terça-feira, 28 de maio de 2019

NÃO ME ABANDONE JAMAIS

Vocês já leram Não me Abandone Jamais, de Kazuo Ishiguro?
Detestei o livro e pensei em largá-lo inúmeras vezes. O maridão disse que não larguei por causa do título, que toda vez que eu pensava em substituir o romance por um outro, o título do livro me implorava para não abandoná-lo. Acho que um dos motivos de eu não ter largado é que o livro é de um ganhador do Nobel de Literatura. 
Eu pensava: em algum momento isso vai ficar bom, vai se justificar. Mas não: é decepcionante mesmo. E também não larguei porque odeio largar livros e filmes pela metade. Ou pelo começo. Depois comentei isso com meu amigo Alex Castro, que é escritor. Ele achou uma bobagem e afirmou que abandona livros sem dó. 
Eu li no Kindle, e estava já nos 12%, muito impaciente, esperando a história começar. Eu não lembro como o livro foi parar no meu Kindle. Alguém ou alguma lista deve ter recomendado. Então eu não sabia nada sobre a história, que começa com Kathy, uma cuidadora experiente em lidar com doadores. Certo, temos aí dois termos (cuidadora e doadores) que não fazem parte do nosso dia a dia. Portanto, fica a estranheza, e a vontade de saber do que ela está falando. 
Só que isso foi na primeira página. Aí você chega a 12% do livro e ainda não sabe do que a narradora está falando. Nessa hora eu recorri ao Google, que na primeira resenha, sem avisar que vinham spoilers, diz tratar-se de clones. Essas criaturas são criadas para que seus órgãos sejam usados como peças de reposição (para quem? Como? Esqueça, isso o romance não vai explicar). E este foi o terceiro motivo pelo qual eu não larguei o livro: ei, que legal, clones! Ficção científica! Distopia! Eu esperava que algo interessante pudesse sair disso.
Odiei a trama chata e arrastada em que quase nada acontece, odiei todos os personagens, mas, acima de tudo, odiei a narração. Eu não tenho que gostar de algum personagem ou do narrador pra adorar um livro. Eu adoro Lolita (narrado pelo pedófilo patético Humbert Humbert), eu adoro Psicopata Americano (narrado pelo serial killer, e pior ainda, yuppie (young urban professional) -– o coxinha viciado em cocaína e dinheiro dos anos 1980 -– Patrick Bateman), só pra citar dois exemplos que vieram fácil. Mas Não Me Abandone Jamais tem uma narradora tediosa que conta tudo da forma mais tediosa possível. 
Até entendo que o autor tenha usado este tipo de narração para mostrar um cenário claustrofóbico de seres que não se preocupam com o que acontece do lado de fora do colégio interno onde passam sua infância e adolescência. Entendo também que o estilo seja monótono e repetitivo de propósito (pra testar o leitor?) pra nos fazer ver a falta de resistência daquelas personagens. Um jeito meio hipnótico de escrever, talvez (como uma página sussurrando “duuuurma”). Mas não é isso. 
Não tem nada que apareça, por mais inútil que seja, que não será repetido outras duas vezes, no mínimo. E não não é que será repetido capítulos adiante, mas na mesma página! O estilo é mais ou menos assim: “Não quero falar sobre isso, quero falar sobre aquilo, mas antes preciso falar sobre isso. Como eu disse, pra falar sobre aquilo antes preciso falar sobre isso. Depois de falar sobre isso, poderei falar sobre aquilo”. As palavras mais usadas no romance devem ser “como eu disse”, porque eita repetição! Tudo bem, de repente a narradora é uma sonsa que adora repetir tudo que fala. Mas isso não explica que os diálogos também sejam assim!
Com uma boa edição que cortasse as inúmeras repetições, o romance poderia ser um conto. Quem sabe até um conto bacana.
O livro não é uma distopia nem uma ficção científica. Quem esperar algo do gênero vai se frustrar muito. Mas eu não esperava -– como eu disse (argh! Estou sendo influenciada!), eu peguei o livro pra ler sem saber o que era. É sobre o que nos faz humanos. Mas espero que nós humanos sejamos mais interessantes que aqueles do livro. 
Depois vi o filme de 2010, que certamente é melhor que o livro, porque o papel da narração (apesar de ter narração em off) é diminuído. 
E vocês? Leram o livro, viram o filme? Devo dar outra chance a Kazuo Ishiguro, ou todas as suas obras têm esse estilo insosso? Vocês costumam largar livros no meio?

19 comentários:

Cristal Bittencourt disse...

Adoro esse filme e sempre tenho cuidado na hora de recomendar as pessoas (justamente pra nao dar o grande spoiler). O quemais gosto eh justamente o fato do filme ser uma distopia sem cara de distopia, onde nao vemos as coisas que normalmente veriamos (nem tenhamos o cenario esperado) em um filme como esse.

Tambem tinha muita curiosidade com o livro, entao obrigada por tira-lo da minha lista!

ps: desculpe, teclado sem acento.

Jac disse...

Eu tenho essa aversão a largar livro e filmes no meio, mas estou lutando contra ela no último ano.

Se eu estou lendo um livro é em um momento meu de relaxamento e diversão e, se o livro não me traz isso, ele não cumpre seu papel. E eu continuar a ler ele vira "trabalho". Isso colocando em perspectiva que existem milhares (milhões talvez) de livros bons e eu não terei vida para ler todos. Logo, não há espaço para livros que não me agreguem =)

Mario Arkus disse...

Oi Lola. Respondendo a suas perguntas: 1) Eu já li a Ishiguro, duas novelas (não conheço os títulos em português, lî em espanhol): "Lo que queda del día" e "Pálida luz en las colinas". As duas achei maravilhosas, escritas de um jeito subtil, leve, mas com uma profundidade que só dá para achar em grandes escritores. 2) Não assisti o filme. 3) Não sei se você deve dar outra chance, quem sabe com outra novela dele, mas nunca forçar a leitura. Eu sigo sempre o conselho de Jorge Luis Borges: quando você acha um escritor do qual não gosta, tem que pensar que, quem sabe, ele não escreveu para você. Eu digo, "ele não escreveu AINDA para mim", porque talvez isso mude. Eu dexei de ler grandes escritores que muitas pessoas adoram. Lembro agora Thomas Mann e "A montanha mágica"; tentei ler três vezes: não aguentei e não terminei. Só lî "Morte em Veneza" completo porque é breve, mas achei muito chato (gostei um pouco mais, só um pouco, do filme de Visconti -quem também não considero um gênio do cinema). A mesma coisa me acontece com Saramago, autor que tem adoradores, mas eu não consigo aguentar nada do que tentei ler dele, acho ele em algumas coisas uma pálida imitação do Eça de Queiroz.
Enfim, desculpe a extensão e os erros do português, acho que a gente não tem que se forçar com as leituras se são para o lazer.
Abraços de Buenos Aires

Bruno disse...

Li "Remains of the Day" e achei ótimo, muito bom mesmo. Talvez ajude o fato de eu ter morado muitos anos na Inglaterra. Sugiro leitura na língua original sempre que possível, tradução estraga muita coisa.

Anônimo disse...

Comecei a ler em inglês uns meses atrás, não achei absurdamente chato mas também não me pegou. Larguei. Acho que só termino de ler uns 10% dos livros que inicio. No momento lendo "Maternidade", da Sheila Heti, e gostando, embora a tradução tenha alguns problemas. A narradora é bem "relatable", deve ser esse o motivo :)

Gostei muito de ler sua opinião sobre um livro, faço votos de que venham mais posts como esse! :) Bjs

Isabelly Duarte Ely disse...

Lola, do autor, eu já li "Vestígios do dia", um livro ótimo...excelente mesmo. Há também o filme, que na minha opinião, é igualmente bom. Confesso que por não gostar muito de ficção científica, não quis dar sequer uma chance para ver o filme "Não me abandone jamais", pois já havia lido uma resenha. Agora que você comentou o quanto o livro é chato, é que eu não irei ler mesmo. Abraços, Lola!

Hele Silveira disse...

Lola querida, na minha opinião, o livro não é o melhor que li mas também não é o pior. A narração é "arrastada". Fato. Mas me parece que isso está relacionado ao perfil da Kath, procrastinadora por excelência. Ela "arrasta" o quanto pode sua infância, adolescência, o tempo vivido na Hailsham, suas observações, suas sensações, seu trabalho enquanto cuidadora, sua insistência em projetar nos doadores a seu cuidado o desejo por lembranças de Hailsham. Kath jamais se mobiliza para resolver pendências do passado, a menos que instada por Tommy ou Ruth. Achei os perfis bem claros: Ruth, consciente, determinada e manipuladora. Tommy, ambíguo - confuso sendo lúcido e lúcido sendo confuso. Sensível sendo impulsivo e impulsivo sendo sensível. O ouvinte ávido da informação que deseja escutar. A "presa" perfeita para Ruth. Ou Kath, cada qual articulada de um modo próprio. Particularmente, acho que há questionamentos interessantes. Será que o inferno são os outros ou somos nós? Será que o que há de mais humano nas pessoas é justamente a ilusão de humanidade que Miss Emily e Madame tiveram êxito em transmitir aos seus "alunos"? Será que a verdade liberta, vez que quando Kath e Tommy a obtêm, ela também os liberta da ilusão de uma vida com propósitos - o que os humaniza e lhes confere "alma"? Também acho positivo que haja questões em aberto. Quem paga pela criação de um doador? Seu "possível" (modelo), caso este seja elite e não "escória", como aventado por Ruth? A que grupo de elite interessaria a criação de doadores? Seria um completo absurdo ou uma possibilidade pensar que entre nós, pode haver clones há décadas e mais: mantidos a baixo custo, "nas sombras", desde a "destruição de Hailsham"? Os doadores se destinam aos seus "possíveis" ou aos caprichos de quem pode pagar para obtê-los, vez que sempre haverá quem creia que "não têm alma"? Doadores não morrem, "concluem". E o ser "humano"? Conclui ou morre? Ou vive enquanto houver quem vive para "arrastar" suas lembranças, mantendo-o vivo, tal e qual a simbiótica relação entre a proteladora Kath e Hailsham? Madame e Miss Emily, humanas, se eternizam porque os clones Kath, Tommy e outros que creem na possibilidade do "adiamento" existem? E quando o grupo de alunos de Hailsham se extinguir, quando ninguém mais se lembrar ou procurar por respostas à própria ilusão? Miss Emily e Madame "concluirão"? Será que a cada descoberta e consequente visita de um aluno, Miss Emily manda um "criado" embora, mudando-o de lugar? Rsrsrs, paro por aqui, embora haja muito mais. Enfim, Lola, perdoe-me pois talvez eu tenha alcançado ser ainda muito mais chata que o livro, kkkkkk. Abraços e beijos, com carinho!

Denise disse...

Não li esse livro, nem vi o filme, e nem nada desse escritor. haha Só vim aqui dar pitaco pra dizer que eu teria largado o livro, ou então quando me entedia eu faço leitura dinâmica, saca, 10 segundos por página? haha

Eu sempre fui leitora voraz, mas quando tive filho sucumbi ao cansaço e a falta de tempo (apesar de eu não acreditar em falta de tempo, acho que no fundo é mesmo falta de organização e interesse). Há uns 3 meses tomei a decisão de reduzir drasticamente meu acesso ao celular, seriados e afins e voila: voltei a ter tempo pra ler mesmo com 2 crianças pequenas. Estou devorando livros de novo e atualmente estou terminando o “A Menina que roubava livros”, que também virou filme. Estou amando mas pqp que livro pesado e triste. Fico realmente incomodada com a leitura, inacreditável pensar que exista tanta maldade nesse mundo. Penso também como é bizarro que o nazismo tenha cometido as atrocidades que cometeu. Como o povo alemão deixou chegar naquele nível de crueldade?? Daí vejo a ascensão do Bolsonaro, o rumo que o Brasil está tomando, e bate realmente uma tristeza de ver que o mundo não aprende com seus erros e que a maldade, a falta de empatia e respeito ao próximo se perpetuam...

Kasturba disse...

Odeio parar coisas pela metade, e isso inclui tudo, desde livros, filmes, hobbies, trabalho... mas estou tentando aprender. Filmes eu acabo assistindo até o final, pq é pouco tempo, então nao custa muito. Mas livro, que gastamos mais tempo pra ler, to aprendendo a simplesmente largar e partir pra outro.
Nunca li esse livro, nem nada desse autor.

Hele Silveira disse...

Qual é o seu problema, Anônimo das 8:26? 1- Apagar o que não se quer no próprio blog não é sobre hipocrisia, é sobre escolha. Que NÃO é sua, mas DA DONA DO BLOG. Não gosta? Não entre, simples! 2-Desde quando dar "sumiço" em quem não coaduna com as suas práticas é função do Presidente? 3- Dá pra ofender o que não existe? Porque em se tratando da honra do seu presidente, olha...rs...

titia disse...

Nossa, também tenho essa mania de não largar de jeito nenhum um filme ou livro até terminar. Li um que achei chatíssimo e banal pulando de 10 em 10 páginas e nunca mais quis ver pela frente. Até hoje só dois livros foram tão chatos que me fizeram desistir no meio, nem lembro os títulos, e acho que não vou arriscar esse também. Odeio drama.

Alguém traz um rivotril pra gente colocar na alfafa do Marmelo-Wannabe?

Hele Silveira disse...

Titia, o livro não é sobre drama. Em momento algum os personagens fazem um. Ao contrário. Mesmo suas paixões soam desapaixonadas e o sexo terrivelmente desinteressado. "Não me abandone jamais" - título, traduz tão somente uma ideia fixa de Kath, a narradora, sobre algo que nunca lhe foi pedido (jamais esquecer ou se desvincular psicoemocionalmente de Hailsham). E... mesmo não se tratando de um drama, confirmo que a leitura pode ser bastante cansativa. Li, não me arrependo. Mas não aconselho. Não levaria para a minha "galeria" (trabalhos que retratam a alma, segundo o livro).

Anônimo disse...

O que tem de mascutroll desocupado dando suas opiniões inúteis e odiosas em sites feministas não é brincadeira não.

Mas a opinião deles não interessa pra ninguém com exceção de doentes mentais iguais a ele, por isso a raivinha histérica deles

titia disse...

Obrigada, Hele Silveira. Bom, eu vou aceitar sua sugestão e não vou ler, de tediosa e banal já basta a vida mesmo.

Rafael disse...

A vida é curta demais pra perder com livro, filme, peça e gente chata.

Unknown disse...

Vi o filme e tive a mesma sensação. Continuar assistindo mesmo querendo desistir só pela esperança de que alguma hora fosse ter algo bom.... e no fim não me pareceu ter. além de ser amaaaargo, triste mesmo.
Muito parecido aliás com a sensação que o filme "O lagosta" me deu.
Fico feliz de nao ter sido a única.

Anônimo disse...

Eu li O Gigante Enterrado do mesmo autor, achei bem interessante

Anônimo disse...

Você reclamou do site dar spoiler e fez a mesma coisa. Não custa nada avisar!

Carolina disse...

Nossa, não vou tentar ler esse. Eu largo sim livro no meio se for chato.