domingo, 26 de novembro de 2000

CRÍTICA: GAROTOS INCRÍVEIS / Crítica prolixa para filme idem

Fui ver "Garotos Incríveis" e vou escrever uma crítica no estilo do filme. Peralá, não deveria ser tão direta assim. Deixe-me dar voltas e levar uns quatro parágrafos até começar. No final, você acabará de ler sem saber do que eu estava falando, e sem muita convicção se gostou ou não do que leu. Mas o fim é legal, apesar de não redimir tudo.
Você sabe que está com problemas quando alguém pergunta: "sobre o que que é o artigo (ou o filme)?" e você não consegue mencionar a idéia central, se é que ela existe, ou os objetivos. O personagem principal de "Garotos Incríveis", um escritor e professor cujo único sucesso já completa sete anos, está preparando um novo livro. Era pra ser um livro curto (de duração, não das idéias), umas 300 páginas, mas vemos que, após datilografar o número 261, ele acrescenta mais um "1". Ou seja, ele está redigindo uma obra imensa, sem nexo, altamente descritiva, onde a árvore genealógica do cavalo do tio é dada, acho que não vai chover hoje, e ainda está longe de terminá-la. Segundo uma de suas alunas, outra escritora brilhante, interpretada por uma dessas estrelinhas de TV a cabo chamada Katie Holmes, tá, vamos fingir que acreditamos que este pessoal sabe escrever o próprio nome, voltando ao assunto, esta mocinha aponta que ele poderia criar um romance melhor e fazer escolhas, que é a arte de escrever, se não trabalhasse "sob a influência" de drogas. Ufa! Parece que você leu três páginas, mas foram só umas cinco linhas. Assim é o filme: dura menos de duas horas, mas dá a impressão de durar mais de três. É um épico do lugar nenhum.
Eu gosto do Michael Douglas. Sempre gostei, primeiro como produtor, pois ele foi responsável por obras importantes dos anos setenta, como "Um Estranho no Ninho" (não, não é sobre passarinhos alienígenas) e "Síndrome da China", sem ligação com países asiáticos. É sobre uma usina nuclear mesmo, e é brilhante. Pena que seja impossível de encontrar em vídeo, e a TV não passa nada que preste. Michael contracenou com a Sharon Stone em "Instinto Selvagem", e, aproveitando o embalo da época, tornou-se um Casanova americano. Gostei que nosso criativo astro alegou, ao ser flagrado pela esposa, que era viciado em sexo, e lá foi ele se internar num spa. Hoje, nosso herói se casou com a beldade de Hollywood Catherine Zeta Jones, que deve ter idade pra ser sua bisneta, mas o que isso importa, se a moça já fez par romântico com o Sean Connery, e o que isso tem a ver com o filme em questão? Michael está velhinho em "Garotos Incríveis" e traz uma voz esquisita na bagagem. Pensei que fosse o Joe Pesci. Todos têm vozes estranhas, talvez a qualidade do som no cinema não estivesse boa. Michael quase certamente será indicado ao Oscar por sua corajosa decisão de aparentar na tela a idade que tem na vida real.
"Garotos Incríveis", a julgar pela profusão de nomeações ao Globo de Ouro – que, ao contrário do que se pensa, não tem nada a ver com a Rede Globo –, deve ser lembrado pelo Oscar em várias categorias. Aí você pode questionar: ué, mas o filme merece? É bom? Não, não é bom, mas também não é ruim. "Erin Brokovich" também não é grande coisa e vai ser indicado, simplesmente porque este ano de 2000 que acabou de acabar foi de uma safra terrível. Pense bem: quantos filmes bons de verdade você viu? Chega no três? Agora, quantos filmes péssimos? Use os dedos dos pés pra ajudar a contar.
"Garotos Incríveis" tem gente de respeito, como o Tobey Maguire, de "Regras da Vida", a Frances McDormand, que decorou sua lareira com o Oscar de "Fargo", e um dos melhores atores de sua geração, Robert Downey Jr, de "Chaplin", recém-saído da prisão mais uma vez por uso de drogas. Tem um cachorro morto também, devo confessar que nutro uma antipatia natural por qualquer filme que mata cachorro, mesmo de mentirinha. A direção é de Curtis Hanson, super badalado depois de "Los Angeles, Cidade Proibida". Viu só no que dá escrever sem rumo? E juro que eu nem estava "sob a infuência".

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