Tecnicamente falando, “Espíritos” é muito bem feito. Começa com um jovem casal atropelando uma moça, o que arruína a carreira do rapaz, que é fotógrafo (o filme é de 2004, uma época em que, aparentemente, todas as máquinas digitais da Tailândia foram levadas pelo tsunami). Por causa do espírito insistente e metido, as fotos dele passam a sair com fachos de luz cobrindo rostos ou com sombras de caveirinhas. Seria melhor pro Rodrigo Santoro do Oriente procurar uma outra profissão. Já o maridão pensa que, se um gasparzinho persegue a gente, só existe uma profissão adequada – médium. Enfim, eu não me assustei nadinha com a trama, mas não posso falar pelo resto do público, que gritou, esperneou, chorou e pulou nas cadeiras, numa grande sessão pipoca de sábado à noite. Eles gostaram.
Pode ser que o meu desdém se deva ao meu lado cético. Como não acredito em muita coisa, não costumo ter medo de nada, tirando baratas e alguns filmes de terror (não este). Eu não só não consigo ver espíritos no meu dia a dia (o morto-vivo do maridão conta?), como não consigo ver espíritos nem em fotos. Eles precisam ser muito bem circulados com caneta vermelha pra que eu os note. Mas, apesar de não crer em fantasminhas, acho que somos muito poderosos. Como disse pro maridão: “Se a gente forçar bem a mente, dá pra ver o que quiser”. Ao que ele respondeu: “Ah é? Eu queria ver ‘Cabaret’, mas não encontro nas locadoras”.
Pois bem, o que “Espíritos” tem de vagamente original é que o protagonista não é um santo. Pelo contrário: o que ele faz no início – ordenar à namorada que fuja depois do acidente – é fichinha perto do que a gente descobre sobre ele no final. O Rodrigo é um pulha. As outras cenas são as de praxe. Assim: numa ocasião o espírito puxa o lençol do Rodrigo, começa a subir na cama dele, e some. E o que faz o Rodrigo? Procura embaixo da cama, lógico. Cá pra mim, acho que qualquer jumento que olha embaixo da cama depois que um espírito lhe tira o lençol merece mesmo ter um pluft pra puxar sua perna. Há mais ocorrências perturbadoras. Por exemplo, a moça vê uma sombra passando do outro lado da porta. Chama e ninguém responde. De repente a maçaneta da porta treme freneticamente. O que qualquer pessoa minimamente sã faria? Correria pra bem longe daquela porta, bidu. O que faz um personagem em filme de terror? Abre a porta! E entra num quartinho escuro... Ah, e não entendi um negócio. Vamos supor que haja um estuprador e uma vítima, e o estuprador peça pra que alguém fotografe a vítima sendo estuprada pra que ela não conte a ninguém. Ahn, ou eu perdi algum pedaço, ou a Tailândia não é um bom lugar pras mulheres.
Mas nenhuma cena gerou uma reação tão histérica da platéia quanto esta. Senhora em close chorando. Bem em close mesmo. Meleca começa a pingar do seu nariz. Público faz “Ahhh!”. Muié põe as fotos bem lá, entre sua boca e o nariz. Público vai ao delírio. Depois disso aquelas fotos devem ter recebido mais alguns espiritinhos.
Um comentário:
Só um detalhe: fotografos profissionais não costuma(va)m usar máquinas digitais, por causa da qualidade da resolução das fotos (nitidez, et cétera).
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