quinta-feira, 20 de março de 2008

PIRATARIA, COPYLEFT E SILÊNCIO

O Júlio César fez uma pergunta interessante sobre pirataria. Comecei a responder, me empolguei, sabe como é, e então acabou virando um post. É o seguinte: os EUA pressionam muito países pobres como o nosso pra ter leis mais rígidas no combate à pirataria. Imagina tudo que a Microsoft, por exemplo, deixa de ganhar, porque no Brasil poucas residências pagam pelo software. Mas tem duas coisinhas: eu não tenho a menor pena da Microsoft, ou de qualquer outra grande corporação. E falando com técnicos de computação dos EUA (quase todos vindos de outros países, principalmente da Índia), a gente descobre que aqui também é assim! Eles dizem que o assunto é meio tabu, e que nas empresas o software tem que ser legítimo, mas que nas casas é tudo pirata também. Isso foi uma surpresa pra gente, que está acostumada a ouvir que só país subdesenvolvido, sem leis, uma selva (como diz o slogan de Turistas, “Num país onde tudo pode acontecer...”), tem pirataria.

Aqui não tem camelô vendendo DVD pirata do filme que está em cartaz nos cinemas porque não há camelô vendendo qualquer coisa. Não vou dizer que não existe, mas eu pelo menos nunca vi, nem em Detroit, nem em Chicago, nem em Washington, nem em NY (mendigos, ao contrário, têm de monte). Não é comum o comércio informal nas ruas, em parte porque o desemprego aqui é muito menor que nos países pobres (apenas uns 6%, mas subindo). E ter um emprego formal aqui quase sempre vai pagar mais que um informal, o que certamente não ocorre no Brasil. Mas voltando aos DVDs piratas, há tanta diferença assim entre comprar um de um camelô e download o arrasa-quarteirão da vez no nosso computador? Bom, deve haver, porque eu pessoalmente nunca comprei um DVD pirata, mas já downloaded vários. E claro que no caso do DVD pirata há toda uma rede pra fabricar o troço, que inclusive usa trabalho escravo. E alguém tem lucro com isso (o pobre camelô deve ter o menor lucro). Mas ambos os casos são ilegais. Só que ilegais até que ponto? Pra quem? O movimento do “copyleft” (que usa o cezinho do Copyright invertido, e as palavras “All wrongs reserved”, ao contrário do “Todos os direitos reservados”) defende que direitos de copyright são uma instituição que só visa o lucro. O Copyleft quer que filmes, livros, músicas e obras de arte estejam acessíveis pra todo mundo. Como, sei lá, os blogs, o YouTube, alguns acervos (ainda pouquíssimos) de biblioteca...

Os grandes estúdios vêm fazendo uma campanha apelando pro nosso senso moral. Você já viu, né? Tá em quase todos os DVDs agora. A peça veiculada pergunta se a gente roubaria uma bolsa, se pegaria dinheiro de alguém, e compara tais crimes com download de filmes. Mas isso aconteceu com os CDs de música e vai acontecer com os filmes. Francamente, quando foi a última vez que você comprou um CD? Pro maridão e eu, que somos velhinhos, demorou um tempão até a gente gravar um CD com as primeiras músicas. Mas pense no pessoal nascido em 1990, 95. Essa nova geração provavelmente nunca comprou um CD. Cresceu assim. Não tem o menor pudor em download um filme. No entanto, no caso do cinema, ainda restam outros atrativos. Assim como download um CD não faz ninguém deixar de ir a um concerto de rock, ver no monitor de 14 polegadas um filme gravado com câmera digital tremida, com espectadores passando na frente, não deveria substituir a experiência de ir ao cinema. Ir ao cinema continua sendo uma espécie de ritual. Pra mim e pro maridão é uma das raras ocasiões da semana em que nos animamos a sair de casa pra fazer alguma coisa juntos. E mesmo assim, cada vez mais eu passo a encarar alguns filmes como não merecedores de serem vistos no cinema. Atire a primeira pedra quem não pensou “Ah, esse filmeco vou esperar pra ver quando sair em DVD”. Agora não precisa nem esperar. No meu caso em particular tem menos a ver com os efeitos especiais ou a “grandiosidade” do espetáculo que com fatores de interesse mesmo (quem tá no filme? Quem é o diretor? Qual o tema?). Agora, se os espectadores continuarem a se comportar mal, tagarelando durante o filme, aí é que eu vou perder toda a vontade de ir ao cinema mesmo. É uma questão dos cinemas fazerem campanha. Tem um cinema aqui perto, no centro de Detroit, onde tá impossível ver filme. O público não fica quieto. Passei a sessão toda de O Gângster fazendo Shhhh, e nada. Havia no mínimo três casais, em locais diferentes do cinema, que não se calaram o filme inteiro. E não era com voz abafadinha não. Era uma conversa em tom alto. Eles gritavam pra encobrir o barulho do filme, que tava atrapalhando o papo, sabe? Parei de ir a esse cinema. Mas não é que as pessoas de Detroit são malcriadas e estúpidas, e as pessoas dos subúrbios são refinadas. É que nos cinemas do subúrbio, antes do início do filme, um comercial pede pra que o espectador desligue o celular e não fale com o vizinho, pra não atrapalhar. Claro que já tivemos experiências desagradáveis e precisamos trocar de lugar. Mas uma campanha dessas, veiculada antes de cada sessão, conscientiza o público. Compare com o que tá escrito em letras minúsculas no copo vendido por uma das redes brasileiras: “Fale baixo durante a sessão”. Uh? Fale baixo?! Faça o favor de fechar a matraca, pô!

16 comentários:

Andie disse...

Eu imagino que o download de filmes nao diminui a venda de DVDs tanto quanto o download de musicas faz com cds. Afinal, tirando a capa (a maioria de cds nem vem mais com fotos e letras das musicas mesmo), o cd comprado nao traz nada que voce nao pode baixar na net. O DVD, por outro lado, vem com cenas extras, escolha de cenas, e outros detalhes especiais. E aqui da pra comprar DVD bem barato (minha copia de Legally Blonde custou $4!), e mesmo baixando no pc ainda compro os originais.
Duvido que a galera esteja perdendo tanto dinheiro qto eles fazem parecer... :)

Renata disse...

Eu sou uma defensora ferrenha da pirataria, nao de camelo, mas de baixar coisas em casa. Filmes lesbicos por exemplo quase nao existem em locadoras, e se vc mora longe dos circuitos de festivais [como em floripa] nao tem outra opcao...
Os softwares custam muito caro, sinceramente. num pais como o nosso quem vai pagar 600 pau por um progama? chega a ser um insulto.
em relacao as bibliotecas ainda estamos muito longe da democratizacao da informaçao. principalmente pra quem precisa de artigos cientificos como nos e nao faz parte da rede Muse ou JSTOR, q sao uma mafia. soh com pirataria mesmo...
Abraço,

www.oraculodelesbos.blogspot.com

Suzana Elvas disse...

Essa discussão eu já tive tantas e tantas vezes que dá preguiça de escrever de novo. Porque eu trabalhei com livros/autores disputadíssimos (tipos Paulo Coelho e Harry Potter) e sei que a pirataria, ao contrário do que mandaria o bom senso, tem muitos lados.

Paulo Coelho coleciona edições piratas dos seus livros - e acha graça. JK Rowling manda até a Interpol e a Legião Estrangeira atrás de quem copia os livros dela.

Sim, acredito que distribuição de saber, de cultura tem que ser democratizado. Mas acredito também em trabalhar para viver - e conheço inúmeros autores, músicos de estúdio, figurinistas, contra-regras e outros que dependem da venda do que eles produziram para viver.

Já existe um consenso entre baixar na internet para seu uso particular (como as séries de TV) e para comercializar. Quem gosta mesmo baixa e depois compra.

O consumo descartável faz com que eu goste do grupo KDJH hoje - sabendo que ele vai durar o quê? Uns três anos? Baixo a música, ouço, e adeus. Mas eu compro CDs e DVDs de filmes que são perenes (o ao vivo de 2007 do Led Zeppelin, por exemplo), principalmente infantis.

É uma discussão longa, interminável, em que todos têm razão e ninguém está certo - é o caso de uma tecnologia que literalmente atropelou todo mundo.

PS.: Lola, sou que nem a Elaine de "Seinfield": O Paciente Inglês é o que há de chaaaaato...!

lola aronovich disse...

Tem toda razao, Andie. O preco contribui muito. Vale mais a pena comprar um DVD por 4 dolares de um filme que a gente gosta, todo bonitinho, com capa, com extras, que fazer o download. Nao da pra justificar CDs sendo vendidos a 25 reais... Isso eh um incentivo a pirataria.
Renata, eu ia ate te perguntar como vc ve todos esses filmes de distribuicao hiper limitada. Acho que nao tenho a mesma desenvoltura de vcs, pessoas muito mais jovens, pra encontrar coisas na net. Por que vc diz que Muse e o JSTOR sao mafias?

lola aronovich disse...

Su, eh uma discussao complicada, sem duvida. Eu me sinto otima podendo ler Ensaio sobre a Cegueira sem pagar (se bem que prefiro mil vezes ter o livro nas maos), mas, ao mesmo tempo, penso que escrevo pra internet desde 2000e nunca recebi um centavo. So recebo alguma coisinha do jornal impresso e vendido nas bancas e pra assinantes. E escrever leva muito, muito tempo. Eh como eu disse em outro post: meu sonho de consumo seria pagar uma taxa baixa por mes pra ter acesso a TUDO! Mas como essa taxa seria distribuida entre os autores?

Julio Cesar disse...

Eu só queria uma resposta em duas linhas. :-)

Eu nem conhecia o Copyleft. Eles querem que escritores, por exemplo, não recebam um centavo pelo seu trabalho? Democratização da informação que dizer isto pra mim. É claro que copyright só defende o lucro. Vivemos num mundo capitalista.

Eu também não troco a experiência de ir ao cinema por nada. Mas conheço muita gente que deixou de ir porque pode baixar de graça. Duas salas de cinema aqui fecharam em 2006 por falta de movimento. Então me sinto diretamente afetado pelo meu colega que compra uma cópia pirata. Tem o lado positivo porque faz as empresas repensarem seu esquema de negócio. O preço estava muito alto? No caso dos CDs é um círculo vicioso porque as gravadoras alegam que os altos preços resultam da pirataria. Se mais pessoas comprassem o original, eles poderiam baratear o produto. Mas não acho que isso seja muita verdade. Os downloads de músicas são atraentes pela facilidade. Qual seria o impacto de uma loja itunes no Brasil? Ou o consumidor realmente não quer pagar para ter uma música? Se pensarmos bem, isto sempre existiu. Quem nunca pegou uma fita cassete e gravou o CD de um amigo? Só que agora este hábito ficou fora de controle.

Eu concordo com a Andie, um DVD possui mais atrativos do que um CD. Sou um colecionador de DVD e não resisto ver um Trainspotting por R$ 9,90. Também não tenho pena das corporações. Exploração é chave do sucesso.

Anônimo disse...

sou contra pirataria de arte (música, filmes e afins) porque sou artista e sei o quanto se demora pra compor alguma coisa de apenas 5min, por ex. (seja música ou vídeo) mas não deixo de piratear programas que não dependem da minha contribuição para os criadores pagarem as suas contas do fim do mês, tipo tudo o que vem da micro$oft. da mesma maneira, pago de bom grado por programas que acho justo pagar, programas que uso pro meu trabalho. questão de valores na minha humilde opinião. e acho muita graça de quem pensa que música baixada de graça é igual a que vem no CD. não é. mas aí, o problema não é meu. como disse, questão de valores. quem assiste a um vídeo baixado pela rede num computador, muitas vezes sem som 5.1, sem uma super tela na sua frente, tem o seu retorno justo também. aliás, mostra o valor que dá ao trabalho dos outros. nós que também temos contas a pagar no fim do mês.

Unknown disse...

Eu digo q sao mafia pq soh as universidades q assinam poder acessar os artigos. Universidades como as brasileiras nao tem como, e acabamos nao tendo o mesmo acesso aos artigos academicos. a pergunta eh: como vamos ter uma producao cientifica de valor se nao conseguimos nem ver oq jah foi escrito antes da gente? principalmente num campo como o nosso, de literatura de lingua inglesa, onde a maior parte da producao academica vem de lah.
dae vem o jeitinho brasileiro... oq vc nao consegue por outras fontes, consegue pq algum professor tem uma senha antiga pra esses portais e por ai em diante. a gente tem q ser virar... soh nao pode ficar sem.
mas a questao da pirataria num pais como o nosso sempre volta pro poder de consumo e pro valor da informacao. os estudantes nao tem como comprar todos os livros q usam, entao tiramos xerox. isso eh democratizacao da informacao. oq esse pessoal defensor de copyright quer? nao temos como comprar esses materiais, mas precismos nos educar da mesma maneira.
anyway... jah tive muitas conversas de bar sobre isso... I could go on and on... hahaha
um abraço

lola aronovich disse...

Nao conheço os números de frequência ao cinema, não sei se caíram ou não. Mas o download de filmes afeta a frequência logo na faixa etária mais disputada, a de adolescentes. Daqui a pouco vai estrear no cinema o "88 Minutes" com o Al Pacino. Até eu já vi esse filme (péssimo) no computador. Parece que saiu em DVD em Israel há mais de dois anos, e claro que a cópia se espalhou rapidamente. Mas vai estrear nas telonas americanas de qualquer jeito, porque o Al Pacino atrai um público bem mais velho, que não download filmes pelo computador...

lola aronovich disse...

Aninha, bem-vinda! Acho que é seu primeiro comentário, não? Pois é, pra quem cria e vive de vender seu trabalho é realmente muito complicado que tudo possa ser encontrado de graça na internet. E o público que vai download uma música no computador nunca vai notar que existe diferença entre essa gravação e aquela num CD. Se notar, não vai ligar. Tem um pouco de "cavalo dado nao se olha os dentes". Acho que todo o nosso espírito crítico cai.
Renata, em matéria de artigo acadêmico acho que tudo deveria estar disponível pra todo mundo, e de graça. Aqui nos EUA o pessoal tb tira xerox, nao é só em país pobre não. É completamente inviável comprar um livro porque a gente quer ler um dos 15 capítulos do livro. Não dá. Conhecimento tem que ser democratizado sim.

Anônimo disse...

Oi Lola,

Eu já tinha comentado aqui há tempos, sobre aquele post do Michael Clayton.
Na Europa as bilbiotecas também permitem xerox, todas têm máquinas disponíveis para cópias. Acho que a idéia é um pouco de liberar cópias para estudantes, mas quando você passa ao status de profissional tem o dever de comprar livros/cds/etc, ou ao menos alugá-los ou emprestá-los em bibliotecas e mediatecas. Eu pelo menos penso assim...

Abraços!

Liris Tribuzzi disse...

Esse é um assunto delicado. Nunca comprei um DVD pirata, mas copio em casa (apesar de não gostar muito disso), logo não posso afirmar que sou contra a pirataria. Se a mordida do leão não fosse tão ferrenha por aqui, talvez fosse mais fácil comprar DVDs ou mesmo CDs (não me lembro do último que eu comprei, mas ganhei uns há uns 2 ou 3 anos). O jeito que eu encontrei de comprar filme mais em conta é ir àquelas locadoras que vendem as cópias qndo o filme já não chama mais tanta atenção. Paguei R$15 pelo 'O Grande Truque'. Se eu gravasse o mesmo filme, gastaria R$ 4,50 com o aluguel, R$1,00 com a mídia e R$0,50 com a embalagem.
Até semana passada eu podia dizer que não via um filme fora do cinema se ele estivesse em cartaz ainda, mas uma pessoa me emprestou um monte de filmes piratas e eu tive que ver um pelo menos pra poder comentar. Ainda bem que foi 'Rambo IV'. Pelo menos não gastei nada vendo aquela bomba nos cinemas.
Ah! Não troco uma ida ao cinema por nada! Mesmo pra ver filmes sem conteúdos, ruins, chatos... Nada supera estar sentada numa poltrona de cinema vendo aquela tela gigantesca.

Anônimo disse...

Eu compro DVD pirata copio baixo pela net e faço novos DVDs e cds piratas estou nem ai com seu certo comentario nuncaaaaa vou comprar um original que e um roubo faço copias com qualidade que nunca deu erro nunca vinherao trocar e gostarao da minhas copias que sao muitos boas e outra eu tiro por mes em torno de 6 a 7 mil reais so com as vendas de DVDs legal neh e eu quero que o original se FODA palavra dita Ass. DJ.

Hugo Chávez disse...
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Hugo Chávez disse...
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... disse...

não existe trabalho escravo para fabricar um dvd pirata

hoje em dia é a coisa mais fácil do mundo fabricar um dvd pirata