Meu querido Flavio Moreira, colaborador habitual do bloguinho, traduziu este texto publicado por Justin Rosario no Daily Blanter. E ainda comentou:
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"Só posso me masturbar com
memórias da minha infância,
parte 347" (Lembra do Scooby?) |
"Acho que vale a pena lembrar que, tanto no original quanto na dublagem em português, She-Ra invocava a 'honra de Greyskull' em sua transformação, enquanto He-Man bradava 'pelos poderes de Greyskull'. É uma escolha de palavras nada sutil, pois a mulher precisa ser a 'guardiã da honra' enquanto o homem detém 'os poderes' (o fato de estar no plural também é muito significativo). Em inglês, apesar do desenho ter por título She-Ra: The Princess of Power (A Princesa do Poder), ela também grita 'For the honor of Greyskull' (pela honra de Greyskull)".
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O novo vale dos male tears (lágrimas masculinas) |
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"A nova She-Ra parece o
Tom Holland" |
Eu não deveria estar escrevendo isso. Não posso acreditar que estou escrevendo isso. Por que, em nome de tudo que é mais sagrado, estou escrevendo isso? Homens crescidos estão tomando as redes sociais para dar chilique porque a personagem-título no reboot do incrível desenho dos anos 80 que foi She-Ra parece mais jovem e não um objeto de masturbação.
Sério, eu não estou inventando isso:
"O ultraje em relação à nova She-Ra parece estar relacionado [...] à ideia de que ela não é bonita, que ela supostamente tem quer ser bonita e sexy e que alguém destruiu o que antes era uma mulher linda e sexy. Algumas pessoas acreditam que a She-Ra reimaginada é desprezível".
Costumo ouvir o podcast de Anita Sarkeesian, Feminist Frequency. É útil para ter a perspectiva feminista sobre meios de comunicação de massa e cultura pop. E mesmo que elas tenham um gosto terrível para filmes, e que seus erros em relação à cultura geek me façam chorar às vezes, suas discussões sobre a cultura tóxica do fanboy (sobre o significado do termo e seu uso, veja este link) são iluminadoras.
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O novo design de She-Ra, como babacas
que querem ver meninas menores de
idade sexy acham que o novo design
parece, como babacas querem que o
novo design de She-Ra se pareça |
Sarkeesian foi uma das vítimas primárias (e “vítima” é a palavra certa a se usar) do Gamer Gate, que foi uma campanha massiva de abuso online executada pelo proto-alt-right [na época o ainda insipiente movimento de extremíssima direita dos EUA]. Desde então, ela tem lançado uma luz brilhante sobre os bebês chorões racistas, sexistas e entitled que acreditam ser os guardiões de toda a cultura geek.
É claro que eles têm um ódio visceral por ela. Mas esse novo surto em relação à She-Ra é apenas parte da mesma coisa. Eles são os mesmos joões-ninguém que piraram na batatinha porque Star Wars: O Despertar da Força tem um negro e uma mulher branca como protagonistas.
Eles espumaram porque a personagem Rose Tico em O Último Jedi (não estou brincando) não usava maquiagem nem roupas que acentuassem suas curvas. A atriz Kelly Marie Tran de fato é bem atraente e possui curvas para exibir. Mas seu personagem é uma mecânica que trabalha nas entranhas de uma nave espacial. Quantos encanadores você conhece que ficam sexy no meio de seu dia de trabalho?
Ah, e eles ficaram ofendidos por ela ser asiática, porque de alguma forma isso é importante.
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"Netflix claramente está com medo
que She-Ra seja uma mulher linda.
Óbvio. Veja como ela pode ser
assustadora" |
Fanboys tóxicos são casos perdidos que ainda não engoliram a ideia de que mulheres e pessoas de cor também leem quadrinhos, jogam vídeo games e assistem filmes de ficção científica. A indústria do entretenimento finalmente se deu conta desse enorme e inexplorado público e começou a satisfazer os gostos dele também. Foi isso que provocou uma fúria branca abrasadora (ênfase em “branca”). Para eles todo esse universo geek pertence a eles e, como crianças mimadas, eles não querem dividi-lo.
O reboot de She-Ra é o exemplo perfeito. Está sendo lançado com um público bastante específico em mente: garotas jovens. Como qualquer programa dedicado a jovens garotas, as principais personagens terão idades mais próximas às delas para que haja mais identificação.
Ainda assim, homens adultos estão furiosos que um programa que não é para eles não satisfaça seus caprichos sexuais. Por quê? Porque She-Ra faz parte da cultura geek e a cultura geek “pertence” a eles.
Deus nos proteja se eles tivessem dado a She-Ra outra etnia!
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"Lésbica masculina re-imagina She-Ra
como uma lésbica masculina. O total
egoísmo disso é espantoso" |
Esse sentimento de “entitlement” é o que tem levado pessoas brancas a chamar a polícia para pessoas negras cuidando de sua própria vida em espaços públicos. Foi o que as levou a votar em um nacionalista branco imbecil. E é o que está levando-os a se comportar como babacas por causa de um desenho animado para crianças. É tudo parte do mesmo detestável sentimento branco (principalmente masculino) de que merecem tudo e qualquer coisa.
Pelo amor de Deus, gente! Se controlem!