quarta-feira, 27 de novembro de 2002

CRÍTICA: DOCE LAR / Missão: Pilotar fogão

Juro que fui ver "Doce Lar" pensando ser um filme francês chamado "Lar Doce Lar" (o maridão preferia ver um sobre dragões). Chegando lá, reparei que o pôster tinha a Reese Witherspoon que, salvo ledo engano, não sabe francês. Mas insisti, fui nesse mesmo, e cá estou eu soltando fogo pelas ventas. Putz, por que fazem coisas tão lamentáveis?

A Reese, cujo único ponto alto no currículo é o excelente "Eleição", faz uma estilista de sucesso em Nova York, apesar de se vestir mal pacas. O filho da prefeita fecha a Tiffany's pra lhe pedir em casamento. Oh, o amor é lindo! Todas as atendentes da loja a fitam com admiração, como se este fosse o sonho dourado de 100% da população feminina. Mas a Reese tem um probleminha pra resolver, e ela deve ir até sua cidade natal, nos cafundós do Alabama, pra se divorciar em definitivo do marido abandonado há sete anos. O cara é interpretado por um tal de Josh Lucas, que é clone do Matthew McConaughey ("Contato"), que por sua vez é cópia do Paul Newman (Deus). Ou seja, é loiro, é bonitinho, cheio de atitude e faz um par perfeito com a Reese, tipo Mickey e Minnie. Não quero insinuar que "Doce Lar" seja previsível, mas digamos que, assim que ela e o loiraço se encontram, a gente sabe que ela acabará em seus braços, que sua carreira não vale nada, que o importante é ser uma boa dona de casa, e que o Alabama, ao contrário do que se possa pensar, não é o Afeganistão dos EUA, mas sim um lugar digno e repleto de ideais conservadores. Não estou contando o final deste troço. É só reparar no título pra sacar tudo que vai acontecer. Então, dependendo da experiência cinematográfica, você pode ou não achar essa trama um tanto dejá-vu. Por exemplo, se este não for o primeiro filme da sua vida, talvez seja possível surpreender-se com as reviravoltas. Não sei, tem as novelas também. Bom, ficamos assim: se você nunca viu nenhuma outra comédia romântica, nenhuma novela, você talvez sinta que "Doce Lar" tenha algum frescor. Se bem que eu acho que, pra não adivinhar o fim desta baboseira, só sendo meio devagar das idéias ou ter sido criado no Sul dos States.

O diretor Andy Tenant, de "Para Sempre Cinderela", toca o hit "Sweet Home Alabama" umas três vezes, pra gente fixar o título. Pra piorar, traz uma sub-trama de um gato que foi dinamitado vivo. Agora, eu sou contra a pena de morte, mas acho justo prisão perpétua pra quem comete essas atrocidades. E o fato do gato não morrer não serve de atenuante. Além do mais, o grande momento da Reese é um monólogo num cemitério de cães. Bem no clímax, tive um ataque de espirros. Deve ser AFR – Alergia a Filme Ruim.

Se você não chama o Bin Laden de Osama, pode estar enxergando um certo anti-americanismo neste texto. Impressão sua. É que é difícil se identificar com caipiras que gostam de reviver a Guerra Civil. E ainda que os produtores tenham realizado uma limpeza étnica no Alabama, eliminando praticamente todos os negros, não acho que pega bem colocar montes de bandeiras da Confederação. Elas também não são o símbolo da Ku Klux Klan? Ou quiçá seja esta a intenção: a de transformar esta joça no filme de cabeceira da família Bush. Afinal, quem é a única vilã da comédia? Ué, a única mulher independente da história. Ser Rainha do Lar pode, ser prefeita de NY, não (e ela é do Partido Democrata, ainda por cima). "Doce Lar" cheira a propaganda dos velhos valores americanos, para que nós, das colônias distantes, possamos aprender como se faz a tradicional geléia do Alabama.

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