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Siga essas dicas de prevenção de estupro. Sim, sabemos que é difícil, mas... você consegue! (Imagem tirada daqui, de um texto que circula já faz um tempinho na internet. Tradução minha). 1. Não co
loque drogas nas bebidas das pessoas para controlar o comportamento delas.2. Quando você vir alguém andando sozinha, deixe-a só.3. Se você encostar seu carro para ajudar alguém com problemas no carro, lembre-se de não estuprá-la.4. Nunca arrombe uma janela ou porta trancada sem ser convidado.5. Se você estiver num elevador e mais alguém entrar, não a estupre!6. Use o sistema de amizades! Se você não for capaz de deixar de estuprar as pessoas, peça a um amigo para ficar com você enquanto estiver em público.7. Seja sempre honesto com as pessoas! Não finja ser um amigo preocupado para conse
guir a confiança de alguém que você pensa em estuprar. Pense em falar pra ela que você pensa em estuprá-la. Se você não comunicar suas intenções, a outra pessoa pode ver isso como um sinal que você não pensa em estuprá-la.8. Não se esqueça: você não pode transar com alguém a menos que ela esteja acordada!9. Leve um apito! Se você está preocupado que pode estuprar alguém acidentalmente, você deve dar o apito à pessoa com quem você está para que ela possa usá-lo se você tentar alguma coisa.10. Não estupre. ---
Se você, homem, sente-se ofendido porque escrevo o estuprador no masculino e a vítima no feminino, saiba que infelizmente é assim que o estupro funciona no nosso mundo. Em vez de reclamar desta realidade, que tal tentar mudá-la? Faça a sua parte.
Faz meses que li esta notinha num tumblr americano. Agora a traduzo:
Caro Todososhomens,
Quando nós recla
mamos sobre homens estuprando, abusando, incomodando e recusando-se a nos dar direitos humanos, e você vem furioso dizendo 'Mas não são todos os homens que são assim! Como vocês ousam inferir que eu posso ser assim?”, você não acha que o problema pode vir do fato que você fica furioso com a gente por reclamar, ao invés de ficar furioso com seus colegas garotos e homens por esta misoginia duradoura? Ao invés de ficar furioso por nós apontarmos que tantos homens agem dessa forma -– incluindo homens em quem as mulheres confiam plenamente –- fique furioso que existam homens que tratarão mal sua mãe, irmã, filha, amiga, namorada simplesmente por elas serem mulheres. Não apenas isso, mas esses homens te dão uma má fama, não a nós.
Atenciosamente,
Mulheres Tradução imagem 1: Vivemos numa sociedade que ensina a não ser estuprada, ao invés de não estuprar.
Imagem 2: Beber não é crime. Estupro sim. (Crise de Estupro – Escócia).
Imagem 3, da série “Minha força não é pra machucar”: Então quando paguei o nosso jantar, ela não me devia nada. Slogan: Homens podem parar com o estupro.
O capitalismo não está funcionando. Um outro mundo é possível
O documentário A Doutrina do Choque, baseado no livro de Naomi Klein, tem seus probleminhas de ritmo, mas o conteúdo é interessantíssimo e me mostrou vários pon
tos que eu desconhecia (dá pra vê-lo inteirinho aqui). Ele começa fazendo uma associação entre choques elétricos testados nos anos 1950 para tratar pacientes (técnicas que foram logo incorporadas pela CIA), e a doutrina de um dos maiores pensadores do capitalismo, Milton Friedman (vencedor do prêmio Nobel de Economia em 76, e saudado por Bush no aniversário de 90 anos do economista). Friedman estava convicto que uma terapia de choque econômico seria mais aceita pela sociedade para implantar o capitalismo sem nenhuma regulamentação. Ele havia se oposto
ao New Deal de Roosevelt na década de 30, um plano que permitiu o mínimo de sobreviência à população pobre durante a Depressão, oferecendo empregos no setor público e uma rede de seguridade social. Logo após a Segunda Guerra, a Europa abraçou a causa da proteção social. Friedman também vociferou contra isso, pois achava radical. O que ele defendia era que qualquer intervenção governamental era maléfica, e que a economia saberia controlar-se a si própria. Nos anos 50 essas ideias eram vistas como coisa de maluco. Governo deixar
de providenciar serviços à população? Não intervir na economia? Não dar nenhum tipo de alento à população menos favorecida? Pois é. Só que três décadas mais tarde essa visão virou a predominante.
A primeira chance que Friedman teve para testar seu modelo foi no Chile. No 11 de Setembro alternativo, mas igualmente trágico, o de 1973, um golpe militar orquestrado e patrocinado pelos EUA derrubou o presidente eleito, o socialista Allende, e colocou o general Pinochet no poder. Em questão de dias, 13 mil opositores ao regime foram presos, a maior parte mantida dentro do Estádio Nacional. Após pressões internacionais, Pinochet desocupou o
estádio. Pouco depois, a FIFA deixou que jogos de classificação para a Copa do Mundo ocorressem em Santiago ― no mesmo Estádio Nacional que havia sido palco de torturas e mortes um mês antes! A União Soviética, que devia disputar uma partida contra o Chile, recusou-se a ir. A partida foi jogada, com a equipe chilena chutando sozinha contra o gol vazio do outro lado! O Chile se classificou para a Copa.
Friedman e os Chicago Boys investiram pesado no país sul-americano. Muit
os estudantes chilenos receberam bolsas para ir para a Universidade de Chicago aprender a doutrina liberal. Qualquer sugestão de estatizar alguma empresa foi rapidamente ceifada. O primeiro ano deste choque de capitalismo no Chile foi uma explosão de desemprego, um alto custo social para os pobres, e uma inflação de 375% ao ano, a maior do mundo no período.
Durante os 17 anos em que Pinochet foi ditador, Friedman (e os EUA) esteve ao seu lado. Mas isso não impediu que os Chicago Boys colaborassem ativamente com outros governos militares, como o do Uruguai e o do Brasil. Na Argentina, após o golpe de 1976, esses economistas americanos cons
eguiram postos-chave no governo. Um ano depois, os salários da população perdiam 40% de seu valor. E aí vem outro sinal de como futebol é o ópio do povo (veja Pra Frente Brasil): em 1978, a Argentina sediou a Copa do Mundo. A final ocorreu num estádio a poucos quilômetros de onde boa parte dos presos políticos eram torturados e mortos sob as ordens do ditador Videla. Essa foi a ditadura em que quinhentos bebês de desaparecidas foram adotados por militares e simpatizantes do regime (Videla foi derrubado pelas Mães da Praça de Maio e mais tarde co
ndenado à prisão perpétua. Enquanto isso, outros países ainda não conseguiram enfrentar seus fantasmas e punir militares).
Em seus discursos, Friedman gostava de dizer que capitalismo e liberdade andavam de mãos dadas, que o capitalismo era uma luta contra a tirania. Este ainda é o discurso oficial.
A grande vitória de Friedman veio nos anos 80, quando dois países ricos finalmente passaram a seguir sua doutrina com afinco. Margaret Thatcher, no Reino Unido, e Ronald Reagan, nos EUA, cortaram gastos do governo, reduziram impostos e a propriedade estatal, e impediram a regulamentação da indústria. No primei
ro ano de governo de Thatcher, o desemprego dobrou em alguns setores da economia, e houve muitas greves, a mais famosa a dos mineiros, que durou um ano (através da força policial, a dama de ferro derrotou o sindicato, e aproveitou para privatizar tudo). Naomi Klein diz que a impopularidade de Thatcher parecia provar que a doutrina liberal era detestada demais para ser implantada num país que dependesse de aprovação popular, tipo uma democracia. O que salvou Thatcher foi uma crise, a guerra. Embora a maior parte dos britânicos
nunca tivesse ouvido falar nas Ilhas Falkland, Thatcher promoveu uma guerra lá nas Malvinas contra a Argentina, em 1982. Durou apenas três meses, mas gerou uma onda de patriotismo, o que fez com que a dama de ferro ganhasse a reeleição em 83.
Antes de Thatcher, um CEO (alto executivo) na Inglaterra recebia dez vezes mais que um trabalhador médio. Em 2007, ganhava cem vezes mais. Nos EUA pré-Reagan, um CEO ganhava 43 vezes mais que um trabalhador. Em 2005, já ganhava 400 vezes mais. Ou seja, é óbvio que o sistema funciona. Não pra todos, mas aí já é querer demais.
Quando o capitalismo
chegou à Rússia, em 91, empresas estatais foram vendidas por uma pechincha, e pequenos grupos começaram a prosperar. Um terço dos russos caiu para abaixo da linha da miséria. A corrupção e a máfia tomaram conta do país. Com Yeltsin, que dissolveu o Parlamento ― com o total apoio do Ocidente ―, o número de pobres na Rússia explodiu, mas nenhum outro país no mundo teve tantos novos milionários. É uma compensação, né?
Com um inimigo de tantas décadas derrotado, era essencial que aparecesse um n
ovo. Este novo inimigo surgiu em 2001, com o outro 11 de Setembro. Agora lutávamos contra um eixo do mal pouco especificado, sempre pronto para acolher novos inimigos na sua indefinição. Os conflitos que se seguiram foram vendidos como um choque entre civilizações, uma guerra contra o terror. Guerra esta que virou mais uma grande chance de negócios. A guerra no Iraque é a mais privatizada da história moderna. Em 2007 havia mais terceirizados que soldados, o que contraria até o que Friedman pensava (ele achava que as Forças Armadas não deveriam ser privatizadas).
A despedida de Friedman, em 2006, foi dizer que Nova Orleans depois do Katrina era uma terra de oportunidades. Poderia-se, por exemplo, privatizar toda a rede de ensino, então completamente destruída. Negócio imperdível!
Klein fala que o capitalismo é melhor implantado logo após um desastre (natural ou causado), quando as pessoas ainda estão anestesiadas pelo choque. No Sri Lanka, depois do tsunami, muitos habitantes foram impedidos de vol
tar as suas terras, que logo seriam vendidas para empreendores multimilionários que as transtormariam em hotéis de luxo.
Em setembro de 2008, como todos sabemos, o mercado implodiu, na mais grave crise desde o Crash de 1929. Nenhuma das duas quebras foi obra de comunistas. Pelo contrário, a crise é um resultado direto da política de privatização e da falta de regulamentação. Para tentar atenuá-la, dinheiro foi transferido do governo, dos impostos, para as empresas e os indivíduos que causaram a crise. Mas o documentário é otimista e diz que, da última v
ez em que o mundo se viu diante de uma crise tão grave, tivemos o New Deal e políticas keynesianas de seguridade social. Quem sabe aconteça de novo?
Eu adoraria ser tão otimista, mas acho que, se tem uma coisa que o capitalismo conseguiu fazer bem, foi vender pra maioria das pessoas a ideia de que este é o único modelo possível.
Terça passada dei uma palestra sobre Sexualidade, Corpo e Mídia no SESC-CE, parte de um ótimo seminário que apresentou os resultados de uma ampla pesquisa da Fundação Perseu Abramo sobre as mulheres (prometo falar mais sobre isso). Uma das palestrantes f
oi a Maria da Penha, pra você ver a minha responsa. Mas, como diz o Borat, minha apresentação acabou sendo um “great success”. Muita gente veio falar comigo no coquetel que houve depois. Duas moças inteligentes e articuladas me perguntaram sobre a novela Insensato Coração. Afirmaram que todos os personagens homens agem e falam de uma forma machista que desvaloriza as mulheres. Eu respondi que não sabia, pois só assisto (e recomendo) Amor e Revolução, que trata dos anos de chumbo (e eu considero uma novela feminista, pois mostra o papel relevante que as mulheres tiveram na luta contra a ditadura). 
Aí recebi um email de uma leitora simpática, a Aurora, falando da novela, ao mesmo tempo em que li este textinho da atriz (Bruna Linzmeyer) que faz a Leila, uma garota de 19 anos que se apaixona pelo mulherengo André (Lázaro Ramos). Se você estiver boiando tanto quanto eu, neste vídeo André comenta com um amigo como a menina se jogou em cima dele. Ele parece ser um escrotossauro (a meu ver, mais pelo que fala da esposa do colega do que pelo que fala da garota). Mas nesta cena em que Leila se declara a ele, eu gostei da resposta dele. Nesta parte Júlio, o
pai (Marcelo Valle), descobre que André tinha saído com a filha. Aqui, o pai chama a filha de vadia e recebe um tapa (gostei! Em geral é o patriarca que espanca a filha, e o público aplaude). E aqui, Leila acaba saindo de casa. Agora que você já está a par de tudo, leia o depoimento e as dúvidas de Aurora, que eu volto no final. Aurora: Esta semana tivemos um jantar em família pra apresentar o namorado novo da minha prima. Eis que em certo ponto da noite, depois de toda a comilança, resta
m apenas as mulheres e o convidado na mesa. Começa a novela das 9, e logo estamos todAs engajadas numa discussão sobre os últimos acontecimentos da trama.Talvez você não veja novela, então vou apresentar a situação bem por cima: Uma jovem vive frustrada por não se realizar sexualmente. Em busca de prazer, se joga nas baladas e começa a sair com vários caras, tudo sem compromisso nenhum. A casa vem abaixo quando o pai (que acredita piamente naquela história de mulher que transa é vagabunda) descobre que ela transou com dois colegas de trabalho dele. Como ele descobre? Do pior jeito possível: está numa mesa ouvindo os colegas falarem "horrores" de uma garota e, papo vai, papo vem, ele liga os pontos e perceb
e que a filha dele é a mulher em questão. Há um tremendo barraco e sequências com o pai em casa, dizendo que não criou a filha pra ser uma vadia e chorando horrores pela decepção gigantesca. Eis o nosso diálogo na mesa:Tia: Vocês viram que horror ela aprontou com o pai?Mãe e prima: Ah, é, foi horrível!Eu: Tá, mas e se a filha na verdade fosse um homem? Tipo, é o cara que sai pra balada toda a noite e passa o rodo. Será que seria a mesma coisa?Tia, rindo nervosa: Ah, mas é diferente... Ele é PAI... Ela é filhA... E ele teve que ouvir aqueles caras falando dos detalhes...
Eu: Ela é maior. Trabalha e se sustenta e--Mãe: Ela quer dizer que é diferente o sentimento...Tia: É, filhO tanto faz, mas filhA o pai quer proteger... blábláblá...E aí elas me encurralaram -- eu nunca tive um pai, não entendo nada disso. Olhando de fora me parece um argumento machista (sexo é sexo, pô. Porque se a filhA faz sexo ela corre perigo, e se o filhO faz sexo tanto faz? Se o pai tivesse ouvido meninas comentando que o filho dele é bom de cama, ou que é galinha, ele ia pra casa chorar?). Me parece que a questão é cultural, e não simplesmente um instinto protetor que naturalmente só se aplica a m
eninAs. E me parece muito, mas muuuito errado perpetuar essa coisa de que "sim, papai te trata diferente, mas você devia ficar feliz, isso é porque você é especial! Na verdade, seu pai se importa mais com você do que com seu irmão! Não, ele não vê sexo como algo diferente pra vocês dois! Sexo realmente É perigoso PROS DOIS, mas o caso é que ele tá é se lixando pros riscos que o seu irmão corre! Ele só quer saber de proteger a menininha dele!". Tava todo mundo emocionado e feliz na mesa dizendo que um pai trata uma filha "com mais carinho".... e eu boiei, porque não sou pai nem nunca tive um. Não se trata de "vencer" o debate. O negócio é que eu fiquei intrigada. E óbvio que a primeira coisa que me veio à cabeça foi o Escreva, Lola, Escreva...
Então lá vai: É possível aplicar conceitos como feminismo e/ou machismo à família? Se sim, como a ótica feminista vê uma relação pai-filhA? Até que ponto se questiona a "espontaneidade" dos sentimentos afetivos? Até que ponto a sociedade influencia o que se passa dentro de casa?Além disso, tem outra questão: Na novela, é clara a intenção do autor de levantar o debate. Pelo menos a meu ver, até aqui a história se mostrou a favor da menina, levando pras pessoas a noção de que está tudo bem a mulher ser sexualmente independente. Mas não é bem assim que o povo está recebendo -- lá em casa todo mundo interpretou como "o retrato da desgraça de um pai", não como "o tratamento diferenciado que uma jovem tem que enfrentar". Será que não dava um
post?Se fosse um filhO, seria o mesmo? Sim? Não? Por quê? Quero focar na reação dele em relação à filha estar "falada". Essa "proteção" é questionável ou não? Ele é retrógado, ou todos os pais são assim? Quando a filha tenta argumentar que é maior, independente, etc, por que ele não escuta? Pais se revoltam quando os filhOs vão pra cama com meninas... hã... qual o feminino de cafajeste? Ah, você entendeu. Pais brigam pra defender a honra sexual dos filhOs? Etc, etc, etc. A novela foi só um gatilho pras minhas dúvidas.Euzinha de volta, respondendo apenas a algumas das perguntas (o resto eu deixo
pra você nos comentários): Lógico que a reação dos pais seria diferente se a filha em questão fosse filho. Não consigo imaginar pais destruídos com a honra do seu filho, por ele “estar passando de mão em mão”, falando coisas horríveis sobre sua sexualidade! É só comparar: o que de horrível pode ser dito da sexualidade de um cara? Que ele broxa? Que ele goza rápido demais? Que ele tem o pênis pequeno? As opções acabam aí. (Ah sim, que ele -- o horror, o horror -- é gay!). É só lembrar quantos termos pejorativos existem pra descrever a sexualidade de uma moça: vadia, vagabunda, piranha, galinha, vaca etc etc (desculpe, meu vocabulário é meio limitado). Uma mulher não precisa fazer nada pra ser chamada de vadia. Basta ser mulher. É aquela velha história que só homem gosta de sexo, que mulher tem que se dar o respeito ― e só transar depois de casada, imagino. Quantos parce
iros uma mulher precisa ter na vida pra ser taxada de promíscua? E os homens? Cadê a igualdade neste cenário?Se a gente realmente quiser mudar a sociedade e acabar com a desigualdade entre os gêneros, é primordial que paremos de educar filhas e filhos de forma tão diferente (leia um excelente guest post sobre isso). Aquela ladainha: a menina tem que cuidar dos afazeres domésticos enquanto o irmão fica jogando videogame, o menino pode sair à vontade enquanto a irmã tem hora pra voltar, o menino tem sua curiosidade sexual valorizada enquanto a irmã deve se envergonhar. Nada disso é natural ou biológico. Ninguém nasce assim. A gente aprende. Claro que, enquanto vivermos numa sociedade tão desigual, é compreensível que
os pais se preocupem mais com a filha adolescente que com o filho. Dificilmente um senhor ou sua assistente chegarão pra um menino e dirão que, se ele sair com o velho, ganhará coisas (como aconteceu comigo com 12 ou 14 anos). Quando uma jovem engravida sem querer, sobra pra ela. Existe também a ameaça do estupro, da violência sexual. Sem dúvida, é um mundo perigoso pras meninas (e pras mulheres). Mas o pai da novela não está preocupado com nada disso (tanto que ele expulsa Leila de casa, onde ela estará mais desprotegida ainda). Ele só condena que ela esteja sendo "comentada". Seu lamento é com a sua honra ― a honra dele, como pai. Ele está chateado porque falam da sua filha, sua propriedade, com desdém. E isso é de um machismo rid
ículo e inaceitável nos dias de hoje.O único “crime” de Leila é não ser mais virgem e ter transado com mais de um. Isso aos 19 anos! Em outras épocas, se Leila fosse menino, o pai, constrangido com a virgindade do filho, o teria levado a um prostíbulo. Aqui, ele expulsa Leila de casa. Que venham me falar de igualdade!
Eu pra minha cara metade: Você diria que você tá me desejando ardentemente neste exato momento?Maridão, totalmente hesitante e com cara de que definitivamente só deseja ardentemente a cama, e sem acompanhantes: Ahn, eu diria que talvez eu...Eu: Diria? Talvez? Tá colocando muitos obstáculos aí antes de responder, anjo!Ele: Tá bom, sem talvez.Eu: Então vou te perguntar de novo: Você diria que tá me desejando ardentemente?Ele: Eu diria que... Eu: Sem diria
, amor! Seja definitivo!Ele: Mas a sua pergunta tem diria... Eu: Você pode responder sem diria. Vamulá, amor. Você consegue! Então: Você diria que tá me desejando ardentemente?Ele: Hum, como que eu respondo isso sem diria?... (Após longa pausa, enquanto eu reviro os olhos:) TÔ!Outros diálogos entre o maridão e eu (olha que eu já quis publicar um livro com esses diálogos, chamado Crônicas de Como o Amor é Estúpido, mas não encontrei editora): beijos, apelidos, exercício, loteria, herança, cheiros, educação, sensualidade, mais sensualidade, engano, energia, nova fonte de energia, dominó, romantismo, mini-kabongs, autoestima, reflexos, fidelidade, comunicação, efeito isidoro.
Na terça recebi o email de uma doutoranda em Linguística Aplicada na UFRN recomendando o vídeo que logo foi transmitido pra todo o Brasil, o da professora Amanda Gurgel, que falou corajosamente, explicando a greve dos professores no RN, para a Assembleia Legislativa. Se você ainda não viu, veja, porque o discurso da Amanda é excelente e merece toda a repercussão que está
tendo (li que amanhã ela vai aparecer no Faustão). Ironicamente (porque o discurso da Amanda, uma sindicalista, uma mulher de esquerda, vai contra os interesses da direita), no mesmo dia a Globo começou um bafão sobre o livro didático do MEC.Na quarta, uma leitora muito carinhosa, a Angélica, me enviou um longo (e gostoso) email. Pedi autorização a ela para transformar parte dele num guest post. Angélica tem 26 anos, é advogada, mora em Belo Horizonte, e vem de uma família que ela define como de grandes mulheres. Sua mãe, por exemplo, além de feminista, é técnica em edificações e há 41 anos trabalha em obras de construção civil por todos os cantos do Brasil. O email da Angélica é de indignação -- tanta indignação quanto da Amanda. Sou uma mulher bem sucedida de classe média e não consigo compreender posici
onamentos políticos que só observam aqueles agraciados pelas benéfices das condições materiais. Me sinto mal e não me envolvo numa discussão quando percebo que o ouvinte é surdo para o debate da consciência em prol da inclusão e da melhora social que alcance o maior número possível de indivíduos. Não posso compreender mentes que consideram políticas públicas como medidas “eleitoreiras e populistas, coisas para os politicamente corretos”, ou aqueles que acreditam que o pobre agora tem mais filhos para conseguir mais um Bolsa Família. É deplorável. E eu, no topo da arrogância do meu conhecimento, negligencio a discussão e permito que a boçalidade permaneça no meu ambiente de convívio diário (como no trabalho, por exemplo).Sofro. Não posso compreender uma mente reacionária. Não compreendo a Globo. Não consigo pensar em nenhuma justificativa para a mente de uma pessoa formadora de opinião, que utiliza da inderrotável força da mídia para disseminar a barbárie da ignorância. Terça pela manhã, tomava caf
é em um hotel que tinha uma televisão ligada na Globo. Foi o suficiente para embrulhar meu estômago. Os “brilhantes intelectuais” que apresentam o jornal expunham uma matéria que já começou com a manchete: “o MEC dessa vez passou dos limites! Aprovou um livro de língua portuguesa que não tem certo ou errado, mas coloca como adequada ou inadequada a forma de expressar o idioma! OOOOHHH!”.A situação só piorou. Depois da chamada asquerosa, a belíssima repórter, com cara de “muito indignada”, continuou balbuciando asneiras. “O MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (dando ênfase ao órgão) está a favor da queda de qualidade no ensino. Alexandre Garcia!” (veja o vídeo). Nesse momento eu quis ir embora. Considero o Alexand
re Garcia um reacionário do mal, um privilegiador das classes altas. Mas permaneci para me embriagar de asco. Ele, sem surpreender, foi soltando afirmações grotescas de uma ignorância profunda, dizendo que agora estamos nivelando a educação por baixo, que ninguém mais vai aprender como se fala a língua portuguesa, que o politicamente correto é o fim, que nada presta neste país.Meu deus, Lola. Meu deus do céu. Quanta ignorância. Cheguei ao trabalho querendo acender uma vela para a Santa Ignorância Padroeira dos Reacionários. Eu saí enjoada do café, com um sentimento de tamanha revolta com essa droga que é a Globo, com essa mentalidade mesquinha da classe média que lê Veja. Senti que eu precisava dizer algo a esse jornal ruim, a esse jornalista ruim e à Globo. Queria dizer primeira
mente que eu, que nasci em 1985, cresci assistindo a bons programas infantis na televisão, como Rá Tim Bum, Castelo Rá Tim Bum, Xis Tudo, Glub Glub. No intervalo de todos esses programas, passava um programinha rápido chamado Nossa Língua Portuguesa, apresentado pelo famoso Professor Pasquale, que eu e as minhas irmãs adorávamos. Não tínhamos senso crítico suficiente para saber a corrente de ensino da língua que ele seguia ou se era uma forma ruim de ensinar, mas o programa era rápido, passava no intervalo dos programas infantis e sempre utilizava nos exemplos trechos de músicas brasileiras ou de livros conhecidos. Algo que sempre chamou a nossa atenção (a minha e das minhas irmãs) era que o Professor sempre dizia que não havia problema em falar dessa ou daquela maneira, que no nordeste há expressões que não são utilizadas no sudeste e vice-versa. Ele afirmava que o que tínhamos que fazer era aceitar a todos, com a forma de expressão que tiverem, mas que deveríamos saber sempre a linguagem com
o ela é, com suas teorias complexas todas, como ela nasceu, para que isso fosse um instrumento para ser usado, uma emancipação, visto que a língua é a maior expressão da cultura, é um liame objetivo que nos une e que, dessa forma, deve ser observada de forma dinâmica, para acompanharmos o reflexo da língua no povo e o reflexo do povo na língua. Ele utilizava, dentre vários exemplos, as adaptações de expressões em língua estrangeira que iam sendo incorporadas. Eu internalizei isso. A empregada de casa falava tudo “errado”, ela tinha vindo da roça, não concordava plurais ou sujeitos e verbos. Mas ela foi essencial na construção do meu caráter. O lugar que os ensinamentos dela preencheram na minha pessoa, nenhum professor erudito da universidade alcançou tão profundamente. Eu cresci num ambiente que fazia questão de ver brilho em todos. Eu e as minhas irmãs estudamos 100% em escolas públicas, do ensino fundamental às universidades. Comemos merenda, tivemos colegas sem família, brincamos com os filhos de empregadas doméstic
as, que eram maioria na nossa escola. Ainda assim, o ensino que nos foi dado foi suficiente para fazermos vestibulares em escolas federais e passarmos de primeira. Aprendemos a gramática "correta", sabendo que a linguagem coloquial prevalecia. Até agora não tenho certeza por que motivos Alexandre Garcia, no meio do assunto do livro de português, teria colocado a opinião estúpida de que o presidente do FMI não seria algemado no Brasil. Ahm, seria para dizer o tanto que ele acha que o país está ruim e o tanto que ele acha que “lá fora é que é bom”? Quanta ignorância. Assistimos a crises longas e graves em países ricos e antigos, percebemos que no Brasil estamos à frente em diversas correntes de pensamento. Mas essa vantagem intelectual é tomada pela sagaz opinião reaci
onária como “chiliques do politicamente correto” e o excesso de zelo da “galerinha dos direitos humanos”.Alexandre, meu amigo, saia da sua novela de Manoel Carlos, onde todo mundo é lindo, limpo, mora no Leblon e viaja para Paris no final do ano. Aqui, onde as pessoas reais existem e são maioria (desprivilegiada, claro), fala-se o português coloquial. Aqui onde residem as crianças da escola pública, onde o Estado não chega com tanta eficácia quanto para você, com suas ruas asfaltadas e seus vinhos caros do Pão de Açúcar, há um sentimento fomentado de raiva e desilusão quanto a essa exclusão. Aqui, no universo das pessoas que se alimentam de merenda escolar (quando tem), o Estado não fornece condições dignas para que estas se esquivem da triste realidade de quem sofre necessidades primárias. A inclusão dessas pessoas na língua portuguesa seria até um ato de dignidade. Mas para você, pouco importa, elas vão sofrer a negligência do Estado e, mais tarde, serão algemadas, espancadas, julgadas e condenadas ao fogo do inferno. Enquanto isso, você estará no paraíso com a Ana Maria Braga, o Rafinha Bastos, o Bolsonaro e todos os reacionários que aplaudem a barbárie, as galés, o horror. Vocês
estarão lá suplicando pela pena de morte.Se “lá fora” é tão bom assim, vocês não são cidadãos que fazem falta, podem ir viver com eles.Aqui devem permanecer as pessoas que estão construindo um país mais unido, agregado, debatendo ideias de forma humana e sabendo que somos todos idênticos. Aqueles que diferenciam brasileiros de qualquer forma por preconceito e ignorância, não estão tentando fazer o todo crescer, melhorar, evoluir. Estão tentando segregar mais (vide Rafinha Bastos) para expor as cabeças dos segregados em praça pública, como Vargas fez com o bando de Lampião, para que possam aplaudir o sangue escorrer.Para vocês eu aconselho que saiam, sim. Que vão para bem longe, para cessar o prejuízo de mentalidades desperdiçadas como estas. Não é necessário ninguém para segregar. Preci
samos de pessoas para unir, fortalecer, trazer respostas. Enquanto vocês difundem apenas a crítica por capricho, o preconceito e a manutenção do privilégio social, não precisam ficar. Podem ir embora para onde se defendem as algemas, e deixem o Brasil para aqueles que quando falam em público, quando representam o povo, querem ouvir o que o povo tem a dizer e a reclamar, mesmo que em português inadequado.