Por essa você não esperava: vou defender “Mulher-Gato”, o filme-judas da temporada. Os críticos americanos malham a produção por três motivos: falam mal do diretor Pitof pelo cara ser francês, se irritam com o feminismo da história, e se intimidam pela roupa de Dominatrix da Halle Berry. Nessas horas é que dá pra ver como a maior parte dos críticos é homem... Bom, não é que eu vá elogiar a aventura, eu não me rebaixo tanto, mas “Mulher-Gato” não é, nem de longe, o pior dos filmes baseados em histórias em quadrinhos. Não é pior que “Demolidor”. E pra quem gosta de gato é um prato cheio.
Vamos ser honestos: a ambição suprema de todo mundo é virar gato. Ou virar a Halle Berry. Eu, por mim, na próxima reencarnação quero nascer gato. Agora, claro que tem gente que odeia gato, e eu respeito todas as opiniões, mas acho que entre as sessões de eletrochoque essas pessoas deveriam ser perguntadas se elas também odeiam tigres e leões, que são idênticos a gatos, só que maiorzinhos. Porque os felinos são todos iguais: todos fazem rum-rum, dormem de barriga pra cima, soltam pêlos, tomam banho de língua... Isso posto, tá na hora de me contradizer: no fundo, nenhum gato é igual a outro. Meus gatos, por exemplo, não têm nada contra a chuva ou contra cães. E o Calvin gosta de, hum, como direi, cenoura. Sei que nem deveria falar isso publicamente, já que agora ele pode ser expulso da Associação Internacional dos Gatos.
E vou compartilhar com você, paciente leitor amante de gatos (porque a essa altura só amante de gato continua lendo essas mal-traçadas), a musiquinha favorita que canto pros meus gatinhos aqui em casa. Essa tá no alto do hit parade. Vai com a melodia do McDonald’s, lembra aquela que dizia “Dois hamburgers, alface, queijo, molho especial, cebola, picles, em um pão com gergelim”? (Aliás, não entendo como o documentário que fala mal do McDonald’s, “Super Size Me”, só vai passar no Rio e SP. Tá me dizendo que um filme desses não tem potencial pra blockbuster? Imagina se todas as meninas com tendência à anorexia não iam adotá-lo como filme de cabeceira?). Ahn, voltando, a minha adaptação da canção diz: “Dois gatinhos, selvagens, lindos, fofos, especiais, bons caçadores de hamsters e gerbelins. São os gatinhos! Gatinhos! Gatinhos!”. Tá, talvez você não ache uma obra-prima, mas os gatinhos sempre aumentam o volume do rum-rum quando eu canto essa.
O filme, Lolinha, o filme. Certo. Bom, a mensagem de “Mulher-Gato” é que toda mulher deveria se soltar mais, ser mais gato, mais hedonista. Não é uma mensagem nobre? A história é tão feminista que o produto a ser combatido não é uma bomba atômica, mas um creme de beleza. Nossa heroína tem até uma melhor amiga gordinha, coisa rara. O enredo é aquele que a gente já viu em algum “Batman” de doze anos atrás, quando a Michelle Pfeiffer interpretou a Mulher-Gato, mas não lembro dela. A Halle morre, renasce meio felinizada, veste couro, e sai por aí combatendo seus inimigos. Ela tem o principal super-poder felino, que é se desmaterializar num canto e reaparecer no outro. Mas ela não tem a vantagem das garras retráteis, e, mais importante ainda, não tem cauda. Cauda é algo fundamental prum gato, pois proporciona equilíbrio e indica seu humor. Mas que negócio é esse de chicote? Desde quando um gatinho teria a mínima afeição por roupas de couro e chicotes? O figurino é só pra satisfazer alguma fantasia sado-masô.
O filme sofre com essas contradições. A roupa da Halle é pra adultos, mas a aventura é infantil: não tem palavrão, não tem violência (não dá pra ver os efeitos especiais, que são rápidos demais. Sabe quando você vê um gato passar correndo, e você não vê nada, só sente uma mini-rajada de vento? Assim são as cenas de luta), sexo nem pensar. Quem conhece gato sabe que eles gostam da coisa. Mas, sei lá, apesar de toda a perfeição física e moral dos gatos, acho que eles não rendem bons super-heróis. Um bicho que dorme dois terços do dia?! Aposto que quem odeia gato morre de inveja do estilo de vida que eles levam.
Tirando os diálogos sofríveis e as cenas de ação, “Mulher-Gato” nem é ruim. A Sharon Stone vem como vilã e se diverte no papel, e o Benjamin Bratt surge como interesse romântico da heroína e único policial da cidade. No fundo, ele também é bem felino, no sentido de estar em vários lugares ao mesmo tempo. Ah, o gato principal tem movimentos esquisitos, e deve ter sido gerado por computador, como o Garfield. E pra quem sente falta da Michelle, o filme deixa a entender que existem várias mulheres-gato por aí, e a Halle é apenas uma. Aqui vai uma confissão: eu também sou. É verdade que tenho uma certa dificuldade pra passar entre barras de prisão, mas...
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