quinta-feira, 3 de outubro de 2019

A CRUZADA DA GUERRA IDEOLÓGICA DO BOLSONARISMO CONTRA A EDUCAÇÃO

O desmonte da educação é um projeto dos fascistas. O orçamento do MEC para o ano que vem será o mesmo de uma década atrás! 
O orçamento para investimentos e despesas cotidianas (como energia, água, segurança) foram R$ 15,33 bi em 2010. Para 2020, no desgoverno Bolso, serão R$ 15,73 bi (18% menor que em 2019). Compare: em 2014, este mesmo orçamento foi de quase R$ 32 bi. Dessa forma o Brasil foi de 45 universidades públicas em 148 campi, em 2003, para 63 universidades em 321 campi em 2014. O número de universitários matriculados dobrou nos governos petistas (500 mil em 2003 para 932 mil em 2014). E quem acha que a extrema-direita tirará dinheiro das universidades para colocá-lo na educação básica se engana. O apoio à infraestrutura na educação básica terá um corte de 62%. 
Tudo isso equivale a um retrocesso de DEZ ANOS na educação! E aí, vamos deixar? Vamos sair às ruas hoje para protestar! 
João Paulo Jales dos Santos, estudante do curso de Ciências Sociais da UERN e colaborador frequente no blog, explica direitinho o que está acontecendo: 

Das cinco áreas que a presidência escolheu como cruciais, por fazerem parte do que o bolsonarismo considera uma espécie de guerra civil e política, a educação certamente é que tem efeitos imediatos na sensação de cruzada perante uma maior parcela da sociedade. 
Não que a cruzada ultra-ideológica delirante do bolsonarismo com as outras quatro áreas (meio ambiente, cultura, relações exteriores e direitos humanos) não seja nociva à população. Mas pelo fato de a educação ser uma política pública de amplitude universal e de maior sensibilidade de percepção, esta pasta acaba notoriamente sendo a mais visível na cruzada bolsonarista.
Numa sociedade excludente e segregadora como a brasileira, a educação historicamente serviu como um capital cultural para diferenciar socialmente as classes mais abastadas das mais pauperizadas. E essa diferenciação se deu com maior ênfase, ao longo do tempo, na educação pública superior. No Brasil, a elite dirigente deu para a classe média alta uma educação superior totalmente pública sem pagamento de mensalidades, diferentemente do que ocorre em boa parte dos países desenvolvidos e subdesenvolvidos.
Foi na educação superior que a classe média alta fez seu processo de distinção social em relação às parcelas baixas do estrato socioeconômico do país. Numa nação tão desigual como a brasileira, qualquer traço de diferença social já tem enorme impacto em delimitar uma clivagem social.
Poder cursar a universidade pública dá à classe média alta, que nunca foi elite, um suspiro. Será na universidade que seus filhos irão estudar para ter uma formação profissional que irá lhes garantir algum grau de acesso competitivo mais favorável com os filhos da elite. A classe média alta nunca foi contra, e não é, o intelectualismo acadêmico, até mesmo porque esse intelectualismo lhe garante status e capital cultural. O que a classe média alta não vem suportando ao longo dos últimos anos é o intelectualismo vinculado ao pensamento de esquerda. 
Se não é elite, por não deter a propriedade privada dos meios de produção e o poderio político, a classe média alta fez do social e da cultura um modo de delimitar um terreno onde pudesse se fazer presente a partir da influência. A universidade pública é apenas um dos meios dessa distinção sociocultural, um dos maiores, ao lado do poder ideológico, da capacidade de influenciar a opinião pública. 
Mas por que ultimamente a classe média alta vem tecendo ataques à universidade pública? Por uma única razão: porque se vê amedrontada pela entrada dos pobres, da classe trabalhadora e dos negros nas universidades. Ao longo dos treze anos de governo petista, o estrato alto da classe média não viu grandes ganhos econômicos, como experimentaram a elite e as classes baixas. Os rendimentos da classe média alta subiram pouco, e ao ver a elite lucrando juntamente com os pobres, se viu pressionada. Ao ver os pobres e negros entrando nas universidades, a partir da ampliação de matrículas, de criação de universidades públicas em outros locais além dos grandes centros urbanos e da ampliação das cotas sociais e étnico-raciais, a classe média enxergou uma ameaça a sua diferenciação social. 
Numa sociedade desigual e com altos índices de pobreza como a brasileira, a entrada dos pobres na universidade, historicamente excluídos desse ambiente, tem um enorme impacto de possibilidade de mobilidade social. Para a classe média alta o que importa é que essa parcela que entrou nas universidades deixe o campus. Nisso a cruzada do governo Bolsonaro contra as universidades públicas é uma forma eficaz de expulsar os negros e os pobres. Cortar recursos orçamentários é importante porque inviabiliza a expansão universitária. No seu íntimo, a classe média alta quer que a universidade pública seja restrita como era no passado, para manter seu status quo. Ser contra a corrupção, usar de artifícios moralistas e praguejar contra o PT e o comunismo são apenas subterfúgios para o que a classe média quer -- voltar a fazer da universidade pública um espaço só seu. 
A excelência de ensino e pesquisa superior do país se deu nas universidades públicas, com alguns poucos centros de ensino privado conseguindo grau de excelência em ensino-pesquisa. A massificação universitária dos governos petistas veio atrelada a um aumento das matrículas em universidades privadas, onde está a maioria dos universitários, uma massificação que optou por uma lógica mercadológica e consequentemente precarizou ainda mais o ensino superior particular. 
O diploma universitário também é extremamente importante para a classe média baixa, que historicamente nunca foi presença maciça dentro da universidade, mas sempre esteve em larga escala em escolas públicas de ponta e no ensino técnico-profissionalizante. A relação que a classe média baixa tem com a universidade difere daquela da classe média alta. Para a alta, o ambiente universitário importa em sua totalidade; para a baixa, o importante é obter o diploma. O sentimento anti-intelectualista que vem da classe média baixa pode ser mais forte do que o da alta, porque seu vínculo com a universidade não se faz num intuito forte de simbolismo cultural, como é com a classe média alta. É através do diploma que a classe média baixa irá competir, mesmo que em relativa desvantagem, no mercado de trabalho, com a classe média alta. 
Numa situação em que não é pobre para viver em condições precárias, mas muito menos possui uma condição abastada para viver numa situação social parecida com a da classe média alta, a classe média baixa se vê ainda mais espremida na pirâmide social, e para ela a entrada do pobre e do negro na universidade representa uma maior ameaça, quando se compara com o ressentimento nutrido pelo estrato alto da classe média. O anti-intelectualismo vindo da baixa classe média é um ressentimento que está vinculado com sua própria formação social, que difere da classe alta.
O Brasil é uma sociedade extremamente fechada, de pouca mobilidade social e econômica, em que a desigualdade gritante e a pobreza estendida são vistas com bons olhos pelos estratos medianos e altos da sociedade. As estruturas racistas e de ressentimentos classistas fizeram com que espaços sociais fossem criados para servirem de privilegio sociocultural e econômico para determinadas camadas sociais. O ataque empreendido pelo governo Bolsonaro contra a educação pública superior é a representação fidedigna de todo o ódio étnico-racial e de classe que viceja no seio do tecido social brasileiro. Exatamente por isso a maior parte das classes média baixa e alta veem os governos do PT como um retrocesso para o país, porque foi o governo do PT que ainda tentou mexer um pouco nas estruturas racistas e de concentração classista. 
Os pobres e a classe trabalhadora, juntamente com a alta burguesia, foram os mais beneficiários das políticas econômicas e de consumo dos governos do PT. Os excluídos e a classe trabalhadora pauperizada, característica dentro da clivagem dos trabalhadores do Brasil, junto com a classe trabalhadora como um todo, são simpáticos às políticas petistas porque se sentem beneficiados e sabem o impacto que tais políticas trouxeram em suas vidas. Já a classe média baixa, que tem as finanças apertadas, necessitária das políticas do PT, nutre outro tipo de percepção. Mergulhada num reacionarismo contumaz que marca o pensamento dos estratos médios do país, a classe média baixa não reconhece as afirmações sociais e as políticas econômicas da era PT, resvalando para uma direitização que imprime extremismo, entendendo que se avançou alguns degraus na escala social, isso foi devido tão somente a seu esforço individual, característica marcante no ideário neoliberal. É por isso que a classe média baixa é mais fiel ao governo Bolsonaro do que qualquer outro estrato socioeconômico. 
A ampliação das universidades públicas levou ensino superior para o interior do país, principalmente no Nordeste, beneficiando os excluídos da zona rural, permitindo com que uma geração de jovens visse na universidade uma chance de ascensão de mobilidade social. A ampliação da universidade brasileira desconcentrou as universidades dos grandes centros urbanos, também levando campus para os centros populosos médios. As políticas de cotas sociais e as étnico-raciais, beneficiou com que os pobres e filhos da classe trabalhadora tivessem maiores chances de cursar o ensino superior nos grandes centros urbanos, numa realidade social em que a complexidade das zonas metropolitanas é maior do que as cidades médias e interioranas. 
É justamente essa geração que adentrou na universidade com a ajuda da ampliação de matriculas e criação de cursos, aliadas às políticas de cotas, que é a mais afetada pelos cortes das bolsas de graduação e, de sobremodo, de pós-graduação. E o modo ainda um tanto tímido com que essa geração universitária vem se mobilizando contra os cortes na educação superior, é alerta que causa preocupação numa maior massificação de mobilização estudantil para os próximos atos contra o governo. 
Não se faz ciência de ponta cortando orçamento da educação superior. Não se desenvolve um país sem que a economia esteja atrelada a bons índices de educação e desenvolvimento humano. Ao cortar bolsas, instrumento crucial para a permanência das classes baixas dentro da universidade, o bolsonarismo visa expulsar aqueles que na última década mais se favoreceram das políticas de ampliação e permanência universitária, os pobres, os negros e inclusive, a classe média baixa. Ao apoiar um governo que fomenta políticas que vão numa direção oposta de maior possibilidade de ascensão social, a classe média baixa joga contra si mesma, e atesta que o reacionarismo que Marx e Engels teorizaram acerca da pequena e média burguesia encontra total respaldo no Brasil da segunda década do século XXI. 
O perigo nos cortes do orçamento das universidades públicas, onde se produz a ciência do país, é que caso Bolsonaro perca em 2022, e assuma o governo uma direita conservadora centrista, esta direita venha a não se comprometer em aumentar os investimentos em educação superior, mantendo o mesmo orçamento que Bolsonaro entregará ao passar o comando do governo, um orçamento baixíssimo. 
Momentos difíceis para a educação pública superior no Brasil encontram paralelos históricos, mas há uma diferença quando se compara com o atual momento. O governo bolsonarista corta do orçamento da educação universitária num momento histórico de ampliação das universidades e maiores níveis de investimento. O governo não corta o orçamento da educação superior a partir de uma base já baixa de investimento e custeio, como ocorria em momentos anteriores, mas sim a partir de um orçamento alto, por isso o tombo nesse momento histórico é maior.  
E os cortes orçamentários não são apenas em relação à educação superior, mas na educação federal dos institutos federais e nos repasses aos programas nacionais de custeio da educação básica nas instâncias municipais e estaduais. O quadro é de uma enorme calamidade pública na educação, em especial, na de nível superior, porque nesta, o reacionarismo da direita comanda uma cruzada guerreira vista como crucial para expurgar, nos delírios conspiracionistas da direita, o comunismo e a ideologia de gênero (que nem existe), de dentro das universidades. 

6 comentários:

Marina disse...

Discordo da análise feita. A distribuição de escolaridade, com universidades de ponta para a “classe média alta” e educação inferior para a grande massa da população é todinho um projeto da elite. E “ao ver a elite lucrando juntamente com os pobres” a classe média alta resolveu ser contra universidade públicas para todos? Que pobres que lucraram? Acesso à direitos via consumo não é lucra NADA!Tanto q foi td absolutamente destruído em menos de 3 anos. E classe média alta não tem poder político nenhum, não consegue influenciar nada realmente.
Olhem só, a elite precisa de UM POUCO mão de obra altamente qualificada pra tocar os departamentos especializados dos meios de produção e UM TANTO A MAIS de mão de obra técnica menos especializada pra tocar o chão de fábrica, e UM MONTE de gente pra ficar com a corda no pescoço pra constituir o exército industrial de reserva.
O aumento de acesso nas universidades começou a qualificar mais gente tanto pro chão de fábrica, desfazendo o exército industrial de reserva e a colocando mais gente como mão de obra altamente qualificada. Com o aumento de demanda por políticas de investimento público e tbm o alto preço das commodities (entre outras coisas), aumentou tbm a demanda por mão de obra. Tudo isso pressionou pra cima os salários de TODO MUNDO, inclusive da classe média alta. E quem começou a perder com isso foi a própria elite!
Não foi a “classe média alta” q colocou essa estrutura de sociedade, foi a própria elite q distribuiu esses papéis. E é mega conveniente pra essa mesma elite q a gente fique aqui se digladiando enquanto eles estão lá rindo da nossa cara, eles querem que a gente brigue entre nós e manobra todas as classes pra isso mesmo. A maior parte das pessoas de classe média alta está sendo movida por um ódio irracional e nem sabe pq no fundo (óbvio q tem exceções). Vamos parar de fomentar briga entre nós e cair nesse papinho desagregador! Esse mesmo expediente está sendo utilizado com a reforma da previdência e será usado quando da discussão da reforma tributária, fodendo com todo mundo, do pobre ao alto executivo, nos deixando aqui como baratas tontas brigando entre nós. Os únicos q vão estar e ficar bem é a própria burguesia! Vamos ter foco pessoal, e o foco é: PAZ ENTRE NÓS, GUERRA AOS SENHORES.

Anônimo disse...

Bolsonarista passando pano pra ease governo me lembra aquele meme em que tudo pega fogo ao redor mas um cachorro com chapéu continua sentado dizendo "it's fine".

Anônimo disse...

a) Texto nota mil te admiro Lola.

b) Ja me sinto em campanha temos que eleger vereadores em 2020 faço campanha ja escolhi os meus candidatos vou a luta e assim que vamos virar o jogo.

c) Vc esta acompanhando que deputados estaduais conservadores em Sao Paulo querem proibir atletas trans de competir estamos caminhando para a idade media

Anônimo disse...

Eu tô achando ótimo

Anônimo disse...

Quando se busca deselitizar a universidade pública supostamente para tornar mais acessível o acesso as elites com expansionismo e cotas sem mudar a organização social muito desigual, a elite não torna o seu acesso mais fácil, mas sim transfere o treinamento das elites para a universidade privada caríssima. A elite se vingou e atua a lei das consequências não previstas.

O que está acontecendo na universidade pública é o que já aconteceu com os nossos vizinhos. Vc tinha uma universidade pública que formava as elites coloniais espanholas e que quando se popularizaram, as elites foram para as particulares. Se olhar na Argentina, Chile, Peru, México etc a universidade top é a particular e não a pública.

Anônimo disse...

Perfeito comentário.