E agora vem o grande desafio: conseguirei falar de “Herói” sem recorrer aos clichês? Acho que não. Vamos acabar logo com isso: este épico tem imagens de rara beleza, cenas deslumbrantes, é um espetáculo visual, um balé de artes marciais. Tudo é lindo - as aulas de caligrafia na areia, as flores e folhas que mudam de cor, o enxame de flechas, o jogo de varetas, as gotas de chuva. E os próprios atores, claro. Os chineses são muito bonitos (e estão lá pra não me deixar mentir a Maggie Cheung e o Tony Leung, o par romântico de “Amor à Flor da Pele”). E, no entanto, o filme parece ser mais longo do que é. Ele cansa um pouco depois de um tempo, e a mensagem, contada à la “Rashomon”, é bem retrógrada. A produção pergunta se há guerras que são benéficas. Vale a pena matar quilos de gente pra poder unir os povos? Traduzindo pro nosso contexto, é mais ou menos assim: se eu chegasse a dez passos do Bush, eu hesitaria em matá-lo? Afinal, até o Coisa Ruim tem seu lado bom: ele trucida milhões de iraquianos e afegãos pra unir um povo (o americano). Olha, melhor ignorar a mensagem reaça e me concentrar na educativa. Todo mundo em “Herói” diz “por favor” e “obrigado” antes de enfiar a espada em alguém. É um exemplo pras crianças.
Mas por que eu não gostei de “O Tigre e o Dragão” e gostei muito de “Herói”? Difícil explicar. Entrei mais no clima de “Herói”, compreendi a mitologia dos guerreiros voadores, e pelo menos desta vez não há nomes compostos pra me distrair, tipo Velho Touro Sentado ou Cachorro Chorão, só pra ficar nos exemplos aqui de casa. Os nomes em “Herói” são mais simples, Espada Quebrada, Lua, Neve, Sem Nome. E por que gostei mais de “Kill Bill”? Meu chute é que o sangue faz falta à “Herói”. Dá a entender que essas brincadeirinhas com espadas, lanças e flechas são inofensivas. Ninguém nem perde a cabeça, ué. Acho que prefiro minhas vinganças mais vermelhas.
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