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domingo, 20 de abril de 2014

GUEST POST: CRÍTICA DE HOJE EU QUERO VOLTAR SOZINHO

Vitor tem 21 anos, mora em MG, é graduando em Publicidade e Propaganda, e trabalha em uma agência como redator e social media, além de ser colaborador do blog Weird Fishes, onde escreve sobre o cenário da cultura pop e underground de Belo Horizonte. 
Ele me enviou esta crítica sobre um filme que ainda não vi, Hoje Eu Quero Voltar Sozinho (trailer aqui), baseado no curta que eu (e um montão de gente) vi e recomendo

Hoje eu quero voltar sozinho, que venceu o prêmio da crítica no Festival de Berlim, estreou recentemente em 140 salas de todo o Brasil. 
O longa é um encontro com a tolerância e a descoberta de uma realidade muito próxima a de qualquer um de nós. A história de Leonardo, um adolescente cego que busca pelo seu lugar e descobre sentimentos até então desconhecidos, é a representação de uma fase importantíssima na vida dos jovens, hoje despercebida devido à crença de que a felicidade é um direito e não uma consequência.
A narrativa retratada atualmente nos cinemas está na cabeça das pessoas desde 2010, quando Daniel Ribeiro, já premiado em Berlim pelo curta Café com Leite, resolveu fazer um curta-metragem, devido à dificuldade em financiar um longa, apresentando os seus personagens e contando a história de Eu não quero voltar sozinho, que somou mais de 3 milhões de visualizações no Youtube. A popularidade da história na rede social não é por acaso. 
Ainda que o tema retratado pelo curta fosse categorizado, na época, como representativo para a “minoria”, a internet já contava com mais de 1,97 bilhões de usuários no mundo, sendo 204,7 milhões só na América Latina.
Diferente do curta, o longa não trata apenas da descoberta e construção da sexualidade, mas também de desbravar as relações com a família e com o mundo. De maneira profunda e carismática, nossas certezas e expectativas se misturam com as dos personagens Leonardo (Guilherme Lobo), Giovana (Tess Amorim) e Gabriel (Fabio Audi), que permeiam o roteiro como um reflexo de todos nós, tornando o discurso real e palpável, de maneira que se torna essencial tal experimentação para qualquer idade.
Com mais tempo e recurso, era evidente que seria necessário explorar com a mesma sensibilidade presente no curta, todas as nuances que envolvem a sexualidade dos jovens e as dificuldades de uma pessoa cega na luta pela sua independência. E isso, apesar de um detalhe ou outro, é feito. 
Com uma pegada leve, o longa trata sobre bullying e homossexualidade de maneira atual e sem exageros, fazendo com que o telespectador, sem forçar a barra, reflita sobre o seu posicionamento perante as mudanças da própria sociedade.
É através das expressões com intensidade entre Leonardo e Gabriel, que descobrimos que é preciso coragem para ultrapassar a barreira do cinema em busca de uma realidade com mais compreensão, liberdade e amor. Ao olhar atentamente para as pessoas presentes na sala de cinema, percebo o espanto, a felicidade e a aceitação gerados pelo amadurecimento do curta para o longa – não apenas no roteiro e nos personagens – é algo muito mais particular.
Depois do êxtase, quando as luzes se acendem, o contato com o mundo mudou. Percebemos que somos pouco diferentes de Leonardo, que com olhos repletos de curiosidade, soube dar novas cores a um mundo tão cinzento.

domingo, 25 de setembro de 2011

TOMARA QUE ENTRE

Já tomamos o Brasil, agora queremos tomar o mundo

Tropa de Elite 2 foi escolhido para representar o Brasil no Oscar do ano que vem. Isso não significa grande coisa: cada país submete apenas uma produção para concorrer a Melhor Filme Estrangeiro, e depois uma comissão da Academia seleciona cinco candidatos entre vários países. Infelizmente, o Brasil não entra na dança desde 1999, quando Central do Brasil concorreu. Quase entrou com O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias, mas não. E enquanto a gente não consegue nem ser pré-selecionado, nossos hermanos e maiores rivais já colecionam duas estatuetas de Filme Estrangeiro (A História Oficial, em 1985, e O Segredo dos seus Olhos, ano passado).
Não há dúvida que Tropa de Elite 2 era o melhor que o comitê brasileiro podia escolher. Se tivesse preferido o concorrente famoso, Bruna Surfistinha, ficaria de fora da seleção do Oscar com certeza absoluta. Não sei se Tropa 2 faz o perfil da Academia. Na categoria de Estrangeiro, é impressionante o número de produções que tenham crianças como protagonistas, ou que se passem em tempos de guerra. Tramas violentas demais, no entanto, costumam ser renegadas. Mas acho que o que pesa mais contra Tropa 2 é o 2 do título. Por mais que ele seja superior ao primeiro Tropa (que representa uma visão meio fascista, impossível de agradar aos membros da Academia, mais liberais), não é comum que concorram sequências. Torço para estar enganada, até porque gosto muito de Tropa 2 (e do 1 também). Uma mera indicação faria com que ele fosse mais visto no cenário internacional (por enquanto, os dois Tropas ― embora um sucesso absoluto por aqui ― não engataram em outros países). O Oscar, goste-se ou não dele, continua sendo uma grande vitrine.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

CRÍTICA: ASSALTO AO BANCO CENTRAL / O que acontece fora interessa mais

Fiscal da dengue interrompe escavação

Permitam-me ser honesta como sempre. Antes de ir ver Assalto ao Banco Central (mas bem depois de decidir que queria ver o filme), fiquei sabendo, via Twitter, da polêmica envolvendo a produtora e o crítico de cinema Pablo Villaça. Não é nada tão gigantesco, então imagino que tenha um monte de gente que não sabe. Vou contar o que entendi. Pablo, que é crítico profissional com um bom tempo de estrada e muitos leitores, não gostou de Assalto (leiam sua crítica aqui; concordo com algumas coisas — é realmente absurdo o retrato do Lima Duarte no escri, ou “Banco Central” escrito em letras garrafais na tela do computador do banco —, discordo de outras). A produtora de elenco não gostou da crítica de Pablo e escreveu um tweet que parece muito preconceituoso, dizendo que Pablo (que é mineiro) tem cara de cearense. Seria melhor ter ficado quieta, né? Até porque parte do filme foi rodado aqui em Fortaleza. E o que seria cara de cearense? Eu também tenho?
Mas desconfio por que a produtora (que é também a mulher do diretor Marcos Paulo) ficou furiosa com Pablo. Ele exagera em dizer que a aparição de um minuto da também atriz (ela faz a namorada da detetive feita pela Giulia Gam) é caricatural. Sua presença na tela é tão breve e pouco importante que acho injusto pegá-la pra Cristo. Lógico que sua personagem não acrescenta nada pra trama, mas aí a culpa não é da atriz, é do roteiro.
Meu problema com o filme é que não entendi seu propósito. É só entretenimento? Porque, se for, ele não faz rir (na sessão em que eu estava, houve alguns poucos risos baseados unicamente no personagem gay interpretado por Vinicius de Oliveira), não comove, não faz perder o fôlego nas cenas de ação ou de sexo. Li no site deles que o filme é uma obra de ficção. Deve ser, porque eu saí do cinema sabendo menos sobre o assalto ocorrido em Fortaleza do que quando entrei. E, pô, eu fui pra me informar mais sobre a história do maior assalto a banco no Brasil!
Tudo bem, não esperava um documentário. Mas queria conhecer melhor os participantes, suas conexões, o que aconteceu com eles, talvez suas motivações. E também queria saber um pouco mais sobre o local em que o assalto aconteceu. Infelizmente, o filme mostra tão pouco de Fortaleza que poderia ter sido filmado em qualquer lugar. Não deu nem pra saber aonde fica o tal banco.
Eu morava em Santa Catarina na época do assalto, em agosto de 2005. Foi um crime espetacular e muito noticiado pela mídia: um túnel imenso cavado por baixo do banco, e quase 165 milhões de reais roubados. Obviamente envolvia uma grande quadrilha, sem lugar pro amadorismo. Mas meu interesse maior ao longo desses seis anos foi constatar aquele velho clichê de que o crime não compensa. Toda notícia que saía no jornal era de um integrante preso, morto, ou sequestrado, quase sempre extorquido por policiais e outros bandidos. Sei que pouco dinheiro foi recuperado (cerca de 20 milhões em dinheiro e mais outros 20 em bens).
Quase nada disso aparece no filme. Tá, mas se não vão mostrar o planejamento ou a execução do crime, pelo menos vão mostrar o que cada participante faz com o dinheiro, certo? Ahn, não. E olha que essas partes costumam ser minhas fantasias preferidas. Você cometeu um crime e/ou precisa sumir da face da Terra. O que fazer? Praonde ir, pruma cidadezinha no fim do mundo ou pruma metrópole bem distante? Como mudar o nome? Como lavar o dinheiro? Tem como depositá-lo num banco suíço? Eu e o maridão conversamos sobre o assunto após a sessão e constatamos que não levamos o menor jeito pra coisa. Não temos qualquer inteligência criminal. Mas juro que o papo foi mais interessante que o filme.
Desculpe, o elenco tá bem, o filme até tem um ritmo decente, pelo jeito a bilheteria tá indo de vento em popa, e eu sempre torço pro cinema brasileiro dar certo. Mas achei Assalto muito decepcionante. E mais não tenho vontade de falar sobre ele.
Pronto. Se alguém quiser me achar com cara de cearense, já vou avisando que adoro esta cidade e este Estado que escolhi pra morar desde o ano passado. Mas sou tão cearense quanto fui americana durante o ano em que vivi nos EUA.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

CRÍTICA: TROPA DE ELITE 2 / Pede pra sair, reaça!

Capitão Nascimento antes de perder as ilusões.

Momentos de emoção! Primeira vez que volto ao cinema após ver A Origem! Essa ausência se deve ao trabalho insano e também à falta de grandes atrações nas telonas. Mas muit@s leitor@s exigiram minha crítica sobre a produção mais polêmica da temporada, e aqui estou eu: a última pessoa a falar de Tropa de Elite 2.
Antes preciso tratar um tiquinho do filme de 2007, até pra lembrar dele. Vi o fenômeno no computador, pois eu vivia nos EUA quando todo mundo passou a falar do troço. E gostei muito. Tem um ritmo excelente, boas interpretações, diálogos que viraram moda. Mas nem por isso deixei de achar o tema fascista. Ele glorifica um grupo policial, o BOPE (Batalhão de Operações Especiais), tão incorruptível quanto justiceiro, que não tem problema algum em sair matando criminosos sem julgamento. E, numa cena chave, espanca um usuário de drogas da zona sul que vai à favela comprar maconha. Defender tortura e execuções sumárias e tirar sarro da defesa de direitos humanos são, sim, ideias fascistas, e perigosas. Mas é perfeitamente possível condenar a mensagem e gostar do mensageiro, não? Por exemplo, um dos clássicos do cinema que eu mais amo é Laranja Mecânica ― que me lembra Tropa porque alguns ex-membros da gangue do protagonista viram policiais (violentíssimos, lógico). Mas o tema de Laranja é pra lá de duvidoso.
Bom, certamente Tropa 2 é muito mais complexo que Tropa 1. Logo na primeira sequência eu já fiquei apreensiva com o tratamento que seria dado aos “intelectuaizinhos de esquerda”. Quem narra é o herói, Capitão Nascimento (Wagner Moura), que, após dez anos de trabalho árduo, continua comandando o BOPE. Diante de uma rebelião de presos em Bangu I, tudo que o capitão gostaria seria deixar que todos os presos se trucidassem entre si, ou autorizar a entrada de sua tropa pra dar sua ajudinha no genocídio. Mas ele reclama que não pode fazer isso por causa de Fraga (Irandhir Santos), um professor de História e ativista de direitos humanos. E a montagem vai intercalando a violência dentro do presídio com uma palestra de Fraga (em que ele faz uma conta absurda provando como, em 2080, todos os brasileiros estarão na cadeia) com a narração condenatória do capitão, que odeia tanto os bandidos quanto os ativistas que defendem direitos humanos para esses bandidos. A pessoa chamada para interceder e evitar que Bangu I se transforme num novo Carandiru é Fraga, e aí eu pensei: ihhh, o filme vai deixá-lo mais ridículo ainda ― ou ele vai se corromper ou se borrar de medo. E não, nada disso acontece. Pelo contrário: Fraga é corajoso, sabe negociar, entra na linha de fogo, recusa colete de balas, não titubeia um momento sequer. Quando tudo dá errado e um policial do BOPE atira no presidiário, Fraga dá entrevistas às redes de TV e faz uma pergunta importante: a gente quer uma polícia que tenha a caveira como símbolo? O capitão critica a exploração da camiseta em inglês do Human Rights Watch manchada de sangue, mas quer saber? É Fraga o herói do filme. Ele não vai embora. Ele se casou com a ex-mulher do capitão e agora cria seu filho. Até o final, não vai haver um só fato que o desabonará ― ele se elege deputado estadual, depois federal, chefia CPI, bate de frente com a corrupção, colabora com a imprensa, é ético e idealista (parece que o personagem foi baseado no deputado estadual pelo PSOL do Rio, Marcelo Freixo).
Enquanto isso, o capitão é apresentado como um homem amargurado, solitário, cheio de dúvidas, que na maior parte das vezes não sabe o que está acontecendo. O filme mostra o seu aprendizado. O seu adeus às ilusões. E, claro, não às ilusões da esquerda, personificadas por Fraga, mas às ilusões de direita. Depois do massacre em Bangu I, o capitão é aplaudido de pé ao entrar num restaurante de luxo, o que responde à pergunta sobre o tipo de polícia que queremos. Ele é promovido a subsecretário da segurança e tirado das ruas para servir à inteligência (espionagem). Com a sua força, o BOPE invade favelas e mata um monte de traficantes. E então, o Rio se transforma num paraíso? Não. O sistema é corrupto e tem a manha de se reinventar. Quem toma o poder nos morros é a milícia. Favelado deixa de ser explorado pelo traficante pra ser explorado por uma máfia composta de policiais e políticos. O capitão assiste a tudo, impotente.
E o vilão no filme pode ser o sistema, como repete um de seus dois heróis, o capitão. Mas o vilão também tem rosto, mais especificamente duas caras: o apresentador de programa sensacionalista que vira deputado, e o policial chefe da milícia. Pra mim, a cena mais apavorante é uma em que o poderoso chefão anda de revólver em punho, discursando e dançando, tudo segurando uma arma.
Tropa 2 tem um certo fascínio pela violência explícita, mas até aí, qual filme não tem? Um momento fascistóide que deve provocar grande prazer ao espectador é quando o capitão organiza uma blitz para parar um deputado, o arranca do carro e o espanca até nocauteá-lo. Vi a produção num cinema vazio, mas suponho que, num fim de semana, esta cena deve causar uivos na plateia. Ao mesmo tempo, o filme é até anticlimático por não punir certos personagens como gostaríamos. Não vemos diretamente o que ocorre com os vilões. Eles nem sofrem!
Tropa 2 é ótimo pra constatar qual a ideologia de cada um. Quem é de direita vai odiar Fraga porque odeia defensor de direitos humanos e, consequentemente, poderá detestar o filme que faz dele um herói. Um comentarista do tio Rei, que é quem melhor representa a direita no nosso país hoje, com suas ideias Tradição, Família e Propriedade, sem tirar nem por, disse que saiu do primeiro Tropa louco pra encontrar uma passeata pela paz pra dar porrada, mas desta vez se decepcionou (tio Rei detestou Tropa de Elite 2, e afirmou que o Capitão Nascimento só faltou se filiar ao PSOL). Normal: a direita acredita que a criminalidade é causada unicamente por escolhas individuais, não por problemas sociais, que bandido bom é bandido morto, que polícia deve atirar primeiro e perguntar depois, que vale tudo pra proteger a propriedade, e que maconheiro também merece apanhar, pra deixar de ser bicho-grilo com camiseta do Che. Isso tudo foi louvado em Tropa 1. Mas desapareceu de Tropa 2.
Como diz o slogan do filme, “o inimigo agora é outro”. São vocês, reaças.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

CRÍTICA: LULA, O FILHO DO BRASIL / Sem olhos vermelhos. Nos dois sentidos

Ao contrário do Lula real, este não empolga.

É possível que um filme sobre um político seja apolítico? Ô, se é. Lula, o Filho do Brasil serve como prova cabal disso. O problema é que eu queria um filme político.
Em geral, não sou grande admiradora de cinebiografias. Mas nem sei até que ponto Filho é um biopic. Afinal, que espécie de biografia é essa que basicamente omite o maior momento de do biografado? Sabe, é meio como mostrar a trajetória do Cazuza, e deixar de fora o lado musical. Filho deixa de fora o lado político de um cara cujo maior mérito é justamente ser político.
A trama é bem aquilo que está no trailer (e o trailer é ótimo e comovente, tudo que o longa deveria ser): a infância pobre de Lula, o pai alcoólatra, a mãe-coragem (Glória Pires). Há cenas muito boas nessa parte inicial, como a mãe respondendo à professora que sugere adotar o menino Lula para que ele se torne alguém, “Ué, ele já não é alguém?”. Dá gosto de ver o Lula adolescente sujando o macacão de óleo para orgulhar a mãe. A música cheia de violinos é linda, assim como alguns cortes, como o de Dona Lindu lembrando como foi tirada a foto de Lula menino, e surge o corte pro Lula adulto fichado pelo DOPS. Há um instante de metalinguagem que é legal também, quando um jovem Lula se entusiasma em ir ao cinema pela primeira vez. Sem dúvida o filme deseja atrair esse tipo de espectador que nunca entrou num cinema, como fez Dois Filhos de Francisco.
E aí eu penso: putz, a direita tem mais é que gostar de uma história sofrida dessas. Porque é tudo que ela defende: que as oportunidades são iguais pra todos, a tal ponto de um nordestino miserável que vai de pau de arara pra São Paulo conseguir virar presidente do quinto maior país do mundo (em população e tamanho). A direita adora self-made men como Silvio Santos. Aquilo do cara que, sozinho, só pelo seu talento, vence na vida (um termo totalmente de direita, que separa as pessoas entre vitoriosas e fracassadas). Lula não cabe bem nesse roteiro de sucesso porque ele se juntou a sindicatos, ohhh, e porque ajudou a fundar o maior partido de esquerda do mundo. Mas a direita até poderia assistir a Filho sem medo, porque o PT sequer é mencionado, e porque os sindicatos não são mostrados com bons olhos. Politicamente, Filho é tão conservador quanto a direita que o condena.
Só exibir multidões gritando “Lula! Lula! Lula!” não é suficiente. Tem que mostrar por que as multidões vibram com ele, e nisso o filme é totalmente baunilha. Mostra um Lula que caiu nos sindicatos de paraquedas, sem querer, sem ideologia. Até aí, paciência. Isso acontece direto, e é comum que operário tenha birra contra seu sindicato. Mas cadê a mudança? Lula não muda em nenhum momento? Ele permanece alienado até depois das greves do ABC? O que vemos é um Lula repetindo 150 vezes que não é comunista e discursando amenidades como “Trabalhador não é de esquerda, muito menos de direita” e “Trabalhador não é contra patrão. É o patrão que nos paga”. Ah, vai! Essa covardia toda do roteiro é a troco de quê? Eles têm a ilusão de converter o pessoal de direita desse jeito? Pra mim, que sou de esquerda, centrar-se num Lula tão light não é louvável. Rui Ricardo Dias, que faz o Lula adulto, se esforça, mas é mais bonito que o Lula real e não fala com a língua enrolada. E o Lula do filme fala muito menos errado que o Lula de verdade. É um Lula higienizado, em todos os sentidos. E perdão, mas talvez os realizadores tenham ouvido falar que tem um monte de gente adora o Lula real.
Uma das críticas recorrentes que tenho lido sobre Filho é que ele é excessivamente melodramático. Bom, o que há de errado num filme feito pra emocionar? Por que um filme não pode ser manipulador e melodramático? Alguém avise um dos maiores diretores vivos, o Almodovar, que não pode. E aproveitando, o que que tem um filme ser panfletário? Um filme encher de orgulho os eleitores de um político muito, muito popular? Infelizmente, Filho não é nem uma coisa nem outra. É apenas vazio e superficial. E alguém ainda precisa me provar que o filme foi feito pra emocionar. Gente, eu choro em tudo quanto é filme. Eu chorei no trailer de Filho. Outro dia chorei vendo comercial da Omo! Não se iludam: se tem filme feito pra chorar, eu compareço alagando a sala. Filho não é um desses. Vejam a cena em que Lula é informado que sua esposa e bebê morreram. Não há closes nem lágrimas. A câmera está longe, lá no fim do corredor. E a cena é curta. Não segura o clima pra construir emoção. Filho é frio, tanto que ninguém na sessão onde eu estava saiu com os olhos vermelhos. Ninguém aplaudiu ou vaiou.
Mas se não é pra emocionar, pra levantar a galera que é fã do homem, ou pra converter os detratores, pra quê o filme foi feito mesmo? Volto ao meu chute inicial: pra ganhar dinheiro (depois li entrevista do Barretão, o produtor, “confessando” isso). Opa, não pode? Não é bem a direita que defende o direito (quase o dever) ao lucro? Filho foi feito pra lucrar em cima do nome de um personagem. Mas não reconheci o Lula que admiro no filme.
Eu e o maridão somos grandes fãs do cara, e ambos achamos o filme fraquinho. Vocês têm que ver pra formar sua própria opinião. O que é uma estupidez é falar sem ver, porque há montes de mentiras circulando. A direita diz que o filme faz de Lula um santo. Pô, se um sujeito inseguro e alienado é um santo, eu fico com o diabo. Já os realizadores dizem que a história nem é sobre o Lula, mas sobre Dona Lindu. Não é. É sobre o Lula mesmo. Ele é o personagem principal desde bebêzinho. Só não é o Lula que os admiradores amam amar, e que os detratores amam odiar.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

CRÍTICA: SALVE GERAL / Não é a salvação da lavoura

Andréa Beltrão e o pano de fundo.

Provavelmente o que você sabe sobre Salve Geral é que é aquele filme nacional que foi selecionado pra ser o concorrente do Brasil no Oscar do ano que vem. E, de fato, esse deve ser o maior atrativo do filme, que não vem fazendo muito sucesso. Ele está longe de ser ruim, cativa o público, tem um bom ritmo, mas não tem nada de memorável. Fala de um episódio da nossa história recente, quando a facção criminosa Primeiro Comando da Capital aterrorizou São Paulo, em 2006. O diretor Sergio Rezende (O Homem da Capa Preta, Zuzu Angel) disse, em entrevistas, que isso foi “o nosso 11 de Setembro”. Mas lógico que não foi. Se tivesse sido, mais gente se lembraria. Mesmo assim, esse cenário é praticamente um pano de fundo pra protagonista da trama. Andréa Beltrão está muito bem como uma professora de piano que precisa se adaptar a uma nova vida. Depois que seu filho (Lee Thalor) mata alguém e vai preso, ela relutantemente usa sua formação de advogada pra passar recado entre os líderes do Comando, todos presos. Salve poderia ser sobre um dos vários líderes, sobre a vida na prisão, sobre a linha tênue que separa alguns advogados que trabalham pra criminosos dos próprios criminosos, mas não é. É sobre uma mãe coragem.
Mãe coragem, pero no mucho. Quando ela se envolve com um líder criminoso jeitosinho, deixa de visitar o filho durante três semanas. Eu também deixaria, na boa. O rapaz é um mala.
Ele já era um mala antes de cometer seu crime. Fica fazendo cara feia pra mãe, que luta pra sustentá-los. Assim que ele chega na cadeia, é chamado de playboy pelos outros presos, que não sabem que ele vivia num subúrbio pobre de SP (é boa a cena em que seu amigo negro vê a casa onde o “playboy” mora e se decepciona). Depois de preso, mesmo não sendo um playboy no sentido financeiro (embora seu padrão de vida seja bem superior ao da maioria), ele se comporta como um menino mimado. “Mãe, arranja 500 pila pra mim”, e não quer nem saber como ela vai arranjar. Mãe, faz isso. Mãe, você não veio me visitar! Depois dessa, eu perguntaria: “Quem é você?” e ia embora pra nunca mais voltar.
O interessante é que, de todos os presos, o que é mais humano está longe de ser o rapaz-malinha (que sequer parece se arrepender de seu crime). E tampouco é o “Professor” (Bruno Perillo). A gente empatiza um pouco com ele apenas porque ele parece gentil e se apaixona pela protagonista. Mas o mais humano é um preso (Taiguara Nazareth), negro, bonitão, que está saindo da cadeia em condicional, mas para isso precisa colaborar com a polícia corrupta. Ele quer se reabilitar. A gente o vê chorando, acompanhando sua mulher quando ela dá à luz. Lógico, seria um outro filme se Rezende se centrasse nesse personagem. Há também um outro negro, amigo do filho da protagonista, que acredita que o que eles estão fazendo é uma revolução, no sentido político. Pena que Salve não explique melhor esse ponto de vista.
Essa talvez seja a maior falha do filme pra mim, centrar-se no lado pessoal de uma mulher de classe média ao invés de enveredar pelo lado político. É risível que, mesmo sendo apolítico, Salve tenha sido atacado como uma tentativa petista de politizar o Oscar. Na realidade, eu nem sei se foi muita gente da direita que inventou esse absurdo ou se foi apenas um paquiderme de plantão, conhecido por criar um blog anônimo pra difamar Luis Nassif (entre várias outras trollagens). Pois bem, o cara disse que Salve Geral foi escolhido pelo governo pra representar o Brasil no Oscar para manchar a imagem do PSDB em ano eleitoral. É muita criatividade pra um paquiderme conspiratório só! Quem escolhe o filme que representa o Brasil não é o governo, mas um comitê independente (que muda todo ano) composto de críticos de cinema, produtores e diretores. Ano passado um outro comitê optou por Última Parada 174, provavelmente pra falar mal do... ahn, nem sei qual o partido que governava o Rio na época. Praticamente todos os filmes brasileiros recebem financiamento público, entre eles muitos que a classe média critica por “mancharem a imagem do país no exterior”. O BNDES acabou de dar dinheiro pro José Padilha, diretor de Tropa de Elite, fazer um filme sobre o mensalão, com o sugestivo título de Nunca Antes na História Deste País. Estranho, porque eu pensava que o BNDES só dava dinheiro pra filme que falasse mal do PSDB! Enfim, se essa acusação de que Salve foi escolhido pra representar o Brasil no Oscar já era ridícula no papel, depois de ver o filme, então... Não tem nada na trama que sequer indique que o PSDB governava SP. Eu lembro de quando as notícias tomaram a mídia. As pessoas com quem eu falava aqui em SC associavam o problema da criminalidade ao governo federal, não ao estadual. Aliás, pouca gente fora de SP sabe que o PSDB governa o Estado ininterruptamente desde 95 (e nesse caso aquele argumento de como alternância no poder é algo positivo não conta).
De toda forma, duvido que a Academia indique Salve para melhor filme estrangeiro. Além de não ser uma produção marcante, não tem o perfil dessa categoria do Oscar, que tá mais pra O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias (que ficou entre os oito pré-selecionados em 2007). Sabe, algum momento histórico visto pelos olhos de uma criança, perda da inocência, essas coisas.
Ah, mas eu preciso dizer que um dos meus temas preferidos de todos os tempos é apenas sugerido por Salve. Tá, você vai ver o filme e não vai entender nadinha. Mas o meu tema é esse: ter que fugir de um lugar e fingir ser outra pessoa, sem ser reconhecida, com outro nome, em outra cidade. Esses temas raramente são explorados no cinema. Tem um pedacinho do Butch Cassidy na Bolívia (mas eles vivem do crime, e, vamos admitir, um Paul Newman e Robert Redford chamariam a atenção em qualquer lugar do universo. Na Bolívia, dois americanos não passariam incógnitos). Tem um pedacinho de Dormindo com o Inimigo em que a Julia Roberts foge do marido abusivo, que promete matá-la, e vai parar num lugar do outro lado dos EUA (ele põe um detetive particular na sua cola). Nos filmes de Hollywood, quando alguém tem que fugir, cruza a fronteira e vai pro México. Aqui, temos a vantagem que não precisamos mudar de país. É só mudar de estado. A menos que saia o nosso perfil num Linha Direta da vida, acho que dá pra viver escondido, sem ninguém suspeitar. Falei sobre tudo isso com o maridão. Falamos de como mudar a nossa aparência (ele usaria barba, eu tingiria o cabelo de loira e engordaria mais ainda, porque emagrecer tá difícil). Falamos do José Dirceu, que fez cirurgia plástica pra mudar totalmente o rosto e poder voltar com outro nome ao Brasil da ditadura. Perguntei pro maridão que cidade seria boa pra se esconder, se uma pequena, uma média, ou uma metrópole. Média, ele disse. E aí sugeriu fugir pra... Curitiba! Eu fiquei indignada: “Amor, Curitiba fica a duas horas de distância de Joinville! E a gente já esteve lá inúmeras vezes. Seria inevitável esbarrar em algum conhecido”. Ele não quis saber. Eu dei graças aos céus que a gente não tenha que fugir, porque ele não duraria um mês sem ser descoberto. Mas eu, eu tenho uma mente criminosa, ha hi ha hi (risinho diabólico).
Lógico que isso não tem nada a ver com Salve Geral, mas eu precisava desabafar.