sexta-feira, 21 de janeiro de 2022

MORRE A INIGUALÁVEL ELZA SOARES

Ontem morreu aos 91 anos uma grande inspiração, uma mulher formidável: Elza Soares. Reproduzo aqui um dos melhores textos que li sobre essa lenda, publicado há quase 3,5 anos. É de Adriana Lisboa (outro muito bom é este, de Euler de França Belém). E, como eu disse ontem no Twitter, apesar de tantas músicas feministas que Elza consagrou, eu vou me lembrar dela cantando "Façamos (Vamos Amar)" com o Chico. 

Foi para comprar remédios para o filho recém-nascido que uma menina chamada Elza da Conceição Soares, então com 13 anos de idade, resolveu tentar a sorte cantando num programa de calouros da Rádio Tupi, no Rio de Janeiro. Arrancou gargalhadas da plateia quando subiu ao palco com duas tranças feitas em um cabelo mal arrumado e usando um deselegante vestido emprestado da mãe, cheio de alfinetes para se ajustar melhor ao seus poucos 33 quilos. Não era para ser levada a sério, aquela Elza. O deboche era incentivado pelo apresentador do programa, o compositor Ary Barroso, notório pela crueldade com que tratava os calouros.

Mas Elza Soares não era apenas uma caloura prestes a ser mandada embora do palco com suas esperanças destroçadas ao soar de um gongo. “O que foi que você veio fazer aqui?”, perguntou Barroso, ao que Elza respondeu: “Cantar.” “E de que planeta você vem mesmo?”, continuou o apresentador. E foi então que a menina sem graça obrigou a plateia a se calar ao responder: “Venho do mesmo planeta do senhor. O Planeta Fome”.

Diz Elza que, nesse momento, pensou na lata d’água que costumava carregar desde pequena equilibrada sobre a cabeça, na favela onde morava, e no zunzum do louva-a-deus que tanto amava. Ela sempre cantarolava alguma coisa enquanto caminhava levando água, e foi o que fez no programa da Rádio Tupi: soltou a voz como sabia, como era natural à menina com a lata d’água na cabeça, à menina que se inspirava no canto do louva-a-deus encontrado no mato – o inseto que lhe ensinou a técnica do scat bem antes que ela ouvisse falar no jazz norte-americano.

O gongo não soou, Elza cantou até o fim, e um transfigurado Ary Barroso anunciou, sob os aplausos da plateia, que acabava de nascer uma estrela.

Sete turbulentas e gloriosas décadas mais tarde, em 2015, Elza lançou ,"A Mulher do Fim do Mundo", seu 81º lançamento fonográfico, ganhador de um Grammy Latino em 2016. As canções, todas inéditas, foram escritas por compositores da cena contemporânea de São Paulo especialmente para ela, e inspiradas por ela. Um deles, Celso Sim, classificou o álbum como “samba punk”, mas um dos maiores fascínios de Elza Soares é sua recusa, desde o início, a caber em definições, como reiterou na conversa que tivemos por telefone. Ela ama o samba, o jazz, o rock, o hip-hop, e se sente inteiramente à vontade em todos esses gêneros (e suas interseções).

Talvez a melhor definição desse último álbum seja a do website Audiograma: "Elza nos dá um soco no estômago quando abre a boca". "A Mulher do Fim do Mundo" é, acima de tudo, o grito poderoso de uma mulher e de uma artista que vem se reinventando ao longo de mais de oitenta anos – sua data de nascimento é nebulosa – e que sobreviveu a relações abusivas e a muitas perdas terrivelmente dolorosas.

Elzinha, como é carinhosamente chamada pelos amigos, viu sua carreira posta em cheque no período de sua pior crise, no final dos anos 1980, mas ressurgiu das cinzas como a fênix que leva tatuada na panturrilha. E hoje, só faz uma única exigência, nos versos da canção que empresta seu título ao álbum recente: “Quero cantar até o fim.”

Um saxofone na garganta

Elza Soares nasceu na favela de Moça Bonita, Rio de Janeiro, filha de um operário e uma lavadeira. Logo a família se mudou para Água Santa, na mesma cidade. Aos 12 anos de idade, ela foi obrigada a se casar, após ser surpreendida no mato em meio a uma briga violenta com um menino cinco anos mais velho. Aos olhos de seu pai, a luta corporal era na verdade um estupro. “Eu nem sabia o que era sexo, queria mais era empinar pipa,” diz Elza, mas o casamento aconteceu assim mesmo, e os filhos começaram a chegar logo em seguida.

Seu marido sofria de tuberculose, o que a obrigou a procurar emprego muito cedo numa fábrica de sabão. Aos 21 anos, Elza já era viúva e tinha dado à luz sete filhos, dois dos quais morreram antes mesmo de ter nome, e um terceiro que foi doado.

A música, apesar dos pesares e das dores, nunca a abandonou. Ao longo dos anos, Elza reafirmaria que em muitos momentos cantava para não enlouquecer. Começou a gravar samba e bossa nova no início dos anos 1960, em discos como o antológico "A Bossa Negra". Viria a ser considerada uma das grandes renovadoras do samba no Brasil, permanecendo por quinze anos na gravadora Odeon.

Na ocasião da Copa do Mundo de 1962, a nova estrela da música brasileira foi convidada para ser madrinha da seleção brasileira de futebol, e acompanhou o time até o Chile. Ali cantaria o hino nacional e chamaria atenção de ninguém menos do que Louis Armstrong, também presente.

O divertido encontro dos dois é relembrado até hoje com carinho por Elza. 

Após ouvir a cantora brasileira no palco, Armstrong a convidou para ir até o seu camarim, e pediu que lhe dissessem que ela era sua filha, já que se valia com tanta naturalidade e talento da difícil técnica do scat, cuja paternidade é atribuída a ele. Sem saber uma palavra de inglês, a brasileira ouviu dizerem daughter, pensou que a estavam chamando de doutora, e tratou de esclarecer: "Não sou nenhuma doutora não, eu sou a Elza!". Explicado o mal entendido, pediram a ela que fosse “fazer um carinho naquele armário, um baita negão,” ela recorda, e que dissesse a ele: "My father". Duas palavras que em português soam perigosamente próximas de "me fode", or "fuck me", e uma constrangida Elzinha achou que não seria boa ideia.

Ao fim, Louis Armstrong de fato se tornou uma espécie de pai espiritual seu. Foi ele quem disse, ao tentar explicar aquela voz rouca, rascante e potente, que Elza tinha um saxofone na garganta.

Elza e Garrincha

No final dos anos 60, quando lançava uma trinca álbuns com o cantor Miltinho ("Elza, Miltinho e Samba", divido em três volumes e grande sucesso de público e crítica), Elza Soares se casou com o célebre jogador de futebol Manuel Francisco dos Santos, o Mané Garrincha, apelido que vinha do nome de um passarinho e que o acompanhava desde menino. Os dois também tinham se conhecido no Chile, e começado a viver então um relacionamento amoroso clandestino.

Para alguns o melhor jogador de futebol de todos os tempos, Garrincha trazia a herança de um passado de miséria e privação. Neto de escravos e vítima da pólio, tinha as pernas tortas para um lado e uma coluna vertebral retorcida (o que lhe valeria a alcunha de “Anjo das pernas tortas”), além de um pai alcoólatra.

Ele próprio também penava com o alcoolismo, coisa que Elza não sabia ao conhecê-lo. Um atleta que bebia uma garrafa de cachaça por dia – em dias de jogo, inclusive – e que acabaria por morrer, em 1983, de uma cirrose hepática, sozinho e sem um tostão. Ainda assim, como o autor uruguaio Eduardo Galeano sublinhou, “em toda a história do futebol ninguém mais fez tanta gente feliz”: outro dos apelidos de Mané Garrincha era “A alegria do povo.” Conquistara duas Copas do Mundo para os torcedores brasileiros, em 1958 e em 1962; com ele e Pelé jogando lado a lado, o Brasil jamais foi derrotado numa partida.

Mas a alegria ainda era efêmera para Elza, que foi casada com o jogador durante 17 anos, numa relação conturbada. Ela chegava a percorrer os bares pedindo que ninguém servisse bebida a Garrincha. "Era uma criança", diz. Seu “neném”. E como o craque desfizera um casamento anterior para viver com ela, a cantora recebia acusações de ser “inimiga do lar” e “danosa ao casamento” pelos conservadores. As mulheres, parece, tinham medo dela – “Cuidado com a Elza,” diziam. Elza também angariava a antipatia dos torcedores do Botafogo, clube carioca no qual Garrincha jogava, para os quais era a “bruxa” responsável pela decadência do jogador. Ela desabafou numa entrevista à Rolling Stone: “Ser livre, naquela época, foi difícil. E se minha história com Mané se passasse agora, com os jogadores ganhando milhões, não sei se eu seria a mulher dele. Conheci um Garrincha pobre e nosso amor era verdadeiro.”

Uma das tragédias que marcaram a vida da cantora nessa época foi a perda da mãe num acidente de carro em 1969 na rodovia Presidente Dutra, que liga as cidades do Rio de Janeiro e São Paulo. Ao volante, Garrincha, embriagado. Elza também estava no radar da ditadura militar, tendo feito um show com Geraldo Vandré, um dos principais opositores ao regime, além de ter gravado um jingle para uma campanha de João Goulart – em 1964, o então presidente Goulart foi deposto pelo golpe de estado perpetrado pelas Forças Armadas Brasileiras com o apoio do governo estadunidense, inaugurando 21 anos de feroz repressão. Os militares invadiram certo dia a mansão que Elza havia comprado no bairro nobre do Jardim Botânico, no Rio de Janeiro, e ela partiu com Garrincha para uma breve temporada de exílio na Itália sem saber ao certo o motivo da perseguição.

“Minha vida é assim,” diria Elza. “A cada cinco minutos, um desafio.” Foi na Itália que o jogador começou a beber mais, segundo ela – deprimido, sem ter sido convocado para integrar a seleção que foi à Copa do México em 1970, cujos jogos assistia de um quarto de hotel em Roma.

No início dos anos oitenta, a carreira de cantora já estava sendo posta de lado em nome dos cuidados com o marido e o filho único do casal, Manoel Francisco dos Santos Filho, o Garrinchinha. Elza chegou a se apresentar em circos, e pensou em abandonar o canto para trabalhar numa creche, a fim de garantir o sustento do menino.

Nesse momento crucial, em que sua fé na música balançou, o amigo Caetano Veloso veio em seu socorro, convidando-a para cantar sua composição “Língua”. Décadas mais tarde, Caetano diria ao jornal "O Globo": “Ela é uma potência criadora. É um esteio para o Brasil. Desde que apareceu, já apareceu com aquela afirmação do talento, da personalidade, com uma visão de mundo aguda. Então, poxa, isso não se joga fora.”

Mas o grande golpe que quase destruiu Elza Soares viria em 1986, três anos após a morte de Garrincha. Ao regressar de sua primeira viagem à terra do pai – em Magé, município do estado do Rio de Janeiro – Garrinchinha, então com oito anos de idade, morreu num acidente de carro. Em certa ocasião, Elza declarou que perdeu com essa tragédia 99,9% do que era. E que só seguiu adiante movida pelo medo – e por um amor incondicional pela música. Acabou deixando o país algum tempo depois. Passou nove anos cantando nos Estados Unidos e na Europa, sem condições de viver no Brasil após uma perda de tamanha magnitude.

Rosas nos ombros

O hiato nas gravações chegou ao fim em 1997, quando, regressando enfim ao Brasil, Elza Soares lançou um álbum composto exclusivamente de sambas, "Trajetória". Veio em seguida um trabalho gravado ao vivo, "Carioca da Gema". E, por fim, a consagração internacional ao ser eleita a cantora do milênio pela BBC de Londres.

Nesse ínterim, um acidente no palco de uma casa de shows no Rio de Janeiro: com o facho de um canhão de luz ofuscando-lhe os olhos, Elza sofreu uma queda de uma altura de dois metros, que anos depois a obrigaria a realizar uma série de cirurgias na coluna e começar a cantar sentada, no palco. Que, ainda assim, ela nunca mais pensou em abandonar. “Coluna é coluna, voz é voz”, afirma.

O álbum que finalmente selou o seu triunfante regresso foi "Do Cóccix até o Pescoço", de 2002. Com ele, recebeu sua primeira indicação ao Grammy Latino. Contando com a direção artística e a parceria fundamental de José Miguel Wisnik, um dos compositores que a acompanham também em "A Mulher do Fim do Mundo", o disco teve o grande mérito de “devolver Elza Soares ao lugar que sempre lhe pertenceu, mas que andou se confundindo com o esquecimento: a excentricidade” (Folha de São Paulo). Ali há de tudo um pouco – samba, funk, rap, tango – e Elza passeia pela obra de grandes compositores brasileiros.

Hoje [setembro de 2018], Elza vive seu mais glorioso momento artístico. Mostra que é uma potência de vida em "A Mulher do Fim do Mundo", derramando sua voz sempre magnífica em canções que abordam a violência doméstica contra a mulher (na poderosa “Maria da Vila Matilde,” ela canta: ”Cê vai se arrepender de levantar a mão pra mim”), e questões de gênero e raciais. Reafirma ser a “rainha dos gays” e canta, na belíssima “Benedita,” a história de uma transexual viciada em crack. E Elza “nunca soou tão negra”, comentou Silvio Essinger no jornal "O Globo" – logo ela que foi recusada por uma gravadora, no início da carreira, pela cor da sua pele: “Ah, que pena, ela canta muito, mas é negra,” relata ter ouvido, na ocasião. Lamenta que o Brasil seja, ainda, um país tão racista. “O Brasil e o mundo,” diz.

Atualmente, ela não tem feito planos. “My name is now”, diz. Não menciona novos projetos, deixando-se embalar ainda pelo fabuloso sucesso do álbum recente. As roupas ainda são sexy, decotadas, justas no corpo; os cabelos sempre coloridos e a maquiagem carregada. Volta e meia, novas tatuagens, como as rosas nos ombros e nas costas – uma homenagem ao grande compositor brasileiro Lupicínio Rodrigues, que certa vez lhe ofereceu um buquê de rosas na boate Texas Bar, no Rio de Janeiro, onde ela cantava (a mocinha Elza não reconheceu Lupicínio, num primeiro momento, e recusou o buquê). Sua vida pessoal, sempre ousada e controversa, até recentemente incluía namorados 45 anos mais jovens, mas hoje ela afirma estar feliz casada, finalmente, consigo mesma.

Elza é a musa brasileira rebelde, não a dócil Garota de Ipanema da bossa-nova, que se deixava acompanhar pelos olhos dos homens ao balanço das ondas do mar. Ela é a fúria criativa de uma mulher que é dona da própria voz, do próprio corpo e da própria vida. E se passou sete décadas cantando para não enlouquecer, o “soco no estômago” que desfecha em seu último álbum é um grito de sanidade num mundo delirante.

7 comentários:

Anônimo disse...

Adoro a Elza Soares, mas eu como uma pessoa LGBT+, digo que ela não estava no seu lugar de fala quanto á questão LGBT+.

Anônimo disse...

Continuação do post sobre lugar de fala: A menos que ela tenha sido bissexual e eu não saiba, prefiro apenas as pessoas com identidades LGBT+ se posicionando quanto aos nossos problemas.

Anônimo disse...

Anônimo das 22:13, acredito que ela não fosse bissexual, ao menos na mídia pelo menos nunca vi Elza comentando sobre sua vivência bi, de fato uma cantora querida, mas a vida dela foi um campo de batalhas, ela passou por dores imensuráveis, no lugar dela eu teria sucumbido, por sorte ela soube ressignificar seu luto através da arte.

avasconsil disse...

"Se só os suicidas pudessem falar sobre suicídio, nenhuma linha teria sido escrita sobre o assunto...".


Na segunda parte do nosso papo com Guilherme Terreri/Rita Von Hunty, Thiago e ele conversam
sobre lugar de fala e como esse conceito pode ser danoso: "Se um discurso só reverbera num lugar,
você precisa de muito pouco pra matar aquele grupo". Guilherme cita exemplos como Fernando Holiday e Clodovil para mostrar que "lugar de fala não é um garantidor de que aquela fala não é correta". O apresentador do canal "Tempero Drag" afirma, ainda, que a questão LGBT no Brasil é "uma questão de vida ou morte, porque ninguém
é assassinado por ser hétero". Confira!

https://youtu.be/CiiwsvOq8aQ

Vídeo bem interessante sobre lugar de fala. Vale a pena ver e ouvir.

avasconsil disse...

Como Guilherme Terreri falou no vídeo do comentário lá de baixo, o lugar de fala não é um fator de legitimidade de um discurso, mas de análise dele. Pra falar com propriedade sobre o holocausto a pessoa não precisa ser judia. Pra falar com propriedade sobre homofobia não precisa ser gay. Os suicidas não precisam se manifestar em sessões mediunicas pra falar sobre o suicídio, pra que seja respeitado o lugar de fala. O lugar de fala serve pra a gente analisar o porquê de uma pessoa ou grupo ter um determinado discurso. E não pra legitimar o discurso pela vivência na própria pele. Um exemplo. Tomemos um órgão como o judiciário. Nele trabalham membros, que são os juízes e os desembargadores, e o resto (servidores, motoristas, copeiras, faxineiras, guardas...). Se você perguntar a um juiz o que ele acha do ambiente de trabalho, provavelmente ele vai dizer: "Acho ótimo. Todo mundo mundo me trata bem. Sorri pra mim. Me cumprimenta. Me oferece café ou chá. É solícito. Gosto muito de trabalhar aqui". Se a mesma pergunta for feita a um servidor, mesmo o órgão sendo o mesmo, a resposta pode ser: "Sabe, acho o ambiente aqui meio hostil. Poucos membros olham pra cara ou falam com os servidores. Os servidores também, quando cruzam uns com os outros pelos corredores, costumam desviar os olhos, olhando pro chão ou pro teto, pra não precisar cumprimentar. Tem uma competição danada por cargo comissionado. Muito servidor parece uma baratinha ou um ratinho, correndo desesperado pelo chão, na tentativa de agarrar alguma migalhinha que suas excelências tenham deixado cair da mesa em que eles se banqueteiam. Os motoristas não olham pra nossa cara também. Trabalho aqui há 16 anos, e nenhuma copeira nunca me ofereceu um copinho d'água. Quando elas entram na sala, e o chefe ainda não chegou, elas dizem na cara da gente: 'Ninguém chegou ainda'... " Por que os discursos são tão diferentes? Por causa do lugar de fala. Um favelado com certeza tem uma visão de Brasil bem diferente da de um Faria Limer. Por isso o Guilherme Terreri está certo: lugar de fala não é um elemento de legitimidade de um discurso. Mas de análise dele. Serve pra explicar por que os discursos são ou podem ser tão diferentes. Mesmo quando o assunto é o mesmo.

avasconsil disse...

Por isso que eu acho que o "homem cordial", do Gilberto Freyre, segundo ouvi falar, né, já que, confesso, ainda não li nada do Gilbertinho, apesar de ter umas coisas dele na estante, tava contaminado pelo lugar de fala dele. Pra um homem cis, branco, hétero, intelectual, com uma certa condição financeira, é fácil achar que o brasileiro é cordial. Duvido muito que uma pessoa pobre e preta achasse a mesma coisa, já naquela época. O lugar de fala pode mudar tudo, por isso pra criar um conceito mais abrangente sobre alguma coisa, é bom procurar por perspectivas dadas por lugares de fala diferente, pra evitar o erro de generalizar o discurso de um lugar de fala só, que mostra só uma faceta de uma realidade multifacetada. Bom, agora preciso voltar pra o meu trabalho. A casa grande à qual eu estou subordinado está esperando meus textos. De fato, mas não de direito, o membro sou eu. A casa grande é só a revisora dos meus textos. Ela lê o que eu escrevi, troca entendeu por considerou. Medicamento por fármaco. Tratamento por terapêutica. Doença por moléstia... Ela é uma revisora meio inútil, é verdade, pois só faz trocar 6 por 1/2 dúzia. Se apropria de 100% da produção da senzala (a casa grande, pelo menos essa a que estou subordinado, quase não trabalha. Quem trabalha mesmo é a senzala...). É o trabalho de revisora mais bem pago do Brasil. Ganha 40 mil por mês. Tem 02 férias por ano. Ou seja, ganha 02 vezes a gratificação de 30%. E mesma trabalhando tão pouco, ainda pode vender 1/3 das férias dela. Isso garante ao cofrinho dela mais uns 24 mil por ano, além dos 30% da gratificação de férias. Definitivamente o Brasil é um país ridículo. Pelo menos é assim que meu lugar de fala me permite enxergar este país.

Anônimo disse...

Elisa Lucinda ensina ações cotidianas de antirracismo
https://www.youtube.com/watch?v=zLABeKXe5XU

(Importante e divertida!)