polícia militar, e ouvi algo do tipo: "Mas nesse ônibus não tinha nenhum homem, não? Para dar uma sova nesse maluco!?". E nem pediram informações da linha ou do suspeito, agiram como se nada mais pudesse ser feito. Vou ter que passar pelo constrangimento de encontrar com o tarado mais uma vez a caminho do trabalho e fotografá-lo para ligar para a polícia.
O que mais me incomoda é o descaso dos órgãos públicos. É tudo muito devagar e, no fundo, todos só querem empurrar o problema para a instituição vizinha. Será que não há mesmo uma solução para um problema que nos atormenta com tanta frequência?