sábado, 9 de abril de 2011

POR QUE FECHAR OS OLHOS PRA HIPÓTESE DA MISOGINIA?

Quinta-feira, quando aconteceu o massacre na escola em Realengo, houve uma onda de boataria no Twitter. Disseram que o assassino era ateu, muçulmano (olha o preconceito aí! A carta dele aponta pra outro tipo de fanatismo religioso), HIV positivo, sei lá mais o quê. O que me chocou é que, no meio de todas essas fofocas, tão poucos falaram o que parecia óbvio ― a diferença entre o número de vítimas meninas e meninos. A Valéria foi a primeira que eu vi falar em feminicídio, no Twitter, ainda na manhã de quinta. Mas o que eu lia era todo tipo de coisa pra explicar essa diferença no gênero das vítimas: desde que meninas são boas alunas, portanto chegam mais cedo e sentam na frente da sala, ao incrível “meninas correm menos, então não conseguiram fugir” (vídeos mostram muitas meninas e meninos deixando em disparada a sala onde estava o assassino. As meninas parecem correr bastante bem). No decorrer do dia, apareceram vários depoimentos de testemunhas dizendo que Wellington alvejava as meninas, que atirava nelas na cabeça, para matar, que ele matava as bonitas, e até um boato de que perguntava pras suas vítimas se eram virgens.
Ontem vi o Jornal Nacional e não se falou uma só palavra sobre crime de ódio. Pelo contrário, algum especialista bateu na tecla das meninas sentarem na frente (apesar de, aparentemente, não ter havido execução de crianças sentadas; meninas estavam amontoadas próximas à parede). Não entendo essa recusa em ao menos se discutir o óbvio (que dez meninas e dois meninos morreram, que há muito mais meninas feridas que meninos). Isso não significa de maneira alguma justificar a tragédia, mas debater algumas possibilidades.
É chato ver até feministas cheias de dedos pra discutir a misoginia como uma das possíveis causas dessa tragédia (ainda mais porque o assassino falava tanto em impureza, o que claramente tem um caráter sexual, e porque outros casos parecidos têm a misoginia como marca registrada, como registrei no post de ontem). Se a gente, que lida frequentemente com temas como machismo e misoginia, não vai chamar o massacre pelo nome ― crime de ódio, feminicídio ―, certamente não será a grande mídia que o fará. É triste admitir que, pela primeira vez na vida, concordo com um reaça histriônico como Luis Carlos Prates (demitido da RBS por criticar pobres que têm carro, agora no SBT). Veja aqui o que ele disse ontem.
Claro que não concordo com tudo que ele diz. Nem com a metade. Não sou fascista. Acredito sim que todos têm direito a um julgamento e a uma defesa, e sou contra a pena de morte. Mas nada disso está em discussão neste caso de Realengo. Não tenho dúvida que Wellington se suicidou. Ele deixou uma carta de despedida, destruiu seus pertences, fez tudo planejado ― sem falar que o suicídio é comum em casos desse tipo. O policial atirou nele, e assim salvou várias vidas (porque Wellington estava indo para outro andar e ainda tinha 17 cartuchos de munição), mas o psicopata não ia sair vivo da escola, de um jeito ou de outro (e também não tenho nada contra um policial atirar num criminoso em legítima defesa). A gente sabe que esse discursinho prateado é sempre usado pra condenar quem defende direitos humanos. Enfim. O momento não é para se discutir direitos humanos, a aplicação da lei penal ou a segurança das escolas, como prefere Prates, mas o facílimo acesso que cidadãos têm a armamentos. E talvez o bullying. E a misoginia.
Eu tampouco tenho a fúria do Prates pra sair chamando todo mundo de “covardes de uma figa”. Mas minha pergunta (que escrevi na noite de quinta) é a mesma: por que não se fala em crime de ódio? Quero acreditar que é por prudência, que é por não querer levantar hipóteses antes que surjam mais provas ― mas dez meninas mortas, uma carta falando em “impurezas”, e testemunhos de que Wellington atirava em garotas não seriam provas suficientes?
Insisto, vamos chamar o que houve pelo nome: foi um crime de ódio. Feminicídio, em outras palavras.

51 comentários:

Unknown disse...
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Jamille disse...

Li o post de ontem e todos os comentários e concordo contigo, Lola.
Por que o medo da mídia em falar em crime de ódio?

Letícia disse...

eu concordo absolutamente com vc. assisti a vários jornais falando sobre (e já explorando...) a tragédia e fiquei atônita por notar que pouquíssimos foram os que abordaram a questão dos alvos terem sido mulheres. foi a primeira coisa que notei quando ouvi a notícia! pra mim, ficou claro se tratar de misoginia.

ouvi, inclusive, um relato de um garoto do colégio, que afirmou: "o bandido me abordou, armado, mas disse pra eu ficar sossegado, que não faria nada comigo". não tá evidente? ele entrou na escola à caça de garotas.

bom, pra mim, o necessário em relação a esse tema é discutir, sim, crimes de ódio e, como única solução possível, discutir a proibição e fiscalização severa do porte de armas de fogo... mas a Globo teima em fazer uma análise detalhada sobre o tipo de arma que o cara usou. ¬¬

Unknown disse...

Me surpreende o fato de ele ter matado muito mais meninas não ter sido discutido, me chamou a atenção desde o começo. Mas ele ter dito que nenhum impuro pode tocar no corpo dele sem usar luvas pode mostrar claramente que ele era muçulmano sim, e faz bem sentido ele só ter atirado em mulheres porque sabemos como religiões são machistas, especialmente essa muçulmana... Acho que ele provavelmente era misógino desde mais novo e encontrou nessa religião o que ele procurava, se identificou, já que também prega a inferioridade das mulheres, na qual ele já deveria acreditar... agora seria uma ótima hora pra discutir o machismo religioso

Isabel SFF disse...
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Marilia disse...

Donner, cuidado ao chamar de muçulmano. Ele era cristão, não muçulmano.
Jesus não é salvador para o islamismo, e ele acreditava em Jesus.


Mas o crime é de ódio e é feminicídio, sim!

Lord Anderson disse...

Donner.

Desculpe, mas não havia nada mostrando claramente que ele era mulçumano.

As frases sobre impuros e as instruções do enterro tb aparecenm no Torá e no Velho Testamento.

E em sua carta ele fala de Jesus e Deus, sendo que um islamita mencionarioa apenas Alá.

E pelo que foi contado ele ja teve participação em seitas cristãs como as Testemunhas de Jeova.

Isso de islamico ta no mesmo nivel do boato dele ser portador de HIV.

Lola, os jornais da rede Record de hoje de manha falaram sobre as vitimas seram meninas e de que esse crime foi mesmo um ato de odio contra elas.

Infelzimente outros veiculos como a Veja e a Globo, se focaram nos habitos "estranhso" do rapaz.

Tal como passar muito tempo na internet, ser reservado, e gostar de games violentos.

Ou seja, eu sou um suspeito tb pelo jeito...

A irresponsabilidade da nossa midia é um absurdo.

Unknown disse...

Ah, verdade, não tinha lido a carta por inteiro, acabei de ler agora. Esse negócio de impureza tinha me chamado atenção por ser característico da religião muçulmana mas não tinha visto ele citar Jesus antes. Mas enfim, acho que sendo muçulmano ou não, ele era fanático religioso no final das contas do mesmo jeito, e pra mim isso nunca dá certo já que boa parte das religiões discriminam mulheres

Elaine Cris disse...

Falou tudo, Lola. Como já disse antes, é porque incomoda mexer em certos vespeiros.

Incomoda tanto que a própria possibilidade de ser um crime misógino já incomoda alguns.
Não, não pode, não foi isso, de jeito nenhum.

O que é isso? Querem tapar o sol com a peneira.

Barbara O. disse...

Alguem tem noticia de algum "blog progressita" (excluindo os claramente feministas) que tenha abordado a questao? Gostaria de saber, pois me parece que estamos novamente diante de questoes onde os "progressistas" sao identicos a velha ou grande midia.

Valéria Fernandes disse...

Bem, eu sou a Valéria citada, a criatura que está cansada de repetir "feminicídio" e ver que algumas pessoas (*um amigo muito amigo meu hoje*) dizerem que não percebem por aí, porque "naõ tem sensibilidade de gênero" que, para ele "importa que jovens foram mortos". Não vou contar os trolls, esses que tenham uma morte virtual bem lenta... Enfim, parece que levantar a idéia de crime de ódio - contra mulheres, claro - é desprezar os meninos feridos e mortos. Não! É juntar 1 + 1 e apontar que foram dois crimes sobrepostos.

Mas hoje pela manhã o analista policial da Record (*acho que é mais ou menos assim que chamam*), tocou no assunto. Ele falou claramente sem citar a palavra "feminicídio". A repórter âncora veio com o papo de "as menina sentam na frente" e ele cortou firme (*e, aí, pesa a autoridade do seu lugar de fala... ele é homem... Lamento ter que dizer isso, mas foi assim*) e disse que deveríamos ouvir as testemunhas, que elas dizem TODAS que Wellington escolheu as meninas e as executou. Um babaca apareceu no meu blog - e foi o único troll que publiquei - dizendo que eu, como "professora de história" deveria me ater aos fatos... Bem, ele nada entende de fazer história, ou mesmo de bom jornalismo, porque os fatos são o testemunho das vítimas e sobreviventes e os números. Mas machistas e misóginos não vêem isso, infelizmente, várias feminsitas, também, não.

Meu marido concordou comigo sobre o feminicídio desde o primeiro momento. E ponderou: "Eu sempre fui rejeitado pelas meninas no ginásio e colegial. Nenhuma quis namorar comigo. Mas NUNCA senti vontade de matar nenhuma delas.". Aí entra o transtorno mental do sujeito, mas a cultura machista e misógina está criando muitos monstros. Eu somente espero que nenhum caso desse se repita tão cedo, porque, sinceramente, acho que teremos outros.

E desculpem o desabafo. Esse caso me tocou profundamente. Me fez um mal desgraçado. E a burrice, insensibilidade e máfé (*escolha uma das três*) de algumas pessoas está despertando o que de pior existe em mim.

Isabel SFF disse...

Como assim, ele era muçulmano? O assassino mencionou Jesus em sua carta...

Enfim, mas é como eu disse ontem, concordo com você, Lola. Foram poucos os jornais que abordaram esse fato de que ele entrou lá com o objetivo de executar meninas. O real motivo disso, nós nunca saberemos. O mais provável é que ele estava num quadro de delírio - e, dentro desse delírio, havia o ódio por mulheres.

Mas qualquer coisa que se fale sobre ele, neste momento, é especulação. O que mais salta aos olhos é a tentativa da mídia de esconder esse fato: houve um feminicídio naquela escola.

Antes que a trollagem comece: não é que este crime tenha sido pior por ter vitimado principalmente meninas. Teria sido horrível de qualquer forma. Mas se o assassino tivesse selecionado vítimas negras, por exemplo, ninguém hesitaria em falar do caráter racista do crime. A questão da Lola é por que evitam dar a esse crime seu nome real? Por que esconder a misoginia tão óbvia nessa tragédia?

Eduardo Marques disse...

"Por que fechar os olhos para a hipótese da misoginia?"

O assassino tinha problemas psicológicos, os quais tinham a ver com sucesso sexual. Ele podia ter alimentado o rancor contra qualquer coisa que ele culpasse por seu fracasso, como (ui! Serra feelings) garotos bonitos e bem-sucedidos, seus próprios pais, a mídia, Deus, o Osama bin Laden. Ele escolheu as meninas por mero acaso. Chamar isso de crime de ódio, comparando a crimes racistas, como os da Ku Klux Klan ou do nazismo, é uma hiótese estapafúrdia e ridícula.

Se ele fosse gay e fizesse uma chacina em uma academia cheia de bofes sarados que não dessem bola pra ele, seria ódio aos homens?

Letícia disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Letícia disse...
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Letícia disse...

(estou com problemas pra comentar aqui. desculpem pelas várias tentativas e comentários repetidos.)

Valéria (Shoujofan), vc tem toda a razão. é preciso chamar atenção para a misoginia nesse caso e deixar de tratar o assassino como um caso isolado de psicopatia. não é, não. como prova disso, vejam esse link (quem não viu):

http://www.youpublic.com/noticia/atirador-de-realengo-pode-ter-sido-incitado-a-cometer-assassinato-por-gangue-no-orkut/

ele foi citado por uma leitora no post anterior, e é muito pertinente. vendo isso, eu tb fico temendo que casos como o de Realengo venham a se repetir... tem muita gente aí disposta a cometer crimes de racismo e misóginos! uma comunidade que prega a "penetração corretiva" de lésbicas tem quase mil seguidores!

Koppe disse...

Sou contra a pena de morte, acho que seria colocar poder demais nas mãos do estado. Mas em uma situação extrema a coisa se torna mais simples (e acho que corpos ensangüentados de crianças ao lado de um maníaco armado pode ser chamado de situação extrema), e na minha opinião o policial que atirou nele foi herói, tendo o assassino se suicidado ou não, não deve fazer a menor diferença. Pra todos os efeitos oficialmente foi suicídio e tomara que continue assim porque o policial que limpou o mundo de um lixo desses poderia ter problemas se fosse descoberto que não foi suicídio.

Lord Anderson disse...

Barbara, bem lembrado.

Ainda não visitei nenhum outro site.

O da Lola e o da Valeria foram os unicos que vi.

Vou dar uma olhar e ver se mais gente se tocou disso.

E devo confesar que eu fiquei meio cauteloso quando a Valeria apontou o tema, pq esta tudo muito confuso...

Mas assim que saiu mais detalhes não tinha como não concordar e ver o obvio.
É triste mesmo.

Pandora disse...

Acho que precisa apenas olhar com o minimo de atenção para perceber que isso foi sim um "feminicídio", está tão claro como água!!! Mesmo minhas visinhas, minha mãe, pessoas simples que não frequentam rodas de intelectuais e nem de longe usariam a palavra "feminicídio" quando foram me explicar o que aconteceu na escola (passei o dia distante de meio de comunicação) foram bem claras quando disseram que nas palavras delas: "ele foi justamente nas meninas".

Não precisa nem ser professora de História ou Jornalista, precisa apenas ter atenção ao que aconteceu!

Lord Anderson disse...

Eduardo.

Desculpe, mas não dá p/ falar em mero acaso.

Com tudo de preparação e de precisão na hora das mortes, me parece que a escolha dos alvos foi bem pensada sim.

No caso que vc supos, sim, eu acredito que poderia.

Mas vamos combinar que crimes de odio contra homens são (felizmente) algo quase inexistente.

Annix disse...

http://dedodomeio.lexlilith.org/000090.html#more

Lane disse...
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Lane disse...
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Lane disse...

Então...
Para mim justificar= explicar= dar motivos= dar argumentos racionais para um ato transloucado, ilógico e irracional como esse


Se podemos considerar como hipotese a misoginia. OK.Tudo bem. Se falamos que foi sim um ATO MISÓGINO. Sim. Tudo bem, mas dai afirmar que era a MOTIVAÇÃO eu achei precipatado especialmente quando compararmos a outros casos em que sabemos do histórico do criminosos.

E desse? O que sabemos sobre seu históricos de relacionamentos para saber se ele era misógino?Conhecemos sua familia? sabemos de sua biografia? Sabemos de seu histórico mental?Sabemos sobre seu comportamentoe em relação as mulheres para? Não não sabemos, o máximo que sabemos é que ele é virgem e que o perfil de atirador em masse foi onde ele melhor se encaixou.

O que podemos fazer é elaborar hipoteses ou conjecturas . Nada mais.

Outra coisa importante. ele não era islâmico,( isso foi um boato que saiu) era cristão e no cristianismo o termo "impuro" utilizado tanto para homens e mulheres que cometeram pecado, especialmente o da fornicação, adulterio.

E mais vejo pessoas utilzando a carta dele a esmo como se no meio daquele monte de delirios e paranoias tivesse algo lógico que explique aquilo, especialmente o tosoco do Arnaldo Jabor que já disse que a culpa era da idéia de Deus.

Sinceramente não sei como alguém que se diz jornalista e está para informar ao inves de evitar demonizações de determinadas religões não INFORMAR que nenhuma religão ensina o indivíduo a fazer uma coisa dessas, isto só alimenta preconceitos e reforça esteriotipos de que todo mulculmano é intolerante, louco e protestante é fanático.

Lane disse...

Mas concordo que foi um ATO DE MISOGINIA e que pode classificá-lo como CRIME DE ÓDIO

É que em caso de pessoas com perturabações mentais qualquer afirmação convicta é sempre inócua e discutivel

Thiago Pinheiro disse...

Desculpe o desabafo. Não pretendo confrontar ninguém. No entanto, o que deveria importar que a versão de crime de ódio é consistente ou que os alvos preferencias eram mesmo as garotas diante da tragédia que se abateu e da dor das famílias das vítimas. Sabe-se que ainda se encontam hospitalizados 8 garotos e 2 garotas. Espero que o número de mortos não aumente. A versão que põe em destaque a misoginia mudaria se por uma nova tragédia a proporção de garotas diminuisse em relação ao de garotos no primeiro dia, ou o tempo entre o ato e a morte pesaria mais? Sinceramente o que me importa que os grandes médias ainda não contemplaram aquilo que vocês dizem ser óbvio?
No mais, os grandes médias são realmente conservadores e não contemplam muitas coisas que poderiam permitir uma discussão mais frutífera. Vossas reclamações não são despropositadas, mais são realmente tão superiores? Tanto ainda se descobrirá. Porque mostrar-se neste momento tão sabidas? Parece uma certa ansiedade por justificar um monte de questões que são existenciais.
Novamente gostaria de sublinhar que não estou negando ou resistindo a versão de crime de ódio. Este ato inominável me comoveu como a todos.

Elaine Cris disse...

Eu não consigo parar de pensar que se as vítimas escolhidas fossem meninos, no lugar de meninas, não se importariam de apontar esse detalhe, de falar que ele tinha algum problema com meninos e não com meninas, esse tipo de coisa... A discussão seguiria um rumo normal, não incomodaria...
Mas como é menina, como mexe em vespeiro, como tem a possibilidade de alguém falar que religiões tem sim mensagens machistas, que temos várias mensagens misóginas por aí, preferem nem começar a pensar no assunto. Foram crianças e pronto. O cara é doido e pronto. A questão a ser discutida não tem a ver com gênero. Aff...

Ághata disse...

Acho que tem gente que está tão abalada emocionalmente que não está conseguindo analisar algumas coisas com clareza.

Inclusive, parece que tem gente ofendida com o fato do crime ser de gênero.

Aliás, eu tinha visto que a maioria das crianças feridas era menina também. Por acaso não é?

Elaine Cris disse...

"o que deveria importar que a versão de crime de ódio é consistente ou que os alvos preferencias eram mesmo as garotas"

Deve importar porque a partir do momento que se discute essas coisas e para de se fingir que elas não existem, vidas podem ser salvas, pessoas que estão por aí alimentando sua misoginia podem fazer uma auto-análise, no lugar da imprensa fazer só um circo pra aumentar a audiência poderiam ser feitas discussões com as quais a sociedade só tem a ganhar.
Jogar a poeira pra debaixo do tapete não vai deixar a sala mais limpa.

Pentacúspide disse...

http://migre.me/4dozF

Bruno Cava disse...

Estou contigo, era inadiável alguém ter dito isso.

No crime passional, a mulher sempre morre (marido traído mata esposa e esposa traída, a amante). Porque geralmente leva a culpa pelos problemas do mundo.

Vou além: o crime também tem fundo racial. É mais um caso de negro pobre chacinando pobres e negros, no caso, negras. Falam em videogames, hollywood, bullying, mas não constatam o mais óbvio: a periferia já vive num cenário de brutalidade permanente, seja de modo direto (guerra) ou difuso (preconceito, ódio, miséria, desprezo público).

Esquizofrenia não causa assassinato por si mesma. Wellington é um cidadão como eu e você que, submetido a circunstâncias extremas, foi levado a um ato extremo. No Brasil, não dá pra separar crime de fatores sociais e raciais. Mas, como sempre a grande mídia repetirá a morte à exaustão, explorará a comiseração, mobilizará o medo, tudo pela agenda da "segurança pública" = gestão violenta e escravagista da pobreza.

Natália disse...
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lauren disse...

Escrevo desde o pais onde mais ocurre matanzas nas escolas. Fico extremamente triste e com uma furia
sobre esse crime. Acho bem admiravel que voces estao conseguindo falar sobre a misoginia e analisar o caso.

Se concordamos que a oppressao das mulheres existe ha 5-7 milhares de anos, a raiz desta matanza e facil de ver. A patriarcada existe na mente de todos. Se um homem sente a raiva suficiente, mata a namorada ou a esposa. Acontece todos os dias.

O que faz um crimen assim?

1) ensina as meninas que a escola nao e lugar delas
2) ensina as maes que a escola nao e lugar da menina
3) ensina que o mundo e um peligro para as meninas e as mulheres; que o lugar delas
e em casa

E justamente por isso que e importante analisar e dar nome ao crimen. Para nao cair nas trampas da patriarcada.

Taís Bravo disse...

Gostei do post mais explicativo. Mas ainda acho que seria legal fazer um texto mais profundo sobre o caso. Acho que é importante reforçar não só que é um crime de ódio, mas também a questão de que um psicopata não é um monstro é atua dentro das condições que a sociedade.

Convidar um psquiátra para um guest post seria um boa, hein.

Adwilhans disse...

Lola, o comentário todo está ótimo, só lamento a referência ao Prates. Ok, ele foi um dos primeiros, se não o primeiro, jornalista a tratar da misoginia. O problema é que o fez no meio de um comentário tão bisonho que desfigura a contribuição que ele poderia ter dado, de alertar para a misoginia...
Só para contextualizar para quem não viu o vídeo do Prates: dentre várias outras barbaridades, ele diz que haveria "advogados abutres" prontos para oferecer seus serviços na defesa do maníaco, e que um cara desses não deveria ter direito a defesa. Bem, um dos pilares da nossa democracia é o direito à defesa e, por direito à defesa, não se deve ter a visão deturpada de um advogado malandro tentando livrar o bandido da punição, mas sim um profissional sério que busca garantir que o criminoso seja punido pelo que fez, segundo as leis vigentes, impedindo que a punição seja agravada pela comoção pública.
Reitero que sei que vc não quis endossar tudo o que ele falou - vc mesma diz isso - mas achei importante aduzir essa parte da importância da defesa, independentemente da gravidade do ato criminoso... No mais, não há do que discordar.

Lu-Bau.Blog disse...

Dica para denunciar comunidades e perfis do Orkut:

Peguem o link e vão à uma outra comunidade (preferencialmente de times de futebol. Sim, é pelo volume de perfis) e coloquem lá o link pedindo para denunciar.
O Google exclui pela quantidade de denúncias. É a primeira fase. Um ou outro denunciando não ajuda.

Patrick disse...

No Canadá, um massacre com essas características (École Polytechnique massacre) levou a sociedade a fazer um grande debate sobre a violência contra a mulher. Aqui, mal estamos avançando em reconhecer o problema :(

Dai disse...

Lola, eu não fico mais chocada com o fato de que o jornalismo brasileiro não problematiza questões, não racionaliza, não apura, não aprofunda. Depois do caso Eloá, nada mais me choca.

É tudo muito raso, para recair naquele discusso 'cansei' de que a nossa segurança pública é falha, e tome apelar para armar soldado na porta das escolas e instigar a auto-defesa da população. Ridículo.

Enquanto os nossos jornalistas não estudarem mais a fundo disciplinas que dêem conta de aspectos sociológicos dos fatos, seguiremos tendo esses resumos mal acabados, mal apurados, que só conseguem ser eficientes na consolidação do boato e do escândalo.

A apuração desse crime foi péssima, apressada, irresponsável e preconceituosa. Lógico que ninguém quer abrir espaço para discutir machismo, saúde mental, desigualdade social, repressão sexual e fundamentalismo religioso. E aí eu acho que política de armamentos, embora faça parte do quadro, é só a pontinha do iceberg.

Quem, nos nossos veículos de comunicação, está mesmo apto a descascar esse abacaxi? E do jeito que apresentaram a história, fica difícil mesmo para as pessoas juntarem pontos, como a Valéria falou, e transcenderem o senso comum, assimilando que houve um componente (fortíssimo) de misoginia nessa tragédia. Triste.

Ana Vitória disse...

Só reconhecendo exatamente qual é o problema é que podemos resolvê-lo. Não adianta dar outros nomes, e nem ficar divagando com justificativas estúpidas, do tipo "meninos correm mais e meninas sentam na frente". Temos todos os dados que comprovam que foi crime de ódio, e é assim que temos de tratá-lo.

Nola disse...

tá, dá pra notar que o cara era misógino e matou muito mais meninas que meninos, mas e agora? Não entendi o que que se ganha com isso.

Mariana disse...

Lola, a PRIMEIRA coisa que me chamou a atenção a ler sobre esse caso horroroso foi a desproporção entre o número de vítimas meninas e vítimas meninos. Falei lá no trabalho: "esse crime tem cheiro de misoginia, de ódio contra meninas"... Não levaram muito a sério, mas algumas pessoas também haviam notado essa diferença.

Daí pesquisei na imprensa e POUQUÍSSIMOS sites trataram a questão como deveria ser tratada. Será que o depoimento do menino que disse que "nas meninas, ele atirava pra matar" não é suficiente? E outras testemunhas que dizem que ele escolhia as meninas BONITAS pra morrer? E ele chamar as garotas de seres impuros??

É praticamente impossível encontrar alguma explicação prum crime desses e acho que nunca haverá alguma que baste. São vários elementos: fácil acesso a armas, maldade, ódio, perturbação mental, bullying... Mas MISOGINIA certamente foi uma das motivações, os números mostram. Também não entendo o excesso de dedos em falar português claro!

coep disse...

Lola,
concordo que foi um crime de ódio, crime contra as mulheres.
Mas acho lamentável ter que faze uma referência ao abjeto jornalista Luis Carlos Prates, pois ele diz claramente que as crianças não devem ser ouvidas; e que o diretor deve ter autonomia para expulsar crianças. Isso vai contra todos os estudos pedagógicos sobre este tipo de acontecimento.
Por outro lado, por que o jornalista não falou sobre "Deus"? Afinal, o assassino não era um fanático religiosos?
é claro que o fanatismo religioso anda de mãos dadas com a misoginia... mas o Prates não quis contradizer sua pregação religiosa, de que falta mas religião nas escolas!!!

mauro Alves da Silva
Movimento comunidade de Olho na Escola Pública
http://MovimentoCOEP.ning.com/

Sara disse...

gostaria de entender o porque na midia , não enfatizar o que realmente ocorreu pelo relato das vitimas, foi feminicidio.
Assusta pensar que a violencia contra nós mulheres é tão frequente, que nem merece essa abordagem.
Parece que não esta longe o dia em que os homens que a praticam serão até premiados, pois punidos , esta claro que não estão sendo.

lauren disse...

E revoltante que a midia - e a sociedade - ainda nao ve nem valoriza a mulher. Escrevo dos EU, onde este tipo de crimen, infelizamente, se tornou comun.
A midia estadounidense, inclusive o jornal o New York Times nunca fala em a misoginia.

Fico bem impressionada com os comentarios de voces, e com este excelente blog.

Nefelibata disse...

Eduardo Marques disse que "O assassino tinha problemas psicológicos, os quais tinham a ver com sucesso sexual. Ele podia ter alimentado o rancor contra qualquer coisa que ele culpasse por seu fracasso, como (ui! Serra feelings) garotos bonitos e bem-sucedidos, seus próprios pais, a mídia, Deus, o Osama bin Laden. Ele escolheu as meninas por mero acaso. Chamar isso de crime de ódio, comparando a crimes racistas, como os da Ku Klux Klan ou do nazismo, é uma hiótese estapafúrdia e ridícula".

Eduardo, o assassino poderia ter alimentado rancor contra qualquer coisa sim. Poderia ter alimentado rancor contra negros e os matado; e aí seria um assassino racista e seu crime, um crime de ódio. Poderia ter alimentado rancor contra judeus e os matado, e aí seria um assassino antissemita e seu crime, também de ódio. Mas como alimentou rancor contra mulheres e as agrediu fatalmente, isso faz desse assassino misógino, e faz de seu crime um crime de ódio da mesma forma. Estapafúrdio e ridículo é você chamar isso de mero acaso e não perceber que o machismo é uma forma de opressão tão antiga, profunda e arraigada que você consegue ver crimes de ódio em assassinatos de negros e judeus, mas não consegue ver isso contra mulheres.

Nefelibata disse...

Lola, é isso mesmo. No outro texto, aliás, você já trouxe o resumo correto disso tudo, quando cita a coluna do NYT. "Estamos tão acostumados em viver numa sociedade saturada de misoginia que o tratamento bárbaro de mulheres e meninas é mais ou menos esperado".

Temos que ouvir por aí que chamar a chacina do Realengo de crime de ódio é forçar a barra, procurar pelo em ovo, distorcer fatos, ver coisas que não existem. É como se a presunção da realidade normal e natural contivesse o fato da agressão à mulher. Não perceber a misoginia disso é talvez a maior prova da força com que o machismo se manifesta em nós.

Priscilla disse...

Lola, eu comentava isso entre um grupo de conhecid@s e o mais reaça (e jovem entre el@s, sic!) comentou que a idéia de matar só meninas atendia a um próposito fundamentado na misoginia. Então o reaça de plantão sabendo que sou militante dos direitos humanos e feminista soltou: "só falta você dizer que o policial agiu errado". Acredita? A questão não era a ação do policial (que diga-se de passagem agiu no modelo operacional padrão, não atirando em pontos vitais e sm imobilizando-o) que foi correta. O fato em foco eram as motivações que levam vários homens a matar e eliminar as mulheres de modo crudelíssimo, como o caso de Realengo. Enfim, foi um desabafo de uma militante aguerrida, mas irritada com a estreiteza de pensamento de muitas, muitas pessoas mesmo.

Alessandro disse...

Não sei se isso muda algo, mas uma professora declarou que o atirador não escolheu vítimas.

http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI5068434-EI17958,00-Professora+diz+que+atirador+nao+escolheu+vitimas+foi+a+esmo.html

Bau disse...

Concordo, Lola, foi um crime de ódio. Sua discussão tem sido muito boa e importante.

Ciro disse...

O cara lá era misógeno, deveria ter sérios problemas em conseguir se com mulheres. Infelizmente, fez o que fez. Dessa vez, o Prates tinha razão.

Iara De Dupont disse...

Tudo que tenha a ver com a violencia direcionada a mulher tem a mesma resposta: Não é por ai..
Então é por onde ? A única maneira de acabar com isso é ensinando as mulheres a se libertar de tudo isso.Com certeza o caso realengo foi motivado por ódio.Mas as mulheres valem tão pouco no circo da midia que nao mereceram nem que isso fosse dito.Paciencia, só educando podemos mudar isso.