sexta-feira, 31 de outubro de 2008

UM FILME B EXISTENCIAL DO CRONENBERG

Simulações da vida são mais fascinantes que a vida real?

Existenz (1999) é mais um filme muito estranho do David Cronenberg, que acho que amadureceu nos seus últimos dois trabalhos, os ótimos Marcas da Violência e Senhores do Crime. Outro que havia perdido desse diretor canadense e vi em dvd foi Spider (2002), com o Ralph Fiennes (gostei bastante). Não entendi muito bem o que acontece em Existenz, e acho que não há respostas concretas. Se você não viu o filme, deveria vê-lo. Em linhas muito gerais, é sobre uma designer de videogames (feita pela Jennifer Jason Leigh, de Noites Violentas no Brooklyn) que foge com seu relações públicas, o Jude Law (Perto Demais), de montes de pessoas que querem matá-la. O jogo está dentro de um jogo que está dentro de outro jogo. Mas é uma viagem, e um prato cheio pra debates existenciais e pós-modernos. Deve haver uma dezena de teses escritas sobre ele. Infelizmente, não entendo nada de videogames, e o último que joguei foi um Atari (nisso eu já revelo a minha idade). Mas adoro quando a Jennifer e o Jude “acordam” no quarto, e ela diz pra ele: “Você está viciado. Sua vida aqui é chata, não acontece nada. E lá no jogo é cheia de ação”. E é verdade. Posso compreender por que montes de adolescentes não queiram se desgrudar dos seus joysticks (isso existe ainda?), onde são super-heróis. Mas a gente não precisa ficar só no âmbito dos games. O cinema é o quê, se não um universo alternativo? Lá podemos viver muitas histórias esquisitas que jamais experimentaríamos na nossa vida real. Quer dizer, quantas vezes você já viu alguém atirar noutra pessoa? Com sorte, nenhuma. Ou quantas vezes você viu uma mulher como a Sharon Stone no dia a dia? É uma fantasia atrás da outra. Isso me lembra os filminhos que são passados à população drogada com Soma em Admirável Mundo Novo (venho citando muito esse livro ultimamente. É que eu o amo de paixão). Enquanto a platéia vibra, o selvagem (a única voz discordante no livro) reclama da violência e do sexo nesses filminhos. Ahn, parece familiar? Outro dia li uma pesquisa entre americanos. Metade deles diz que os filmes britânicos seriam melhores se tivessem mais explosões. Imagino que dessa forma não seriam tão representativos da nossa realidade monótona.

Muitas das coisas que o Cronenberg faz são absolutamente asquerosas. A Mosca e Scannners ainda são meio mainstream (apesar da gente não ver em muitos filmes de Hollywood um carinha guardar num vidro no armarinho do banheiro seu pênis que caiu – o dele, leitor, não precisa checar!). Mas Videodrome e Naked Lunch eu acho difíceis de assistir, com o James Woods tocando uma fita de vídeo em seu estômago, e com uma barata gigante falando pelo bumbum, respectivamente. Existenz certamente entra nessa categoria de coisas asquerosas. Mas a história é muito original, então a gente perdoa. Agora, não gostaria de ver de novo todas as alusões sexuais, como um buraco nas costas, os anfíbios sendo comidos, ou mesmo as armas que atiram dentes. Acho o Cronenberg meio doente às vezes. Mas às vezes um doente genial.

Veja o trailer aqui. E, se tiver estômago, a inventiva cena do restaurante (aí embaixo). Típica do Cronenberg! Sabe quando em Gêmeos o Jeremy Irons, que faz um ginecologista, inventa instrumentos para "examinar" suas pacientes? Em Existenz o Jude Law monta uma arma com sobras de uma comida suspeita.


19 comentários:

Babs disse...

Nossa, wow. Vou passar esse texto pro namorido, ele adora filmes assim...
Eu ainda fico no "wow"...
Bjos

Rosangela Oliveira disse...

Asqueroso é pouco hein! Não sei se o cara era chinês, mas vou evitar os restaurantes orientais por um tempo!

Babs disse...

Ah! O texto voltou!
Agora vi a cena com o Jude Law, wow!
O que o roteirista fumoubebeucheirou?!
Como a Rosângela disse, asqueroso é pouco!
Concordo com você quando você diz que "O cinema é o quê, se não um universo alternativo?". O cinema nos proporciona a oportunidade de abstrair da nossa realidade cotidiana e nos coloca em outra, mas com a particularidade de nos tornar espectador quase onisciente que mesmo sem participar efetivamente tem o poder, muitas vezes, de enxergar coisas que o protagonista não vê. Acho que isso também é tentador no cinema, não apenas estar em outra realidade, mas uma realidade com uma relação de poder diferente, assim como nos jogos.
Bj

Unknown disse...

hmm...eeek,não é "meu tipo" esse filme. hehehe.

aaaw, meu gatinho?
Agora ele vive no "cats heaven". :((
morro de saudade dele.

Babs disse...

Lola, você usa carteirinha de estudante?
Estão querendo limitar a meia entrada da segunda até quarta...
http://noticias.uol.com.br/cotidiano/2008/10/31/ult5772u1301.jhtm

Acho que está dentor do tema do blog né?
Bj

Anônimo disse...

Eu já vi esse filme lola! acho que foi o único do cronenberg que vi. Eu gostei. Se bem que não entendi nada na parte que aparece aquela criaturinha digitalizada.
Mas não é apenas os adolescentes que hoje gastam horas a fio nos videos games...muitos homens adultos também. Li uma matéria no Financial times que falava sobre como o homem de hoje se recusa a envelhever...quer ser um eterno garoto. Além das questões de beleza, quer manter a adolescencia o máximo possivél. Em muitos casos o video-game entrou no lugar daquela pelada de fim de tarde com os amigos.

Anônimo disse...

Nossa, Lola. Cinema pós-moderno e outros que tais não precisa ser asqueroso, nojento, sickening. Ainda bem que você contou bem os detalhes. Vou guardar bem esse nome pra não ver esse filme nem por error. (Como aquele das galinhas, no fundo inofensivo, ne?)Pensar que eu gostei de Senhores do Crime. Até pensei ver outros dele. E olha como as coisas são relativas : até o meu amado Cavaca gostou do filme? Bjs, La Mamacita

Anônimo disse...

Mamacita, o filme tem lá suas partes nojentas mas levanta algumas questões muito interessantes sobre a realidade em que algumas pessoas vivem. Isso é o que se extrai do filme. A minha curiosidade principal nesses filmes é ver alguns actores antes do sucesso. Lembro-me que há muitos anos atrás vi naqueles filmes da madrugada da globo( corujão?) um filme com a Sandra Bullock no mundo country que tenho certeza que pouca gente conhece. beijos.

Ju Ribeiro disse...

lola, eu tinha que te passar isso aqui, já que você gosta de bichos:

www.stuffonmycat.com

www.stuffonmymutt.com

Giovanni Gouveia disse...

Sharon eu não vi não, mas alguém atirando já, e a última vez que vi quem foi alvejado fui eu... :(
Sobre video games, a última vez que eu joguei chamava-se "tele jogo", e era quase um bit de resolução... (claro que com o advento dos computadores eu me viciei em paciência e suas derivações...)

Mas o argumento parece interessante, talvez eu o assista...

Rosangela disse...

Lola, gosto muito de suas crônicas cinematográficas, ainda mais quando no meio delas você abre espaço para 'jokes' sobre si mesma. A menção a sua experiência restrita com jogos eletrônicos (atari) é impagável. A sua capacidade de rir de si mesma é a cereja dos seus textos. Adoro! Como vai a tese? Eu também estou escrevendo a tese de Doutorado e adoraria que você encontrasse um tempinho para relatar como tem sido escrever um trabalho dessa magnitude. Mais uma curiosidade: não há críticas sobre algum filme do Almodovar no seu blog?
beijo grande, Rosangela

Anônimo disse...

Oi, Lola! Não vejo graça em videogames, mas curto muito os filmes do David Cronenberg! Nunca assiti "Existenz". Saiu em DVD?

lola aronovich disse...

Babs, bom, tomara que seu namorido (adoro esse termo!) goste...


Ro, não se preocupa não que esses bichos nojentos que eles comem no filme não existem de verdade. Pode continuar indo ao restaurante chinês sem medo!

lola aronovich disse...

O texto voltou e vc também, Babs! Obrigada pela sua análise sobre o cinema ser um universo alternativo.


Ô Meire, que tristeza! Mas pelo menos seu gatinho parou de sofrer. Quantos anos ele tinha, tadinho? Eu não acredito muito no céu pra pessoas, mas imagino que deve haver um pra cães e gatos. Se bem que alguns bichinhos recebem tanto amor nosso, são tão bem tratados, que a vida deles é o céu na terra. Pena que não sejam a minoria...

lola aronovich disse...

Babs, não uso carteirinha de estudante. Eu levo uma declaração da universidade mesmo, e todo mundo aceita. Mas ainda não fiz a minha deste semestre, acredita? (bom, é que aqui em Joinville eu geralmente não pago cinema. Tenho uma carteirinha que dá acesso especial pra mim e um acompanhante - quase sempre o maridão). Mas obrigada pelo link, claro que tá dentro do tema do blog. Vou dar uma olhada.


É verdade, Cavaca. Tá cheio de adulto que fica horas diante de videogames também. Pode ser por isso que vc falou - não querer envelhecer - mas também porque esses joguinhos são viciantes mesmo. Eu costumava jogar xadrez online, e era um horror! Podia passar o DIA INTEIRO fazendo isso. Terrível como vicia.

lola aronovich disse...

Bom, mãe, o Cronenberg tem dessas coisas. Tanto Senhores do Crime quanto Marcas da Violência são filmes bastante “convencionais”, sem essa violência histérica e nojenta que o Cronenberg tanto gosta. Opa, eu não vi Videodrome com vc, em vídeo, nos anos 80? Lembra do James Woods tocando uma fita de vídeo na barriga dele? Mas Existenz tá cheio de discussões interessantes, mom. Só tem que fechar os olhos pra algumas cenas asquerosas.


Cavaca, essa “mamacita” é a minha mãe. Legal saber que ela é sua fã também! Ela adora a Suzana e a Lolla Moon. Pelo jeito ela acompanha os comentários daqui do blog faz tempo.

lola aronovich disse...

Ju R, há há. Os cachorrinhos ficam com cara de pobres coitados, mas os gatos ficam REVOLTADOS. Dá pra ver pelas carinhas. Adorei esta. Amo como gatinhos dormem em qualquer lugar, a qualquer hora. Eu quero ser assim quando crescer. Ou pelo menos quando terminar a minha tese.


Como assim, Gio? Atiraram em vc? Conta essa história direito!
Ah, tele-jogo! Eu lembro, claro. Mas vc não pegou nem um pouquinho de Atari depois? E vc conseguiu ter computador sem jogar Tetris?

lola aronovich disse...

Ju R, quando falei “adorei esta” quis dizer a do gatinho encostado nos disquetes. É com o nome “Tee. Gee. Eye. Eff”.


A Tia, que bom que vc gosta! É, eu acho que a gente tem que saber rir se si mesma. Não dá pra se levar muito a sério. Ai, a tese vai indo. Agora estou cumprindo o cronograma à risca. Um capítulo por mês. Quer dizer, o que era pra entregar esta sexta vai ficar pra segunda, porque ainda não acabei. Mas este é o cap. 5. São sete no total. Até o Natal tenho que entregar tudo. Aí no semestre que vem é reescrever, corrigir... Mas estando com a primeira versão completa é outra história. Tenho que defender a tese no meio do ano. E sobre o que é o seu doutorado?
Críticas do Almodóvar? Poucas, eu acho. Sei que Fale com Ela tá aqui e Volver aqui. E escrevi um pouco sobre esse grande diretor aqui.


Guta, eu vi Existenz em dvd nos EUA. Mas certamente deve ter aqui no Brasil.

Juliana disse...

realmente, existenz tem muitas coisas asquerosas, mas eu amo!! o filme, as idéias, as viagens, não as coisas asquerosas, hahaha