Sabe
quando a gente critica as distribuidoras brasileiras por não manterem o título no original? Em Meu Nome é Taylor, Drillbit Taylor, considero isso um erro. Porque o título original não quer dizer absolutamente nada. É o nome de um desertor do exército que se tornou vagabundo profissional e é contratado para proteger dois garotos atormentados por bullies na escola. Esse sujeito, que nem é o personagem central, é interpretado pelo Owen Wilson (Penetras Bons de Bico). Na vida real, foi logo depois desta comédia sem graça que o Owen tentou se matar. Dá pra entender porquê. O maridão e eu concordamos que Drillbit foi um dos piores programas dos últimos tempos, e o maior desperdício de duas horas de que temos notícia.

O filme é ofensivo em tantos níveis que nem sei por onde começar. Tá, é ofensivo com os vagabundos, o pessoal que não faz nada ou que pede dinheiro, porque todos são pintados como ladrões. E se é pra ter pena de alguém, vamos ser solidários com uma mulher de rua com duas crianças de colo ou com um jovem homem branco de olhos azuis, bronzeado d
e sol? Ah, pobrezinhos dos homens brancos, esses discriminados. Se Drillbit fosse de outra cor ou falasse espanhol, poderia se integrar tão bem à escola? Poderia tirar dinheiro de criancinhas tão impunemente?

O filme é ofensivo com as mulheres. Imagina que você seja uma menina numa escola e vê constantemente alguns bullies maltratarem guris na sua frente. Você não vai falar nada? E se um deles te chamar de vadia na frente de todo mundo, você continua quietinha? Precisa mesmo que algum menino venha te defender pra abrir a boca? Tá, agora vamos supor que você esteja tomando sol de bíquini no seu quintal, e três garotos passam correndo e quase te pisoteiam. Você não apenas continua deitada, como também, quando os moleques voltam, posa de modo sexy pras câmeras de celular que eles têm, pra mostrar como você está disponível 24 horas por dia. Ok, agora suponhamos que você seja uma professora solteira, bonita e independente, apesar de burra como uma porta. Aparece um carinha do nada e você se envolve com ele. Mesmo depois de descobrir que o sujeito mentiu descaradame
nte, você continua apaixonada. Que homens desinteressantes se envolvam com lindas mulheres já se tornou padrão nas comédias com o toque do Judd Apatow - O Virgem de 40 Anos, Superbad, Ligeiramente Grávidos, e agora este. Queridos nerds, desempregados, e homens que não querem crescer: não se preocupem. Tá cheio de mulher deslumbrante pra te adorar do jeitinho que você é.

Drillbit é ofensivo com a escola e seus professores. Professores só existem pra tomar cafezinho. Se algum dia você precisar deles pra salvar a sua pele, desista. E nem pense em reclamar com o diretor sobre os bullies que vêm tornando a sua vida um inferno. Ele não só não vai fazer nada, como vai rir de você. Ah, e tem mais: qualquer vagabundo pode entrar na escola e fingir ser um professor substituto durante meses. Pode circular entre os alunos tranquilamente. Pode até trazer sua turma de amigos mendigos pra também dar aula e tomar cafezinho.
É ofensivo com os pais. Na realidade, os dois garotos são fracotes covardes pela falta da autoridade paterna. O pai do gordinho se separou da mãe e nunca o vê. O magrinho não tem pai - tem padrasto, que não lhe dá a menor bola. O padrasto, inclusive, revela que ele mesmo foi um pouco bully na sua época de escola, e que isso é bom e natural, e que provavelmente suas “vítimas” devem estar agradecidas até hoje. Não há ninguém para contestá-lo, porque o filme não tem nada contra os bullies, pelo contrário. Se não fo
ssem eles, nossos teens fraquinhos não se tornariam homens (os dois atores-mirins foram escalados por lembrarem os adolescentes de Superbad. Conseguem ser os piores atores do universo).

Porém, não pense que Drillbit seja apenas contra todas as categorias mencionadas acima. Ele é favor de várias coisas. Por exemplo, tem fascínio pelo capitalismo e a iniciativa privada. Você tem que pagar pra ganhar o direito de não sofrer na escola, entende? É também extremamente militarista. O segredo pra parar de ser infernizado por bullies é faltar à escola durante o máximo de tempo possível, e ficar treinando. Violência, como os americanos sabem tão bem, só pode ser resolvida com violência. O treinamento militar é a resposta. E o filme defende uma punição mais severa para desertores do exército.
No início da década de 80, a gente teve Cuidado com meu Guarda-Costas (Adam Baldwin aparece brevemente em Drillbit como candidato). Em 93 Dazed and Confused (Jovens, Loucos e Rebeldes) fez enorme sucesso entre os críticos. Não é exatamente sobre guarda-costas, mas tem bullies atormentando guris, e toda a comunidade (inclusive as vítimas) encara isso como um rito de passagem. É aquele mantra de “a escola é um inferno”. Quem sobreviver virará uma pessoa de valor e nem perceberá quando tiver que pa
rticipar de um outro inferno, como a guerra. A cada geração fazem um filme sobre bullies. A situação não muda. Depois acontece um Columbine e ninguém liga os pontinhos.

E o agressor não é um sistema que permite que esse tipo de atrocidade se repita em cada escola. Não. Nesses filmes todos o agressor é um indivíduo, com um problema individual. Em Drillbit, é um carinha desequilibrado que ainda por cima nem é muito americano e pode ser mandado embora do país. Porque os EUA não tem nada a ver com isso. Olha, mesmo sem conhecer nada sobre, sei lá, Hong Kong, sou capaz de apostar que bullying é um problema menor lá que nos EUA. Na Terra das Oportunidades, colégio é apenas o primeiro dos muitos treinamentos militares que virão.