Ai, ai. Só mesmo com muito boa vontade pra se gostar de “Deus é Brasileiro”, que, como você pode adivinhar, é um filme daqui da terrinha. Se fosse americano, provavelmente se chamaria “O Diabo é Iraquiano”. Mas boa vontade é o que os críticos profissionais têm de sobra. Como se trata de uma produção de grife, com bom elenco e assinatura de Cacá Diegues, esta tolice absolutamente inútil ganha tratamento privilegiado. Se não fosse do Cacá, os críticos estariam malhando sem dó. Como é, o filminho é alçado a retrato poético do Brasil, road movie lírico, essas coisas. O trailer já prometia que “Deus é Brasileiro” seria terrivelmente ruim, mas eu tinha de ver pra crer. E vi, e é. Sabe todas aquelas piadinhas sobre o Todo-Poderoso que apareciam em “Alguém Lá em Cima Gosta de Mim” (aquela baboseira de 77 com o George Burns e, pasme, o John Denver)? Estão todas reprisadas na película do Cacá. Justiça seja feita que fazer uma comédia sobre Deus na terra é um tema pra lá de complicado. Um drama existencial tudo bem, nosso Senhor se perguntando aonde foi que errou, mas uma comédia? É que a gente não associa Deus e religião com humor. Associa com morte, com sofrimento, sacrifício, salvação. Logo, os chistes sobre Deus aqui embaixo são sempre os mesmos: alguém louvando ou chamando o Barbudão e Ele sentindo-se feliz com os elogios ou respondendo “chamou?”. É tudo lugar-comum. Em “Deus é Brasileiro”, dá a impressão que o pessoal resolveu juntar todos os clichês possíveis e imagináveis sobre o Todo-Poderoso e costurar um roteiro. Imagina a cena: opa, põe aí Deus criticando suas criaturas por visualizarem Jesus com um visual americano, loiro de olhos azuis (apesar de Deus no filme continuar tendo barba e sendo homem e branco); ô, não dá pra esquecer de mostrar Deus reclamando da gente clamar por Ele o tempo todo, viu?
O ponto de partida da trama já é um clichezão – Deus desce pra encontrar um santo pra pôr em seu lugar e poder tirar férias. Isso se baseia num conto de João Ubaldo Ribeiro, “O Santo que não Acreditava em Deus”. Pior que ser ateu, o candidato a santo é gago. No caminho, o Todo-Poderoso, que só podia ser o Antonio Fagundes (se ainda fosse o Thiago Lacerda), conhece um carinha muito do chato interpretado pelo Wagner Moura, e uma moça que o segue feito cachorrinho abandonado, a Paloma Duarte. Não há exatamente uma história, há vários esquetes sem a mínima amarração. As piadinhas vão competindo entre si pra ver qual fica com o troféu de pior diálogo. Personagens somem e aparecem sem explicação. E os críticos fingem que acham tudo uma gracinha só porque o filme é do Cacá?!
Eu também tenho grande reverência pelo sujeito que fez o belo “Bye Bye Brasil” e obras menores mas interessantes como “Xica da Silva” e “Joanna Francesa”. Só que, pelo que eu me lembre, isso foi na década de 70, foi não? A última boa ação do Cacá foi “Dias Melhores Virão” que, embora não fosse nenhuma obra-prima, era uma homenagem simpática à dublagem. Depois vieram “Tieta” (que não era ruim, mas a novela era bem superior) e a chegada ao fundo do poço com “Orfeu” e este agora. Se bem que a culpa por este desastre não tá na direção, tá no roteiro. Pode até ser que um bom roteiro não garanta um bom filme, mas estou me convencendo que um mau roteiro garante um mau filme. E o roteiro de “Deus” é péssimo.
Existe a possibilidade, lógico, que eu esteja redondamente enganada e que o filme seja hilariante. Um casal de velhinhos na minha frente, por exemplo, ria de todas as falas. Alguém dizia “Valha-me Deus!” na tela e os velhinhos se acabavam. Eram os únicos do cinema, mas sei lá, de repente, mil coisas. O que mais me chateou não foi que Deus é pintado de rabugento e torturador. É que Ele é poluidor – queima uma árvore, joga um caderno no rio... Aliás, quase todos os personagens jogam papéis no chão. Não entendi se isso é proposital. Só entendi que, pra se aturar “Deus é Brasileiro”, só com reza braba.
Nenhum comentário:
Postar um comentário