domingo, 28 de novembro de 2004

CRÍTICA: EM BUSCA DA TERRA DO NUNCA / Mais simplório que simples

Parece que o Oscar mais uma vez vai passar longe de Joinville. Por aqui ainda não chegou nenhum dos indicados. O que não é de todo ruim, a julgar pela qualidade dos oscarizáveis. Minha sugestão? Vá de “Meu Tio Matou um Cara”, que é divertidíssimo, ultra-fofo, e falado na nossa língua. Anyway, fui ver “Em Busca da Terra do Nunca” em Curitiba. O melodrama não seria tão decepcionante se eu não soubesse que ele está disputando sete estatuetas, entre elas melhor filme. Sim, este produto inconseqüente, típico da Miramax pra concorrer ao Oscar, está entre os cinco mais-mais do ano. Não na opinião desta que vos fala, claro.

Não é que “Nunca” seja tenebroso, é só que é fraquinho. Conta um trecho da vida de James Barrie, autor de “Peter Pan”. Hoje em dia, quando a gente ouve falar em Terra do Nunca e afins, imediatamente se lembra do Michael Jackson. E “Peter Pan” tem exaustivamente sido interpretado como uma história de abuso infantil. Mas dizem que não há provas que Barrie era pedófilo. E é assim: se Hollywood afirma que Barrie gostava das criancinhas sem maldade, eu acredito. Mas que o cara era esquisitão, isso não há dúvida. Apesar de casado, não tinha a menor intimidade com a esposa. E, quando ele entra na vida de uma viúva e seu bando de filhos, não rola o menor clima. Essa figura nunca vai se reproduzir.

Lógico que o filme faz Barrie o mais ingênuo e querido possível. Na pele do Johnny Depp, ele é apenas uma alma inocente. Fiquei procurando alguma nuance na interpretação do Johnny que mostrasse o mínimo de ambigüidade. Mas não tem. É o samba de uma nota só. Idem pro personagem da Kate Winslett. Todos são caricaturas sem profundidade, unilaterais. Por incrível que pareça, os mais complexos são as crianças (digamos, uma ou duas das cinco ou seis). O filme parece querer dizer que a infância é complicada e que quando a gente cresce as nossas fantasias acabam (isso é ruim), mas, pelo jeito, nossos problemas também. Afinal, nossos personagens adultos não têm problemas financeiros, amorosos ou sexuais, já que não só não fazem, como sequer pensam em sexo. O pior que pode acontecer com eles é morrer, e nem isso soa tão horrível, já que a Terra do Nunca tem vagas abertas para os puros de espírito. Meus sais, essa terrinha deve ser habitada por um monte de Frodos e Forrest Gumps.

Dá pra notar que “Nunca” está fadado a virar filme de cabeceira nas palestras de motivação empresarial e nos manuais de auto-ajuda. Já vimos isso antes: bata palminhas se você acredita em fadas. Você pode voar, é só ter fé. Nunca desista de seus sonhos, nunca diga que um cachorro é só um cachorro, porque assim você está sepultando as chances do au-au virar urso. Entendeu? Aplique essa teoria a qualquer profissão e pronto, temos um bestseller. Tá, eu sou cínica e sem coração (se bem que o farrapinho humano aqui chorou no final, plenamente consciente da manipulação). Mas vamos ser francos, né? Pra quem tacha o filminho de “mágico”, recomendo comparar as cenas de fantasia com as de “Almas Gêmeas”, por exemplo. Falta criatividade em “Nunca”. Falta o diretor Marc Forster (do bem razoável “A Última Ceia”) entender que pra ser simples não precisa ser simplório. E o que o Dustin Hoffman tá fazendo no filme? É só uma piadinha pra nos lembrar daquela coisa pavorosa, “Hook”? Ah, bons tempos em que as pessoas queriam ser criança pra sempre. Agora querem ser eternamente adolescentes. Eu prefiro adolescente. Sou mais “Meu Tio Matou um Cara”.

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