sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

CRÍTICA: TRAPAÇA / E eles fazem tudo isso sóbrios

O quinteto principal de Trapaça

Gostei de um monte de coisa de Trapaça, mas infelizmente não vou me lembrar do filme daqui a um mês. Ao contrário de Lobo de Wall Street, ele não é memorável, apesar de duas de suas atuações serem. Vou deixar em suspense pra você tentar descobrir de quem estou falando.
O filme (veja trailer legendado) já começa com uma plaquinha dizendo pra não cobrar fidelidade aos fatos: "Algumas dessas coisas aconteceram". Ou seja, embora a história seja remotamente baseado em fatos reais, preste atenção no remotamente e não exija verdade. A trama é meio confusa, como é de costume em filmes sobre golpes e trapaças (a gente sabe que haverá reviravoltas). 
Christian Bale faz um empresário trapaceiro que conhece Amy Adams. Juntos, eles formam uma bela dupla que aplica golpes pequenos, de 5 mil dólares (isso em 1978, quando essa grana valia muito mais do que hoje) em pessoas não muito honestas. Até que eles são pegos por Bradley Cooper, um ambicioso agente do FBI, que tenta usá-los para pegar peixes maiores. Eles vão atrás de um político honesto e idealista, Jeremy Renner, que está mais ou menos disposto a fazer alianças escusas para ressuscitar Atlantic City. 
No meio de tudo isso está a jovem esposa de Bale, Jennifer Lawrence, que não sei nem como começar a definir -- problemática? Tempestuosa?
Como o filme se passa nos anos 70, somos presenteados com várias características deliciosas dessa época, como os móveis coloridos e exagerados, as músicas, a dança, as roupas e, especialmente, os penteados. Os cabeleireiros devem ter se divertido pacas. Trapaça já abre com Bale diante do espelho, colocando uns apliques com cola para formar uma peruca. 
Com aquele penteado, imagino que ele nunca esteve tão pouco aprazível quanto em Trapaça. Aliás, li que a barriguinha que ele ostenta no filme não é artificial. O cara realmente decidiu engordar um montão de quilos para viver o personagem. Pra quê? Alguém o avise que atrizes que interpretam personagens grávidas não precisam engravidar na vida real. Lembra de Bale esquelético em O Maquinista e Boxeador? Esse engorda-emagrece a cada seis meses, dependendo do papel, não pode ser bom pra saúde.
E, pra ser franca, a interpretação de Bale foi a que eu menos gostei em Trapaça. Ele está bem, claro, como sempre, mas os outros papéis têm mais nuances, mais variações. 
Cooper, tão bonitão em Se Beber, Não Case, aqui aparece quase irreconhecível com seus cabelos artificialmente encaracolados, a custo de bobs (deve ter um outro nome pro que ele utiliza). Numa das cenas Amy Adams também usa um permanente (hoje o cabelo tem que estar alisado, trinta anos atrás tinha que estar cacheado, e galera vem me dizer que o padrão de beleza é imutável). E Jennifer Lawrence surge com um cabelão montado (dá pra ver pelo meu vocabulário o quanto eu entendo de todas essas coisas cabeludas).
O que achei estranho nesse universo todo de golpes e jogatina é que nenhum personagem usa drogas. 
Todos os filmes com esse cenário têm gente viciada. É inevitável lembrar de Cassino, por exemplo. Mas em Trapaça não. Nem beber muito o pessoal bebe. Compare com Lobo e quando o DiCaprio, na cena da tempestade em seu iate, exige que seu amigo traga alguma droga, porque ele não quer morrer sóbrio. Em Trapaça todo mundo aplica golpes sóbrio mesmo.
Jenna Fischer e Amy Adams
O filme vale principalmente por causa de duas grandes interpretações, ambas femininas. É bom que a história ofereça dois ótimos papéis para mulheres. São elas que são a alma do filme. Amy Adams está espetacular, de um jeito que a gente nunca viu. Normalmente essa atriz é considerada a típica girl next door, de feições bonitinhas, nada deslumbrante. Com quase 40 anos de idade, ela costuma pegar papéis meigos (nem parece a mesma atriz de Ela). Tanto que eu sempre a confundia com Jenna Fischer (a Pam de The Office) e com Isla Fisher (Penetras Bons de Bico).
Na sua última parceria com o diretor David O. Russell, em O Boxeador, Adams já fisgou uma personagem que foge do que ela está acostumada a fazer. Agora ela interpreta uma femme fatale, uma mulher mais inteligente que todos os homens juntos. É ela quem controla a ação. Ela sabe mais que os outros. E ela não deixa que a gente saiba o que ela está tramando.
Jennifer Lawrence, apesar da pouquíssima idade, já provou que pode fazer de tudo. Ano passado ela ganhou seu primeiro Oscar (pode apostar: outros virão) por outro filme do Russell, O Lado Bom da Vida. Em Trapaça ela é coadjuvante, mas sempre que aparece, gera faíscas, embora sua personagem pedisse uma atriz no mínimo dez anos mais velha. A cena em que ela vai beber com os mafiosos, depois de perguntar "É desses caras que a gente não deve se aproximar?", é fantástica. 

Provavelmente as duas melhores cenas do filme são as que juntam as duas. A primeira, quando Adams e Cooper surgem no meio da neblina, e a segunda, no banheiro. 
E aí a gente constata como o Bechdel Test tem suas limitações. Ele pede o mínimo do mínimo pra avaliar se um filme passa num quesito básico: 
1) se tem duas ou mais personagens femininas com nome; 2) se essas personagens falam entre si; 3) sobre um assunto que não seja homem. Trapaça cumpre as duas primeiras etapas, mas quando Lawrence e Adams quase se matam, elas só falam de um homem (mas tudo bem, porque há uma outra personagem feminina, a senhora que faz a transferência bancária e gosta de gatos, então Trapaça passa raspando no Bechdel). 
E, no entanto, é um filme com duas mulheres poderosas. A personagem da Adams tem total controle da situação. Já a da Lawrence é uma tristeza só, mas... poderosa.
É pouco comum também ter um filme com narração em off de três personagens diferentes. 
Um dos momentos da narração é mantido por puro desleixo, porque logo depois do que a personagem de Adams narra sobre as roupas abandonadas nas lavanderias de Bale, o diálogo diz exatamente a mesma coisa. E, convenhamos, há vários outros instantes de desleixo. É decepcionante que o suspense gerado pela aparição do Robert De Niro não dê em nada, por exemplo. Mas o filme é agradável. Se bem que depois de ver Lobo, eu pensei que Trapaça poderia ter um ritmo mais rápido.
Estou torcendo pra que a Amy Adams ganhe o Oscar. Das cinco indicadas (Cate, Meryl, Sandra, Judy), ela é a única que não tem uma estatueta. Mas acho que quem vai levar é a Cate mesmo. Aliás, das dez indicações, tô começando a pensar que Trapaça só tem chances grandes em duas categorias: roteiro original e figurino.

16 comentários:

Anônimo disse...

Minha mãe chamava esses rolinhos de bigudinho. Não sei se é mesmo esse o nome. Vou dar uma chance para esse filme pq gosto bastante do elenco, mas achei o lado bom da vida meio ok e meio bobo.

Anônimo disse...

não sei o que aconteceu comigo,sempre amei ver filmes,agora eu não tenho paciência nenhuma.
mas vou tentar ver esse,parece bom,gosto da amy adams e jennifer lawrence.
eu vi o lado bom da vida e eu não sei porque ela ganhou o oscar,li o livro e a história foi destruída com esse filme.

lica disse...

Estou lendo todas as críticas da Lola pra ver se entro bem no próximo bolão do Oscar!! =D

Elaine Cris disse...

Ainda não assisti. Mesmo sabendo que não devemos julgar o livro pela capa achei o título fraco e nome de filme muitas vezes acaba fazendo a gente ver um filme ou não.
Mas sua crítica e o trailer me ganharam. Ótimo ver a Amy Adams sem aquela aura de princesa da Disney de sempre.
Detestei Julie e Julia (era esse mesmo o título?) por causa do personagem dela. Ou da interpretação...

Raven Deschain disse...

É isso mesmo anon. Bigouds. Huashuashu

Vitor Ferreira disse...

Quando vi esse filme o cinema inteiro gargalhava e eu não entendia por que... Não achei nada engraçado.
Não fiquei fã do filme, definitivamente. Achei projeto de Scorsese, Tarantino wannabe, principalmente nos longos diálogos, que ao contrário dos do Taranta, eu não conseguia me concentrar. Sempre me pegava pensando no leite que acabou, no dinheiro pro ônibus amanhã que eu ainda não tinha trocado, na pia cheia de louça pra lavar.
A história também é bem confusa e longa demais. E se Lobo é amoral (ou imoral), o que dizer do final Trapaça? Não vou dizer pra não ser spoiler.
Mas amei a trilha sonora (outra coisa bem Tarantino/Scorsese do filme) e tmbém achei J-Law jovem demais pro papel. A cena do banheiro com a Amy eu achei digna de Bugsy Malone.

MonaLisa disse...

Lola, vc já viu esse filme aqui: Marcas do Silêncio - O link: https://www.youtube.com/watch?v=aOF_TvoGc0Y

Lembro de ter assistido ele quando era criança a fiquei horrorizada. Logo no início tem um aviso de que tem cenas de violência física e psicológica.

É sobre uma mulher que já tem duas filhas e se casa com um cara e o cara começa a perseguir uma das meninas, espanca, a mãe tenta defender a menina, mas ele é muito forte. Uma das últimas cenas é a coisa mais horrível que eu já vi e imagino tantas meninas passando por isso na mão de padrastos, pais, tios.

Não achei nenhuma critica sobre o filme na internet. Gostaria de saber sua opinião.

Worm disse...

Lola,vc não acha um tanto estranho uma pessoa que se diz anti-capitalismo,anti-domínio cultural americano,que discursa sobre a valorização do Brasil e tudo mais gostar tanto assim dos filmes do Tio Sam?Pq não comenta mais filmes brasileiros,séries...
Tá passando uma boa agora sobre Serra Pelada.Vai lá assistir.Mas é só uma sugestão,é claro.

Anônimo disse...

A Amy já apareceu em um papel totalmente diferente quando fez a adaptação de Na Estrada, uma mulher bem drogada. Eu não gostei muito do filme e nem lembro direito, mas acho que tinha gostado da interpretação dela, já que a última vez que eu lembrava de tê-la visto foi no Julie & Julia. (meio chato mesmo)



Aparentemente a Anne Hathaway era originalmente a dona do papel da Jennifer, mas mesmo assim acharia muito jovem...

José Neto disse...

Roteiro original? Jamais! essa é a última estatueta que esse filme deveria ganhar! Roteiro péssimo e entediante!

Anônimo disse...

Lola, não precisa publicar o comentário:

http://www.anonymousbrasil.com/brasil/homem-de-bem-offline-ate-segunda-ordem/

lola aronovich disse...

Já vi, anon das 9:39, que os Anonymous Br derrubaram o site de ódio, que já estava começando a viralizar na quinta. Fico feliz. Mas esses mascus sanctos devem ser presos para cumprirem a pena a que foram condenados (6 anos e meio de prisão). E ver se, pelo menos com mais 2 ou 3 anos de prisão, eles possam ser tratados para conviver em sociedade. Não sei se é possível, pois eles são psicopatas mesmo. Creio que precisem viver com medicamentos controlados pro resto da vida.


Monalisa, eu vi esse filme (Bastard Out of Carolina no original) faz muito tempo. Lembro que achei bom, e chocante. Eu teria que vê-lo novamente pra poder escrever alguma coisa.

Karine disse...

Adorei a trilha sonora desse filme, mas o filme em si achei ok. O Oscar de roteiro original, na minha opinião, tem que ser do Her, gostei muito mais.

Agora não tenho certeza porque já vi esse filme faz tempo, mas acho que o personagem do Bradley Cooper usa drogas sim.

Anônimo disse...

Lola,

Eu sei que o Oscar está chegando, mas queria te dizer que esse blog é tão, mas tão legal, que gostaria de ler aqui mais críticas sobre filmes europeus, sul-americanos, etc...

O filme francês 'Os Belos Dias' é muito interessante. E o chileno 'Glória', você já viu?

Que tal?

Andréa disse...

Como assim os personagens são caretas? A personagem da Jennifer Lawrence fica coçando o nariz, por ex, sugerindo o vício em cocaína...

Unknown disse...

Excelente filme com bom roteiro. Amy Adams é uma atriz muito carismática e Professional, se entrega a cada um dos seus projetos. A chegada é umo dos Amy Adams movies muito bons, fez uma atuação maravilhosa. O filme tem uma grande historia e acho que o papel que ele interpreta caiu como uma luva, sem dúvida vou ver este filme novamente.