terça-feira, 29 de novembro de 2005

CRÍTICA: BOA NOITE BOA SORTE e CAPOTE / Lições para jornalistas

Até que enfim vi alguns dos indicados ao Oscar, mas tive de ir até Curitiba pra isso. Lá peguei uma sessão dupla: “Boa Noite, e Boa Sorte” e “Capote”. Os dois têm coisas em comum. A principal é que se concentram em jornalistas. Logo, se me permite, vou falar de ambos neste breve texto.

Pra começar, gostei muito, muito mais de “Boa Noite” que de “Capote”. Já havia gostado do primeiro filme do George Clooney, “Confissões de uma Mente Perigosa”, e é impressionante que um sujeito tão lindo (o novo Cary Grant) ainda tenha cérebro. Lembra uma camiseta que já usei, que dizia, na altura do peito, “All this and brains too” (“tudo isso e cérebro também). “Boa Noite” é curtinho, só uma hora e meia, e quando terminou ouvi pessoas reclamando da duração. Realmente, acho que poderia ser mais longo, mas o charme é ser enxuto, inteirinho rodado dentro de um estúdio, e não gastar tempo com a vida pessoal dos personagens. A história parece meio banal se você sabe minimamente o que foi o macarthismo. Pra quem esqueceu, é o seguinte: na década de 50, em plena Guerra Fria, o pior adjetivo que alguém poderia receber era comunista (como hoje é terrorista). O senador McCarthy promoveu uma caça às bruxas no meio intelectual e artístico, acusando um pá de gente de ser comunista e forçando outras a assinarem confissões como testemunhas. As acusações eram ridículas, claro: “A ex-mulher do Zé Mané freqüentou uma reunião de um sindicato aí vinte anos atrás. Portanto, é óbvio que o Zé Mané é o maior comuna”. Mas serviram pra encerrar a carreira de várias pessoas, como a do roteirista Dalton Trumbo, que ficou sem emprego durante anos, e marcou pra sempre delatores como o Elia Kazan.

Bom, mas nada disso tá no filme. O enfoque aqui é num jornalista televisivo que peitou o McCarthy. Do jeito que o cara é interpretado pelo David Strathairn (o excelente ator de “Rio Selvagem” e vários outros, sempre como coadjuvante), ele não tem humor e fuma mais que uma chaminé. Aliás, por que será que todo mundo fuma tanto em filmes em branco e preto? É pra ressaltar a fumacinha? Fica um efeito bonito, mas é estranhíssimo pra nós, hoje, ver um entrevistador segurando um cigarro enquanto fala na telinha. Há uma única trama paralela menos profissional, a de um jornalista e uma secretária ou assistente (a profissão dela não fica clara, e era um tempo em que poucas mulheres trabalhavam) que precisam esconder serem casados, já que a rede de TV proíbe casamentos entre os funcionários. Isso eu não entendi direito: podia morar junto sem casar? Podia namorar? Mas até essa sub-trama ilustra bem o clima de perseguição e paranóia da época.

O filme é ótimo em discutir a utilidade (ou falta de) da TV, que mais aliena que informa o público. Pode ser um complemento interessante pra “Nos Bastidores da Notícia”, ou seja, obrigatório pra estudantes de jornalismo. Mas é bom também pra toda uma nova geração se inteirar que caça às bruxas é algo perigoso, ainda mais num país que se vê no direito de invadir outros países em nome da liberdade. Pra gente aqui do Brasil, pode ser útil pra traçar um paralelo entre o que aconteceu lá nos anos 50 e o que tá acontecendo aqui e agora. Eu tava pensando nas investigações da CPI do mensalão, onde o réu deve provar que é inocente muito antes que os acusadores provem que o cara é culpado, sabe?

Enquanto “Boa Noite” é tão bom quanto “Munique” e merecedor da indicação ao Oscar de melhor filme, “Capote”, pra mim, deixa a desejar. Conheço bastante gente que amou o drama, mas como li “A Sangue Frio” recentemente, não me acrescentou nada. A trama se resume a uma frase – Truman Capote foi um escritor famoso que nunca mais se recuperou após criar seu mais notório romance. (leia a crônica sobre "Capote").

Nenhum comentário: