sábado, 19 de janeiro de 2008

CRÍTICA: SICKO SOS SAÚDE / Um sistema doente

Aqui em Detroit não há muitos cinemas. Os famosos multiplexes ficam mais nos shoppings dos subúrbios, e impressiona como a programação deles é uniforme: só o circuitão comercial! Assim, fomos ver “Sicko” num cinema que não é bem um cinema. É mais um bar, com ingressos a 2 dólares. O pessoal bebe, assiste ao filme, e não conversa com o amigo ou atende celular. A única desvantagem é que todo mundo fuma, argh! De qualquer modo, é incrível o timing do documentário na nossa vida pessoal. Sabe qual foi nossa maior dor de cabeça ao chegar nos EUA? Contratar um plano de saúde, um pré-requisito do governo americano pra estudante estrangeiro poder permanecer no país. A universidade queria nos cobrar os olhos da cara por um plano. Após muita pesquisa, encontrei outro um pouco menos caro. Mas sei muito bem que, se tiver que contar com assistência, vou sofrer pra tê-la.


Este documentário do grande Michael Moore (dos excelentes “Roger e Eu”, “Tiros em Columbine” e “Fahrenheit 11 de Setembro”) conta que cinquenta milhões de americanos não têm plano de saúde. Isso é o quê, um em cada seis? E os que têm não estão em situação muito melhor, pois dependem exclusivamente de empresas privadas, que visam o lucro em primeiro lugar.

O filme narra inúmeros casos escabrosos. Uma mulher que trabalha num hospital e tem plano de saúde pra toda a família não consegue tratamento pro seu marido com câncer. Outra que também tem cobertura através da empresa em que trabalha vê sua filha morrer, porque a companhia arranja uma desculpa pra não arcar com o prejuízo. Um casal com plano de saúde, que até tinha uma boa vida, precisa viver de favor na casa dos filhos após ir à falência ao pagar os impostos do plano. Um cara perde dois dedos e precisa escolher qual dos dois quer costurar de volta: o do meio, que vai sair por 60 mil dólares, ou o anular, por módicos 12 mil. E por aí vai. Mas o mais chocante, e também o que ganhou maior publicidade, é o dos heróis das Torres Gêmeas. Como esses bombeiros não têm direito à tratamento, Michael leva alguns pra Guantanamo, onde os militares americanos afirmam que as instalações hospitalares são de primeira. A hora em que ele põe a bandeirinha americana no barco é de fina ironia. Já que Guantanamo não os aceita, Michael os leva pra Cuba. Lá eles são super bem atendidos, e de graça (o documentário se perde um pouco em seguida e foge do tema ao mostrar bombeiros cubanos homenageando os americanos. Mas aí já estamos no fim. O pedacinho que eu não gosto vem antes: expatriados ianques falando sobre suas vidas em Paris).

Há também vários momentos preciosos, e o humor típico do Michael, como na hora em que ele mostra uma americana cruzando a fronteira pro Canadá pra tentar atendimento lá, e justifica: “Somos americanos. Quando a gente precisa pegar alguma coisa num outro país, a gente invade”. É difícil de acreditar, mas existe realmente americano se casando com canadense só pra conseguir assistência médica. Tem até um site pra isso, hook a canook. Mas talvez meu momento preferido seja quando o Michael tá na França, correndo atrás de algum vestígio que indique que as pessoas precisam, sim, pagar algo num hospital público, e ele encontra um caixa. Ahá! Pra quê serve um caixa, se é tudo grátis? É que o governo francês dá dinheiro pro paciente gastar com transporte na volta pra casa...

O documentário é um tratado defendendo os ideais da esquerda, e tem mais é que ser provocativo. À certa altura Michael inclui imagens de uma Inglaterra em frangalhos, após a Segunda Guerra, e a decisão de reconstruir o país com assistência médica gratuita para todos. Um ex-membro do Parlamento fala de democracia, e diz que, se um país pode pagar seus cidadãos para matar pessoas em guerras, pode perfeitamente bem pagar saúde e educação. É uma questão de priorizar as necessidades. E não resta dúvida que a prioridade do Bush é o “combate ao terrorismo” (bota aspas nisso).

Claro que o Brasil não é nenhum modelo de sistema de saúde gratuito, mas não é essa a discussão. Os EUA são o país mais rico do mundo, um verdadeiro império. O Brasil é um país pobre. E, ainda assim, eu e o maridão, que não pagamos plano de saúde privado, temos acesso a um SUS bem razoável quando precisamos (se não morássemos em Joinville seria diferente, eu sei). Eu já imaginava, mas depois de ver “Sicko”, tenho certeza: se eu ficar doente, prefiro o SUS de Joinville ao plano de saúde que comprei aqui.

4 comentários:

Raiza disse...

Gente,não tem nenhum comentário nesse post? o.0
vou fazer um,sei que provavelmente você não vai ler porque o post é antigo,mas enfim...gostei bastante do post,não vi o documentário e nem vou ver (sou fraca pra cenas de pessoas doentes),mas gostei muito do que escreveu,e principalmente da declaração do inglês de que se o país pode pagar pra matar,pode pagar pra curar também.é isso mesmo,só que infelizmente a grande maioria do mundo tem uma noção mais "alternativa" de prioridades...
www.garrafaaomar.zip.net

Kaká disse...

Eu tambén vim comentar nesse post (muito bom, por sinal) só agora porque vi o filme hoje. :)

O que me impressionou foi a propaganda que eles usaram nos anos 50 ou 60 com o Ronald Reagan dizendo que esse negócio de socializar a saúde era coisa de comunista, que o médico não ia poder escolher onde morar, etc. E o casal canadense que paga seguro saúde para passar dois dias nos EUA.

Quando eu sofri um acidente de carro e quebrei a bacia fui atendida no hospital público aqui em Fortaleza, muito bem atendida por um excelente médico. Eu também não tenho plano de saúde, mas eu acho que o Brasil infelizmente está se encaminhando mais para o sistema americano do que para o inglês/francês.

Leila disse...

eu e seus posts antigos né..
vamos lá, não sei exatamente como funciona o sistema de saúde americano mas ouvi dizer que é péssimo, apesar que o atendimento emergêncial parece-me que é bom, se nao me engano os hospitais ganham desconto nos impostos por oferecerem emergência a população.
De qualquer maneira, o namoradão (só pra te acompanhar no maridão) é cidadão canadense e me disse que só por ser cidadão você tem um tipo de plano de saúde, mas não soube me explicar direito.
Agora finalmente sobre o SUS, tive que aprender sobre ele na aula de saúde pública, na teoria ele é o melhor sistema de saúde já desenvolvido, eu sei que não funciona tão bem, mas ele também não é aplicado na maneira que deveria ser, mas é simplesmente as três instancias (cidade, estado, país) aplicando dinheiro e esforços em um mesmo sistema, dessa maneira é mais facil identificar e resolver os problemas.
Bom não vou esplicar detalhadamente, mas um dia se vc quiser eu conto

Navarro disse...

Dahora!!

gostei do jeito q foi tratafo o filme, dando destaques q algumas partes marcantes dele!!
tava ate precisa disso pq vou fazer uma resenha critica do filme pra escola e vou pegar alguns exemplos...vlws gostei mesmO!