quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

GUEST POST: O FLAGELO DA AUTO-FLAGELAÇÃO

Ano passado, ao assistir ao magnífico documentário Miss Represention, descobri algo totalmente alheio a minha realidade: que 17% das adolescentes americanas se auto-flagelam. É um dado alarmante, e no Brasil não deve ser diferente.
A primeira coisa que pensei foi que elas se auto-mutilam porque não gostam de seus corpos, mas já recebi mais de um email dizendo que não é bem assim. Ainda não sei muito sobre o assunto, e nunca publiquei um post sobre isso. Este é o primeiro, da G. Outros virão, porque o autodano (como o chama a G) está longe de ser um problema isolado.

Às vezes eu me sinto feia, feia e imprestável. Mas é como se tivesse uma outra mulher em mim me mostrando isso. Não era assim um tempo atrás. Eu sempre me senti muito bem comigo mesma, nunca tive conflitos com meu corpo, com meu comportamento. Sempre consegui ficar com os rapazes que eu queria, chegando neles. Se eles contavam para os amigos no outro dia que tínhamos transado, não me incomodava. Eu não ia me reprimir sexualmente por causa do machismo deles.
Nunca havia me sentido oprimida por um padrão de beleza. Sequer pensava nesses assuntos ou me pautava por eles. Acontece que de um ano pra cá comecei a me sentir ansiosa, feia e invisível. Essa ansiedade vinha em forma de crise, à noite. E uma dor emocional insuportável tomava conta de mim. Eu só sentia vontade de sair do meu corpo, de não ser mulher. Xingava e amaldiçoava o fato de ser mulher. Tinha a ideia de que se não fosse mulher não me sentiria insuficiente. Suficiente para mim mesma, eu sou. Mas parece que o bem estar depende do olhar dos outros. A dor emocional é de fato muito grande e incontrolável. Nesse momento não consigo pensar em coisas agradáveis, só consigo encontrar um monte de defeitos pra mim.
A única forma que encontrei de acabar com essa dor é me machucando. Daí a dor física alivia meu sofrimento. Eu me arranho até sangrar, nas costas, nas pernas. Um dia eu fiquei tão descontrolada que dei muitos tapas no meu rosto. Ele ficou inchado, com hematomas. Tive de ficar em casa, escondida por três dias. Nesse dia eu estava com raiva de mim, achei que merecia mesmo apanhar.
Ao lado disso está a pornografia. Como me incomoda! Dói! Machuca! Percebi que só me fazia sofrer porque a minha relação com o meu corpo era de objeto. Via a pornografia como concorrente porque me considerava um objeto. Pensei em como isso é cruel. Eu mesma não me enxergando como ser humano. Só de pensar em pornografia eu tinha crises e me machucava. A bunda passou a ser um foco de sofrimento. De repente a bunda  representava tudo o que eu não alcançava. 
Daí me lembrei de um detalhe: quando eu entrei na adolescência minha mãe, ao me ver nua, criticava a minha bunda. Dizia: “Sua bunda é feia. Homem não gosta de bunda assim!” Na época não me incomodava. Minha mãe, fruto de uma criação machista, sempre me colocou no lugar de sua concorrente, e isso começou quando entrei na adolescência. Sinto muita raiva dela enquanto me bato, porque sei que essa insatisfação comigo vem dessa criação para o prazer do homem. Como já escutei: “Você tá com cabelo debaixo do braço. Homem não gosta.” “Você não limpa a casa direito, por isso, quando você tiver um marido, vai apanhar” “Você se veste igual a um menino!" Eu debochava dessas coisas porque sabia que não queria fazer o que um homem esperava.
Quando quis terminar meu primeiro namoro, com 17 anos, minha mãe me privou de dinheiro para pagar minhas contas dizendo que eu tinha de ver que precisava do meu namorado, que cuidava de mim. Sugeriu que eu engravidasse dele para reaver o amor. Ela deixou que ele me xingasse, não acreditou que ele tinha me agredido... enfim. Bastante conturbado. Mas eu saí fora disso, prestei vestibular e fui estudar em outra cidade contra a vontade dela. Por isso não conversamos até hoje. Em resumo, eu quis fazer faculdade no lugar de casar. 
Passados dois anos, ela, nos quarenta, vendeu nossa casa pra fazer cirurgia plástica. Levantar os seios, cobrir a cesariana, tirar a barriga... Esconder sua história para continuar agradando os homens. Ficou sem casa mas recauchutada. 
Eu estava muito chateada com minha mãe. Ela não trabalha, vive de pensão. Estou aprendendo a percebê-la como uma vítima cruel do machismo, e menos pior, ela usa o machismo “a seu favor”. Acontece que essas coisas que nunca tinham me incomodado vieram à tona como valores importantes logo no meio da minha faculdade, longe dela, quando estou num relacionamento agradável, com um grande companheiro. Eu consigo separar as coisas racionalmente, mas meu corpo sente tudo que eu não controlo. 
O ciúme doentio é outra coisa que eu nunca tinha sentido e achei que nunca sentiria, e o que mais faz com que eu me fira. 
Bem, fui saber sobre autodano, estudar feminismo. Tudo tem me ajudado muito. Me arranhava até ficar em carne viva, uma vez por semana eu tinha uma crise. Isso aliviava minha dor. Não me machuco mais com tanta frequência. Estou recuperando minha autoestima e deixando de lado a “outro estima”. 
Uma coisa que adotei foi abolir as palavras “bonita e feia” do meu vocabulário. Mulher não precisa disso. Essa donzela de ferro de que fala Naomi Wolf me fez enxergar exatamente a que estamos sujeitas. Me proponho a estudar a condição das mulheres que sofrem violência, e está aí mais uma modalidade de violência de gênero. Especificamente as mulheres pobres, como eu. O machismo nas classes baixas ainda está lá nos anos 50 em muitos fatores. 
Relutei em me considerar feminista porque não tenho condições de dividir a conta do restaurante, parece condição para toda feminista que vejo! Só que meu companheiro ganha vinte vezes mais do que eu. Daí defendo agora que diferença de gênero não é o mesmo que diferença de classe. Pobres podem e devem. Me considero uma mulher independente, que busca autonomia
Enfim. Precisava contar pra aliviar. Gratidão! Parabéns pelo seu trabalho, Lola, que também foi essencial na minha conquista de autonomia.

60 comentários:

Bia disse...

Como é bom não estar sozinha...

LaGi Schneider disse...

acredito que essa auto-flagelação tenha ocorrido em grande número, aqui no brasil, mais nos últimos dez anos... conheci muitas gurias que se cortavam, não era algo explícito, sabia porque tambem o fazia rs
ótimo texto, sincero e...que mãe, hein, que tristeza... que imaturidade =s

Anônimo disse...

Que dor enorme na alma vc deve sentir, ha tantas coisas que não compreendemos e creio que isso é o que desencadeia ainda mais os processos a que você se refere, porque vc fala que racionalmente entende as coisas mas simplesmente é algo maior.
Eu te entendo, tenho uma amiga que é esclarecida e me fala que racionalmente sabe bem das coisas, mas não consegue se livrar de um relacionamento doentio que tmbm é uma auto flagelação né? no caso dela a mãe é o oposto extremamente "amorosa" porém manipuladora chantagista, acho que deve ter alguma relação.

De todo modo não se sinta só, e procure encontrar algo que lhe agrade para focar sua mente, em uma certa época da vida eu passei por um momento ruim e sei que me sai melhor pois foquei em que algo que era maior que eu, algo que me fazia sentir mais útil e viva.

Abraços e força

Soraia

Katy disse...

Eu lembrei do filme "secretária"...
Eu já tive momentos de me odiar, de querer me matar e tal... mas nunca nem me arranhei, não tenho coragem... fico pensando que se nem eu me amar, como os outros poderão?
E acho esse pensamento ridículo tbm...

M. disse...

Essa coisa de auto-flagelo é muita estranha... comecei a me cortar quando tinha uns 13 anos. Nunca tinha visto ninguém fazer isso. Fiz porque senti vontade, ninguém me "ensinou". Eu morava no interior e me cortava em partes do corpo que tinha certeza, nunca estariam expostas. Hoje, aos 27, casada e com duas filhas, não faço mais isso. Mas acho curioso saber, que em outros lugares, por motivos diferentes, outras adolescentes façam a mesma coisa.

M. disse...

Quando comecei a me cortar acreditava que a dor física pudesse canalizar a dor sentimental que eu não sabia de onde vinha e que não podia controlar...

Anônimo disse...

Nossa tadinha dela ein... A mae é tudo de ruim que existe e ela é um menina " inteligente " que quer se libertar do machismo. Falando serio, qual o problema se a sua mãe quer mudar o propio corpo para " agradar os homens (não acredito muito nisso não)"? O corpo nao é dela? E se ela quiser vender a propia casa para pagar as operações? O que você tem com isso?
Eu concordo que o fato da sua mae viver de pensao é horrivel. Você ainda é menor de idade?
Quanto a sua bunda, eu acho que você esta sendo dramatica demais. E acho que com a idade você vai mudar de ideia. Eu tenho uma mancha imensa na coxa direita, quando eu era mais nova escondia de todo mundo, tava sempre usando calça jeans ou vestido longo e com parte de baixa bem justa. Minha irmã sempre riu de mim por calsa da mancha, entao eu começei a achar que qualquer pessoa tambem iria fazer o mesmo. Se a minha irma, que deveria me apoiar, achava a mancha nojenta , oque as outras pessoas, que nem me conhecem, achariam? Quando eu passei para uma facul no rio de janeiro o calor ( e a ajuda de uma colega de quarto, que nao viu nada demais na mancha) me fizeram começar a usar shortinho. Algumas pessoas reparavam na mancha, mas nunca recebi nenhum comentario ofensivo. Hoje em dia eu acho minha mancha um charme. Muito provavelmente sua bunda nao deve ser feia, isso deve ser só coisa que a sua mae plantou na sua cabeça.
Enfim beiijos e boa sorte.

Mirella disse...

Caramba!


G., você já experimentou procurar uma ajuda clínica? A cidade em que mora é grande? Procure universidades com programa de psicólogos gratuitos. Acho que isso pode ajudar você demais. Como seu companheiro lhe ajuda nestes momentos?
Olha, honestamente, sei nem o que dizer. Apenas procure ajuda o quanto antes, pois você só tem a ganhar. Sei que é complicado ter uma relação tão conturbada com sua mãe, mas infelizmente não há muito o que fazer com ela. Acho que, em primeiro lugar, você deve tomar conta de si (para ontem!). Depois, se for importante para você, tente conversar com ela, retomar o contato - mas só depois de ter restabelecido seu equilíbrio! Ela é sua única família? Você tem amigos mais chegados? Acho muito importante você se cercar 100% de pessoas que amam você e com as quais pode contar.
Quanto ao seu feminismo, olha, ele serve para lhe empoderar! Não é para se sentir mal se você ainda não tem condições de se sustentar plenamente, de ser totalmente independente. É para você se sentir bem de escolher seu próprio caminho, ir atrás dos seus sonhos. Não dá para você, com menos condições, querer equiparar as responsabilidades assumidas. E lembre-se que é temporário, pois você está estudando e trilhando o caminho para tal. Relacionamentos são assim, quando um pode e outro não, um ajuda o outro. Você tem um companheiro, tenho certeza que ele entende e que, se fosse o contrário, você faria o mesmo por ele. Isto não te torna nem um pouco menos feminista.
Força, mulher! Cerque-se de pessoas que te amam, em quem você confie. Cuide de si, e vamos seguir adiante com este empoderamento, hein?

Anônimo disse...

Eu não me corto nem me arranho, só que tenho o hábito de descascar minha pele das mãos e pés. É horrível e vergonhoso, faço até machucar, mas não consigo parar.

Não sei se isso pode ser considerado auto-flagelação

Unknown disse...

anon 12:53..."Nossa tadinha dela ein... A mae é tudo de ruim que existe e ela é um menina " inteligente " que quer se libertar do machismo."

Não tem pra que ironizar, visto que a autora do guest em nenhum momento coloca a mãe como tudo de ruim e inclusive relata vê-la como vítima e como reflexo de coisas bem maiores.

Pronto, te ajudei a ler além daquilo que convém pra poder criticar nos comentários. De nada.

Anônimo disse...

Todo mundo quer igualdade, o que ninguém quer é dividir a conta...

Unknown disse...

Eu nem imaginava que as adolescentes se auto-flagelavam mais que os adolescentes.


Antes que venha alguém dizer que é uma característica feminina (o senso-comum é previsível) eu só digo que acho que é uma característica de quem está sofrendo e não sabe como lidar.

E a opressão (de todos formas, e eu diria que principalmente as mais "sutis") pra cima das mulheres causa sofrimento.

ViniciusMendes disse...

Faço coro com a Mirella, acho que se for possível, é fundamental que a autora do guest post procure ajuda clínica. Não só ela alias, qualquer pessoa que se corte.

@Anônimo das 13:24
Não sou psicologo e se eu fosse não ia sair dando diagnóstico pela internet :P Mas isso pode ser ansiedade das brabas.

Anônimo disse...

Pior que isso são pessoas que debocham de adolescentes que fazem isso pelo simples fato de serem adolescentes.
Hoje mesmo no Facebook vi uma postagem de uma página ironizando e tratando com desdém os jovens que fazem isso.

Anônimo disse...

Quando eu era adolescente, eu também me auto-flagelava. Mas, nunca, de forma alguma, por imposição da sociedade ou porque me sentia imprópria para os homens ou coisa do tipo, mas porque eu me odiava mesmo, odiava minha vida e o corpo que eu vivia, e sentia vontade de retalhar ele. E eu fazia isso. Não fazia para chamar atenção, aliás, cortava na parte interna das coxas, porque tinha pânico que alguém visse, não fazia porque era dramática, simplesmente eu sentia dor, e ódio, e alguém tinha que pagar por isso. E a culpa era minha, certo?

Hoje não faço mais isso. Faz uns oito anos que eu parei, mas de vez em quando, nas minhas piores crises, eu ainda tenho vontade de retalhar meu corpo. Eu ainda me arranho, me belisco, e se fica insuportável, eu "me dou de presente", só "um cortezinho", para tentar fazer passar. Às vezes funciona, às vezes eu fico desesperada por mais. O que eu tento fazer é me cortar num lugar em que as pessoas possam ver, porque então não posso me cortar mais de uma vez. Um corte, eu posso dizer que bati em algum lugar, que foi sem querer. Mas não posso explicar mais de um.

Já fiz terapia, tomo remédio, mas é sempre uma luta constante. Pelo menos, para mim, a vontade sempre aparece por aqui, e fica pairando de vez em quando. E haja força.

Raíssa disse...

Tive umas fases ruins na adolescência, mas nunca cheguei a me cortar. Espero de verdade que você melhore, que encontre felicidade e pare de se odiar, é muito triste que tantas meninas passem por isso, que se odeiem por ser mulher... como o pessoal ali em cima falou, talvez você precise de ajuda psicológica ou talvez mesmo encontre a solução em você mesma, de qualquer forma, te desejo melhoras. Um abraço

Ana Beatriz disse...

G. eu sei mais ou menos o que vc passa. Eu sinto a mesma coisa - eu me arranho e puxo/arranco meus cabelos, também por ansiedade, principalmente quando acho que minhas ações estão sob o escrutínio alheio. Eu me solidarizo com você, e ofereço meu apoio.

Daniele disse...

Isso me lembra a musica "clarissa" da Legião.
"E Clarisse está trancada no banheiro
E faz marcas no seu corpo com seu pequeno canivete
Deitada no canto, seus tornozelos sangram
E a dor é menor do que parece
Quando ela se corta ela se esquece
Que é impossível ter da vida calma e força
Viver em dor, o que ninguém entende
Tentar ser forte a todo e cada amanhecer."

Recentemente descobri que um amigo da faculdade se corta, fiquei bem chocada, gosto muito dele e queria poder ajuda-lo.

Gabriela Luzia disse...

Nossa, consegui sentir na pele a sua dor. Espero que você consiga superar tudo isso, fico feliz que tenha conseguido erguer-se e encontrar um companheiro que a ama. Com certeza você merece.
Tenho meus momentos de self-harming. Acho que é porque às vezes a dor é tão grande que quando a gente se corta desvia, o corpo foca em outra coisa - e alivia, externa. Acalma.
Que bom que você entende que NÃO é sua culpa. A sociedade tende a santificar os pais, como se tudo que eles fizessem fosse justificado com aquele jargão: "eles só querem o seu bem", como se a culpa por nos sentirmos desconfortáveis/tristes/depressivas com o tratamento vindo deles fosse nossa: não é. Me alegra saber que você se desvencilhou dela.
Já pensou em fazer terapia?
Abraço!

Anônimo disse...

Daniele (do comentário acima)

Ao longo da vida a gente vai descobrindo coisas terríveis dos amigos, mas a maturidade nos mostra que o melhor que temos a fazer é ficar sempre ao lado deles, é só disso que eles precisam, a sociedade de um modo geral tende a se afastar das pessoas quando elas estão mal em alguma coisa. Fique por perto e apenas ouça seu amigo, acredite é uma ajuda sem tamanho.

Como falei acima tenho uma amiga passando uma coisa que me faz ficar muito muito triste, mas decidi que mesmo sentindo raiva até dela as vezes, vou ficar com ela, vou ouvi-la sempre sem julgar espero de coração que as coisas melhorem para ela.

Soraia

Anônimo disse...

" Ana Beatriz disse...
G. eu sei mais ou menos o que vc passa. Eu sinto a mesma coisa - eu me arranho e puxo/arranco meus cabelos, também por ansiedade, principalmente quando acho que minhas ações estão sob o escrutínio alheio. Eu me solidarizo com você, e ofereço meu apoio."


Tricotilomania. Também sofro. A minha sorte (acho) é que tirei o foco do cabelo e sobrancelha (era onde eu mais tirava quando ficava ansiosa, tanto que uma vez estava cortando o cabelo e o rapaz perguntou se eu tinha problema de calvície) e fui para outros locais.

Dói, na pele e na alma também. Pq parece bobo, parece besteira, mas não é.

O que me ajudou foi tratamento com ansiolítico e antidepressivo.

Julia disse...

Não consigo entender esse processo de auto-flagelação. Quando eu to com raiva eu a projeto para fora.. nunca em mim mesma. Entao é mais fácil eu quebrar coisas do que me dar um beliscão que seja.

Bunny disse...

Não sei oq dizer pq se soubesse eu já teria parado, só quis dizer... cutter aqui. Desde os 14 anos (tenho 24). Ando o tempo todo de manga longa, nao importa quão calor, pra esconder, pq qdo to em crise esqueço q outras pessoas podem ver e acabo cortando onde é mais fácil e nao onde dá pra esconder melhor.
É horrível ter q explicar as pessoas.
(Esse comentário vai ter um trigger, que pode desencadear reações em quem já se machuca, então não recomendo ler se for o seu caso)
Pq assim, qdo me corto eu sinto um alívio, um prazer quase orgástico, mas não tem nada sexual. Não faço por prazer, simplesmente, de modo algum.
Começa numa crise. Uma ansiedade. E o ódio que sempre senti e sempre sinto de mim mesma aflora, muitas vezes por ser tão burra e estar em crise por algo, muitas vezes, tão bobo. Eu começo a amaldiçoar os meus sentimentos excessivamente intensos pq parece q o mundo todo tá pegando fogo e minha cabeça gira e eu só quero que aquilo pare.
Então eu me corto.
E passa, quando mais fundo, quanto mais sangra, mais calma eu fico. Vem aquele prazer imenso de dever cumprido, tão intenso quanto a angústia anterior, e me acalma. Ao ponto da angústia passar e eu pensar "WTF como vou esconder isso"
E é dificil explicar a relação, mas eu acho que de certa forma é uma punição. Quando me corto eu digo a mim mesma o quanto sou burra e insignificante e idiota e [insira aqui qualquer adjetivo pejorativo que imaginar]. É meio que o meu modo de dizer ao universo que eu não esqueci o meu lugar, que sei q sou mais abeçoada nessa vida doq mereço, q eu sei q deveria me esforçar mais pra ser uma pessoa melhor e q sei q mereço sofrer por não me esforçar o suficiente.
(Eu sei, pode parecer idiota se vc nunca passou por isso, mas acredite, eu sinto cada uma dessas coisas. E que bom que vc não sente. E sim, eu sou idiota por sentir, é por isso q me corto, duh)
Por outro lado, existe uma coisa estranha, mas de um jeito simbólico, a dor interna é externada. Não sei dizer como nem porque. Mas aquilo sai de dentro de mim pelos cortes como se corresse no meu sangue.
Entao não, não é saudável, mas me ajuda de um jeito q muita gente nao conseguiu fazer. E eu deveria parar, é oq me dizem, mas honestamente, nao fossem as cicatrizes e a possibilidade de uma infecção, eu não teria porque. Por mais que me digam que eu não devia me odiar assim, isso não me parece argumento suficiente.
(Pra quem se perguntar, eu faço acompanhamento psiquiatrico. Ele disse que minha auto-flagelação é causada pelo distúrbio borderline, que faz com que as emoções sejam tão intensas que a gente não aguenta.)

Fernanda disse...

Lendo esse post, eu lembro que me autoflagelei na adolescencia. Mas foi multifatorial:

Eu tinha largado a minha profissão de bailarina clássica, que era tudo pra mim, e tinha feito isso justamente pq não me enquadrava no duro padrão estético exigido (hj sou professora de ballet);
Eu estava passando por crises horríveis pq estava sofrendo as consequencias de abusos sexuais sofrido anos antes, e quem abusou de mim foi o meu avô, e isso na época, com hormônios a flor da pele estava realmente me incomodando;
Eu estava apaixonadinha por um otário.

Então achei que a dor física era mais fácil de sentir do que aquele buraco infernal que eu estava sentindo na alma.

Eu me mutilava com um estilete, no dorso da mão, e minha mãe achava que era meu gato que fazia aquilo.

E tem gente que acha que é só piração de adolescente.....O.o

Anônimo disse...

Interessante, também tenho tricotilomania. E gosto de fazer feridas não cabeça tb, engraçado pensar nisso como um autoflagelo, nunca encarei dessa forma. Sempre achei que era muito mais uma mania, um toc, do que isso. Mas faz sentido pq a sensação de dor alivia a ansiedade. Com o tempo vc não sente mais dor, mas o ato, a dor, a repetição alivia momentaneamente a ansiedade.

Anônimo disse...

"Antes que venha alguém dizer que é uma característica feminina (o senso-comum é previsível) eu só digo que acho que é uma característica de quem está sofrendo e não sabe como lidar.

E a opressão (de todos formas, e eu diria que principalmente as mais "sutis") pra cima das mulheres causa sofrimento."

Todo mundo sofre. Mulheres se auto-flagelam mais porque tendem a simplesmente se deprimir em face aos problemas, enquanto a maioria dos homens sente mais raiva do que tristeza, tenta reagir.

Edson disse...

Uma amiga minha me contou que ela fazia a auto flagelação, eu não perguntei muita a respeito na epoca, pq achava que era algo muito íntimo e doloroso pra ela falar sobre aquilo. Infelizmente já não tenho muito contato com ela (só troquei uns 3 e-mails com ela no final do ano passado).
Nunca passei por isso, mas consigo compreender os motivos (não que eu ache correto fazer isso).

Eli disse...

Pois é, parece q isso é mais comum do q a gente imagina.

Eu tinha uma amiga q se cortava, os pais se separaram qndo ela era criança e nenhum deles queria ficar com ela, depois a irmã dela jogou isso na cara dela. Ela cresceu com raiva da família e de si mesma e se cortava por isso. Ela disse q ela meio q queria morrer (ela se cortava no pulso), mas não queria, talvez ela n tivesse coragem de se matar. Um dia um amigo dela morreu num acidente de carro, acho q ela se sentiu culpada por ter uma vida toda pela frente e pensar no amigo q n tinha mais isso, depois disso ela nunca mais se cortou.

Thaís disse...

Hoje estava no banco. Numa dessas filas de 2h. Havia um casal com uma filha de uns 3 anos. A menina estava inquieta e falando alto, estava entediada, gritava de vez em quando. Aí ela berrou.
A mãe instantâneamente falou:
- NÃO FAÇA ISSO. VOCÊ TÁ FICANDO FEIA!
E ela retrucou:
- NÃO! (em outro berro) Mamãe, não sou feia!
- Mas está sendo! Pára de gritar e se comporta.

Me pareceu loucura. A mãe até então tinha falado de tudo e nada funcionava para a criança parar, mas foi só dizer que ela estava feia que a menina reagiu na mesma hora e ficou quieta.

Isso não deveria dar poder à uma pessoa. Bonito e feio são construções sociais.

É errado barganhar ou julgar alguém a partir dessas classificações.

Você é mais forte que isso, fique bem <3

Julia disse...

Anon 19:24
Que explicação simplista, hein?

Carol NLG disse...

Sabe, no inicio da minha adolescencia eu era o tipico patinho feio. Gordinha, nerd, tinha excelentes notas, introvertida.

Pra mim, ser chamada de bonita era quase um xingamento. Quase ouvir que era burra.

E nessa epoca, eu comecei a me cortar. Começou com uma cicatriz de verdade. Um corte bobo no braço. Minha mae ficou horrorizada que eu ia ficar com cicatriz. Dentro da minha logica, a cicatriz me deixaria feia - mas ao mesmo tempo mostraria a quem quisesse ver que eu era forte.

Eu tenho varias cicatrizes no antrebraço ate hoje daquele periodo.

Demorei muito tempo pra começar a ver que eu nao tinha que escolher entre ser bonita e inteligente, feminina e feminista. Eu poderia ser eu mesma. Durante MUITO tempo me senti diminuida em termos de aparencia. Tenho uma irma que sempre foi magrinha, dentro dos padroes. Eu fui colocada de regime - vigilantes do peso - pela primeira vez aos 8 anos. 8 ANOS!! Aos 18, ganhei de presente uma lipoaspiração. Sinceramente, não culpo meus pais por isso. Eles refletiram em mim tudo o que queriam pra filha: ser bonita, inteligente e bem sucedida. Quando comecei a descobrir que sou, sim, bonita, muita coisa mudou, até no meu relacionamento com elez. Hoje eles aprenderam a não mencionar que eu ficaria tão melhor num manequim 38 que num 44. Eu digo que estou, sim, feliz com meu 44. E isso deveria ser o bastante. Sabe o mais engraçado? Passou a ser. Minha mãe até mencionou, recentemente e meio sem querer (e na frente da minha irmã, tadinha) que sempre me achou a mais bonita das filhas.

lola aronovich disse...

Carol NGL, querida, hoje li duas coisas suas que me deixaram de olho arregalado: isso que vc estava ansiosa pela visita dos seus pais, o que eles iam achar da limpeza da casa, e que eles gostaram -- mas mesmo assim fizeram faxina! (engraçadinho, mas ridículo. Lembro quando minha mãe foi me visitar pela 1a vez em Joinville, e só faltou mudar os móveis de lugar! Acho falta de respeito).
E agora essa de colocarem vc (ou qualquer pessoa) com 8 anos num vigilantes do peso! Tenho certeza que não fizeram por mal (assim como sua mãe não deve ter feito por mal falar que sempre te achou a mais bonita das filhas), mas... Pô, meio sem noção os seus pais! Sei que vc gosta muito deles, dá pra ver, mas a distância também ajuda, né?
Abração!

Alice disse...

Nunca me cortei, mas desde muito pequena me auto-flagelei. Lembro de aos 3 anos minha mãe chamar minha atenção pq estava me machucando ao cutucar uma ferida no meu raço direito. Me machuquei nesse mesmo local por muito tempo, tenho até hoje a cicatriz. Tenho 30 anos e até hoje me machuco, mas ao contrário do relato e de muitos comentários, não é uma punição consciente. Eu não me xingo ou penso que mereço no momento que estou fazendo, na verdade, eu nem percebo, só me dou conta do que aconteceu quando vejo o sangue escorrendo ou quando sinto dor. Em momentos de ansiedade, na presença de outras pessoas, eu puxo a pele da lateral da unha, até que sangra. Curiosamente, eu só fui perceber que isso era um auto-flagelo quando assisti Cisne Negro, e vi a protagonista fazendo a mesma coisa. Hoje tenho muitas pequenas cicatrizes na pele, que eu nem sei porque as fiz. Tento não fazer mais, mas ainda não consegui sair desse automático. Não sei se conseguiria falar tudo isso com um terapeuta...

Anônimo disse...

Como me identifiquei com esse texto G. Senti essas coisas da adolescência e hoje vi tudo voltando com uma simples frase da minha mãe, que recentemente fez uma ciurgia estética e tudo que faz da vida é me chamar de gorda. Faz de propósito, como que para competir mesmo, como se quisesse dizer que agora ela é melhor que eu porque está magra. Pode parecer bobagem para alguns, mas imagina sua mãe, a pessoa que mais tem que te amar no mundo, te denegrindo desde que você se entende por gente? E o pior, saber que essa é a forma dela de demonstrar "amor". Porque você tem que se apegar nisso pra continuar sobrevivendo...
Toda a minha família é assim e eu, que leio muito e me dedico muito a escrever e estudar sou desvalorizada.
Tenho também uma pessoa incrível do meu lado que é meu alicerce, que diz que eu sou linda todos os dias quando acordo e ele está sendo sincero, eu sei. Mas a voz da infância às vezes abafa essa sinceridade e eu só consigo me sentir mal.
Parei de me machucar por causa dele e porque eu acho que tenho direito a uma vida. Faço terapia há um bom tempo e isso me ajudou e ajuda bastante, acho que já teria me matado se não fosse ela. Por isso, siga as dicas dos outros comentários e o meu pedido de fazer terapia. Quando você encontra um bom profissional, com quem você consegue se sentir à vontade, as catarses ajudam a diminuir essa opressão no peito.
Não fique sozinha!
E quanto ao feminismo, pagar a conta em restaurante, essas coisas, quando você tem alguém que te gosta e com quem você se dá bem, o que existe é um compartilhamento. Se você não se sente bem, converse com ele e tente achar um meio termo. Ou então pense que quando você tiver condições, vai pagar muitos jantares para ele. No começo do meu relacionamento, eu pagava para o meu marido porque ele não trabalhava e hoje ele paga para mim porque resolvi sair do emprego para fazer mestrado. Quando se está junto, não importa!
Beijo e se cuida,
T.

Anônimo disse...

Acontece muito mais do que parece, no tumblr é frequente ver adolescentes fazendo referências a auto-flagelação. Eu me sinto muito mal por elxs, quero ajudá-lxs de alguma forma mais direta, mas não sei como. Uma vez, uma menina que se auto-flagelava começou a seriamente falar sobre suicídio, eu mandei uma mensagem pra ela e ela pareceu melhor, por mim eu falaria com todxs mas às vezes me parece meio invasivo.
Me lembro que na oitava série minhas amigas começaram a se cortar por "brincadeira", na época eu não tinha noção do simbolismo do ato. Uma delas tem cicatriz até hoje e desconfio que não tenha parado. Não sei se eu deveria conversar com ela, só não queria que ela nem ninguém sofresse a esse ponto.

Anônimo disse...

Eu imagino que tanto as causas quanto como parar com o self-harm variem de pessoa pra pessoa, mas seria interessante ouvir uma opinião profissional, se alguém se dispuser a escrever um guest-post pra Lola sob esse ponto de vista, já tem meus agradecimentos (:

Anônimo disse...

Eu também me mutilava na adolescência. Mas porque eu não gostava de viver mesmo. Eu tinha uma vida boa, mas simplesmente não sentia prazer em nada na vida. Eu me esforcei muito pra ter, mas eu simplesmente não conseguia, então eu tinha impulsos suicídas. As minhas amigas não entendiam, eu também não me entendia, era uma dor assim inexplicável, irracional, eu me sentia miserável porque eu era um ser incapaz de sentir alegria mesmo tendo uma vida boa. Aí um dia eu tentei me matar cortando meus pulsos (coisa de adolescente que acredita que é fácil morrer assim), e não morri mas a dor me deu um alívio, aí viciei em me cortar quando o desespero batia, é um desespero tão horrível que a dor física alivia, quanto mais fundo eu cortava mais aliviante era. Hoje já não me corto mais, embora ainda tenho tendências suicidas, mas aprendi a controlar um pouco de outras formas menos destrutivas. Eu imagino que, mesmo por motivos diferentes, deve ser a mesma coisa, é uma dor mental tão grande que a pessoa procura desesperadamente por um alívio, mesmo que seja dessa forma. Não há tempo pra pensar, você só quer sentir algum alívio. E é muito triste imaginar que por culpa do machismo tantas mulheres se sintam assim, será que só se sentindo assim também para as pessoas se sensibilizarem?

Anônimo disse...

Embora eu tenha amiga q faça esse tipo de auto flagelação, eu nunca pude entende-la.
Acho absurdo q uma pessoa consiga ferir a si mesma, pois me amo acima de todas as coisas, e me preocupo com meu bem estar sempre.
Essa minha amiga faz tratamento com psicologos e psiquiatras ha muitos anos, e nunca vi o menor sinal de melhora, e este é um dos motivos pelo qual não recomendo esse tipo de profissional, pois a única coisa q ela conseguiu foi alem dessa compulsão, ela ficou dependente desses profissionais que cobram preços extorsivos ainda por cima.

Binha disse...

Texto muito emocionante. Acho que você poderia procurar ajuda psicológica também... Vai ajudar a cicatrizar essas feridas interiores.

Renata disse...

Bunny, você conseguiu descrever muito bem o que eu sinto quando me corto. Também faço isso há muito tempo e sempre alivia. É a forma mais eficaz que encontrei pra diminuir a dor da minha "alma".

Anônimo disse...

"Anon 19:24
Que explicação simplista, hein?"

Qual é a sua explicação?

Leio Lola Leio disse...

"Daí defendo agora que diferença de gênero não é o mesmo que diferença de classe. Pobres podem e devem. Me considero uma mulher independente, que busca autonomia."

Aplausos!

Unknown disse...

Anônimo disse...

(Ju disse_): "Anon 19:24
Que explicação simplista, hein?"

Qual é a sua explicação?


Bueno, eu que escrevi aquilo que o senhorito anon citou pra dar a sua explicação realmente simplista posso responder.

Todo mundo sofre, nisso você está certo. Mas a opressão das mulheres é um sofrimento-bônus.
É um sofrimento que às vezes não deixa a mulher nem ter acesso à sua condição humana...


E eu me arriscaria a dizer que o sofrimento inflingido pelas obrigações de ter uma "natureza feminina", ou seja , pela obrigação de ter/ser algo que não existe causa uma sensação de "vazio" muito maior que qualquer sofrimento comum.



Homens também tem a individualidade oprimida por causa do dos estatutos de gênero? Tem. Só que é bem diferente ser oprimido pela obrigação de ser opressor e ser oprimido pela obrigação de ter uma "natureza" que supostamente gosta de ser oprimida.


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Dizer que em face aos problemas os homens tendem a sentir raiva e reagir é simplista sim. Porque ao longo da vida os homens percebem que não vão ser punidos por simplesmente reagir. O máximo que pode acontecer é a reação dar errada, mas ninguém vai lá "policiar" a reação do cara e dizer que ele não deveria fazer nada.

Do mesmo modo que dizer que as mulheres "tendem a se deprimir" frente aos problemas é opressor porque parte da idéia de que as mulheres tem uma "natureza feminina". E é simplista por esquecer da opressão que a própria afirmação carrega.


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Ah, tive 3 amigos homens cis que se cortavam.
Um deles era asperger e eu me lembro dele ficar deprimido com o tratamento dado às ciências humanas na sociedade tecnológica...sei lá, tem alguma lógica nisso que eu não consigo explicar. Ou talvez não tenha haha.

Anônimo disse...

"Todo mundo sofre, nisso você está certo. Mas a opressão das mulheres é um sofrimento-bônus."

Quanto vitimismo.

"Homens também tem a individualidade oprimida por causa do dos estatutos de gênero? Tem. Só que é bem diferente ser oprimido pela obrigação de ser opressor e ser oprimido pela obrigação de ter uma 'natureza' que supostamente gosta de ser oprimida."

Já lhe ocorreu que há outras fontes de angústia além dos estatutos de gênero?

Anônimo disse...

Sofri bastante na adolescencia - pai ausente, irresponsável, e mãe muito autoritária. Estava na época de começar a sair a noite, minhas amigas saíam e eu não podia. Gostava de um menino e não podia sair com ele porque era podada. Minha mãe só berrava comigo. Eu chorava escondida e me cortava, nas pernas, com lápis apontados ou qualquer coisa pontiaguda. Socava minha própria cara como se eu merecesse apanhar por algum motivo que desconhecia. Sempre apanhei muito da minha mãe, por motivos ridículos levava surras, sempre era muito reprimida. Talvez fosse a forma de botar toda minha dor pra fora. Não fiz isso com muita frequencia, da ultima vez ja estava na faculdade. Tive uma briga com um namorado e fiquei tão descontrolada que quebrei um copo e me cortei com o vidro. Faz um tempo já que estou controlada, li bastante sobre o assunto (sobre abuso com crianças/adolescentes), e o entendimento, pelo menos por cima, do que acontece comigo, me ajudou muito. Fiquei surpresa de ver que tanta gente tem esse tipo de reação. É bem triste. Hoje que moro sozinha estou bem melhor, minha relação com meus pais melhorou, mas não sou amiga deles. Eles nao sabem de muita coisa que acontece na minha vida, e nem faço questao que saibam. Eles reclamam de minha ausência ("você quase nao nos visita", "não liga pra familia"), mas nao me culpo mais por ser desapegada. Acho que eles só estao colhendo o que plantaram.

Pedro disse...

O último parágrafo me lembrou dessa música: http://www.youtube.com/watch?v=EkSOOiMDGiY

Anônimo disse...

Olha, eu tenho 23 anos e desde os 12 machuco minha perna. Era pior, eu usava alicate ou agulha e inflamava às vezes, formava furúnculos, uma coisa horrível. Ainda hoje eu faço isso e em épocas de ansiedade piora. Pior causa disso, eu uso somente calça jeans pra sair na rua e olhe que moro no nordeste. Em épocas mais amenas até ensaio colocar um short, mas minhas pernas são tão finas que às vezes agradeço por fazer isso T_T.

Anônimo disse...

Olha, quando eu pesquisei sobre isso e se vc pesquisar, vc descobre que isso vira algo viciante...pq ao se cortar vc libera endorfina. Dai vem a sensação de ''alívio'' tanto relatada pelas pessoas que o fazem. Sempre tive problemas de ansiedade e depressão mas nunca cheguei ao ponto de me cortar, dizem que é realmente um ponto crítico, uma forma de gritar socorro sem saber, quando a pessoa já não sabe lidar de jeito nenhum com as emoções dentro dela. Sempre pesquiso essas coisas pois me interesso muito, achei até incrível que ninguém comentou aqui o lado médico dessa condição, por isso quis falar. :)

Anônimo disse...

Tb achei estranho nenhum comentario mencionar nada a respeito do Transtorno de Personalidade Borderline.

Procure tratamento, terapia, medicamentos se for preciso (um psiquiatra bom vai te orientar).

Pra quem quiser começar a saber mais sobre a parte psicologica do problema, da um google em "Trastorno de Personalidade limítrofe" ou "Borderline".

Anônimo disse...

Faço minhas as palavras dá Bunny.

Muito bom quando isso acaba na adolescência, mas nem sempre acaba. Na verdade a tendência, ao menos comigo, é de chegar nas vaias, no pulso, na morte. Muitas vezes rola um apagão e quando vejo tá lá, aquele monte de sangue e alguém me carregando pro hospital. É bom, o sangue é bom, é bonito, é um alívio, mas é ruim porque minha mãe sofre, o namorado sofre, os amigos sofrem... Aí vc decide procurar ajuda, te rotulam com um distúrbio qualquer e te enfiam remédios fortíssimos sob ameaça de internação. Vc toma os remédios, não se corta mais, fica até tranquila por um tempo, mas sente sua personalidade desaparecendo. C não é mais quem era, vc não é ninguém, pelo menos ninguém mais sofre e vc virá um robô programado pra ser normal. E, no meu caso que sou artista plástica, a robotização mina a criatividade e me vejo ali, inerte, participando da vida feliz das pessoas em minha volta, por dentro é um grito estrondoso que nunca se cala.

LM.

Anônimo disse...

Tenso eu tenho um conhecido que faz isso, tem até videos dele fazendo... acho bizarrezimo mas pelo menos fazem pq querem. Mas certamente é algo que somente alguem que está bem psicologicamente faria.

Anônimo disse...

Gente, sou a G.
Agradeço as trocas, que são muito bem vindas e muito importantes. a verdade é que escrevi este texto faz algum tempo, e não coloquei um feedback. Estou fazendo terapia, vai completar um ano, e sim, está sendo essencial como tratamento. Diminuiu muito minhas crises. Estou feliz, estou me sentindo útil. Este texto foi escrito porque eu precisava muito saber que eu não estava sozinha nesta luta. Para quem passa por isso, a sensação é a de descontrole total do próprio corpo pela busca de alívio imediato para a dor emocional. Então digo à estas pessoas: descobri que é possivel controlar. A ajuda psiquiátrica é fundamental.
Obrigada pelas dicas. Enfim, percebi que todos ficaram preocupados e sim, estou fazendo terapia. Quanto à minha mãe, um comentário rude sugeriu que eu me fazia de "mulher inteligente" vítima da mãe algoz ou algo parecido. Minha intenção foi desconstruir um pouco o imaginário que as pessoas tem dos pais. E mostrar também a responsabilidade que é passar determinados valores para as crianças. E as mães são pontos de referência importante na formação da nossa autoestima. E isso, sim, eu à responsabilizo. Mas estou consciente de que EU sou responsável pelo meu bem estar.
Ficou um pouco confuso essa mistura de gênero e classe social, mas essa sou eu!

Obrigada à todos. Estou bem, e muito feliz com a sensibilidade de todos.
Nos encontraremos no Fazendo Gênero 10! Vamos em Frente!
Gratidão!

Anônimo disse...

Durante + de um ano eu me cortava com alicate de cutícula ou tesoura, tinha 27 - 28 anos. Eu queria me suicidar mas não tinha coragem suficiente ainda, assim os cortes aliviavam a angústia; durante uma crise profunda de depressão... Eu me batia tb. Só parei depois q tentei me suicidar de fato e fui parar no hospital, qdo descobri q era traída - abandonada pelo meu ex-noivo. Isso foi a gota d'água pra tentar o suícidio.
Hj não me corto mais mas sei q vivo muito próxima do limite.
É péssimo, horrível, triste, angustiante... praticamente só quem passou por isso entende e outras pouquissimas pessoas compreenssivas, já q as motivações variam de pessoa pra pessoa...

Qwper disse...

Existe um filme chamado Painful Secrets (ou Secret Cutting) do ano de 2000 que trata desse assunto do self-harm.
Eu acompanho muitas meninas no tumblr que tem anorexia e a maioria se corta. Eu aprendi com elas que o self-harm tem muita mais a ver com lidar com a dor emocional do que simplesmente se punir. Acho que pode até vir como punição, mas na maioria das vezes acontece numa situação de desespero.
O comportamento geralmente esta ligado a algum nivel de depressão e ansiedade. Beber exgeradamente e abusar de drogas também pode ser considerado self-harm.

Cora disse...

nem sei o q dizer. bom saber q a autora procurou ajuda especializada, tem amparo emocional e está melhor.

muita força pra vc.

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conheci garotos e garotas q se cortavam. os garotos q conheci... bem, aparentemente não era sistemático, pois faziam na frente dos colegas, mas eram arranhões grandes, as vezes palavras inteiras. nunca entendi muito bem pq faziam aquilo. eles diziam q eram “tatuagens” ou q era “legal”. gostavam de exibir as marcas. não eram meus amigos, então não conversávamos sobre o q acontecia.

mas as garotas, pelo jeito era mais como o relatado no post. sofrimento emocional. elas não disseram e eu não as vi se cortando. apenas cicatrizes nos braços, como arranhões de gato mesmo, mas muitos. vistas de relance sob a manga comprida. não éramos amigas intimas. nunca comentei. não saberia como fazê-lo. isso acontecia junto com outros comportamentos considerados “estranhos” pelas pessoas. percebíamos claramente o sofrimento emocional por trás do comportamento, mas ninguém sabia muito bem o q acontecia (adolescência e algum problema na família podem ser combinações bombásticas).

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concordo com qwper. abuso de álcool e drogas tb são formas de auto-mutilação e são especialmente comuns entre garotos e homens. e acho até mais complicado de ser percebido como auto-mutilação, já q o consumo de álcool é bem tolerado, até incentivado, especialmente entre homens. normalmente quando a família enxerga o problema, a pessoa está tão afundada no vício q não consegue sair.


L. disse...

Oi Lola,
sempre passo por aqui,mas raramente comento... mas hoje, com esse guest que conta um pco do que vivo, tive que me manifestar.

Eu me corto desde os 15 anos (hoje tenho 22). Começou pra aliviar qlqr coisa relativa ao meu mundo adolescente, cortei ambos os braços com uma lâmina.
Aquilo foi ótimo, me fez sentir que, ainda que não pudesse controlar a dor que me feria por dentro, eu ainda "mandava" na dor física.
Tive crises quase diárias entre os 15 e os 19 anos.
Minha família nunca percebeu (não morava com meus pais á época, mas sim com minha avó e bisavó, que estava com Alzheimer, extremamente debilitada), ninguém tinha tempo para lidar cmg.
Hoje em dia, sempre que uma dor muito profunda me atinge, algo que não consigo lidar, acabo me cortando. Passei quase 1 ano sem me machucar, até uma crise extrema na semana passada.
Mas é como dizia Kurt Cobain: "Me corto para não me matar."
De repente um dia conte minha história da forma como ela merece!
=(
G, parabéns pela coragem! Lindo texto!

Lola, super obrigada pelo bloguinho! Tens me feito mudar muitos de meus conceitos!

Lu_ud disse...

Bunny,

"É meio que o meu modo de dizer ao universo que eu não esqueci o meu lugar, que sei q sou mais abeçoada nessa vida doq mereço, q eu sei q deveria me esforçar mais pra ser uma pessoa melhor e q sei q mereço sofrer por não me esforçar o suficiente".

Entendo perfeitamente. Eu não me corto, mas faço outras formas de auto-punição, de auto-sabotagem. Às vezes eu me puno com comida, às vezes me isolando do resto do mundo, às vezes deixando de fazer coisas que preciso fazer como forma de sabotar meu próprio bem-estar, tranquilidade e sucesso profissional. Não é uma escolha, não é consciente, mas quando vou ver estou fazendo, já fiz, já era. E eu sei exatamente porque estou fazendo, e acho um absurdo, mas isso só é um motivo pra me boicotar mais ainda, porque olha só como sou idiota fazendo essas coisas idiotas, eu sei que são idiotas, então porque não paro? Devo ser mesmo muito imbecil.

É difícil pra caramba. As pessoas não entendem se você falar, e sempre vem o discurso do "ame a você mesma". Mas o problema é exatamente esse, eu não consigo!! Como é que eu vou solucionar o problema com o próprio problema?? Só faz eu me sentir ainda mais incompetente por não ser capaz de me amar. Estou começando, sabe... E o feminismo me ajudou muito nesse processo. Mas é um processo, e é lento.

É especialmente difícil quando as pessoas colocam grandes expectativas em mim, porque acho que não vou conseguir cumpri-las, ou que não sou merecedora da confiança dessas pessoas. Ou então quando consigo algo muito bom, quando minha vida está perfeita demais, fico achando que não mereço aquilo, que é demais.

Culpa e humildade. Não são essas as coisas que a educação cristã nos ensina desde criancinhas? Você é culpado pelas suas dores, porque Adão e Eva e o pecado original e blablablá. E humildade, ah, essa é uma das maiores virtudes cristãs! Ninguém te ensina que também pode ser um dos maiores defeitos.

Não que eu acredite na Biblia, na culpa de Eva, nem nada dessas coisas. Mas fui criada numa sociedade cristã, e internalizei essas coisas. Junto com todos os outros fatores da minha vida unidos, cá estou eu, me auto-sabotando mais uma vez.

Saber o mecanismo da coisa ajuda. Mas não resolve. É um primeiro passo. Ainda não descobri o segundo, se alguém souber me diz? (E por favor, "ame a si mesma" não é um bom conselho, vai por mim).

Anônimo disse...

Me autoflagelo por meio de mordidas e tapas nos momentos de raiva desesperada. É uma sensação estranha, a qual aos poucos vou tentando das um significado. Sensação de um desejo de me explodir, de ser machucada, mas nunca de morrer de fato. Em geral ocorrem após brigas com pessoas importantes, brigas que acabam em gritaria e descontrole. Acredito que eu acabe me vendo do modo que suponho que a pessoa me veja e acabe introjetando primeiro a noção de que eu não tenho a razão na briga (o que na maioria das vezes é correto) e vai evoluindo até eu concluir, de uma forma bem corporal mesmo, que eu não valho nada e mereço ser punida.
Ao contrário de muitos relatos aqui, o autoflagelo não tem a ver com a dor. Talvez por estar muito relacionado com a raiva, me alivia por eu estar batendo E apanhando. A dor é só um efeito colateral. Contanto que seja violento, que eu descarregue a raiva e o desespero em mim, seja por meio de tapas, socos ou mordidas, o alívio é instantâneo.

Vou fazer um adendo a essa questão: embora o autoflagelo esteja por vezes relacionado à ansiedade e/ou ao TPB (borderline), isso não é uma regra: nem todo mundo com ansiedade ou TPB se machuca e nem todo mundo que se machuca tem, necessariamente, algum transtorno - por incrível que pareça. É claro que isso depende da frequência e da gravidade do autoflagelo, bem como das características secundárias, como o que a pessoa sente antes, durante e depois do ato.

Outro adendo importante é sobre o sentir-se mal por se estar sentindo mal: o primeiro passo que considero importante para diminuir qualquer tipo de sofrimento é aceitá-lo. Não falo de aceitar o ATO do autoflagelo em si, mas aceitarmos em nós mesmos que somos humanos e temos direito ao sofrimento é um facilitador para a quebra do ciclo do auto-ódio: nos odiarmos por estarmos nos odiando, por estarmos nos flagelando, não é produtivo, gera um ciclo vicioso desnecessário. Também não faz sentido: ninguém é inferior ou superior por sofrer ou deixar de sofrer, cada pessoa tem seus motivos e não há ninguém no mundo com autoridade para julgar se sentimentos/emoções são bons ou maus.

Terceiro e último adendo: sobre essa questão de responsabilizar os pais, creio que por vezes é inevitável, visto que os pais são, sim, aqueles que deram o suporte (ou não) para lidarmos com os problemas. Outra coisa, para mim, é CULPAR os pais. Eles, como nós, são seres humanos passíveis de falhas, com suas próprias questões que infelizmente acabam repercutindo na vida dos filhos. Não são vítimas nem vilões, são seres humanos.

Enfim, é isso. Quis dar minha singela contribuição.

Iolanda

Nara disse...

Sempre leio o blog, mas é a primeira vez que comento. Passei e passo por isso há muitos anos, quase 10. Ando com uma lâmina na bolsa. Não importa o lugar, fazia em qualquer banheiro. Falando assim parece até que sou dependente química, mas é quase assim que me sentia. É uma angústia tão grande e forte, você quer se rasgar e abrir inteira pra fazer sair, é maior que seu corpo, muito maior, é um desespero muito intenso. É difícil fazer com que os outros entendam. Tenho marcas nos braços, pernas, barriga, seios, quadril. Hoje faço tratamento psicológico e psiquiátrico e tem me ajudado bastante. Meu companheiro também me ajudou muito desde o início, diversas vezes eu ficava paranoica em relação a alguma coisa dele e ao invés de perguntar, eu me cortava; quando ele via, eu estava sangrando inteira. Agora tudo está mudando... às vezes eu sinto essa vontade, mas tento externá-la de alguma outra maneira, sem me cortar com a lâmina. Ainda assim ainda me arranho um pouco, e passei a não deixar a unha crescer por isso.

Espero que a autora e as outras pessoas que comentaram aqui consigam encontrar esse alívio para a dor interna sem fazer isso. Pode ser difícil, mas aos poucos a gente consegue :) Força a todxs!

Anônimo disse...

Bom, hoje tive uma crise insuportavel, o fato é qe minha melhor amiga, brigamos, eu nao me corto, eu me queimo com o fosforo, eu nao consigo acender apenas um, eu uso a cixinha toda e aberto com força ate ficar na carne viva, esses dias eu ando me sentindo sozinha mesmo com uma multidao ao meu lado, ando me sentindo inutil, nao consigo dormir e nem comer, td qe acontece em casa eu coloco a culpa em mim.
Eu so comebtei por qe eu precisava dividir minha angustia com alguem .