segunda-feira, 25 de agosto de 2008

“NÃO ACEITO O MEU CORPO”, VERSÃO UNISSEX

No fundo, o provocante documentário Bigger, Stronger, Faster é sobre aceitação do próprio corpo. Uma cena comovente ocorre quando o diretor Christopher Bell fala com sua mãe, que não consegue entender como seus filhos usam esteróides na vã tentativa de alcançar um tipo físico à la Schwarzenegger. Enquanto ela se aceita como gorda, seus filhos querem ser mais do que são. E a tristeza é que essa insatisfação eterna não começa e acaba na adolescência. Eles são homens feitos, e continuam se auto-desprezando. A insatisfação se reflete em todos os outros aspectos de suas vidas. Nenhum relacionamento amoroso é pleno, nenhum emprego é bom o suficiente pra eles (ainda que o corpo malhado sirva como cartão de visitas, eles não podem viver de musculação e de levantamento de peso. Precisam trabalhar)...

Outro ponto instigante do documentário é que um homem não tenta ficar super musculoso pra fazer sucesso entre as mulheres. É pra fazer sucesso entre os homens mesmo. Um carinha americano, portador do maior bíceps do mundo (horrendo, parece deformado), conta que as moças, quando vêem seus braços, gritam “Ui, que nojo!”. No entanto, entre os rapazes, todos querem falar com ele e parabenizá-lo pelo tamanho. É igualzinho à magreza pras mulheres. Em geral, os homens não se sentem atraídos pelas super-magras. Mas não é por eles que as mulheres querem perder peso até desaparecer. É pra competir entre elas. Ou seja, músculos, para os homens, e magreza, para as mulheres, não são algo que a pessoa faz pra atrair o sexo oposto, e sim pra competir entre seu próprio gênero sexual.

Chris conta como, nos anos 80, o governo Reagan nomeou o Schwarzza como consultor nacional de fitness. Em outras palavras, o austríaco bombado (hoje governador da Califórnia) basicamente foi alçado a modelo de saúde. Pouco depois, com o escândalo Ben Johnson nas Olimpíadas, os EUA promoveram uma campanha anti-esteróides. Fica uma mensagem conflitante, não fica? Mas é idêntica à mensagem passada às meninas. As modelos, magérrimas, puro osso, são consideradas padrão de beleza (e saúde, se formos compará-las a mulheres obesas). Logo, um monte de menina fica com essa idéia fixa de ser tão magra quanto as modelos e vira anoréxica. Quando alguma garota chega a morrer em decorrência dessa obsessão, a sociedade condena o culto à magreza extrema. Não é confuso?

O documentário mostra como, ao longo dos anos, até o padrão físico de bonecos destinados ao público masculino foi mudando. Sabe o Falcon? Existe um mais popular nos EUA, chamado G. I. Joe. Nos anos 60, esse boneco era franzino. A cada década seu corpo tornou-se mais torneado. Hoje é uma montanha de músculos. As bonecas femininas também mudaram pra ficar cada vez mais magras. Em ambos os casos, esses bonecos/as perseguem o padrão de beleza vigente. Servem como educação do que meninos e meninas deveriam tentar ser.

Talvez uma pergunta pertinente, tanto pra homens quanto mulheres, seja: e se a gente milagrosamente alcançasse o corpo ideal? O que faria depois? O que faria da vida? Porque parece que a gente gasta tempo e empenho demais nessa busca.

16 comentários:

Giovanni Gouveia disse...

Complementando o post sobre montanha de músculos, a pressão não vinha de meu pai, que, graças a Deus, não interferiu em minhas opções, mas a comparação erea inevitável. Apesar de não ser "magricela" nem gordo, mas o tipo atlético bombado nunca fez a minha cabeça, preferi carregar o peso dos livros, quase levando-me à escoliose/cifose/lordose e outras oses

Comentava com um companheiro de trabalho, que é formado em Ed. Física, que Esporte de Alto Nível (olimpíadas como mairo vitrine, mas também os concursos de mister universo/olímpia, e campeonatos mundiais em geral) pode ser tudo, menos saúde. Boa referência é:
RÓIZ, José. Esporte Mata! São Paulo: Editora Casa Amarela, 2004. 178 p.

lola aronovich disse...

Que bom que vc escapou dessa neurose toda de ter um corpo bombado, Gio. Acho que hoje isso afeta muito os meninos. Ainda não tanto quanto a busca da magreza afeta as meninas, mas... E sobre esporte de alto nível não ser sinônimo de saúde, realmente, não parece mesmo que seja. Pode ser sinônimo de superação, de dedicação, de abdicação, mas de saúde, acho que não. Eu, quando fazia handbol na adolescência (que não era um esporte de alto nível de jeito nenhum, mas eu treinei mais de 4 horas por semana, durante 4 anos), tinha muitas dores, cãibras direto, todo dia. Era bem sofrido, e olha que não tem comparação com atletas olímpicos. Quando parei de praticar handebol, parei de ter cãibras. Então, não sei, o sedentarismo não é de todo mau. Quer dizer, hoje acordei com cãibra, mas isso porque meu gato Calvin me entortou (ele dorme nas minhas pernas). Levantamento de gato conta como esporte?

Giovanni Gouveia disse...

Ah, tem um detalhe que eu lembrei, esteróides/anabolizantes dão musculatura aparente, mas atrofiam os testículos...

Nita disse...

Graças a Deus eu nunca sofri qualquer tipo de pressão assim dos meus pais. O máximo de pressão que já sofri deles foi para comer mais quando eu peguei o maldito do rota-vírus e emagreci absurdos e até hoje não recuperei o meu peso normal. É, eu tenho o problema inverso da maioria das pessoas, eu emagreço muito fácil e demoro muito para engordar de novo.

Anônimo disse...

Olha, eu sou careca, porque meu pai é careca, e não tem nada que vai mudar isso (ainda). Me conformei desde os 20 quando eu acordava de manhã e percebia que no travesseiro tinha ao menos uns 50 fios. Ok, pensei, você vai entrar para o clube dos carecas quer você queira quer não. Mas e daí. Não vou fazer o implante para ficar com cabelo de boneca (muito menos gastar muito dinheiro para isso) e uma peruca...francamente. Mas é assim que começam as coisas, a busca dos musculos, depois o fim das rugas, o cabelo liso, os dentes super brancos...

Anônimo disse...

É realmente muito doido,quanto a essa mensagem conflitante que você falou,lembro de uma vez estar assistindo ao Fantástico (não se preocupe,não assisto mais)logo no começo do programa apareceu uma reportagem sobre anorexia,falando de como a mídia influencia e essa coisa toda,e mais tarde NO MESMO PROGRAMA,apareceu uma reportagem endeusando uma modelo magérrima.
é muita cara-de-pau.

Anônimo disse...

Acho que um dos grandes mistérios da humanidade, uma das grandes questões é o que fazer quando 'se chega lá'. Taí nosso Lula que, quando finalmente virou presidente não sabia o que fazer....

Beijos

Junior disse...

Uma notícia relacionada a uso de esteróides...um alemão ficou com lesões permanentes na pele, vejam a reportagem:

http://g1.globo.com/Noticias/Ciencia/0,,MUL736032-5603,00-USO+DE+ANABOLIZANTE+FAZ+PELE+DE+JOVEM+ALEMAO+EXPLODIR.html

Junior disse...

O link ficou quebrado :(
Vamos tentar denovo:
reportagem esteróides.

DIARIOS IONAH disse...

na minha opiniao o grande barato eh mesmo a aceitaçao do corpo por si mesmo e nao pela visao do outro, algo bem dificil neste tempo de midia intrometida.
e isso demonstra cada dia mais que as pessoas estao perdendo o poder de pensar por si mesmas e levam na cabeça o peso da ignorancia a que estao se submetendo.

lola aronovich disse...

Gio, o documentário discute bem os efeitos colaterais dos anabolizantes, e meio que conclui que há muita histeria nisso tudo. Sobre atrofiar os testículos, pros musculosos não tem problema: esses caras aparecerem muito mais sem camisa que sem cueca...


Nita, sorte a sua, né? Eu até emagrecia rápido até os 30 anos. Depois disso, só engordo rápido.

lola aronovich disse...

É isso, Cavaca, mas primeiro que a calvície atinge muito mais homens que mulheres, e como pros homens a aparência conta muito menos que pras mulheres, não há uma histeria em torno da calvície. Algumas pessoas acreditam, por exemplo, que se a obesidade só atingisse os homens, não haveria tanta conversa de “epidemia que mata” como temos agora. Mas então, com a calvície, por mais que haja um grande mercado pra explorar isso, ainda se acredita que é genético e que pouco ou nada pode ser feito a respeito. Mas vende-se a idéia que ser gordo não é genético – ou seja, que vc pode, e tem, que fazer tudo pra combater essa “anomalidade”. Vende-se até a idéia que envelhecer não é natural!


Pois é, Princesa, eles fazem isso no mesmo programa, na mesma revista... Quantas revistas femininas a gente não lê falando sobre anorexia? Aí, no mesmo exemplar, vemos as modelos magérrimas de sempre...

lola aronovich disse...

Chris, eu gosto muito do Lula, e acho que ele vem fazendo um bom trabalho. E não sou só eu que pensa isso, né? A aprovação dele tá em quanto? 65%, 70%? Deve ser tudo gente que recebe bolsa-família, decerto... (é o que a direita usa pra justificar a popularidade do presidente).


Obrigada, Vb, vou dar uma olhada.


Concordo, Ionah, mas é muito difícil pensar “por si mesmo”. Somos um produto do tempo e do lugar em que vivemos. E, como tal, somos influenciados por tudo ao nosso redor. Sofremos lavagem cerebral!

Eu-lírico disse...

O meu irmão do meio (que é uma mistura de Paulo Zulu com Luciano Szafir), hoje com 29 anos, começou a malhar ainda adolescente por causa dos filmes do Arnold S. e daquele outro que faz Rambo e Rocky. Resultado: há uns 2 anos quase parou de andar por causa de uma hérnia de disco, que é um problema seríssimo de coluna. Há males que vem para o bem, pois ele amadureceu com isso e aprendeu a se perdoar pelo que fez com o próprio corpo há anos a fio. Chegou a ser campeão mineiro de fisiculturismo, mas... a hérnia é para sempre.
Falaram sobre calvice, e acho que o grau de preocupação masculina acerca dela é proporcional à preocupação das mulheres em ter cabelo liso - mas o engraçado disso tudo é que mulher não liga se o homem é careca e os homens não entendem por que as mulheres se submetem à chapinha!

lola aronovich disse...

Luciana, que horror! Como que alguém com 27 anos quase pára de andar?! Hérnia de disco é pra sempre, não tem cura? Bom, que bom que ele se conscientizou. Deve ser difícil pra alguém que dedicou tanto tempo e esforço a uma atividade saber que não pode mais exercê-la.
“Mulher não liga se o homem é careca e os homens não entendem por que as mulheres se submetem à chapinha!” Adorei essa frase. Ela já diz tudo sobre como um padrão de beleza imposto afeta muito mais as mulheres que os homens...

Samara L. disse...

E se o povo soubesse quanto tempo e energia a gente ganha para a gente mesma depois que para de perseguir o corpo perfeito!