sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

FELIZ 2022, UM ESQUENTA PARA O ANO DA RECONSTRUÇÃO DO BRASIL

Pessoas queridas do meu coração, desculpem não escrever muito, mas estou sem internet por causa da reforma da casa, que está quase no fim (a reforma, não a casa!). Falta só terminar o escri, o nosso banheiro, a garagem, e fazer uns retoques finais, e a casa vai ficar nos trinques. O pedreiro promete que isso acontecerá na segunda.

Hoje (faz menos de duas horas) inauguramos a geladeira nova! Trocamos a nossa Electrolux 262 litros de quase doze anos (compramos quando chegamos em Fortaleza) por uma Consul de 342 litros. É a maior geladeira que Silvinho e eu já tivemos juntos. Afinal, pra só um casal, a outra dava certinho. Ela está funcionando direito, só que tem várias coisas quebradas por dentro. Se alguém quiser comprar, vamos vender por R$ 250 (o resto a gente deu tudo; a geladeira, vamos tentar vender). 

Enquanto o maridão e eu colocávamos os alimentos e bebidas da geladeira velha pra nova, e constatamos que havia uma prateleira demais na porta (tiramos, ou caberiam poucas garrafas mais altas), Silvinho, sempre espirituoso e agora de melhor humor com o quase fim da reforma de quase dois meses e 40 mil reais (20 mil a mão de obra, a outra metade para material de construção, tinta, muita tinta, e alguns móveis e eletros novos), disse: "Tá ouvindo? É a geladeira velhinha rindo lá embaixo". 

A reforma é um bom jeito de acabar o ano. A gente realmente precisava reformar a casa há tempos, e tudo ganhou mais urgência quando um pedaço do forro do nosso escri por centímetros não caiu em cima das nossas cabeças, em fevereiro de 2020. Começamos uma reforma na época (na realidade, contratamos uma firma de engenharia que não fez muito mais além de esburacar as paredes de toda a casa, mas foi importante pra constatar que a casinha tinha conserto, não estava em estado terminal), e tivemos que parar em seguida, por conta da pandemia. Quem acompanhou minhas lives e aulas nesses dois anos viu um pedacinho do cenário de guerra. 

Esses últimos dois anos foram péssimos. O Brasil nunca esteve pior. Minha amada mãe, que morava conosco, morreu em março, de câncer. Em matéria de trabalho, continuei dando aulas remotas, lógico, mas fiz pouco do que tinha que fazer, principalmente em matéria de publicações. Parece que fui abatida por um grande desânimo. Sei que não sou a única!

Tenho esperança que 2022 seja melhor. Pelo menos a partir de outubro estaremos felizes e animados, prontos pra reconstruir o país, que vem sendo completamente destruído pelo genocida. A gente só precisa sobreviver até lá. "Só"! Como se fosse fácil. 

Agora vamos cuidar da ceia de hoje. Por enquanto só temos a sobremesa, que preparamos ontem à noite: mousse de chocolate. Vamos fazer carbonada, que é bastante simples (é um cozido que leva milho, abóbora, cebola, cenoura, batata doce, alho poró, tomate, frango e um pouco de carne suína). Espero que seja tudo tranquilo, sem rojões. 

Vamos entrar em 2022 melhor que em 2021, acredito, mas certamente pior que em 2023, que será o ano da mudança, da reconstrução, da esperança, de tomar de volta o nosso país. Que vocês tenham uma linda virada de ano, cercados de amor. Vamos todos continuar lutando! Tudo de bom pra vocês, e obrigada por todo o apoio e carinho que vocês me proporcionaram nos momentos mais difíceis!

quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

CADÊ A GRAÇA DE NÃO OLHE PARA CIMA?

Estou  sem tempo e sem internet, mas bastante gente bacana me pediu pra ver Não Olhe pra Cima (Don't Look Up) e falar sobre ele, então lá vai: odiei o filme. 

Juro que entendi tudinho e concordo com ele politicamente. A cultura do espetáculo tomou conta do planeta e talvez a maior parte da população tenha mais interesse por fofocas do que por qualquer coisa minimamente importante, como, sei lá, a sobrevivência da Terra. Fiquei muito chocada no ano em que passei nos EUA fazendo meu doutorado-sanduíche (entre 2007 e 2008) porque, durante alguns meses, eu via TV (depois desisti). E as notícias giravam em torno da Lindsay Lohan. Parecia que nada mais relevante estava acontecendo que os apuros de uma jovem atriz. E não estou falando de canais de entretenimento ou sensacionalismo. Eram todos. 

Lógico que a gente não precisa ir até os EUA pra perceber que o mesmo se passa aqui. As pessoas adoram reality shows e dedicam todo o tempo e atenção a eles. Não importa que o Brasil tenha afundado de vez com a eleição de um fascista. Não importa que continuamos vivendo a maior pandemia de nossas vidas. O que importa é o que alguma sub-celebridade fez ou falou num programa feito pra nos manipular. 

Nesse sentido, Não Olhe para Cima é extremamente factível. Alguma dúvida que, se cientistas dissessem que daqui a seis meses um enorme meteoro vai acabar com o planeta, um monte de gente diria que o cometa não existe, que é tudo uma conspiração marxista globalista judaica para o domínio do mundo? Vemos isso todos os dias. Tanto que quase todo mundo no Twitter compara o personagem do Jonah Hill (que faz o filho mimado da péssima presidente Meryl Streep) ao Carluxo. 

Meu problema com o filme é que ele é longo demais, arrastado, repetitivo, chato, sem foco, e super sem graça. Os diálogos não me fizeram rir uma vez sequer. Eu e o maridão levamos três noites pra conseguir ver o filme inteiro. Achei o elenco estelar totalmente desperdiçado. Sou fã do Leonardo DiCaprio, mas é meio constrangedor ver o tanto que ele se esforça pra ser engraçado -- sem resultados. Talvez quem se saia melhor seja a Cate Blanchett como uma âncora de TV. 

Algo que me soou bem hipócrita foi o diretor Adam McKay (A Grande Aposta, Vice) incluir uma canção original cantada por Ariana Grande só pra ser indicada pro Oscar. É o tipo de música feita por encomenda pra ser apresentada na cerimônia.

E olha, mesmo ideologicamente Não Olhe para Cima tem suas fraquezas. Concordo demais com Tatiana Roque, coordenadora do Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ: quem causa o desastre no filme não somos nós, é algo vindo de fora, um cometa. E parece simples demais enviar uma missão espacial para resolver esse pepino. Mas a crise climática ignorada por tantos capitalistas selvagens é sim criada por nós. 

E, se o filme não está nem irritando os negacionistas otários de extrema-direita que ele critica, é sinal de que tem algo de muito errado com ele...

quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

BRASIL PARALELO, A PRODUTORA DA DIREITA QUE QUER SE PASSAR POR NEUTRA E IMPARCIAL

Reproduzo este ótimo texto publicado pelo professor de História da Universidade Federal da Bahia Carlos Zacarias de Sena Júnior no Le Monde Diplomatique Brasil. Carlos foi alvo de tentativa de assédio jurídico e não se calou. Em vez de publicar nota de retratação, botou a boca no trombone. Parabéns, Carlos!

O preço da coerência é não discutir com negacionistas

No dia 20 de agosto de 2021 eu recebi uma notificação extrajudicial da produtora Brasil Paralelo por um post que fiz no dia 11 de julho referente a um conteúdo indicado no material didático da Secretaria de Educação do Estado da Bahia (SEC-BA). Naquele dia, após tomar conhecimento de que o material destinado ao ensino online para estudantes da escola pública trazia ao menos uma indicação da produtora gaúcha, escrevi o seguinte:

“Soube agora que o caderno de apoio para o ensino de História da Secretaria de Educação do Estado da Bahia tem a indicação de um vídeo da produtora do Brasil Paralelo. Para quem não sabe essa produtora é olavista e, pelo que dizem, vem sendo vitaminada por verbas do governo Bolsonaro através da compra de séries para o MEC. Para quem não sabe o governo da Bahia é comandado pelo PT desde 2006. O Brasil Paralelo não é uma produtora qualquer, mas um canal que produz ‘conteúdo’ de história de caráter revisionista/ negacionista. Seu filme mais importante, Brasil, entre armas e livros, sobre o golpe de 1964, é uma peça de propaganda ideológica anticomunista sem nenhum respaldo científico. Atenção professores de História da Rede Púbica estadual, Secretaria de Educação do estado da Bahia e governador Rui Costa. Negacionismo e falsificação da história é caminho aberto para o fascismo. É preciso rever urgentemente esse material didático.”

Meu post teve boa repercussão e eu recebi o retorno educado de algumas pessoas ligadas à SEC-BA que esclareceram o assunto, dizendo que o reparo seria feito. De fato, no mesmo dia eu soube que a indicação foi retirada, algo que considerei uma vitória em nome dos meus amigos e amigas historiadores e historiadoras que nesses tempos sombrios têm lutado com todas as suas forças pelo respeito à verdade.

A Brasil Paralelo é uma grande empresa que nos últimos anos cresceu na esteira do ódio à política e do fomento à ideia de que professores de História são doutrinadores. Supõe, a produtora, que eles são “apartidários e imparciais”, por isso disseminam a tese de que todos que assistem TV, leem jornais ou tiveram professores de História são “manipulados”. Alegam, entre outras coisas, que o sucesso das suas produções não é fruto do ódio à política, nem da eclosão da pós-verdade, quando apelos à emoção, crenças e ideologias têm mais influência em moldar a opinião pública do que fatos objetivos. Para a Brasil Paralelo, seu sucesso decorre da “imparcialidade” e da “desvinculação de grupos políticos”, motivo pelo qual se arrogam de não receber nenhum centavo de dinheiro público, em que pese que algumas de suas produções sejam exibidas pela TV Escola.

A produtora se ressente de eu tê-la chamado de “olavista”, argumentando por absurdo ser confundida com qualquer “grupo ou indivíduo em específico”. É claro que ela não se importa de usar a exaustão as referências de Olavo de Carvalho que, não raro, aparece em suas produções, ignorando qualquer historiador ou consenso estabelecido dentro da academia sobre temas como fascismo, nazismo, golpe, ditadura militar, entre outras coisas. Do mesmo modo, a Brasil Paralelo se ofende por ser chamada de “revisionista/ negacionista”, arguindo que suas produções são feitas “a partir de robusto arcabouço documental” que é “examinado por uma equipe de mais de 30 profissionais”.

Na década de 1990, ficou célebre o caso em que a historiadora estadunidense Deborah Lipstadt teve que enfrentar nos tribunais o negacionista britânico David Irving. Lipstadt narrou sua saga contra o negacionismo em um belo livro chamado Negação, publicado no Brasil em 2017 e transformado em um ótimo filme dirigido por Mick Jackson, com Rachel Weisz e Timothy Spall nos papéis principais. O negacionismo, como demonstrou a historiadora e professora da Universidade de Emory, é a porta de entrada da reabilitação do nazifascismo, de modo que a equipe de advogados que a defendeu em Londres traçou como estratégia provar que o Holocausto foi um irrefutável fato histórico.

No processo narrado em seu livro, Lipstadt demonstra que a negação do Holocausto era não apenas motivo de prestígio e riqueza de Irving, como era também do interesse de grupos supremacistas e neonazistas de diversas partes do mundo. Tais grupos sustentavam parte dos seus argumentos pela obra do negacionista Irving, independente do que o consenso acadêmico dissesse e mesmo depois de consumada a derrota do jornalista/ historiador David Irving na justiça britânica.

O negacionismo dos dias que correm tem muitas faces: científico, sobre as vacinas, terraplanista, sobre as mudanças climáticas e sobre a história. Tenho me interessado por esse tema a partir dos estudos que venho desenvolvendo sobre a relação entre memória e história e sobre aquilo que alguns de nós chamamos de revisionismo, algo bastante presente na academia. Todavia, porquanto a verdade venha sendo desafiada em diversas frentes, parece ser absolutamente necessário que sejamos capazes de defendê-la diante dos irracionalistas e todos aqueles que atentam contra o bom senso, o respeito e a democracia quando promovem a desconfiança e o ódio contra cientistas, artistas, jornalistas e professores de história.

Não fui o único a sofrer uma tentativa de intimidação da parte da Brasil Paralelo. Tenho, próximo de mim, jovens estudantes que vêm sendo alvo de investidas da produtora que deve dispor de muito dinheiro para mobilizar escritórios de advocacia para tentar impedir que pós-graduandos desenvolvam pesquisas e publiquem suas conclusões sobre o assunto pelas pós-graduações do Brasil, além de professores e outras pessoas que lhe apontem o dedo em variados espaços, inclusive na rede social.

Como escreveu o historiador franco-judeu Pierre Vidal-Naquet, no magnífico Os assassinos da memória:

“podemos e devemos discutir sobre os 'revisionistas' [negacionistas]; podemos analisar os seus textos como fazemos a anatomia de uma mentira: podemos e devemos analisar o lugar específico na configuração das ideologias, questionar-nos sobre o porquê e como apareceram, mas não discutir com os ‘revisionistas’ [negacionistas].”

Não tenho nenhum interesse em discutir com a Brasil Paralelo e sua turma o conteúdo das suas produções, mas não me furtarei um único minuto a debater com professores, estudantes e quem mais tiver interesse sobre o porquê de não reconhecer credibilidade naquilo que eles despejam na internet ou conseguem, lamentavelmente, incluir em alguns canais de TV como se fosse conteúdo de “história”.

A propósito, em seguida ao episódio aqui descrito, juntei-me a diversos historiadores e outros professionais que atuam em defesa da verdade fazendo inúmeros eventos, entre lives, mesas em congressos, entrevistas e debates sobre o tema do negacionismo. Apesar de todo o esforço, contudo, a Brasil Paralelo segue se alimentando do clima ainda propício à mentira, tanto que amplia suas atividades inclusive investindo milhões em anúncios nas redes sociais, como o demonstra matéria publicada no The Intercept Brasil.

A luta é longa e difícil, mas não podemos recuar diante do avanço das mentiras, ainda que tenhamos que tomar cuidado para não promover os disseminadores de fraudes aos patamares dos grandes debates públicos, lugar que efetivamente eles não merecem ocupar. Como afirma Deborah Lipstadt:

“Precisamos conduzir uma luta implacável contra aqueles que encorajam – direta ou indiretamente – os outros a fazerem essas coisas. Mas, mesmo enquanto lutamos, não devemos imbuir nossos oponentes de uma importância primordial. Jamais devemos atribuir a nossa existência a seus ataques contra nós ou deixar nossa batalha contra eles se transformar em nossa razão de ser. E, enquanto os combatemos, devemos vesti-los com – ou forçá-los a vestirem sozinhos – uma fantasia de bobo da corte.”

A Brasil Paralelo esperava de mim uma retratação sobre aquilo que escrevi no dia 11 de julho. Um dia depois de comemorar o Dia do Historiador, que se celebra em 19 de agosto, eis aqui a única resposta que pude oferecer aos que me acompanham e aos que, inadvertidamente, acreditam que há algo de bom nos conteúdos da produtora gaúcha. Considerando que não pretendo debater o que quer que seja com uma empresa que vem ganhando bastante dinheiro supostamente oferecendo “narrativas alternativas” sobre a história e outros temas, é tudo o que tenho a dizer. Essa é, para mim, a única resposta possível e, como diz Pierre Vidal-Naquet, “o preço da coerência intelectual”.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

QUEM PODERIA IMAGINAR QUE O FASCISTA FARIA UM GOVERNO TÃO HEDIONDO?

Em entrevista a um jornal português, a senadora Simone Tebet, candidata à presidência pelo partido golpista MDB e que certamente deve ter apertado 17 com força nas últimas eleições,
afirmou que "ninguém imaginava que Bolsonaro poderia namorar com o autoritarismo, ameaçar as instituições democráticas, tentar mudar todo o pensamento de uma geração com o discurso de ódio contra as minorias e fazer uma gestão tão ruim”, sendo considerado o “pior presidente da história do Brasil”.

Sério, senadora? Ninguém imaginava? Quais das dezenas de declarações fascistas de Bolso você perdeu? Ninguém te avisou não? O cartunista Aroeira já avisava desde a década retrasada. Esta charge é de 1993.

Quem poderia imaginar, não é mesmo?!

sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

FELIZ NATAL É CRIANÇA VACINADA

Este governo é tão vergonhoso que hoje, às 20:30, espera-se um enorme panelaço. É que Bolso vai falar à nação por um minuto e meio. E desde 2019 virou tradição bater panela toda vez que o genocida tomar a rede pública para contar mais alguma mentira.

A nossa revolta da vez é que, apesar da Covid matar crianças, o governo negacionista e anti-ciência é contra vacina (pra qualquer um, mas mais ainda pra criança). As estatísticas provam que a Covid matou uma criança de 5 a 11 anos a cada dois dias no Brasil. Está entre as maiores causas de morte nessa faixa etária. Mas Bolso prefere mandar atacar técnicos da Anvisa! 

O sinistro da saúde, Marcelo Queiroga, para satisfazer seu patrão, decidiu que crianças só serão vacinadas com prescrição médica. Não é à toa que seu apelido agora é Queirodes. 

Ainda bem que os secretários estaduais de Saúde já tomaram a decisão conjunta de que vão desrespeitar a medida do sinistro. Não vão exigir prescrição médica. É o que promete esta carta pública do presidente do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde), divulgada hoje e endereçada às crianças do Brasil:

"Infelizmente há quem ache natural perder a vida de vocês, pequeninos, para o coronavírus. Mas com o Zé Gotinha já vencemos a poliomenite, o sarampo e mais de 20 doenças imunopreveníveis. Por isso, no lugar de dificultar, a gente procura facilitar a vacinação de todos os brasileirinhos. E é esse recado que queremos dar no dia de hoje, véspera de Natal: quando iniciarmos a vacinação de nossas crianças avisem aos papais e às mamães: não será necessário nenhum documento de médico recomendando que tomem a vacina. A ciência vencerá. A fraternidade vencerá. A medicina vencerá e vocês estarão protegidos". 

Governadores como Camilo Santana (PT-CE) também se pronunciaram, informando que vacinarão as crianças sim: "Jamais seguiremos os negacionistas [...]. Esses estão mais preocupados em promover disputas ideológicas e políticas que salvar vidas". 

É exatamente isso: Bolso não está nem aí em negar vacinas às crianças, já que seu séquito cada vez menor de eleitores acredita nas fake news de que vacinas matam, contém chips, são comunistas, e que a pandemia sequer existe. Quando o povo chama Bolso de "genocida", não é exagero. 

Por isso, na hora de votar ano que vem, todos devemos nos lembrar de quem apoia o genocida. Deputados e senadores que estão do lado do governo da morte nunca devem ser reeleitos. Candidatos de partidos que formam a base de uma administração que mata crianças não podem chegar ao Congresso jamais!

Que vocês tenham um Natal feliz, dentro do possível. Estou confiante que o Natal do ano que vem será muito melhor, cheio de esperança. E que o Natal de 2023 simbolize o primeiro ano da reconstrução do Brasil. Tudo de bom pra vocês!

quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

O DIA EM QUE VOTEI NA ELEIÇÃO MAIS IMPORTANTE DO CHILE

Domingo foi um dia de grande alívio para a democracia, pra América Latina, pro mundo, e, claro, principalmente pro Chile: o jovem de esquerda Gabriel Boric venceu o segundo turno e se tornou o presidente mais novinho da história, derrotando o candidato da extrema-direita, pinochetista assumido e literalmente filho de nazista. 2022 é nóis, Brasil!
Pedi pra minha correspondente oficial no Chile contar como foi. A jornalista Isabela Vargas é mãe da Gabriela, feminista e integra a coordenação do coletivo Mujeres por la Democracia Santiago de Chile, que organizou os protestos do #EleNao no Chile. Fala, Isabela guerreira!

O dia 19 de dezembro de 2021 jamais será esquecido por chilenas e chilenos. Eu jamais irei esquecer desse dia. Porque foi nessa data que votei no jovem Gabriel Boric, eleito presidente do país, aos 35 anos de idade. O ex-líder do movimento estudantil chileno, natural de Magallanes, zona austral do país, teve uma votação histórica: foram 4,6 milhões de votos numa eleição que teve a maior participação eleitoral já registrada (8,4 milhões de votantes). Um triunfo impressionante para sepultar qualquer chance de a extrema-direita chegar ao poder no Chile.

É verdade que até alcançarmos esse resultado um longo caminho foi percorrido. Depois de momentos de muita tensão e ansiedade, finalmente, a esperança venceu o medo. Quando vi o resultado, não pude conter a emoção. Chorei, chore muito! De alegria e alívio por saber que estávamos livres desse pesadelo chamado fascismo.

Votei cedo. Sempre voto pela manhã porque meu marido trabalha nas eleições. Ele é fotógrafo e trabalha num jornal. A caminho do meu local de votação, vi pelas redes sociais que a prefeita de Santiago Centro, Iraci Hassler, tinha acabado de visitar o colégio onde voto. Ela percorreu vários lugares e isso ajudou a assegurar que o processo transcorresse rápido e tranquilo. 

Acredito que levei mais tempo no meu deslocamento do que para votar. Cheguei na escola e não tinha filas. Passei direto e, enquanto aguardava no corredor, uma funcionária do Servel (Serviço Eleitoral) perguntou o número da minha mesa e, em seguida, me passou para a sala. 

Como sempre, pediram minha identidade e, depois, que eu baixasse a máscara para conferir a foto. Assinei o livro e com a cédula, entrei na cabine para marcar com a minha caneta azul a opção 1, Gabriel Boric. Depositei o voto na urna e fui embora com um misto de ansiedade, alegria e esperança. Fazia muito calor no domingo e o simples fato de sair já era um ato de coragem para qualquer pessoa. 

Cheguei em casa e meu marido saiu para votar. Diferente de mim, que uso o metrô para chegar ao local de votação, ele usa ônibus. Revisando as redes sociais, comecei a ver vários relatos de falta de transporte coletivo. A princípio, em alguns bairros da região metropolitana. Logo, apareceram denúncias de prefeitos na região de Valparaíso, no litoral do Chile, depois mais ao sul, em Temuco, até outras localidades.

Então, a ministra dos transportes do Chile, Gloria Hutt, concedeu uma entrevista coletiva para garantir que havia um plano de contingência para assegurar transporte no dia das eleições. Ao longo do dia, ela foi desmentida pelas imagens na TV e pelos próprios trabalhadores do setor. Alguns motoristas saíram de casa e abriram mão de seu dia livre para transportar voluntariamente passageiros. 

Nas redes sociais, as pessoas começaram a oferecer carona solidária. Uma hashtag foi lançada para incentivar quem tivesse carro e compartilhar transporte com outros eleitores. Alguns prefeitos colocaram à disposição ônibus de aproximação para que as pessoas pudessem ir dos terminais de ônibus, trens e metrô até locais de votação. 

A mobilização dos chilenos lembrou demais o espírito de organização que eu tinha visto no documentário La Batalla de Chile do Patrício Guzmán. Dividido em três partes, o filme mostra como os chilenos apoiaram o governo de Salvador Allende e resistiram ao boicote de empresários e caminhoneiros que culminou com o golpe de 73. 

O documentário foi exibido em setembro desse ano pelo canal de TV aberta La Red, que – é importante destacar -- também colocou carros de suas equipes de reportagem à disposição de eleitores que precisassem chegar aos seus locais de votação. Enquanto a população corria contra o relógio para votar, os canais de televisão abriam os microfones para escutar relatos de quem enfrentava o calor e a espera para garantir seu direito fundamental ao voto e à participação popular numa eleição decisiva.

Aquilo tudo foi me deixando mais e mais angustiada. Meu marido foi trabalhar e fiquei em casa acompanhando as notícias pelas redes sociais. A votação encerrava às 18 horas e a orientação do Servel era de que as mesas não podiam fechar enquanto tivessem eleitores esperando para votar. Aliás, o serviço eleitoral chileno teve uma atuação impecável nesse domingo, o que garantiu um final de jornada relativamente tranquila apesar do evidente boicote do atual governo, da direita e do empresariado. Sem nenhum pudor, apoiaram a um candidato fascista e ainda tentaram impedir o povo de eleger um jovem candidato de esquerda.

Graças à solidariedade, à garra e à alegria, o povo chileno não se deixou abater. Quando começou a apuração dos votos, estava conversado com minha mãe pelo celular e compartilhando minha angústia por causa do boicote. Durante o dia, como não tenho carro, fiz o que faço melhor: a militância virtual. Toda vez que alguém oferecia carona solidária, eu divulgava e torcia para que mais e mais eleitores pudessem chegar ao seu local de votação. 

Passados alguns minutos da abertura das urnas, o Servel começou a divulgar os resultados parciais. Rapidamente, ficou claro o recado das urnas e o resultado dessa eleição: Gabriel Boric era o novo presidente do Chile! Não podia conter as lágrimas de emoção com uma notícia tão maravilhosa e ansiosamente esperada durante todo o segundo turno.

Um alívio por ter contribuído com meu grãozinho de areia na conversa com o motorista do Uber indeciso, na participação em grupos de militância virtual, na difusão do comunicado do nosso Coletivo Mujeres por la Democracia em Brasil reiterando nosso apoio aos que nos apoiaram quando lutamos (e perdemos) contra Bolsonaro. Ufa! Que alívio!

O recorde de participação de eleitores e de número de votos é resultado, especialmente, de uma campanha feita nas ruas. O comando da campanha do Gabriel Boric armou as “brigadas voluntarias” em várias localidades. Os militantes iam de porta em porta buscando votos e conversando com eleitores. O Boric fez campanha assim e a chefe de campanha dele, a médica Izkia Sichez, também. Com sua bebê recém-nascida nos braços e amamentando, ela percorreu o país de norte a sul numa iniciativa chamada “1 milhão de portas por Chile”. 

Outra liderança feminina que também se destacou na campanha de Boric, especialmente se posicionando nos meios de comunicação e ajudando a desmentir fake news, foi a deputada Camila Vallejo. Ela não concorreu à reeleição esse ano para se dedicar à campanha de Boric e valeu a pena. A participação de Camila em entrevistas sempre clara e sem rodeios foi decisiva para consolidar a vitória da esquerda.

As mulheres, em geral, foram grandes apoiadoras dessa campanha e importantes mobilizadoras. Tanto é assim que o penúltimo comício de campanha foi um showmício organizado por diversas organizações feministas que contou com a presença de Gabriel Boric. No discurso da vitória, diante de uma alameda lotada de apoiadores, ele fez um merecido e especial agradecimento às mulheres.

“Quero agradecer às mulheres do nosso país, que se organizaram para defender os direitos que lhes têm sido tão difíceis de realizar (...) O direito ao voto, o direito de decidir sobre o seu próprio corpo (...) Contem conosco, vocês serão protagonistas do nosso governo”, declarou Boric. Pode ter certeza que nós contamos e muito com esse governo! 

Muito ainda iremos analisar sobre o resultado dessa eleição e é importante que a esquerda no Brasil olhe para o Chile com atenção. São realidades bem diferentes, mas acredito que o fator fundamental nas mobilizações do Chile tem sido a presença das mulheres. Outro aspecto que chama a atenção foi que as lideranças chilenas deixaram de lado o ego para vencer um mal maior. E, finalmente, a participação popular com militância na rua, não apenas no ambiente virtual. 

Os chilenos nos deram uma aula sobre como enfrentar o fascismo. Agora, é hora de arregaçar as mangas e jogar o jogo da vitória para recuperar o Brasil e livrar o país desse pesadelo chamado fascismo.