sexta-feira, 8 de maio de 2009

CLÁSSICOS MODERNOS: Louca Obsessão, uma introdução

Kathy Bates e James Caan em jantar romântico.

Eu adoro Misery, ou Louca Obsessão, e considero-o um dos melhores filmes dos anos 90. Quando o vi pela primeira vez, em 1990, gostei, mas não tanto assim. Continuo achando superior Um Sonho de Liberdade, outra história baseada numa obra do Stephen King. Só que cada vez que revejo Misery, mais eu gosto. Tirando o final. Chegarei lá.
Pra quem não conhece, Misery é o nome da protagonista de uma série de subliteratura criado por um famoso escritor, Paul Sheldon. Paul―o nome lembrou Sidney Sheldon?―está cansado da série e, no seu último livro, mata a personagem para poder escrever um romance de verdade. Vamos descontar que o Stephen King também deve ter essas ilusões de que está atado a um só tipo de literatura que o impede de tornar-se um grande escritor (eu já falei que não considero o King muito bom, apesar d'ele ser um ótimo inventor de tramas que, nas mãos de diretores competentes, viram clássicos do cinema). Paul sofre um terrível acidente de carro durante uma nevasca no meio do nada, e é resgatado por uma enfermeira, Annie Wilkes, que diz ser sua fã número um (“I'm your number one fan”). Annie o leva pra sua casa e cuida dele, até que ela lê o livro mais recente de Paul, recém-publicado, descobre que sua personagem favorita, Misery, foi morta pelo autor, e força Paul a ressuscitá-la. As coisas vão piorando a cada momento. Paul tenta fugir, e percebe que Annie é uma psicopata. O filme é uma delícia cheia de suspense (veja trailer aqui), e não seria tão memorável se não fosse por uma cena que todo mundo se lembra. Aquela cena. Sabe, aquela em que Annie, pra impedir que Paul fuja, põe uma tábua entre seus tornozelos e dá uma martelada, num procedimento conhecido como hobbling (você pode ver a cena aqui, se tiver estômago).
Misery é do Rob Reiner, diretor de excelentes filmes como Harry e Sally e This is Spinal Tap, e de obras menores, mas ainda assim marcantes, como Conta Comigo e Questão de Honra, e que neste milênio ainda não fez nada que preste (Antes de Partir, Dizem Por Aí). Mas qualquer um que fez Harry e Sally, pra mim, é um diretor muito acima da média. Acontece que Rob nunca havia chegado perto do gênero terror/suspense. Nem nunca se aventurou nisso novamente, após Misery.
Na realidade, quem estava cotado pra dirigir o filme era o George Roy Hill (de Golpe de Mestre e Butch Cassidy). Os direitos do livro tinham sido comprados e o festejado roteirista William Goldman (de Butch Cassidy e Todos os Homens do Presidente) já havia escrito o roteiro (inclusive, algumas das informações que coloco aqui eu peguei dos comentários do diretor e do roteirista no dvd, e do livro Which Lie Did I Tell?, do William). George havia topado fazer o filme, até ler aquela cena no roteiro. Aí desistiu. O Warren Beatty, que foi sondado para dirigir e até aceitaria ser o protagonista se não fosse seu envolvimento com Dick Tracy na época, deu um toque ao William. Warren entendia que William havia sido fiel ao romance de King. No livro, Annie não apenas quebra os pés de Paul. Ela corta mesmo os dois pés do escritor, na altura do calcanhar. Corta a machadadas e cicatriza com uma tocha. Warren reclamou com William: “Ela não pode cortar os pés deles, porque isso é irreversível! Mesmo que ele sobreviva, será um loser sem pés pro resto da vida”. William não queria mudar a cena, porque era essa brutalidade que o havia levado a querer adaptar o livro. Mas, depois de notar a recusa de diretor após diretor, e também de ator após ator, decidiu mudá-la.
Ah, ficou curioso(a)? Quer saber quais astros disseram “No, thanks” pro papel de Paul? A lista é longa: William Hurt, Kevin Kline, Robert Redford, Robert De Niro, Al Pacino, Michael Douglas, Jack Nicholson (porque já tinha feito Iluminado, outra adaptação baseada em obra do King), e Richard Dreyfuss (que já tinha recusado o papel que foi pro Billy Crystal em Harry e Sally, também do Rob Reiner, e deve se arrepender até hoje). Quem William Goldman acha que estaria perfeito: Richard Gere. Cof cof. Você consegue visualizar o Richard no papel? Pra mim é impossível. Mas Richard sequer foi cogitado, já que estava morto e enterrado em 1989, ano em que o elenco foi escalado (isso foi antes d'ele renascer das cinzas com o sucesso de Justiça Cega e Uma Linda Mulher).
James Caan aceitou. Fazia tempo que ele não tinha um papel de destaque e ele vinha de um sério problema com drogas. Foi irônico ter um cara super ativo e físico como ele (pense nele em Poderoso Chefão, onde ele não fica quieto um segundo) no papel de alguém que fica preso a uma cama o filme todo. Eu acho que ele está muito bem, mas, sinceramente, também sinto que Misery é inteirinho da Kathy Bates (que levou o Oscar).
Ah, sim, como falei que iria falar do final, lá vai: não gosto de como Annie morre. Acho que é só pra atender a uma demanda de mercado, que exige que vilões sejam punidos de forma horrenda. O fim é cruel e misógino. Não precisávamos ver Paul 1) furando os olhos de Annie, 2) batendo sua cabeça no chão, enquanto a chama de vadia; 3) batendo com a máquina de escrever em sua cabeça; 4) derrubando-a com as pernas (se bem que essa cena é importante: ele ainda pode usar as pernas que ela mutilou!); 5) fazendo-a engolir papel queimado; 6) quebrando seu crânio com uma estatueta de porco. Imagino que um ou dois dessa lista já seriam suficientes pra matar uma pessoa.
No próximo post sobre Misery eu chuto por que todos aqueles astros recusaram o papel, e tento convencer vocês a respeito do que o filme realmente tá falando.

33 comentários:

Patricia Scarpin disse...

Lola, eu também adoro esse filme - acho que qualquer outro ator que tivesse topado o papel de Paul Sheldon teria sido ofuscado pela Kathy... Ela está simplesmente perfeita. Aquele olhar dela me dá arrepios só de pensar!

Giovanni Gouveia disse...

Numa frase:
Kathy Bathes é maravilhosa (ever)

Tina Lopes disse...

Ufa, pra todos os que recusaram, com ênfase no William Hurt e no Michael Douglas. Claro que o filme é da Kathy, mas o James Caan formam um par perfeito às avessas. Eu não sabia que no livro ela amputava o cara, cruzes, que horror. Mas é sempre assim, a coisa tem que ser amaciada. Imagina que no Iluminado, o livro, o personagem do Jack mutila o próprio rosto com um taco de golfe para que o filho não o reconheça e não consiga fazê-lo "despertar" da possessão, por amor. Ou coisa que o valha.

Alfredo disse...

Amei a sua descriução do filme! Eu ja estava querendo fazer download dele e apos ler o seu texto me deu mais vontade ainda. Deixei a sugestão anotada na minha agenda. Sobre o final que vc falou... poxa.. que odeia é esa de querer defender a psicopata so pq é mulher? Eu sou contra homem bater em mulher, mas poxa Lola... daqui a pouco vc vai querer defender Ana carolina Jatobá... na minha opiniao, o assassino (a) deve sofrer mais que a vítima (cadeira eletrica, amputamento bem lento pra sofrer bastante.) Dúvido que se castrassem estupradores em praca publica e exibindo as imagens durante o jornal nacional, esse negocio de estupro continuaria existindo.

Alfredo disse...

Ah proposito vc poderia fazer tb um guest-post com atores que recusaram determinados papeis. Nossa seria otimo. Isso faz exercitar nossa imaginacao!

Cris disse...

Ei, Lola, muito boa a sugestão do Asnalfa.Não lembro qual atriz famosa recusou o papel de "Um Linda Mulher", para sorte da Julia Roberts.
Não me recordo agora de outros exemplos, mas seria bem interessante um post sobre isso.
beijos

Masegui disse...

Contra minha vontade eu sou obrigado a concordar com o asnalfa. Eu gostaria muito de ver o Al Pacino ou o Robert De Niro (ou outro qualquer) escrevendo um post pra Lolinha e explicando porque não aceitou o papel... (he he he).

babsiix disse...

hahahah, qdo li q a cris disse q a sugestão do asnalfa era mt boa achei q ele estava falando da castração publica, lenta e com img veiculadas no jornal nacional.

Lola, vc podia fazer enquetes como "melhor comedia romantica" ou "melhor filme de herois".

Alfredo disse...

babsiix

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

pq nao?? vc nao concorda comigo nao??

Ollie disse...

Oi?! Adoro.
Você estava me devendo esse post há tempos, heim?
Mal posso esperar pela sequência.
Depois comento.
:)

Leila Silva disse...

Eu também adoro esse filme e estou precisando rever, não me lembrava mais de como a Kathy Bates, ou melhor, a personagem interpretada por ela, morria.
Kathy Bates é ótima, não me lembro de ter visto um só filme ruim com ela, mas também não vejo tantos filmes quanto você.

Que vontade fiquei de rever este filme!

abraço
Leila

Jorge Tambodeguihn disse...

Quer dizer que cortar os pés do cara e cicatrizar com tocha é maldoso, mas furar os olhos da mulher é misógino???

Lola, Lola, Lola... como você bem disse: no próximo post você tenta convencer.

Gustavo C. disse...

Do que o filme realmente tá falando? Mensagem subliminar? Ixi.. Será que eu caí nessa? To achando que sim, seja lá o que for..

Sabe como eu queria que a Annie acabasse? Sendo presa, mas não só isso.. (podia ser depois do Paul tirar um pouco de sangue dela, afinal, de que outro jeito o homem ia se defender? Acho que cada golpe que ela levou teve justificativa suficiente) Que a prisão dela fizesse o caso ser amplamente exposto, pra todo mundo ver a louca que ela era, cair a máscara. Muitas vezes acho que a morte para o vilão é um final muito ameno para todo o tempo que ele aprontou. No caso desse filme, acho que a exposição de quem ela realmente era para toda a cidadezinha seria um castigo à altura. E ela teria que ficar com esse "fracasso" (imagino que para um psicopata seria isso).

Chaves disse...

Vcs esqueceram que ela matou um monte de bebes quando era enfermeira? Ela é a anti-mulher, que não cuida daquilo que devia cuidar.
No caso, do cara que ela diz que adora, que estava sob sua proteção, das pessoas de quem ela deveria ter cuidado enquanto era enfermeira...
A mensagem do filme deve ser algo assim: mulher que sonha demais (lê romances baratos e fantasia em cima disso) não consegue cuidar dos outros direito.
A outra é que o amor feminino é possessivo e causa a destruição do homem, e que os meninos para que possam crescer devem ser afastados de suas mães logo que possível.
A condição infantilizada do escritor, enquanto estava acidentado representa isso, e a quebra dos pés é o meio usado pra "simbolizar" que para a mãe o menino não pode (literalmente) caminhar por si mesmo... jogo de controle, sabe como é... coisa que mulheres "píssicas" fazem...
Mas isso pra mim é leitura viajandona, sei lá, acho que o filme funciona otimamente como terror/suspense, e sinceramente não sei se homens se sentem mais "vingados" do que as mulheres quando vêem a Annie apanhando.

Srta.T disse...

Ainda não vi esse filme, mas depois de ler o post, tô achando "Hellraiser" coisa de criança.

Asnalfa, não sei se Ana Jatobá é um bom exemplo de psicopata: http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u562436.shtml
Esse caso tá looooonge de ser resolvido, tem muitos furos.

Olha Chaves, eu espero mesmo que não sejam essas mensagens que o filme passa, porque achei muito sexista, de verdade. "Ela é a anti-mulher, que não cuida daquilo que devia cuidar." - Essa frase pegou supermal. E, até onde eu sei, loucura não tem gênero, né? Nem amor possessivo. Tá aí o Lindemberg que não me deixa mentir.

Cris disse...

Lola, lembrei de outro...Ghost, que eu saiba, quase não foi feito pela Demi Morre e pelo Patrick Swayze. Se não me angano, a Julia Roberts recusou o papel de Molly e outro ator famoso o de Sam. Mas eu não sei qual.

Viu, Lolinha, quando o Asnalfa para de reclamar e esquece a mania de perseguição, ele até tem umas idéias boas, kkkkkkkkk.
(beijos, Asnalfinha)

Srta.T disse...

Nadavê com o post, mas como você já escreveu sobre isso no blog, achei que interessaria: http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u562678.shtml

Cristine Martin disse...

Oi Lola!

Essa é uma das melhores adaptações de Stephen King para o cinema, na minha opinião. A Kathy Bates rouba mesmo o filme, a gente nunca mais ouve a expressão "fã número um" depois disso sem lembrar dela e sentir um arrepio...

Cris, as atrizes que recusaram o papel de Vivian em "Uma Linda Mulher" foram Valeria Golino, Molly Ringwald, Meg Ryan (a preferida da Disney), Michelle Pfeiffer, Jennifer Jason Leigh, Jodie Foster, Sarah Jessica Parker e Brooke Shields. Escrevi um artigo no Rato de Biblioteca falando sobre este filme e o My Fair Lady, comparando os dois.

Abração!

Chaves disse...

Bom, eu só relatei o que seria uma "leitura viajandona" segundo os meus critérios. Minha opinião é que a Annie é uma psicopata, e ponto final. Tem maluco pra tudo, o filme é ótimo e eu adoro.
Só acho que se você for olhar segundo o ponto de vista feminista, ou freudiano, sei lá, pode ser que veja as coisas por esse ângulo - e considerando que a Lola vai postar algo sobre isso, talvez tenha a ver...
Se existe um subtexto ali, certamente é esse: amor de mulher/mãe não presta. E sob esse ponto de vista, é um filme misógino e bate com as pistas da Lola.

Unknown disse...

Lola, daaaaahrling....

Mandei o link do trailer por e-mail.
:*

beijocas.

Norma S disse...

Olá Lola, gosto muito do seu blog e não pude deixar de comentar este post. Acho que a Kathy Bates nesse filme me passa o mesmo horror que o jack Nicholson em O Iluminado. Mas amo a cena dela no estacionamento em Tomates Verdes Fritos, cheia de raiva, mas era um outro tipo de raiva, como uma espécie de raiva justa dos oprimidos. Não era raiva de maluca má...ehehe
bjs

JR Costa disse...

Eu ADORO esse filme.

E sim, ele só é tão memorável por causa da Kathy Bates, que aliás está ótima em todo filme que faz, até aqueles bem ruins.

Felipe Guimarães disse...

Eu adoro Louca Obsessão. Tb acho que o filme é todo da Kathy Bates. Também não gosto quando ela faz engolir o papel queimado. Sério que era para cortar os pés dele e cicatrizar com uma tocha? Não sei, fico indeciso. As duas cenas são ótimas. Tb já escrevi sobre esse filme.
= D

Vitor Ferreira disse...

Lola, eu gostodo filme, mas acho ele bem cruel. Filmes como esse, como diria o Roberto Jefferson, despertam os meus instintos mais primitivos, e eu nao posso dizer que nao vibrei com o final. Se qualquer pessoa quebrasse um pezinho so meu daquele jeito, eu faria mais coisas do que a lista de 6 coisas, so pelo odio acumulado.

Vitor Ferreira disse...

Outra coisa, esse filme eh do mesmo ano de Uma Linda Mulher. Lembro que a Julia foi indicada junto com a Kathy para o Oscar.

Alessandro RC disse...

Esse filme é sensacional! Eu comprei em DVD e a performance de Kathy Bates não tenho palavras para descrever. Quem faria melhor?

Dreamer disse...

Poxa, eu adoro esse filme! Recordação boa!

Isabella disse...

Nossa, Lola, taí uma adaptação que gostei MUITO e que o livro tb é muitom (e, se me lembro bem até mais cruel). Não sabia que tantos atores haviam recusado o papel... E vc tem razão, a Kathy Bates, arrasou! Mas b não lembrava da morte dela ter sido tão cruel... Furar os olhos?

Eu AMEI Shashank redemption! Eu gosto do Stephen King.

Christina Frenzel disse...

Lola, pra mim esta é uma das melhores adaptações de Stephen King. Só perde para Iluminado, e assim mesmo por que Jack é o Jack -sem desmereçer Kathy Bathes, maravilhosa!

Beijos

Anônimo disse...

nssa, que comentário insano kkk "fim misógino"!! a mulher matava bebes, aprisionou uma pessoa, quebrou os pés dele, era uma verdadeira assassina, mas ser morta em legitima defesa foi um fim misogino!
se fosse um homem, oq vc pensaria?

Anônimo disse...

GOSTEI MUITO DO FILME KATHY BATES FOI FANTÁSTICA,E O FINAL É MUITO JUSTO POR QUE ELE ESTAVA IMPOSSIBILITADO DE ANDAR E AINDA A MATOU POR LEGITIMA DEFESA,COM MUITA DIFICULDADE,ACHO MUITO COVARDE UM HOMEM BATER NUMA MULHER MAS NUM MONSTRO TUDO BEM,AMEI ESSE FILME PESSOAL,TCHAU.

Anônimo disse...

FILME BOM COM FINAL JUSTO,KATHY BATES FANTÁSTICA COMO ELA É,AMO ESSE FILME.

Gean Alipio dos Santos disse...

Eu discordo a respeito do final ser cruel e misógino; acho que foi um desfecho à altura de uma personagem psicopata e stalker, que mantém alguém naquelas condições em cárcere privado, além de toda opressão psicológica e tortura física às quais o coitado do escritor é submetido.
Fora o background da nossa querida Annie Wilkes, como se confere na cena em que Paul, durante uma das ausências demoradas dela, descobre seu livro de memórias, cheio de artigos que sugerem um longo rastro de vítimas da enfermeira.