BOLSONARO REFORÇA SUA IGNORÂNCIA DIANTE DE ELLEN PAGE

A jovem atriz e ativista LGBT Ellen Page (Menina Má, Juno, X-Men, A Origem) fez uma série de documentários (Gaycation) sobre gays em vários lugares do mundo, inclusive no Rio. Na sexta, foi divulgado um vídeo dela confrontando Jair Bolsonaro.

Page não é a primeira a fazer isso, lógico. Três anos atrás, o ator britânico Stephen Fry foi até o Rio entrevistar Bolso para o documentário Out There. Naquela ocasião, o deputado homofóbico já envergonhou o país ao declarar, contra todas as evidências (a começar pelo seu posicionamento), que "Não existe homofobia no Brasil", e que os gays mortos morrem por drogas, prostituição, ou assassinados pelos parceiros.

No vídeo, é possível ver Fry humilhando o deputado que esteve na Câmara durante 22 anos antes de conseguir aprovar um só projeto. Fry questiona o que Bolso considera "normal" e "natural", já que, na natureza, 480 espécies de animais exibem comportamento homossexual, mas apenas uma é homofóbica (o bicho-homem). Bolso responde que a cultura inglesa é diferente da nossa, que ainda não estamos preparados "pra isso" no Brasil, que precisamos ter um norte moral na vida.

E ainda, o velho medo: 

"Gays querem afetar nossas crianças para fazê-las se tornar gays quando adultas e satisfazer sua sexualidade no futuro".

(Essa declaração é um avanço em relação ao que Bolso e sua legião de homofóbicos costumam dizer: que gays querem usufruir das crianças sexualmente quando elas ainda são crianças. Afinal, segundo eles, todos os gays são pedófilos, e só gays são pedófilos). 

Fry descreve a experiência de se encontrar com Bolso como uma das mais sinistras que ele já teve. 

E conclui que Bolsonaro é o homofóbico típico que existe em todo lugar do mundo, com seu discurso de que gays querem dominar o mundo, recrutar crianças ou abusar delas: "Só odiamos quando somos ignorantes ou temos medo". 

Com Ellen Page, Bolsonaro reforça tudo que qualquer ser pensante já sabia: que ele é um ignorante orgulhoso da sua ignorância. Ele sabe que está falando besteira, mas não dá a mínima, porque sabe que seus eleitores pensam como ele. 

Ao mesmo tempo, ele tem que manter o mínimo de compostura, porque sabe que o vídeo será assistido por gente de outros países que não o Brasil, e Bolso não quer ser visto como uma caricatura. Uma coisa é Donald Trump, no país mais poderoso do planeta, ser visto como um palhaço caricato no resto do mundo. Outra coisa é um deputadozinho fanfarrão num país que ainda é periférico. 

Page pergunta a Bolso se ele acha que deveriam bater nela pra ela deixar de ser gay, pois ele já incentivou essa "cura" antes. Ele responde que não se importa se ela é ou não gay, e que, se ele fosse cadete e a visse na rua, iria assobiar pra ela. Porque não basta ser homofóbico, tem que ser misógino também. A reação no rosto de Page já diz tudo.

E aí Bolso faz seu discurso mais ridículo: "Quando eu era jovem, né, falando em percentual, existiam poucos [gays]. Com o passar do tempo, com as liberalidades, drogas, a mulher também trabalhando, aumentou-se bastante o número de homossexuais". 

Ele também lamenta que se um filho começar a sair com "certos tipos", ele adotará aquele comportamento e passará a encará-lo como normal. Ele defende bater nos filhos para educá-los. Para ele, normal é um casal que gera filhos. 

Ou seja, eu, hétero, casada há 25 anos com um homem, não sou normal porque escolhemos não ter filhos. Um casal hétero infértil também é anormal, segundo Bolso. Um padre, uma freira, enfim, qualquer um que não se reproduza, por qualquer motivo, foge à normalidade. 

Bolso segue com sua profunda ignorância ao dizer que ele não vai transformar Page em hétero, e nem ela em gay (porque parece que é contagioso, está no ar). Page lhe dá uma resposta calma e convincente: "Não quero que pessoas que não sejam gays virem gays... exceto talvez Kate Winslet". É o único momento da entrevista em que Page ri, e Bolso ri também, sem saber porquê. 

Eu sou otimista e acredito que um fascistóide como Bolsonaro jamais será presidente. Mas ele vai se candidatar em 2018 e terá cerca de 20% dos votos, número não incomum para candidatos de extrema direita em grande parte do mundo. É horrível e preocupante, sem dúvida, que um energúmeno desses tenha tantos seguidores, tanta gente que pense igual. E nada do que ele disser ou fizer vai tirar votos dos mais ignorantes, porque o preconceito fala mais alto. Eles não estão votando num candidato, e sim num modelo de prepotência e estupidez.

Essa gente acredita que a homossexualidade é uma doença contagiosa que se passa pelo ar, pela água, pelos hormônios do frango, ou pela mulher trabalhando fora. 

Ignora que o número de gays, lésbicas e bissexuais é sempre o mesmo (e não se sabe quanto exatamente, entre 2% e 10% de toda a população). O que temos hoje é mais gente que saiu do armário, que assume sua orientação sexual, que não precisa se esconder para conviver em sociedade.

Os eleitores de Bolso são todos iguais. É gente homofóbica, racista, machista, que odeia feministas, que prega a pena de morte, que é contra direitos humanos, que quer uma polícia ainda mais violenta. Essas pessoas existiriam com ou sem Bolsonaro. Graças a ele, elas podem apelidar seu colossal preconceito de "mito".