"EU NÃO GOSTAVA DO PT, AGORA VOTO DILMA"

Relato lindão e comovente da Lara:

Em primeiro lugar, parabéns pelo blog! Já tem uns anos que leio sempre, admiro sua coragem, inteligência e perspicácia nos argumentos. Maravilhoso, mil vezes parabéns! Precisamos de pessoas como você no mundo!

Escrevo esse texto para compartilhar algo muito interessante que vi acontecer bem de pertinho. Fui criada em Porto Alegre, minha mãe é militante do PT, e a política sempre esteve muito presente em minha vida. De outro lado, separado da minha mãe, tenho um pai militar e ele sempre foi muito tolerante e “mente aberta”, dentro do possível e aceitável para um militar, claro. Desde cedo eu entrava em debates acalorados nas escolas em que estudei e entre elas estava o colégio militar. Sempre tive os dois lados bem equilibrados, por assim dizer...

Minha namorada é de uma cidade pequena aqui do interior do Rio Grande do Sul que tem muita ligação com a pecuária, o latifúndio, o agronegócio. Foi criada em uma família bem tradicional, comerciantes da cidade. Seus pais nunca foram contra nenhum político, eram tranquilos quanto ao assunto. Votavam nos candidatos que conheciam, com quem tinham algum contato e que favorecessem sua atividade comercial. 

A única coisa que nunca fizeram foi votar no PT. Era como se fosse uma regra implícita naquela cidade, não votar no PT. A presença do Movimento dos Sem Terra naquela região, que invadiu as terras de uns grandões lá, criou um ódio ainda maior.

Minha namorada passou a conviver muito comigo e com minha mãe e nos via falar de política, de programas sociais, de políticas públicas, de direitos humanos, enfim. Ela só ouvia e não falava muito. Aos poucos, foi chegando a hora da campanha. Eu dizia pra ela lá no início do ano que a gente provavelmente teria posições políticas diferentes, mas que não deveríamos deixar isso atrapalhar nossa relação. E ela sempre me dizia que nunca teve nada contra o PT, nem ela nem a família, mesmo a maioria da cidade tendo. Minha mãe brincava com ela pedindo o voto para candidatos a deputado estadual e federal, e ela ria. Depois de um tempo começou a dizer que ia votar nos candidatos e que seria a primeira vez que votaria no PT.

Ela começou a acompanhar a campanha, a ver os acontecimentos, os debates, os programas, a comparar. Minha mãe trabalha na Secretaria de Políticas para as Mulheres e sempre chegava em casa falando que inaugurou uma delegacia especial da mulher, a casa da mulher, a patrulha Maria da Penha, a capacitação de mulheres para a construção civil, a formação de árbitras de futebol, entre tantos outros projetos. 

Comentávamos sobre a importância do Bolsa Família para a dignidade de pessoas que não tinham um prato de comida e que agora, com uma ajudinha, podem se alimentar e, sim, trabalhar. Que ninguém pode viver somente com a ajuda do Bolsa Família, é pouco dinheiro! De que o Brasil não é ruim por fazer isso, países ultra desenvolvidos proporcionam esse tipo de subsídio, inclusive muito maior e que, de fato, sustentam aqueles que não trabalham (pelo motivo que for). O ProUni, o Pronatec, o Ciência sem Fronteiras, a necessidade das cotas para a inclusão dos negros no ensino superior...

Minha namorada mora em Porto Alegre e foi até sua cidade para votar no primeiro turno. Não só votou como ainda conseguiu angariar alguns votos dentro da família, para um ou outro candidato do PT. Chegou de volta e ficou muito abalada quando viu que o Olívio Dutra não tinha sido eleito para o Senado, quem se elegeu aqui no RS foi o Lasier Martins, um jornalista bancado pela Globo, completamente despolitizado, preconceituoso, fraco mesmo. Tarso Genro, nosso candidato a governador daqui, também acabou ficando em segundo lugar, o que não se esperava. Mas minha namorada não precisava ter se abalado tanto! Mal dormiu naquela noite.

Eleitor tucano tuita isso ontem
durante debate da Globo. Não
entendem que violência contra
mulher não é piada

Segundo turno. Começa a disputa, o cinismo, o ódio... e agora ela tem ainda mais certeza das escolhas que fez no primeiro turno! Ela começa a ver as pessoas de sua cidade no seu Facebook e fica triste, se sente distante delas. Não entende como as pessoas não enxergam as coisas boas acontecerem, como pode as pessoas não quererem que as outras melhorem de vida? Que todos possam viajar de avião, frequentar a universidade? Quanto egoísmo! Como esses médicos almofadinhas não veem a importância da presença de mais médicos no interior do país, onde eles não querem se enfiar? 

Por que um gay vai votar no Aécio se os maiores homofóbicos do país o apoiam? Como pode uma mulher fazer piada com o mal-estar da Dilma no debate, relacionando isso com a Lei Maria da Penha, sendo que essa lei é feita para proteger justamente as mulheres? E até a invasão do MST lá na cidade dela minha namorada questionou. Disse que o cara era um baita latifundiário e que aquelas terras estavam lá paradas sem produzir e sem pagar imposto há muuuuuito tempo. Que ele merecia.

Ela fica triste com tudo isso, chocada, mas ao mesmo tempo mais decidida. E, de repente, sem precisar fazer isso, de coração, ela para e explica pras pessoas que perguntam ou para as pessoas que chegam com esse discurso de ódio típico dos eleitores do Aécio, o porquê de sua escolha.

Em meio a esse turbilhão ela vem e me pergunta: “Será que estamos certas, já que a maioria pensa diferente?” E eu digo pra ela: “Se você fez uma escolha consciente, entendeu do que se trata o projeto no qual está votando, se isso tudo faz sentido pra você, então, sim, você sempre estará certa!” E ela diz: “Verdade! Não tem jeito, nós sempre seremos minoria, né?”. Se considerarmos que somos um casal de mulheres, sim, somos minoria e este é mais um motivo para não nos calarmos, para não tomarmos decisões sem pensar, deixando-nos levar pela “maioria”.

Estou muito feliz e orgulhosa dela não só porque ela vai votar na Dilma (isso é ótimo, claro), mas por ela ter despertado para a política, por se questionar e repensar seus paradigmas!