quarta-feira, 2 de abril de 2008

HIP HOP, PRECONCEITO E IDENTIDADE

Vi um documentário muito interessante sobre hip hop ano passado. Foi num auditório da universidade, e infelizmente depois não houve espaco pra trocar impressoes. Outra infelicidade é que não anotei o nome deste documentário independente, de distribuição pra lá de limitada, então não posso compartilhar o título com você. Bom, sei quase nada sobre hip hop, mas ando acompanhando as críticas feitas à linguagem usada nesse tipo de música. Boa parte da comunidade negra daqui quer banir termos ofensivos como “nigger” e “bitch” – termos usados abundantemente por rappers, e também pela maioria da juventude negra. Claro que é diferente um negro chamar seu amigo de “nigger” (que é um palavrão hiper ofensivo, que eu nem deveria estar escrevendo) de um branco tratar um negro com esse termo. Assim como uma mulher se dirigir a sua amiga como “ei, sua vadia!” é diferente dos “vadias e vacas” usados por homens que odeiam mulheres. Existe até uma publicação feminista (branca) chamada Bitch. E os gays pegaram um termo ofensivo como “queer” e o transformaram numa expressão de orgulho usada academicamente (queer theory etc). Mas talvez, se uma mulher negra não aprove que um homem branco a chame de “bitch” ou “the n-word”, ela tampouco deveria divulgar esses termos.
O documentário discute conceitos de masculinidade. Parece que 70% dos consumidores de hip hop nos EUA são homens brancos. Posso entender por que homens são atraídos para uma música que fala tanto de violência, confronto e poder. E imagino que rappers negros gostem que homens brancos paguem por sua música, ainda que eles jamais serão considerados parte do mesmo grupo. É tudo uma questão de se enturmar. Como aqui nos EUA a segregação é imensa, claro que jovens negros encontram uma identidade em comum. Os pais desses jovens, suponho, ja não seriam aceitos na mesma comunidade. Nem as mulheres. Se bem que há várias bundas e peitos nos videoclips. Mulheres são tratadas como objetos, mercadorias. Um clip mostra um rapper passando um cartão de crédito entre as nádegas de uma moça. Taí algo que tem muito a ver com o Brasil, né? É de se pensar por que tantas mulheres topam ser cidadãs de terceira classe nessa comunidade. Tem o dinheiro, mas será só isso? No fundo, é também uma construção social. Assim como os meninos são ensinados que homem não chora, que armas são objetos de desejo, e que a pior coisa que você pode ser no universo é ser gay, as meninas são avaliadas apenas pela sua beleza exterior. Desde a infância se espera que uma menina seja bonita. O sucesso que a menina vai conseguir dependerá dessa avaliação. Então imagino que elas aceitem ser objetos sexuais porque podem. É também uma maneira de se enturmar. Elas seguem um roteiro que foi programado pra elas desde o nascimento. Parecido com nossas dançarinas do Tchan, mas essas pelo menos não são chamadas de vadias. Já outras são chamadas de cadelas, e gostam. Tem algo errado nesse mundo.
Aqui apenas 12% da população é negra, mas entre os presidiários, 50% são negros. Armas de fogo são a principal causa de morte entre jovens negros (como no Brasil). E uma mulher negra corre risco muito maior de ser violentada ou espancada que uma mulher branca. Portanto, promover uma cultura (o hip hop) que glorifica as armas de fogo e promove a violência contra mulheres e gays não parece algo inteligente pra sobrevivência da própria comunidade. Pessoalmente sou contra qualquer tipo de censura. E não consigo compreender como um grupo historicamente discriminado como os negros passe a discriminar outras minorias pra fortalecer sua própria identidade. As minorias deveriam se unir contra os preconceitos, nunca fortalecê-los. Não parece lógico?

5 comentários:

Anônimo disse...

Parece, porém esse pessoal não pensa assim. Aliás, eu acho que esses caras nem pensam. Eles usam os cérebros jurássicos para elaborar rimas e não sobra espaço para outras coisas.
Na comunidade gay também acontece algo parecido: os não afeminados falam mal dos afeminados e caricatos, os ricos dos pobres, etc.
No fundo o problema está na sociedade atual e essas culturas (ou subculturas) apenas reproduzem em pequena escala o preconceito vigente em escala superior. Dá medo viver num mundo assim.

lola aronovich disse...

É, Ollie, é incrível como parece que a gente sempre precisa do "outro", do diferente, pra criar a nossa própria identidade sempre em oposição a alguma coisa. Assim a gente acaba vilanizando o outro. Tinha esquecido disso que vc falou, dos gays não afeminados discriminarem os gays afeminados. Até dentro de uma minoria há outras minorias discriminadas!
Ô, mas o pessoal tá devagar pra comentar hoje, hein?! (não vc, Ollie). Tá indo muito bem de visitas hoje, mais de 175 já, mas sabe quantos comentários? QUATRO!

Dii disse...

Meu o preconceito existe dentro das próprias pessoas que sofrem o preconceito, eu sei que existe mesmo alguns "preconceituosos" mas será que o preconceito existe apenas por esses, na maioria dos seguidores do "hip hop" tratam brancos, como branquelinhos de mer**, o que seria preconceito também para os brancos, mas isto não é visto como "preconceito" não acha, é aquela questão um negro pode usar uma camiseta escrito
"100% negro" e um branco não pode usar uma camiseta escrito "100% branco" devemos ver o preconceito de forma igual, aqui no Brasil tem um grupo de Hip Hop que pessoas de pele clara não podem entrar no show deles, o que seria isso? Uma forma de pagar o que fizeram com seus antepassados? Preconceito é igual e para todos, e só os "que não pensam" o sente.

Dii disse...

Faley demais!!!

lola aronovich disse...

É, concordo em parte, Di. Acho que ninguém deveria ter preconceito contra ninguém. Mas tem uma diferença enorme um negro usar uma camiseta escrito "100% Negro" e um branco usar uma "100% Branco", porque não dá pra fingir que não existe todo um contexto aí. Quais os contextos? Toda a mídia discrimina os negros (e todas as outras minorias). O padrão de beleza não os inclui, eles são discriminados no mercado de trabalho... Um negro usar uma camiseta "100% Negro" tá dizendo que tem orgulho de ser negro, apesar de tudo que a sociedade tem e faz contra ele. Já um branco, que tem todos os privilégios por ser considerado a classe dominante, usar uma camiseta "100% Branco" é errado. Ele tá apoiando movivementos racistas de supremacia branca, que não aceitas os negros e outras minorias. Uma camiseta "100% Negro" não exclui os brancos, necessariamente. Mas "100% Branco" exclui os negros. É tudo uma questão de contexto! Obrigada pela participação, Di!