terça-feira, 18 de agosto de 2009

EU GOSTO DE GUARDAR DINHEIRO E FAZER CÁLCULOS

Sei que, quando a gente é jovem, guardar dinheiro pensando na aposentadoria é muito difícil. Imagina só a gente com 20 anos planejando quatro décadas à frente! Não é muito coerente, com tanta coisa imediata pra fazer: sair da casa dos pais, cursar faculdade, conseguir o primeiro emprego, fazer pós, comprar uma casa, casar, ter filhos, viajar, curtir a vida, e todas aquelas realizações que boa parte do pessoal entre 24 e 30 anos faz. Além do mais, como estamos no início da nossa vida profissional, o salário costuma ser menor. Lembro sempre de uma querida amiga minha que conheci no mestrado. Tanto ela como eu conseguimos bolsa da Capes. Mas era março de 2003, e a bolsa estava congelada em R$ 724 havia oito anos (FHC não deu um aumentozinho sequer, um reajuste pela inflação, durante seus dois mandatos de governo). Pra mim, era muito pouco dinheiro, bem menos da metade do que eu recebia na escola onde trabalhava, e que tive que largar pra cursar o mestrado. Pra minha amiga, que tinha só 25 anos na época, aqueles 724 representavam a maior renda que ela já recebera na vida. Certamente 724 reais têm peso diferente pra quem tem 25 e pra quem tem 35 anos. (Só pra constar: o governo Lula deu três aumentos de 2003 pra cá, e hoje a bolsa de mestrado está em R$ 1.200).
Quando eu comecei a trabalhar, com 19 anos, eu simplesmente guardava dinheiro, sem me preocupar pra quê estava guardando. A maior parte dos 10 mil dólares (eu nem tinha conta em banco; a inflação estava em 1,000% ao ano, e eu trocava cruzeiros por dólares) que economizei durante os primeiros sete anos da minha vida profissional eu usei pra comprar a casa onde vivo hoje (que custou incríveis 7,500 dólares - em valores atuais, com o dólar a R$ 2, seriam 15,000 reais. Ok, acho que hoje seria meio impossível encontrar um lugar por esse preço. Minha casa hoje vale uns R$ 80 mil, suponho). Depois de obter a casa própria em Joinville, me permiti ficar sem trabalhar por uns dois anos. Eu ainda tinha alguma rendinha jogando xadrez e alugando a casa minúscula que veio no terreno da minha casa, mas o principal é que eu gastava muito pouco. Lembro de viver um semestre em 1993, antes do maridão se mudar pra cá, gastando apenas 100 dólares por mês. Certo, eu não tinha computador, não tinha carro, não tinha telefone. Mas juro que me senti muito livre ao descobrir que, pra mim, era possível viver com tão pouco. E que ganhar cem dólares por mês exigia um esforço mínimo. Trabalhar pra quê? Essa sensação de que nunca vamos passar fome (a menos que estejamos de dieta) é algo que nosso privilégio de classe média não nos permite perceber. É sério, só por eu nascer dentro de uma determinada classe social, ficou decretado que eu jamais passaria fome. Não ter o que comer não faz parte da minha realidade. Nunca fez, nem no breve período em que eu e minha família não tínhamos onde morar. É verdade que não havia dinheiro pra comprar chocolate, mas ninguém passou fome. Nem perto disso. Com a educação que a gente (classe média) recebe, as amizades que tem, as habilidades que aprende, só passa fome com grande empenho. Bem diferente dos dois terços da população mundial que precisam se preocupar se vão poder colocar comida na mesa a cada dia. Classe média literalmente reclama de barriga cheia.
Mas, voltando um pouco, porque sei que a gente não gosta de ser lembrada dos nossos privilégios, entre 93 e 95 eu me dei ao luxo de não fazer absolutamente nada. E me arrependo um tiquinho. Foram dois anos que eu podia ter usado pra estudar. Pra escrever. Pra trabalhar. Na hora pareceu a coisa certa a se fazer. Afinal, cá estava eu numa cidade nova, ainda sofrendo com a perda do meu pai. Mas, olhando pra trás, esses dois anos “improdutivos” fazem falta!
Eu digo isso financeiramente. Olha só o que acontece se a gente consegue poupar 5 mil reais por ano entre os 24 e os 30 anos. Digamos que você queira se aposentar com 65 anos. Deixando esse dinheiro aplicado, sem mexer nele, durante 35 anos (dos 30 aos 65), e sem poupar nem mais um tostão, aos 65 anos você terá R$ 660 mil. Você só guardou dinheiro durante sete anos, e terá essa fortuna pra gastar até o final da vida (85 anos, por aí?).
Agora, compare com este outro cenário: você achou que pensar na aposentadoria aos 20 e poucos anos era besteira. Então, só começa a economizar com esse objetivo aos 40 anos. Se você guardar 5 mil todo ano, dos 40 aos 65 (ou seja, não mais durante apenas sete anos, mas agora durante 25 anos), com 65 anos você não terá mais 660 mil. Terá 400 mil.
No primeiro cenário, naquele que você poupou durante sete anos, você pode se aposentar aos 65 recebendo R$ 2,400 por mês. No segundo (começando aos 40), com R$ 1,400 por mês.
Isso é por causa dos juros compostos, que são péssimos se a gente tá devendo, mas ótimos se a gente tem dinheiro guardado. Esses dois cenários consideram um retorno de 8% ao ano (rendimento que, é verdade, tá cada vez mais difícil de conseguir). O dinheiro vai crescendo porque ele fica um tempão rendendo.
Lógico que guardar 417 reais por mês, ou 5 mil ao ano, com 40 anos é menos difícil que com 25 porque, em geral, nosso salário aumenta com a nossa experiência. Porém, pra quem não vive de bolsa de mestrado, não é totalmente impossível. O negócio é o seguinte: a gente vai ter que pensar na aposentadoria mais cedo ou mais tarde. Por que deixar pra quando for tarde?
Parece um informe publicitário, mas não é, juro. Até porque me dei mal na única vez que investi num fundo de previdência privada. Voltarei ao assunto.

16 comentários:

Amanda Lourenço disse...

Fico meio com pé atras em pensar na aposentadoria desse jeito, pois fico com medo que daqui a tanto tempo tudo vai mudar. E se os bancos quebrarem? E se uma crise econômica estourar de vez? Dai a gente poupa tanto pra nada.

Mas eu sou como vc Lolinha, gasto muito pouco mesmo. Fora aluguel e contas a pagar, consigo sempre conter meus gastos. Minhas amigas não entendem como eu não quero comprar tantas roupas e produtos inuteis como elas e minha mãe fica abismada quando eu recuso as coisas que ela quer comprar pra mim.

Mas pra essas familias pobres, que passam fome nas favelas do Brasil, por exemplo, da cinco mil reais pra ver o que eles compram: 50 reais de comida e o resto todo em marcas famosas. Eles são pobres e sem educação e moram no coração de um centro de consumo capitalista. Eles olham em volta e tem vontade de ter as coisas tbm. A maior parte deles não consegue fugir desse padrão imposto pelas elites.

Margot disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Fabiana disse...

Lola, por favor me ensina a ser econômica. Eu penso todo dia na minha aposentadoria, mas só consigo guardar dinheiro por meio de um fundo de aposentadoria privada. Tô mal, né?

Anônimo disse...

Nossa, eu sou da época da bolsa de mestrado de 724 reais e 1072 pra doutorado. Lembro de ouvir pessoas desinformadas, que não sabiam o que era mestrado me perguntando: "Vc ganha pra estudar??? Que moleza." Aí (h?)aja paciência pra explicar que não era bem assim. E que como mestranda eu não poderia trabalhar pq as agências financiadoras da bolsa não permitiam.

Eu tinha 23 anos qdo fui fazer meu mestrado mas saí da casa dos pais pra morar em outra cidade e isso significava pagar todas minhas contas sozinhas. Isso morando em cidade do interior onde o custo de vida é mais barato mas mesmo assim, era impossível guardar dinheiro sendo que o aluguel era mais de 1/3 da bolsa. E como nunca houve reajuste da bolsa, mas a todo ano tinha reajuste do aluguel, chegou num ponto onde meu aluguel era metade da bolsa de mestrado. Ainda bem que acabei e começei a ganhar bolsa de doc senão acho que tinha passado fome, pq tinha condominio, água, luz e gasolina. Eu não tinha telefone pq era muito caro, na época não haviam linhas e só o aluguel de um telefone era uns 100 pila.

Agora me explica uma coisa Lola, qdo eu vim fazer meu doc sanduíche aqui nos EUA, a bosla no Brasil era 1024 reais e aqui virava 1100 dolares + uns 60 dolares de seguro saúde. lembro que o primeiro reajsute da bolsa o Brasil foi qdo eu tava pra voltar e defender mas pq a bolsa pro exterior continuou em 1100 dolares? Tá certo que aqui a inflação não é tão gde mas existe tb. Eu já estou aqui há 5 anos e sei que os mesmo 1100 de 2004 não compram a mesma qtidade de coisas que hj.

Lolla disse...

tô guardando com um propósito definido, mas fora isso eu não sei se gosto de poupar. pelo menos não a ponto de me privar de algumas coisas com o intuito de ter dinheiro no banco. guardar pra comprar uma casa, um bem durável, investir em educação ou viagens, tudo bem. mas vai que você passa vinte anos se sacrificando para ter uma grana BOA na aposentadoria e acaba morrendo antes? fala sério.

sabe o que eu acho bem melhor do que poupar? NÃO DEVER. aqui em casa, fora as prestações da casa, não devemos UM centavo para banco, empresas de cartões de crédito e similares. coisa rara, porque naquela época de oba-oba, quase todo mundo aqui achava SUPER normal dever um ou dois anos de salário, o que eu sempre achei inacreditável.

Lola, não sei se você já viu esse anúncio da PETA:

http://lollaloves.blogspot.com/2009/08/one-more-reason-to-dislike-peta.html

(o link tá no meu blog em inglês, mas o texto não é meu; crédito no fim do post).

Nunca gostei da PETA, taí uma excelente justificativa pra continuar não gostando.

aiaiai disse...

Eu também sempre fui supereconomica...é porque não sou consumista, então acaba sempre sobrando!
quando tinha 24 anos, minha conta no banco não estava lá essas coisas e o gerente me disse que só poderia me manter no cheque especial se eu fizesse algum investimento, tipo capitalização ou previdência.
Na hora fiquei na maior raiva, porque sempre mantive a conta com um saldo legal...mas bom, acabei fazendo a tal da previdência privada: foi o melhor investimento que fiz. Hoje tenho uma grana legal e, se eu não gastar vou ter uma renda legal a partir dos 60 anos
como não pretendo parar de trabalhar vai ser um extra e tanto
na verdade minha intenção é tirar a bufunfa toda, assim que fizer 60 e dai gastar muito kkkkkkk

Carla Mazaro disse...

ai ai... eu não sou muito consumista, quer dizer, não muito. Mas adoro comer! Não em restaurantes e talz, mas gosto muito de cozinhar. Se deixar gasto 30 reais cada vez que vou no mercado... só para testar receitas novas...
Acho que gastaria todo meu dinheiro em comida e cinema! hehe

Anna Vitória disse...

Bem, confesso que esses meus 15 anos de vida não me deram ainda muita experiência com dinheiro. Mas achei suas idéias bem sensatas, embora na prática sejam difícil de efetivar, por motivos de oba-oba juvenil.
Mas seu blog é muito bom, eu super gostei.
Beijos

Drixz disse...

Eu realmente invejo pessoas que conseguem economizar dinheiro. Eu sempre fui afobada até com grana. A única vez que economizei dinheiro só serviu pra comprar uma moto que não presta e um notebook q pesa uma tonelada. Estou trabalhando psicilogicamente para começar essa empreitada porque realmente confiar no INSS ou na previdência privada é furada.

Nessa disse...

bah... e eu sobrevivo com a bolsa de apoio técnico, R$ 483, CNPq. caramba!

Masegui disse...

Nunca guardei dinheiro, nunca poupei. Sempre pensei "eu morro amanhã e algum vagabundo vai aproveitar o que eu podia ter aproveitado!"

Tá, às vezes me arrependo de não ter uma graninha sobrando, mas aí me lembro de tudo que vivi e dou muitas gargalhadas...

Meu menino mais velho é munheca de samambaia, pão duro que só ele... mas não aprendeu comigo, juro. Eu sempre gastei tudo que ganhei e não "harará" de ser agora, com 52 maios, que vou mudar...

Boa prova procê!

Társio disse...

Em breve terei 23 anos e nunca consegui ficar num estágio tempo demais para guardar qualquer dinheiro. Com certeza, a primeira coisa que eu farei quando arranjar algo mais seguro vai ser guardar alguns trocados para me mudar... para um apartamento pequeno e muito provavelmente dividido com alguém. hehe

Barbara disse...

Gostei do que vc falou sobre o fato de que nunca vamos passar fome. Eu tive muitos privilegios sim. Ontem estava falando com uma pesquisadora que esta fazendo um levantamento sobre brasileiros aqui em Londres, e eh triste ver como a sociedade de castas do Brasil so se repete aqui. Quem, como eu, estudou em boa escola, aprendeu ingles no Brasil, veio para estudar, tem uma vida melhor do que o povo que nao teve oportunidade nenhuma no Brasil e continua tendo poucas aqui.
Acho que eh nossa obrigacao reconhecer o privilegio. Eu ralei pra burro e aproveitei as oprtunidades, mas tem gente que NAO TEM as oportunidades, ne?
Enfim, eu mudei de assunto, mas eh que eu acho importante ter essa nocao.

Anônimo disse...

Lola parabéns por "pensar no amanhã" digamos assim. Não nasci econômica mas tive avó e tenho mãe com noções muito claras de saber fazer render o salário.E a mais preciosa lição é (com exceção de moradia) nunca faça prestações. Pessoalmente sou um desastre em administração financeira e por isto gostei muito deste post. Sugiro a vc que escreva algo tambem sobre as ofertas de empréstimo a aposentados, que acho uma grande sacanagem.Bj da Fatima

Patricia Scarpin disse...

Lola, eu sou mais ou menos como a Lolla, até gosto de poupar, mas o que me alivia muito é não dever. Meu pai nunca teve controle com o dinheiro dele - aliás, o que ele menos tem em muitos quesitos da vida é juízo - e passamos uns perrengues grandes na vida. Morro de medo de passar por aquilo de novo, tento me precaver de tudo quanto é jeito.

Já tive uma fase mais consumista - gastava bastante com roupas e sapatos - mas de uns 6 anos para cá parei. E foi tão bom pra mim.

Quanto tenho uma meta - como a minha viagem em 2007 pra Europa ou a compra do apê ano passado - guardo dinheiro de maneira ferrenha e não acho difícil (sim, sou chamada de pão-dura mas nem ligo). :D

Anônimo disse...

LoLa, esse assunto (finanças) é ótimo pra vc trazer pralgum post atual... é um assunto feminista!