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sexta-feira, 11 de junho de 2010

UM MODELO DE QUEM SABE LIDAR COM A CRÍTICA

A primeira crítica a gente nunca esquece.

Estou perplexa. Não sei se você já ouviu falar do caso do apresentador de programa policial e do aluno de jornalismo de Ponta Grossa - PR. Aparentemente, vários blogs falaram nisso em março e abril, quando o assunto veio à tona, mas você sabe como eu sou, meio lerdinha, então só vi um post ontem no Azenha. O caso é o seguinte: um rapaz de 20 anos escreveu, para uma disciplina chamada Crítica de Mídia, um breve artigo criticando um programa da TV a cabo local. O artigo do aluno você pode ler aqui. É bem soft e, pra ser franca, cheio de clichês, criticando a “linguagem exageradamente coloquial”, atestando que o programa “trata os assuntos com parcialidade”, e que “quanto pior o acontecimento parece maior o esforço para registro e transmissão”. Se eu fosse professora do rapaz, lhe imploraria para que me contasse algo que eu não soubesse.
Convenhamos: falar mal de um programa mundo-cão do tipo Ratinho é a coisa mais fácil do mundo. Esses programas são como urubus, se alimentam de carniça. Vivem da violência. E o pior é que atraem um público amplo e fiel, que vibra com a violência que finge condenar, e que elege (muitas vezes literalmente, para vereador e deputado) os apresentadores como porta-vozes da moralidade. Blergh. Toda cidade tem pelo menos um programa assim. E eu adoraria viver num mundo em que esse lixo televisivo não existisse, mas defendo o direito que existam. Não que o aluno de jornalismo, Lucas, tenha pedido que o programa fosse tirado do ar ou algo do gênero.
Pois bem. O apresentador do Rádio Patrulha 2, um tal de Zeca, decidiu ler o artigo do aluno no ar. Começa com “seu filho de uma égua” e segue com todo tipo de ofensas e ameaças. Chama o rapaz de “vagabundo”, “safado, filho de mãe solteira”, e diz que fará o pobre Lucas engolir o computador. Transcrevo alguns destaques do apresentador revoltado, mas, se preferir, pode conferir a parte 1, 2 e 3 do programa no YouTube:

- “Guarda a sua opinião pra você”.
- “O que eu vou fazer pra você você ainda não viu”.
- “Vou te pegar, viu? Tô falando isso sério pra você”.
- “Se eu te pegar você tá f*dido”.
- “Se acontecer alguma coisa com você hoje, fui eu que te peguei”.
- “Vocês jornalistas, que acham que são deus, que nunca fizeram porcaria nenhuma por esse país, porque o que faz aqui é adevogado [sic], ou o Ratinho, vocês só sabem escrever isso aqui, né Lucas? E a mamãe, como é que tá?” [ok, eu admito: tenho preconceito contra quem fala adevogado].
- “Eu sei de pessoas do seu curso que gostam de uma canabis”.
- “Porque eu aguento de tudo na minha vida, já aguentei tiro, mas isso aqui você vai engolir” [mostra o computador].
- “Não quer, não assista, mas não faça isso comigo, porque você arranjou o pior inimigo da sua vida agora, cara, porque eu arrebento a minha vida, mas eu arrebento com você agora.”
- “Isso pra mim é pior que um tapa”.
- Aí liga uma espectadora pra dizer que ela e a filha estão indignadas com a falta de ética... do aluno de jornalismo! “É lamentável que uma pessoa chegue a esse nível. [...] Tô chocada que um universitário esteja falando isso”.
- Depois Zeca lê os dois comentários postados no blog do aluno, obviamente xingando os comentaristas e anotando seus nomes. É um momento surreal da TV brasileira quando o apresentador gasta longos segundos lendo as sugestões do comentarista sobre tipos de letra para serem usados no programa: “Existem fontes bem mais bonitas [que a Arial], como a Din, a Heras, a Helvetica, a Square, a Futura ou a Globoface”.
- Mais Zeca: “Quem tem c*, me perdoe, é chulo, quem tem bunda, tem medo”.
- “É o meu programa, é a mesma coisa que eu falar que a mãe dele peida de noite quando tá comigo”.
- Finaliza com Zeca exibindo a barriga que já foi baleada: “Porque eu fiz isso por Ponta Grossa, pra mostrar pra vocês quem é bandido, e esse pra mim é bandido”.

Uma flor de pessoa, certo?
Lucas fez muito bem: fez boletim de ocorrência, abriu processo, Zeca foi demitido e o programa tirado do ar, mas já está de volta. Outra coisa chocante é que a Universidade Estadual de Ponta Grossa, ao invés de dar apoio jurídico ao aluno, lavou as mãos e disse que o problema é de esfera privada, entre ele e o apresentador. Hã?
A atitude da universidade é absurda e irresponsável, sem dúvida. As ofensas de Zeca são horríveis e, lógico, machistas, com peso extra na mãe do aluno, julgada e condenada por sua sexualidade. Típico. Mas o que me choca mais, o que me motivou a escrever este post, e o que não sai da minha cabeça, é: o apresentador e seu programinha nunca tinham sido criticados antes? Isso é reação de quem recebe a primeira crítica na vida! E, como eu disse lá em cima, nada do que o aluno escreveu é novidade. Ou um programa policial chamado Rádio Patrulha (não precisa nem assistir pra saber) não é sensacionalista? Não faz de tudo pra aumentar a audiência? Não é parcial? (Lucas, querido, tudo é parcial).
E depois eu que sou grossa e intransigente! A próxima vez que alguém me acusar de não aceitar uma crítica, vou pôr o link pra este post. E ainda mostro minha barriga!

sábado, 15 de maio de 2010

FOLHA PROVA QUE NÃO FAVORECE NINGUÉM, E MINHA PESQUISA

Sabem a pesquisa que fiz só por curiosidade, perguntando em que vocês iam votar pra presidente? Entre os 561 votos, 287, ou 51%, disseram que votarão na Dilma, do PT. Em segundo lugar veio a Marina do PV, com 86 votos, ou 15%. Em terceiro, um sonoro “Ainda não sei”, com 66 votos, ou 11%. Encostadinho no “não sei” veio o Serra, do PSDB, com 61 votos, ou 10%. “Ninguém – vou anular” recebeu 44 votos, ou 7%, e “outro” (que não sei quem é; será Plínio de Arruda Sampaio, do PSOL?), 17 votos, ou 3%. Muito obrigada por participarem! Eu bem que imaginava que a maioria vai votar na candidata do PT.
Mas querem saber o que me inspirou a realizar a enquete? Foi uma pesquisa da Folha de SP entre seus leitores, divulgada no início do mês. O Datafolha entrevistou 350 de seus leitores (minha pesquisa teve mais gente e, só pra constar, o sistema do Blogspot não permite votar mais de uma vez), e chegou ao seguinte resultado: 54% votam no Serra, 18% na Marina, 15% na Dilma. Até aí, nada de mais. Até esperava uma vantagem maior pro Serra — afinal, ele é de SP, mesmo estado do jornal. E fico um pouco surpresa com os 15% masoquistas, que não abandonaram a assinatura nem depois do ditabranda ou do artigo afirmando que Lula tentou estuprar um prisioneiro de cela. Mas não foi nada disso que motivou a minha pesquisa, e sim este número do Datafolha: para 74% dos leitores, o jornal não favorece nenhum candidato (13% acham que favorece Serra, e 6%, Dilma). Quer dizer, dois terços dos leitores creem que a Folha é neutra e imparcial! Não é incrível?
Certo, nem sei por que me surpreendo. Tipo, todas as pessoas que conheço que leem a Veja e a levam a sério pensam exatamente como a revista. Não creio que o semanário forme a cabeça delas. Apenas que elas buscam na Veja dados e informações para “provar” seus pontos de vista. E encontram, lógico. Eu não conheço uma só pessoa de esquerda que leia a Veja (a menos que seja para “saber como pensa o inimigo” e poder criticá-lo). Nenhum amigo meu que vota no PT lê a Veja. E, por coincidência, os leitores de Veja que conheço são todos radicalmente anti-PT, anti-MST, anti-sindicatos em geral, anti-Chavez, anti-Evo Morales... Enfim, anti qualquer coisa de esquerda que a direita-que-não-é-direita-porque-essa-divisão-acabou-com-a-queda-do-muro-de-Berlim elege como seu inimigo natural. E o engraçado é que essas pessoas consideram a Veja neutra e imparcial! Assim como elas se veem como perfeitamente justas e equilibradas, apenas do lado da verdade (sim, elas creem em verdade absoluta). Para elas, ideologia é coisa que move os outros — os petralhas, por exemplo. Já elas têm o pensamento que têm porque viram a luz, imagino.
Mas a Folha não é a Veja. Pelo menos ainda não. Apesar da campanha sistemática que o jornal faz ao governo, ela não parece ter um porta-voz tão abertamente declarado como Reinaldo Azevedo ou Diogo Mainardi. E os leitores também não são todos de direita (o que quer dizer que estou me baseando na minha experiência pessoal pra declarar que conheço gente de esquerda que lê a Folha. O número diminui a cada ano, mas conheço). Eu mesma li a Folha durante toda a minha vida. Por muitos anos, inclusive depois de deixar SP e nos instalarmos em SC, assinávamos a Folha e o Estadão. Eu preferia o Estadão. Afinal, já que ambos os jornais eram de direita e não me representavam, ao menos o dos Mesquita era mais assumido, enquanto a Folha posava de moderninha. Com o tempo me cansei. Além do mais, duas assinaturas eram caríssimas. Mantivemos apenas o Estadão. E aí decidi que ficava revoltada lendo o jornal, que lá não havia democracia ou liberdade de expressão coisa nenhuma (porque, se houvesse, haveria mais de um pensamento publicado), que nunca havia “o outro lado”, que todos os colunistas pareciam um só, que ainda por cima seguiam exatamente a mesma linha editorial dos patrões, e que, se eu realmente quisesse ler o jornal, poderia fazê-lo de graça, na internet, sem ter que desembolsar 400 reais por ano (era isso? Não lembro). Paramos de assinar qualquer tipo de jornal em 2007, quando fomos pra Detroit. E não sentimos falta (apesar d'a gente gostar muito de ler enquanto come, e nossos laptops não chegam nem perto da cozinha).
Mas voltando a minha pesquisinha interna, fico mais uma vez orgulhosa de ter leitor@s como vocês. Não só porque vão votar na Dilma (ok, isso ajuda), mas porque, se eu fizesse uma outra pesquisa (querem que eu faça?), perguntando se vocês acham que este bloguinho que vos fala é parcial e favorece algum partido/candidata, 95% responderiam o óbvio ululante: sim, dãã. Ou seja, vocês são mais inteligentes que o leitorado da Folha. Ou pelo menos mais honest@s.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

A VEJA SÓ CULPA AS CHUVAS DE VEZ EM QUANDO

Adoro como a Veja é neutra e imparcial! Na capa de fevereiro, a manchete foi “Por que chove tanto”, e já vinha com resposta: “Uma rara combinação de fatores atmosféricos é a causa do dilúvio que há mais de 40 dias castiga o Sul e o Sudeste do Brasil”.Na capa de abril a coisa muda um pouquinho de figura: não precisamos nem de manchete, já que temos a foto do Cristo Redentor chorando. E o editorial: “Culpar as chuvas é demagogia. Os mortos do Rio de Janeiro que o Brasil chora foram vítimas da política criminosa de dar barracos em troca de votos”.
Quando SP estava debaixo d'água (e tem gente que diz que os bairros periféricos foram mais uma vez os mais afetados porque o governo paulista fechou as comportas para poupar as Marginais), a explicação era meramente meteorológica. Chove forte e o Sul e o Sudeste — nada de ênfase para o estado de São Paulo, que foi quem sofreu mais — é castigado. A culpa é de São Pedro. Culpados pelos dilúvios, em SP, só quando a prefeita era a Marta. Na capa, no cantinho à esquerda, o lembrete aos leitores: “São Paulo sob as chuvas mais fortes dos últimos 63 anos”. A causa do dilúvio não tem como ser a má administração pública, pois o estado é governado pelo mesmo partido há dezesseis anos. E a Veja gosta muito desse partido. Tanto que, quando houve a cratera do metrô (algo que seria tratado como escândalo se tivesse acontecido em outro lugar e fosse responsabilidade de outro partido), a capa da revista foi dedicada a nossos bichinhos de estimação, os cães (o título, "Uma história de amor", bem que podia ser referência ao caso amoroso entre um veículo de comunicação e um certo partido). E quando caiu parte do Rodoanel? Não lembro, mas algo me diz que deve ter sido sobre gatinhos ou sobre a última dieta da moda.
No Rio os governantes não são muito bem vistos pela Veja. Inclusive, um dos problemas do Serra (candidato que a revista obviamente apoia, mas não admite isso num editorial, como deveria fazer se quisesse ser minimamente transparente) é que ele terá dificuldade para arranjar palanque no Rio. Até agora, só surgiu o Gabeira (PV), que sairá candidato por uma ampla coligação que inclui PSDB e DEM (uma aliança que deve se repetir em âmbito nacional no segundo turno, quando Marina apoiar Serra). Logo, a revista não tem dúvida que os atuais governantes de lá adotam “políticas criminosas”. E repare no elitismo, no ódio de classe: os políticos cariocas dão “barracos em troca de votos”. Barracos! Coisa de pobre, argh!
E já que estamos falando nesse assunto desagradável que são os pobres, você deve ter visto a animação da Eliane Catanhade, da Folha, narrando a convenção do PSDB. Lá pelas tantas, na tentativa de fazer do PSDB algo que ele definitivamente não é — um partido do povo —, Eliane cita um assessor anônimo que disse que, desse jeito, a julgar pela convenção, o PSDB até parecia um partido da massa. “Mas de massas cheirosas”, reiterou o sujeito citado por Eliane. Porque as massas em geral não cheiram muito bem, sabe? Nem debaixo d'água.
Pra quem não estava vivo na época, uma das frases que imortalizou o nosso nada saudoso ditador Figueiredo foi quando ele afirmou que preferia o cheiro de cavalos ao cheiro do povo. Pra uma certa elite, as massas fedem.Pro Globo, outro monopólio da mídia que apoia Serra, quem fede é a Dilma, como o jornal fez questão de estampar numa foto.
No entanto, quando eu (e um monte de outras pessoas) digo que a nossa mídia não tem nada de imparcial, aparece uma multidão pra afirmar que não, imagina, parcial sou eu. Ué, lógico que sou parcial! A diferença é que não finjo ser neutra.
Sinceramente? Eu quero mais é que a Veja se afogue.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

EU QUERO UMA PEDREIRA!

Ha ha, adorei a frase da Eliziane, uma moça que está fazendo curso não para tornar-se costureira ou manicure, mas pedreira: “A gente ainda depende de homens só pra matar barata” (ou, como o Globo melhorou, “Só dependo de homem para matar barata”).
Tenho percebido que toda vez que saem matérias sobre mulheres trabalhando em construções (e eu já li mais de uma dúzia de artigos desse tipo nos últimos anos), aparece uma declaração como esta, vinda de uma engenheira: “As vantagens em se trabalhar com a mulher numa obra são muitas: elas são mais detalhistas, mais limpas, organizadas, mais econômicas com o material (porque sabem administrar e não desperdiçam) e estão sempre querendo mais serviços”. Eu acredito!
A matéria, embora curta, ainda traz bons exemplos de como “homem que ajuda em casa” está a anos-luz de distância de realmente dividir os afazeres domésticos com a mulher, e de como ainda há marido ditador que não permite que a mulher trabalhe fora ou sequer estude.
O único porém do artigo é um parágrafo que aponta que essas mulheres pedreiras não abrem mão da vaidade feminina, e que estão sempre maquiadas, algo ― suponho ― totalmente imprescindível quando se está mexendo com gesso e argamassa. Já notou como toda santa reportagem que trata de mulheres em campos tradicionalmente reservados aos homens inclui no mínimo um parágrafo sobre vaidade feminina? Não falha nunca! Até compreendo a estratégia (muitas pessoas preconceituosas acham que um emprego desses “masculiniza” a mulher), mas o ideal seria que os preconceituosos fossem deixados falando sozinhos.
Bom, eu adoraria poder contratar uma pedreira mulher, até porque não é fácil encontrar um pedreiro homem competente. Na realidade, em todas as obras e reformas que contratei alguém pra fazer, só dei sorte com um pedreiro, que foi quem ampliou e fez o sobrado que hoje é a casa da minha mãe. Ele era crente, e muito responsável e cuidadoso. Lembro quando, perto do natal daquele ano, eu e o maridão, burrinhos como só, demos uma garrafa de champanhe pra ele, só pra ouvir “Não bebo, minha religião não permite”. Infelizmente, nunca mais o encontramos para outras obras. Pedreiro quando é bom, pelo menos por aqui, rapidamente se torna capataz de obras. Ou seja, ele vende o pacote completo e fornece os pedreiros, uma equipe informal que trabalha com ele. Torna-se raro ele mesmo por a mão na massa de novo. E eles ganham um bom dinheiro.
Por falar em dinheiro, preciso incluir um adendo: nada contra mulheres fazerem cursos de costureira ou manicure. É só que dá pra ganhar um salário mais alto sendo pedreira. Muito do estereótipo de uma profissão se dá pra manter o status quo. As mulheres não ocupam 90% dos cargos de professoras primárias nas escolas apenas por estarem mais acostumadas a lidar com crianças. É também porque esse emprego é mal remunerado. Não que uma mulher veja uma profissão que paga mal e diga: “Oba, é isso que eu quero fazer da vida!”. Mas a sociedade inteira encoraja mulheres a trabalharem em serviços que pagam menos, já que esse detalhezinho como salário não importa tanto pra gente (preste atenção quando você ouvir alguém falar em “vocação”, se isso não é usado como parte do argumento do “salário não importa”, e se a maior parte que faz esse discurso não é mulher). Como homens ainda são vistos como chefes de família, calcula-se que eles não poderão sustentar uma casa com salário de professor primário, ou de babá, empregado doméstico ou manicure. E é por isso, também, que a desigualdade salarial continua gigantesca entre homens e mulheres (melhor não falar que até homens na mesma profissão, às vezes no mesmo escritório, ganham mais que suas colegas mulheres).
Outro adendo, desta vez à frase da Elziane: pô, vamos parar de sexismo! Homens são essenciais para muitas outras coisas além de matar barata. Por exemplo, aqui em casa tem bastante lesma. Eu tenho nojo de chegar perto, então peço pro maridão colocá-las pra fora. Sempre tenho que pedir, porque ele nunca vê uma lesma. Ela pode estar a um palmo dele, que ele não vê. Ele pega uma pá e uma vassoura (geralmente só chega perto desses instrumentos de limpeza nessas ocasiões), varre a lesma pra dentro da pá, e aí a joga no jardim. Eu chamo de “bungee jump pra lesmas”. Acho que elas se divertem. Pelo menos sempre voltam.

domingo, 13 de dezembro de 2009

COMENTÁRIO DETURPADO, ANONIMATO E TROLLS

Tô passada! O post da Conceição Lemes no Vi o Mundo é muito pertinente pra se falar da blogosfera. Parece que o que aconteceu foi o seguinte, só pra apresentar um resuminho pra vocês: um tal de Sidnei Soreiro, um internauta comum, sem blog nem nada, deixou um comentário num post do blog do ex-secretário de redação da Veja, Augusto Nunes. Pelo jeito, o tal comentário foi algo nessas linhas, talvez com alguns palavrões: Mas o que saiu no blog do Augusto Nunes foi isso:Hã? O que o blog da Dilma tem a ver com a história? Ele nem sequer é feito por jornalistas, mas por eleitores da candidata a presidente. E não recebem nada por isso, não são profissionais. Sou seguidora do blog da Dilma, e dois entre seus dez editores são comentaristas ocasionais aqui no meu bloguinho (o Daniel, de Fortaleza, e o Saraiva, do Rio). Mas, enfim, Nunes decidiu adaptar um comentário que o agredia pra fazer agressão gratuita a um outro blog.
O incrível mesmo é como o sentido do que Sidnei Soreiro quis dizer saiu totalmente deturpado. A repórter do Vi o Mundo ligou pro Augusto Nunes pra conferir, e essas palavras textuais saíram da boca do jornalista da Veja: “Quando critica ofendendendo, sai do jeito que eu quiser”. Afinal, “O que o cara espera, que eu vá publicar insultos a mim?”. E ainda: “Eu jogo segundo as regras do jogo. Se querem partir para a sacanagem, é comigo mesmo”. Ah, a arrogância do quarto poder!
Eu fico de cara. Sabemos que comentários que são enviados para a seção de cartas de jornais e revistas são editados, por motivo de espaço (e de clareza). E muitas vezes, numa edição, fora do contexto, perde-se algum sentido do que foi dito. Mas alterar propositalmente uma mensagem, para dizer o oposto do original, é má fé. Além do mais, em blogs não existe a desculpa de falta de espaço.
Nem dá pra reclamar muito da falta de pluralidade de opiniões nos comentários. Basta abrir a seção de cartas da Folha, Estadão ou Veja pra ver que quase todas as cartas publicadas são elogiosas. Até no episódio recente em que a Folha publicou um artigo sem provas ou testemunhas dizendo que o Lula tentara estuprar o “menino do MEP” — um caso que entra pra história do jornalismo marrom no Brasil — o jornal conseguiu reunir apenas correspondência de apoio (uma carta era de um dos Cassetas, admirando a "coragem" do jornal). Os blogs de colunistas da Veja (aquela revista que, em junho, publicou uma entrevista com o governador do DF, José Roberto Arruda, chamada “Ele deu a volta por cima”. Uma blogueira, a Paola, logo depois descobriu quanto custou aos cofres públicos a entrevista elogiosa: módicos 442 mil reais. Era o que Arruda iria gastar pra distribuir Veja nas escolas) como Reinaldo Azevedo e Augusto Nunes só publicam comentários adversos quando se enganam e os deixam passar por acaso. Mas censurar comentários é uma coisa. Acho que os blogueiros têm o direito de vetar insultos. Já deturpar um comentário é algo totalmente diferente, não?
E sobre a censura, eu ainda não tenho nem opinião formada. Evito ao máximo censurar comentários aqui (até porque este blog não tem moderação de comentários. Eu só os leio depois de publicados, quando vocês os leem). Até hoje, prestes a completar dois anos, este bloguinho teve apenas três trolls. Por coincidência, três homens de direita. Só cortei alguns dos comentários do mais recente deles, o Oliveira, que aparecia apenas pra lamentar o fato da minha mãe não ter feito um aborto quando eu estava no seu ventre. Ultimamente o Oliveira tem se moderado um pouquinho e só me chamado de feia, boba, gorda e burra, além de falar mal do Lula (em posts que não têm nada a ver com política), destilar seu ódio contra nordestinos, e divulgar sua tese que só empresários deveriam ter direito a voto (assim teríamos uma democracia de verdade, entendem?). Eu o considero meio inofensivo, rústico até. E acho até bom pra que as leitoras possam observar de perto a opinião de um troglodita de direita. Sempre me lembro da frase usada em Silêncio dos Inocentes pra explicar o fascínio por um psicopata: “It's so rare to capture one alive!” (“É tão raro capturar um vivo”). Eventualmente aparecem outros internautas com intenção de ofender, mas, pra mim, o que faz de um troll um legítimo troll é a persistência. Eles são sistemáticos. E desses, felizmente, só tive três.
Francamente, considero uma perda de tempo escrever um comentário pra algum blog de direita. Eles simplesmente não serão publicados. Sem falar que alguém como o tio Rei não é bobo: ele sabe bem o que seus adversários pensam dele. É exatamente sobre isso que ele escreve dia sim, outro também. Em agosto, um leitor perguntou pra ele o que ele vai fazer se o objeto de 99% das suas críticas, o PT, perder as eleições. Tio Rei deixou claro que continuará criticando a esquerda (porque o que mais a direita pode fazer?): “Ah, sim: os petralhas costumam me enviar provocação indagando se não haverá mais neste blog críticas ao governo caso Serra seja eleito. Acredito que sim. Duvido que, se presidente, ele venha a fazer tudo o que e como eu gostaria que fosse feito. Mas ninguém precisa fazer ilações sobre o óbvio, porque eu mesmo o escancaro: continuarei a combater os mesmos que combato agora, estejam eles dentro ou fora do governo. 'Que mesmos?', indaga o distraído? Respondo: OS ASQUEROSOS QUE DESPREZAM A DEMOCRACIA! A razão é simples: eles não vão mudar. Nem eu!”. Democracia pra direita é chamar o golpe de 64 de Revolução. Eles até hoje vibram com o replay do golpe em Honduras, e torcem para que cheguem novas “revoluções” na Venezuela, na Bolívia e aqui. Pra instalar a democracia, sabe?
Em setembro, outro blogueiro famoso, mas à esquerda, o Ricardo Kotscho, explicou por que bloqueia comentários anônimos no seu blog:
Qual é o problema de se identificar honestamente, sem usar codinomes, nicks, pseudônimos e outros disfarces? Tem medo do que ou de quem esta gente? Da polícia, do patrão, do governo ou da Justiça? Se é da Justiça, tem mais é que temer mesmo porque, apesar da liberdade de expressão agora assegurada na internet, o Código Penal continua em vigor e destruir reputações é crime. Nenhum jornal publica cartas anônimas. O leitor tem que dar não só seu nome, como RG, CPF, endereço, etc. para que as cartas sejam publicadas. Por que haveria de ser diferente na internet? É preciso deixar bem claro que há limites para tudo na vida. A internet é como nossa casa virtual, é preciso respeitar o dono. Ninguém pode entrar na casa dos outros chutando a porta e xingando o dono. Depois, quando o comentário destes valentes anônimos não é publicado, eles saem gritando em letras maiúsculas como se todo mundo fosse surdo: 'CENSURA!CENSURA!CENSURA'. Nada de censura: é só uma questão de civilidade e respeito aos demais leitores”.
Ainda assim, é comum encontrar comentários hostis (não só que discordam do post, mas hostis mesmo) nos blogs do Kotscho, do Azenha, e de outros blogueiros à esquerda. Mas isso que o Kotscho diz merece discussão: por que um comentarista deve se esconder atrás do anonimato ou de um pseudônimo? Qual o temor de dizer o que pensa? E não vou nem falar de blogs que usam o mesmo artifício...
O tal do Sidnei Soreiro pode não ter sido educado com o Augusto Nunes e, por isso, até tenha merecido a censura. Mas ele ao menos não foi covarde e usou seu próprio nome. Nunes tinha duas opções: vetar o comentário ou publicá-lo. Deturpá-lo certamente não era uma opção. Mas, pra quem foi secretário de redação de uma revista que deturpa notícias toda semana, alterar comentário de um leitor da internet deve ser fichinha.
Foto que abre o post do André. Obrigada, André!

Mas hoje é domingão! Um ótimo dia pra vocês lerem os 25 posts do terceiro concurso de blogueiras e votar na enquete ao lado.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

O SR. PISCO DE PEITO VERMELHO WILLIAMS PISOU NA BOLA

- Na minha mocidade, eu preferia poeira à rachadura!

A esta altura todo mundo já sabe da piadinha de mau gosto que o Robin Williams fez sobre o Rio no programa do David Letterman. Ele disse pra Oprah e Michelle Obama não ficarem chateadas por Chicago não ter sido escolhido para sediar as Olimpíadas de 2016. Afinal, não foi uma competição justa: enquanto Chicago levou a Copenhague Oprah e Michelle, o Rio levou meio quilo de pó e cinquenta strippers. Ha ha. De repente foi até um elogio, visto que o ator e comediante já foi viciado em cocaína.
Bom, não creio que o governo deva pedir esclarecimentos ou nada do tipo. É só ignorar. Tampouco concordo com a claque que diz “É só uma piada!”. São os mesmos que gritam “é só um comercial”, “é só um filme” etc, impedindo que se analise qualquer coisa. Eles podiam só dizer “é só a manutenção do status quo” ou “é só o velho preconceito de sempre”, que daria na mesma. Mas, enfim, eu não ia dar um só pio sobre o assunto (que não é muito relevante)... até ver os comentários dos leitores do Estadão. Ah, os leitores do Estadão!... Suas pérolas de sabedoria são mais engraçadas que cem Robin Williams clonados juntos.
Lógico que a maior parte desses leitores concorda inteiramente com o ator e começa seu comentário com “A verdade dói!”. E aí põe-se a falar mal do governo, do Rio, e do Brasil. Como de costume. São esses brasileiros que gostam tanto do Brasil.
Mas o que me fez gargalhar alto foi o comentário de um dos poucos chateados com o Robin. Um que imagina que o ator lê o Estadão. Logo, o incauto leitor decidiu mandar um recado pro ator em inglês. Aparentemente, sem saber inglês muito bem. Não sei se ele usou um tradutor automático da internet, desses que traduzem “I'm your number one fan” por “Sou seu ventilador número um”. Mas taí. Tentem fazer o caminho inverso e descobrir o que o leitor quis dizer em português:

Mr. Robin Williams.
I'm disappointed. Once I had that as one of the most beloved actors. Comment asshole. Are ostracized? Are old? Gaga perhaps? I never thought I would hear of your mouth that comparison. Besides, who are the largest consumers of "dust", crack, and ecstasy of the planet? For it is Mr. Williams, your country and we know that these cocktails do not come from BRAZIL. We have beautiful women, yes we have. Those who may not even the film industry, with millions of special effects succeed, never produce. And we live in throughout the country, while you, poor, are content to go to a program for comment, with wretched words and bizarre comparisons of why we lost the Olympics to Rio Know that everything is fleeting. Until such a program OPRAH. You then ... At your death, will play "POWDER" AMERICAN in your coffin”.

Os highlights pra mim são “comment asshole” (imagino que o leitor queria dizer “comentário babaca”), “dust” (poeira) ao invés de , e “poor” soltinho assim, pra pobre. Gosto também dessas frases: “Know that everything is fleeting. Until such a program OPRAH. You then”, que só podem ser (chutando): “Saiba que tudo é passageiro. Até um programa desses, Oprah. Até você”. Mas essa sentença continua uma incógnita pra mim: “Those who may not even the film industry, with millions of special effects succeed, never produce”. Minha criatividade limitada não permite interpretá-la.
Não sei, talvez o leitor não tenha pensado originalmente em português e daí usado o Babel Fish pra traduzir pro português. Porque o Babel Fish começa com “Sr. Pisco de peito vermelho Williams”. E crack vira rachadura.
Ah, vocês não ficam felizes em saber que nossos empregos como tradutoras-intérpretes estão garantidos até o final do século?

UPDATE: Perguntei pro meu querido blogueiro americano do That's Right Nate o que ele achava da piadinha do Robin Williams. Ele nem estava por dentro, e respondeu: “Eu honestamente não sabia que Robin Williams ainda era convidado a participar de shows que as pessoas assistem”. Mas prometeu investigar.