terça-feira, 27 de novembro de 2001

CRÍTICA: OLHOS FAMINTOS / Trambique famigerado

Eu sabia. Eu deveria ter ido pra casa no momento em que o gerente do cinema perguntou qual filme eu ia assistir, eu respondi “Olhos Famintos” e ele, do alto da sua sabedoria, soltou um “Ui!”. “Ui” é a palavra exata pra descrever este terror classe Z. Quase nunca digo isso, mas poupe seu dinheiro. Espere que “Olhos” passe no Cine Sinistro ou Sessão Calafrio ou qualquer outro espaço na TV dedicado aos “the horror, the horror”s de baixo orçamento.

Ainda estou meio em estado de choque pelo que presenciei. Não tanto pelas imagens e mais pelo fato de um filminho desses ser distribuído em grande escala no país. Meu maridão, em compensação, raramente saiu tão eloqüente de uma sessão. Logo depois, encontramos um amigo. Por causa do meu coma induzido, reproduzo aqui o diálogo deles. Amigo: “Ah, conta, vai. Sobre o que é o filme?” Maridão: “É sobre nada. É sobre dois irmãos que dirigem por uma estrada longa e deserta americana e vêem um cara jogar algo numa tubulação perto de uma igreja abandonada e voltam lá, entram no cano, e descobrem um monte de cadáveres.” Amigo: “Argh! Que nojo!” Maridão: “Não, não, esta é a parte boa do filme. Ele vai piorando num ritmo alucinante, num crescendo sem fim”.

Desta vez tenho que concordar com o maridão. Primeiramente, no quesito do sem fim. Embora “Olhos” dure apenas uma hora e meia, parece que eu permaneci umas quatro horas sentada. Segundo, a evolução da ruindade é realmente impressionante. Chega uma hora em que surge uma criatura bizarra nas telas. Será o Batman? Ou o Coringa, com as asas do homem-morcego? Peraí, ele é verde! Será o Shrek? Será o benedito?! E tem também uma musiquinha animada que leva o nome do título original em inglês, “Jeepers Creepers”. Parece marca de jujuba, mas não é. O protagonista é instruído a correr sempre que ouvir a melodia, ou algo terrível acontecerá com ele. Me identifiquei com ele. Eu tava praticamente na porta de saída do cinema quando a canção tocou pela segunda vez, mas me lembrei do gerente, visualizei sua expressão de “eu avisei!” e optei por aturar o sofrimento.

Tinha bastante gente na platéia. Bom, nem todos foram tão persistentes quanto eu e vários deixaram a sala antes do final. Havia pessoas sem grande experiência com filmes de terror, pois elas se assustavam com certas cenas. Basta ter visto dois thrillers pra saber tintim por tintim o que vai ocorrer. Por exemplo, cena de moça com medo, aguardando no carro. A câmera foca seu rosto no canto e a enorme janela ao fundo. É claro que aparecerá outra face no enquadramento, certo? No entanto, num dos sustinhos chinfrins, uma senhora nervosa se levantou e disse pra sua amiga ao lado: “agora eu vou embora”. E foi. Pelos motivos errados, mas foi.

Quem mandou ir assistir a uma produção com uma penca de desconhecidos no quadro de realizadores? Nunca ouvi falar desses atores, e, se você criar coragem, ignorar meu conselho e ir ver o filme, vai entender porquê. Eles são péssimos e merecem ficar no anonimato. O rapaz arregala os olhos durante toda a película – provavelmente pra justificar o título em português. Quer uma boa dica pra evitar esses micos? Mantenha distância de filmes que contenham a chamada “Uma produção de....” no pôster. No fundo, eles estão dizendo: “o elenco inteiro é composto por zé-manés, o diretor é um joão-ninguém, mas com sorte o nome do produtor te lembre alguma coisa”. Neste caso, vem com a legenda “Uma produção de Francis Ford Coppola”. Sabe quem é, o ex-gênio de “Apocalipse” que, na aposentadoria, junta-se a qualquer projeto em troca de dinheirinho fácil. Ele não veio ao Brasil pra alavancar “Chatô”?

Quando finalmente as luzes se acenderam, saí de “Olhos Famintos” arrasada, pensando que a gente deve ser mais do que quintal dos EUA. Deve ser depósito de lixo mesmo, pois eles enviam cada porcaria pra cá... Comentei com o maridão que ter visto um filme desses não me acrescentou nada, ao que ele concluiu: “pelo contrário, subtraiu um monte”. O gerente que o diga.

Nenhum comentário: