Sofia
Oi Lola, tudo bom? Sou uma novata no seu blog e agora leio diariamente, gosto muito dos seus posicionamentos, acho que o feminismo está se tornando o campo mais dialógico da esquerda.
Comecei a me interessar por questões feministas há pouco tempo, mais ou menos no meio da faculdade quando comecei a entrar no mercado de trabalho. Estudei design e hoje estudo cinema/edição e em ambas as áreas operei/opero muitos softwares e vejo que tem um preconceito muito grande sobre a capacidade e agilidade feminina para com o computadorzinho. É frustrante isso mas pelo menos em edição temos uma tradição mais feminina porque nos tempos da moviola as pessoas tinham que cortar e costurar/colar pedaços de película.
Mas enfim, são tantas questões que eu poderia levantar, né, mas o que eu queria falar mesmo é que eu tenho uma irmã de 9 anos (tenho 23) e uma dificuldade de fazê-la entender certas coisas nocivas na sociedade ou se ela é ainda muito jovem pra entender.
Como eu disse, só me dei conta da sociedade machista nesse processo de achar um emprego, na minha cabeça a escola era igualitária todos tinham a mesma aula, tinha meninas que tiravam boas notas assim como meninos que tiravam boas notas (na minha sala sempre era uma menina que encabeçava as melhores notas) mas claro que isso não tem nada a ver com "ninguém era machista no colégio", ou "a instituição mesmo não era machista".
Há um tempo atrás vejo a minha irmã se queixando de um menino da outra turma que fica atrás dela (aliás, resolvi escrever esse e-mail por causa do post do dia 23). Ele escreve cartas, manda presentes, no recreio fica seguindo, na festa junina mandou um correio do amor... Todos acham muito bonitinho isso, mas a minha irmã é uma menina muuuito tímida, odeia exposição e ela acaba sendo sem querer a menina mais falada da escola. Ela já recusou muitos pedidos de namoro dele, um dia desses teve até xingamento por parte dele (ela nao quis me dizer qual foi...). Isso acabou por me reavivar um caso da minha infância que eu tinha esquecido até: tinha 8 anos e um menino também gostava muito de mim e eu sempre recusei, até que um dia o irmão mais velho (12 anos) dele ligou pra minha casa (não sei como eles arrumaram meu tel) e ele me ameaçou falando que se eu não aceitasse o pedido de namoro do irmão dele, ele me bateria. Prontamente chamei a minha mãe eles desligaram na cara dela. Acabei que não namorei e também não me bateram, mas isso me traumatizou na época, e resolvi contar pra ela. Falei que tinha casos de homens que não aceitam o não e que ela tinha que deixar isso claro pra ele e para as professoras que ela não gosta desse comportamento. Ela me disse que não, mas tenho quase certeza de que as profs não devem achar nada de nocivo nisso, que ele é romântico, sei lá, e que se a minha irmã não faz nada é porque pode estar até gostando de ser bajulada. Eu não sei como ela se sente (ela está incomodada mas não expressa muito bem os sentimentos, se está com raiva, triste) mas na época que isso me aconteceu me senti invadida porque ligaram pra minha casa e acharam que seria possível cercear a minha liberdade dentro da minha casa.
Essas coisas infantis são vistas com um olhar mais brando, claro, mas acho que isso deveria ser mais discutido nas escolas. Não sei se foi uma conversa muito precoce minha, não sei como fazer uma abordagem mais interessante pra ela... Pensei em poupá-la disso pra que ela ache que isso aconteça com pessoas, não só por ela ser mulher. Pensei em falar com as professoras no colégio, quando falei isso pra ela, ela até disse que ele já tinha parado a perseguição. A minha irmãzinha não deixa muito claro as coisas que acontecem com ela isso me preocupa ainda mais.
Ela está toda imersa nesse mundo de divas e modelos e quer ser uma, é muito linda, vive se olhando no espelho não tem muitos sonhos e não é muito criativa. Eu acho engraçado porque na minha época de criança queria ser presidente. Não sei, posso estar errada, pode ser o jeito da minha irmã que é diferente do meu, mas acho que estão reprimindo cada vez mais as meninas. Isso tem que ser debatido, as crianças são as pessoas que mais assistem TV, não podemos deixar que elas achem que a vida é como um comercial de desodorante ou de cerveja ou novela.
Enfim, o que faço pra levantar a auto-estima da minha irmã (sem ser da maneira diva) e qual seria a melhor forma de conversar com ela sobre questões feministas? É muito difícil pra mim fazê-la se interessar por esses assuntos, ela sempre se esquiva por não gostar de conversas mais sérias. Temo que ela sofra muito disso e não queira verbalizar.
Minha resposta:
Encontrei este lindo relato da Raphaella de Souza, da UERJ, do projeto Letras Pretas. Ela fala sobre como educar crianças negras numa sociedade racista.
Sociologia para crianças, da professora e doutora Tatiana Amendola https://www.cartacapital.com.br/educacao/mae-e-filha-mostram-que-e-possivel-e-necessario-discutir-temas-como-racismo-machismo-e-diversidade/?utm_campaign=novo_layout_newsletter_-_com_webinar_2008_usar_ate_3108&utm_medium=email&utm_source=RD+Station
Chimamanda
