quinta-feira, 29 de dezembro de 2005

CRÍTICA: A LENDA DO ZORRO / Heróis mascarados

Sete anos depois de “A Máscara do Zorro”, chega agora “A Lenda do Mesmo Cara”. Apesar de “Máscara” ser bonitinho, eu não tava exatamente prendendo o fôlego enquanto aguardava a seqüência. Desta vez o Antonio Banderas, digo, o Zorro, deve ajudar a Califórnia a se livrar dos mexicanos corruptos e tornar-se um Estado americano, sonho de qualquer pedaço de terra. Mas o casamento com a linda Catherine Zeta-Jones não anda bem e, pra piorar a situação, tem um almofadinha francês planejando destruir os EUA usando barras de sabão (deve ser justiça poética, suponho). Não é preciso ser bidu pra prever como tudo vai se resolver.

Ou seja, politicamente falando, o filme é podre. Começa mostrando que em 1850, várias décadas antes do Schwarzza virar governador da Califórnia, o vilarejo devia votar se queria ou não se anexar aos EUA (referendo a gente conhece bem, só vota mal). O que “Zorro” não revela é que isso se dá dois anos após o fim de uma guerra entre México e EUA, quando o México foi tungado de boa parte do seu território. Uma das causas dessa guerra era que os americanos, sabe, aqueles heróis da liberdade, eram a favor da escravidão e o México, contra. Outro fato que passa longe de “Zorro” tem a ver com a realidade de hoje. Sabia que, nos últimos anos, 10% da população mexicana emigrou pros EUA? Dez por cento, sério! Um jeito de encarar essa questão é ver a América como terra das oportunidades, o paraíso, e o México (e, por extensão, toda a América Latina) como inferno, e todo mundo tem o direito de procurar uma vida melhor e tal. Essa ladainha a gente conhece. Outra é ver como o imperialismo produziu um mundo em que a imensa maioria dos países é pobre. E o México receberia sua porção de sofrimento extra-large por ser mais quintal do império que os quintais daqui do sul. Não é à toa que um dos refrões mexicanos é “Pobre México: tão longe de Deus, tão perto dos Estados Unidos”.

Mas, claro, “Zorro” é só entretenimento escapista, com algumas mensagenzinhas aqui e ali pra não perder a viagem. Uma das mensagens é mais ou menos assim: “Olha, França, se da próxima vez que formos invadir um país você não nos apoiar, vai ser vilã dos nossos filmes durante um tempão, tá ligada?”. E, por falar em vilões, nesse tipo de aventura os roteiristas precisam ser criativos. Por exemplo, eles têm que planejar uma morte horrenda pros bandidos, mas sem que essa morte seja causada pelo herói, porque a gente não pode sentir que o herói seja um sádico sanguinário ávido por vingança. Logo, é só um acidente que a cabeça de um nojentão seja explodida por uma gota de nitroglicerina, entende? E, por falar em explosões, lembra do meteoro gigante que acabou com os dinossauros? Depois de ver “Zorro”, a gente passa a suspeitar que tudo começou com uma explosão na Califórnia. Tá, extinção dos dinos é exagero, mas que foi assim que se originou o deserto americano, isso não resta dúvida.

Breve pausa pra elogiar o filme. Há UMA frase engraçada, quando o Banderas diz pro filho (é, tem filho, é uma diversão bem família): “A prisão muda a vida de um homem”. E a trama não é chata – os Zzzs vinham mais da tela que do público. E gostei do galope do cavalo em dolby-stereo. Pra que mais a gente iria ao cinema se não pra ouvir galope? Aliás, o Capeto, ou Herói, não, acho que esse era o cavalo de outro super, talvez Tornado?, bom, o eqüino de plantão rouba as cenas. Mas fiquei pensando se um cavalo realmente inteligente pularia de um penhasco pra pousar num trem em movimento. Talvez ele tenha alguns neurônios prejudicados por fumar e beber.

Ah, ainda sobre os heróis mascarados. Taí uma coisa que não entendo dessas máscaras. O Zorro vive numa vilinha, e pra se distinguir do Don Diego ele só usa uma vendinha nos olhos, com buracos ainda por cima. Será que nenhuma alma com QI mais elevado liga os pontinhos e vê que o Don Diego é o Zorro de chapéu? O maridão me assegurou que o verdadeiro disfarce não é a máscara, mas a personalidade do herói no dia a dia. Tipo Clark Kent e Superman. A Lois Lane vê ambos todo dia sem chegar à conclusão que são um só sujeito. Pro maridão, o Clark tem uma personalidade tão diferente da do Super que ninguém vai achar que é o alter-ego dele. Mas esse argumento não me convenceu, então eu disse: “Amor, se houvesse um cara igualzinho a você, velhinho e careca, mas esperto e com calça de couro, eu ainda assim desconfiaria que é você”. Touché.

Nenhum comentário: