domingo, 28 de novembro de 2004

CRÍTICA: O EXORCISTA, O INÍCIO / Belo dia prum exorcismo

Preparei a água-benta e lá fui eu, munida de crucifixos, enfrentar “O Exorcista – O Início”, o quarto da série. Na realidade, a história deste se passa antes do filme original. Lembra do Padre Merrin? Então, em 1949 ele ainda não era o Max Von Sydow, mas um outro sueco, o Stellan Skarsgard (de “Dogville” e “Gênio Indomável”), chamado pra investigar uma igreja enterrada na África. O padre loiro tem dúvidas sobre sua fé por ter sobrevivido a uma subtrama interessante à la “Escolha de Sofia”. Mas, após conhecer a igreja mal-assombrada, um menininho nativo, uma médica sexy, e, claro, Belzebu em forma de gente, ele nunca mais terá dúvidas que o Senhor é meu pastor e nada me faltará. Pois é, tinha ouvido horrores deste “Ex”. Pra começar, a produção teve um set de filmagens amaldiçoado. Primeiro o diretor John Frankenheimer foi substituído pelo Paul Schrader (de “A Marca da Pantera”), que entregou uma película inteirinha rejeitada pelos produtores (imagino que a gente vá poder vê-la nos extras do DVD). O terceiro diretor a ser convocado foi o Renny Harlin, de “Duro de Matar 2” (mais conhecido por ser ex da Geena Davis), que gastou mais 40 milhões de dólares pra refazer o negócio. Mas não achei este “Exorcista” tão fim-da-picada como andam falando. Mesmo sem assustar, tem cenas de impacto como a do começo, do campo de guerra cheio de cadáveres. E tem um clima razoável, até que a maionese desanda na parte final.

Pode ser que eu seja excomungada depois desta confissão, mas a verdade é que cada vez que revejo o clássico de 73, mais eu penso: clássico? No quesito anti-Cristo, prefiro “O Bebê de Rosemary” e “A Profecia”. Toda essa franquia exorcisante é muito moralista. No original, a Linda Blair tava possuída pela puberdade mais que pelo Coisa Ruim em si. Esta versão mantém o mesmo terror à sexualidade. Tem até uma cena de menstruação pra nos lembrar onde reside o verdadeiro mal. Olha, se me disserem que vermes e moscas são coisas do demo, eu nem discuto. Agora, sexo? Sexo aqui é o pior dos pecados, usado pra atentar contra a castidade de um padre, tadinho. Um dos problemas deste “Ex” é que a gente sabe que todo mundo pode estar possesso, menos o padre. Neste a gente pode confiar. E a gente também sabe que ele vai comer o pão que o diabo amassou, por assim dizer, mas que vai sobreviver pra, décadas mais tarde, exorcisar a menininha que vomita sopa de ervilha. Cadê o suspense?

Satanás não parece ter muito que fazer além de virar crucifixos de cabeça pra baixo, e o padre logo opta pelo óbvio: existe horário mais adequado pra abrir covas e visitar igrejas abandonadas que no meio da noite? E sozinho? Minha cena constrangedora favorita é quando um personagem aliviado segura um crucifixo e a câmera dá o close de outro personagem sorrindo. E tem também a inacreditável seqüência das hienas geradas por computador. Acho que meu Corel-Draw faria melhor. Mas o filme é até anti-colonialista, no alto estilo hollywoodiano. Ou seja, critica-se a presença de tropas estrangeiras, mas todos os nativos falam inglês fluente. Não importa que em Moscou 2004 nenhuma alma fale inglês. Pra Hollywood, é só chegar num lugarejo da África na década de 40 que todo mundo vai ser fluente. O que me leva à minha cena constrangedora número três. Seguinte: se você algum dia precisar de um assistente pra sua sessão de exorcismo, não se aperreie. Qualquer um serve. Até um personagem que mal sabe ler, cuja primeira língua não seja o inglês, vai prestar um bom serviço – isso tendo que ler andando num lugar pra lá de escuro. Afinal, quando o mal está à solta, todo dia é um belo dia prum exorcismo.

Nenhum comentário: