segunda-feira, 29 de novembro de 2004

CRÍTICA: COMO SE FOSSE A PRIMEIRA VEZ / Nem a primeira nem a última vez

O título “Como se Fosse a Primeira Vez” é, como o pessoal adora dizer, emblemático. Porque certamente não é a primeira vez que um personagem esquece tudo no dia seguinte (vide o magnífico “Amnésia”). Nem é novidade um sujeito ter que conquistar a mocinha todo santo dia – lembra de “Feitiço do Tempo”? E agora a pouco, se não me engano, não colocaram o Ben Affleck como o desmemoriado da vez? Esse eu esqueci, graças a minha memória seletiva. Então, o grau de ineditismo é próximo a zero em “Como se Fosse”. Mas admito que a comédia não é tão medonha como o currículo do diretor Peter Segal (de, pasme, “Professor Aloprado 2”) pode fazer crer.

Permita-me um micro-resumo: o Adam Sandler é um veterinário no Havaí que se apaixona pela Drew Barrymore, cujo único defeito é ter tido traumatismo craniano e assim se olvidar das coisas mais recentes ao acordar. O casal é bonitinho daquela maneira “Goste de mim sem medo porque sou um americano bobalhão”. Bom, eu adoro a Drew desde “ET”. Já não sou tão receptiva com o Adam. Quero dizer, eu realmente conheço alguém que ache “O Paizão” a maior comédia de todos os tempos, mas digamos que seu estilo de humor não faz meu tipo. “Como se Fosse” melhora com o tempo, até porque piorar é impossível, visto que ele começa com uma morsa (um tipo de peixe-boi?) vomitando numa mulher. Há até uma cena bem hilária, tão hilária que eu ri em todas as 128 vezes que vi o trailer. É quando o Adam arma pra apanhar de um amigo, e a Drew desce do carro e espanca o sujeito. A cena do pingüim sendo atropelado é horrorizante demais pra ser engraçada. Porém, de modo geral, algo que tenta fazer rir do Sean Astin mexendo os músculos (não era ele quem fazia par romântico com o Frodo?) não é legal. Sem falar que o filme é pra lá de misógino. Pense em quem leva a pior. Pelos meus cálculos, sobra pra três personagens: a mulher-macho, a esposa havaiana obesa, e a turista ninfomaníaca – que, aliás, não tem nada de tarada. Ela só quer transar na sua última noite de férias, ué. Mas, em comparação com a santa Drew, ela é uma devoradora de homens. O que me leva ao moralismo americano, tão patente no filme. Como a Drew é uma boa moça, ela jamais poderia ir pra cama no primeiro encontro. Sexo só é liberado depois de uns cinco meses, quando Drew e Adam já estão praticamente noivos e o pai aprovou o namoro. Sendo que, comigo, pra me conquistar todos os dias, bastaria me dar chocolate. Ah, uma outra coisinha: eu sabia que a família não ia ficar enganando a Drew por muito tempo porque, se continuasse assim, nossa heroína usaria uma única camiseta durante toda a película. E imagina se a Drew não vai aproveitar uma hora e meia de projeção pra desfilar logo umas duas coleções primavera-verão?

Claro, pode ser que eu esteja redondamente enganada quanto à falta de graça do negócio – redondamente não, que isso faz alusão a minha forma física. Vários espectadores ao meu redor quase molharam as calças de tanto rir. Uma garota soltava um “Iiiiiiiih!” toda vez que aparecia um animal fazendo gracinha. E um cara gargalhava em todos os chistes, principalmente aqueles envolvendo o tamanho do pênis da morsa. Mas pode ser que eles, tal qual um coadjuvante do filme, também tivessem perda de memória recente a cada dez segundos. E se esqueciam que aquela piada já tinha sido feita. Inúmeras vezes, inclusive. E sem sucesso.

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