Adoro o Lula, de verdade. Ele vai deixar saudades.
Neste trecho de uma entrevista exclusiva que deu pra Record (via Vi o mundo), ele diz que não lê a Veja, que não precisa dela nem de outros meios de comunicação pra nada, que se dependesse deles ele teria 0% de popularidade hoje. E que Veja e similares têm o direito de falar o que quiserem, mas que ele também defende o direito de que ele possa falar o que quiser deles. Taí uma coisa que a mídia tradicional não admite. Liberdade de expressão vale apenas pra ela. Não vale para o alvo da crítica. Qualquer crítica à mídia é interpretada como censura. Até direito de resposta é censura... Mas a Veja banir de suas páginas qualquer pensamento que fuja um tiquinho sequer da sua ideologia, aí não é censura. É “linha editorial”. E a revista ainda tem a cara de pau de se proclamar “plural”! Se esse vai ser o mote da campanha do Serra, melhor entregar os pontos já, antes de gastar milhões de reais numa campanha que já nasce morta. Sério mesmo que eles esperam angariar votos com o discursinho fajuto de “Se a Dilma ganhar, o Brasil vai virar uma ditadura”? Primeiro que invocar países como Cuba e Venezuela não vale nada pro povão, que não se preocupa muito com política externa, e não vê o que Chavez e Fidel têm a ver com o nosso dia a dia (hum, eu também não vejo. Como a política deles afeta o Brasil é um mistério pra mim. Sei que serve pras pessoas se posicionarem no espectro ideológico, e só). Depois que não avisaram pros reaças que o PT já está no poder há quase oito anos. Se tivesse algum interesse em implantar uma ditadura, por que não o fez antes? Sem falar que é querer trocar as bolas inventar que o PT, um partido totalmente ligado com a luta pelo fim da ditadura e com as Diretas Já, seja autoritário. Fãs da democracia são os carinhas do DEM, né? Aqueles que ajudaram a implantar a ditadura militar e deram sustento a ela através da Arena... Sei. Mas, voltando à entrevista do Lula, ele se emociona ao falar do empréstimo do BNDES aos catadores de papel. E eu aqui me emocionei também. Chorei baldes. Ok, praticamente qualquer choro perto de mim me provoca lágrimas, mas desta vez exagerei. O Lula é comovente. E é legítimo. Pros cientistas políticos, Lula só pode estar fingindo quando chora, porque é impossível que um presidente se emocione com as conquistas de catadores de papel. Políticos são (ou devem ser) durões, sem coração, não humanos. Isso vai na linha de “político é tudo igual, nenhum presta”, que é obviamente um pensamento de direita (que defende o estado mínimo, ou seja, governo só pra manter a ordem e defender a propriedade de quem tem propriedade). Acho meio impossível ver a entrevista e pensar “Ah, Lula tá fingindo”, mas alguns reaças conseguem. Lula tem aprovação de 85% porque vem fazendo um ótimo governo, causando melhoras visíveis no cotidiano do país. Mas sua carisma, seu afinco às origens, sua insistência em usar linguagem popular, também não atrapalham sua popularidade. E que se dane o cinismo da direita (cuja única paixão política é ser contra tudo que é de esquerda): é gostoso chorar com o presidente, sentir orgulho do que ele diz. Ele vai deixar saudades.
Como eu falei, minha relação com o chocolate encontra-se numa nova crise. Já contei que, na última crise (que praticamente foi a primeira na minha vida de chocólatra, alguns anos atrás), tive uma overdose de problemas chocolatais – meu fígado enfraqueceu, quebrei um dente comendo uma barra, e, pra coroar, comprei um chocolate bichado. Esta crise de agora não foi gerada por tantos fatores. Um deles foi a notícia absolutamente nojenta que toda barra vem com 60 pedacinhos de insetos e um pêlo de rato (ou 8 patas de inseto, dependendo da versão). Isso já me balançou um pouco, já que realmente odeio insetos, e não tenho apreço nenhum por ratos. A outra péssima notícia eu vou contar agora. Espero que esta não seja sua leitura do café da manhã. Eu avisei.
Então, lá estava eu na minha cozinha, devorando uma barra de chocolate. Esta era da Lacta e chama pelo nome de Crocante de Chocolate. Eu não havia aberto a embalagem inteira, só até a metade. Quando terminei de comer aquela metade, fui abrir a outra metade, como é natural pra quem come uma barra de uma sentada só, e foi aí que notei que alguma coisa estava errada. Havia pozinhos, sempre um mau sinal. Uns buracos. Um troço meio esbranquiçado que parecia mofo misturado com teia de aranha. E, olhando bem, lá no canto, uma minhoquinha. Viva! Ahhhhhhhh! Eu dei um berro e joguei o que restava do chocolate no lixo, traumatizada. Foi a quarta vez na vida que encontrei vermes no meu chocolate. Mas foi a primeira que só notei que a barra estava bichada apóscomer mais da metade. Glupt. (O maridão tentou me consolar dizendo que quem come creme de leite com trocinhos verdes e não morre aguenta qualquer coisa. Pode ser. Eu não morri. Mas não estou feliz). Aquela barra, e mais duas da Lacta, eu tinha comprado no mesmo dia, nas Lojas Americanas do Shopping Benfica. Admito que, nesses últimos meses, eu estive fora de controle. Comprei essa promoção de 3 barras por R$10,99 diversas vezes, pelo menos uma vez por semana. E num dia eu fiquei tão descontrolada que comi as três (meio quilo de chocolate!) em doze horas. Eu estava pensando em parar, antes que meu fígado parasse. E achei que a barra bichada foi um sinal divino me mandando dar um tempo. Então, voltei às Lojas Americanas com meu cupom fiscal e os dois outros chocolates, fechadinhos e intocados. Queria meu dinheiro de volta. O atendimento foi algo de outro mundo... Lógico que tive que repetir a história pra três pessoas diferentes. E nenhuma parecia acreditar em mim. A terceira foi a gerente, que estava “sem farda”, como eles chamam (ou seja, sem uniforme da loja). Todas queriam me dar um vale de 10,99 para que eu comprasse o que quisesse na loja. Eu disse que não queria comprar nada, e que queria o dinheiro de volta. Foi engraçado também que todas perguntaram: “Você checou a data de validade do produto?”Eu tive que responder com outra pergunta: “Não chequei. Por quê? Vocês vendem produtos fora da data de validade?”. Quer dizer, eu tinha comprado o chocolate naquele mesmo dia! Finalmente elas acharam que eu estaria fazendo um ótimo acordo se me devolvessem o dinheiro referente a duas barras. O dinheiro da barra bichada elas não poderiam me dar porque... eu não havia trazido o chocolate pra devolver. Eu: “Hum, metade do chocolate tá dentro da minha barriga. A outra metade tá na lata de lixo da minha cozinha. Se quiserem eu trago a lata e a gente vasculha o lixo juntas, na frente dos outros clientes. O verme que tava no chocolate ainda deve estar lá. Querem?” Gerente: “Não, trazer o lixo não. Mas você devia ter trazido o chocolate. É que a gente precisa ver o produto. Afinal, a gente não pode se responsabilizar por um produto que vendemos fechado”. Eu: “Hã? Por favor, você pode repetir o que acabou de dizer? Vocês não se responsabilizam pelo que vendem aqui?” E por aí foi, uma looooonga discussão. Chegou num ponto que disse pra gerente que colocaria a história no meu bloguinho, e aqui está. Finalmente ela notou que daria menos trabalho me devolver os 10,99, e o fez, muito a contragosto. Eu não entro mais lá. Não compro mais na Americanas. Bom, tudo que eu comprava lá ultimamente era chocolate mesmo. Então, gente, é isso. Meu relacionamento com o meu chocolate velho de guerra, companheiro de todas as horas, está novamente abalado. Desde então (isso aconteceu na penúltima sexta, é que não tive tempo de escrever) não comi mais nenhuma barra, apenas sorvete e uma bomba de chocolate. Sinto saudades, mas essa experiência de comer meia barra bichada é repulsiva demais pra mim. Me lembra aquela piadinha: “O que é pior que encontrar um bicho na sua maçã? Encontrar meio bicho na sua maçã”.
Num post (do ano passado!) em que respondi a perguntas sobre a minha (falta de) vaidade, uma leitora, a Márcia, deixou um comentário muito instigante. Perguntei pra ela se poderia transformá-lo em guest post, ela deixou... e eu coloquei o troço em algum lugar do meu computador e esqueci dele pra toda a eternidade. Mas agora o encontrei entre alguns arquivos antigos, e taí. Uma bonita história de auto-aceitação.
Minha mãe tem cabelos lisos, não um liso lambido, mas lisos. Meu pai não, mas os dele sempre foram bem curtinhos. Tenho 3 irmãos, dos quais duas meninas, e só eu nasci com cabelos crespos, a la Vanessa da Mata, herança genética da mãe de minha avó paterna... Agora veja a bronca. Meu pai não deixava de comentar a beleza de uma mulher com cabelos extremamente lisos (lembranças de uma paixão frustrada na adolescência, dizem), e minha mãe reclamava muito quando desembaraçava minhas madeixas. Na minha cabecinha de menina, meu cabelo era um senhor problema. Vivia numa cidade do interior do nordeste. Pobres, estudamos os filhos num colégio de freiras, nos primeiros anos, bolsistas, claro. O fato é que, até começar a me destacar na escola como “uma aluna inteligente” (uma grande merd... esses rótulos...), minha marca primeira eram cabelos crespos, era o que era pontuado em mim, no universo que me cercou nesses primeiros anos de vida, e nem precisava dizer que a marca era negativa, muito negativa. Sem falar nessa coisa complicada de identificação com familiares e a gente ser tão diferente fisicamente, sem ter um reforço positivo pra essa diferença. O meu reforço positivo era estudar e não ser bonita, porque na minha pequena cuca eu era feia e ponto, mas fazia coisas bonitas, desenhos, pinturas, e demais lições escolares, e isso era suficiente para ter as pessoas ao meu redor. Não preciso dizer que vaidade com a aparência eu não tinha (porque vaidade não existe apenas em função da aparência, convenhamos). Na adolescência, eu não tinha grana nem muita paciência pra salões de beleza, mas meu cabelo precisava ter uma forma (pra não chamar tanta atenção), assim relaxava pra baixar o volume, usando-os encaracolados. Aí, aconteceu de me mudar para Recife. Mundo estranho. Eu estava fora do meu ninho, mas cercada dos mesmos amigos, que buscavam, como eu, um curso superior. Fora da minha turma de amigos era muito difícil não me sentir um peixe fora d’água. Aos poucos, a mudança veio, principalmente quando saí da universidade. Nós, os amigos do interior, fomos nos dispersando aos poucos, seguindo profissões diferentes e consequentemente frequentando diferentes ambientes e pessoas. Perdi mesmo um pouco a referência no meio dessas outras pessoas. Eu não era a Marcinha da turma. Fora desta eu era absurdamente tímida, por motivos que não convém por ora. Entrei na noia de cabelos lisos, maquiagem, pra ser vista em outros núcleos. Mas eu não estava em mim, entende? O-ou, algo errado no ar... Alguns anos de terapia (por motivos fora de questão) e as coisas começaram a mudar... Sabe aquela praia evitada por eu não resistir ao banho de mar, poderoso, maravilhoso mar, por causa da química nos cabelos? Sabe aquela natação evitada por cabelos cobertos até o talo de tanta química não resistir ao cloro? Ah, a tesoura do desejo! Vou usá-la. Preciso eliminar os fios compridos cobertos de química que irão se estragar... Adoro água! Meu deus, como conseguir evitá-la por tanto tempo? Que absurdo! E não é que descobri que sou bela e maravilhosa? Olho os meus cachos da adolescência e me vejo tão bonita! Agora, maquiagem, a-d-o-r-e-i, acho que faz parte do processo de me sentir bonita, não por ela em si, mas funciona como uma brincadeira, uma forma de demonstrar que dá pra ser diferente a cada dia se eu quiser, até mesmo quando não tô a fim de usar, sei lá, me sinto numa mudança tão constante, maquiagem e moda são recursos mesmo pra externar isso... e dá pra não abrir mão do conforto que faço questão. “Quanta mudança alcança nosso ser, posso ser assim, daqui a pouco não....” diz uma música. Pois é, é muito difícil sair de um modelo introjetado. Não quer dizer que a gente não perceba esse modelo. Acredito até que a gente consegue fugir de alguns, mas de todos? Não acredito. Melhor não encucar...
Tem uns movie mashups (veja meu primeiro post aqui) que me atraem pelo humor negro, como este que junta Meu Pé Esquerdo com Jogos Mortais. Incrível como o design das capas de Jogos Mortais virou ícone. É facilmente reconhecível, e talvez seja o único ponto alto da franquia: o cuidado com a arte. Enfim, este poster tá mais praquelas piadinhas com as músicas, sabem? Tipo aquele melô dos leprosos: “jogue suas mãos para o céu...”. (Este post não é pros adeptos do politicamente correto, vocês já devem ter notado). Na mesma linha, só que perdendo a graça na tradução, está o poster que une Louca Obsessãoe Footloose – Ritmo Louco, um dos clássicos da minha adolescência. Em Louca Obsessão, Kathy Bates quebra com uma marreta o calcanhar do James Caan, numa cena altamente gráfica e inesquecível pra qualquer um que já a viu (a gente tenta esquecer e não consegue). Footloose é só um musical bobinho de 1984 com o Kevin Bacon, mas a tradução literal do títuto não tem nada a ver com dança. Tá mais pra Pé Solto mesmo. Argh. Neste de Alien com Quero Ser John Malkovich (dá pra fazer um monte de piadinhas com esses dois filmes, pelo jeito), o que mais me chama a atenção é que mudaram o título para Quero Ser John Hurt. John Hurt é o ótimo ator que faz a pobre vítima do alienígena que se aloja em seu estômago no filme de 1979, Alien, o Oitavo Passageiro. (Alien é oficialmente o meu maior sonífero, maior até – creio – que o épico élfico Senhor dos Anéis. Sei que Alien é um filme importante, mas é só eu começar a vê-lo que caio no mais profundo sono logo após os primeiros minutos. Tem gente que passa por isso ao assistir 2001. Pra mim é Alien o antídoto pra qualquer insônia). Este poster é muito maldoso e também perde um pouco da graça na tradução. Junta Bambi, que pra alguns estudiosos foi o evento que despertou a consciência ecológica em toda uma geração, com O Franco Atirador, que em inglês é O Caçador de Veados. Tadinho do Bambi. Espero que tod@s vocês se acabem de chorar na cena inicial, em que a mãe de Bambi é morta por caçadores, deixando o bichinho órfão e desprotegido. Chuif. Mas pra mim esse poster ficou ainda mais divertido porque sempre confundo O Franco Atirador com Amargo Pesadelo. Não sei se é porque ambos são da década de 70 ou por serem sobre um grupo de amigos que se depara com the horror, the horror. Mas eu li Deer Hunter no poster, vi a pose do Bambi, e me lembrei da cena mais famosa de Amargo Pesadelo, que é a do estupro do Ned Beatty. Minha mente faz associações doentias, eu sei.Mais humor negro, ou talvez humor vermelho, nesta mistura de Carrie com... A Garota de Rosa Shocking. Como menstruação é um dos temas centrais de Carrie (ou melhor, a demonização das mudanças no corpo de uma menina quando vira mulher), dá pra pensar em rosa choque. Pior ainda se a gente lembrar do título original do clássico com a Molly Ringwald, Pretty in Pink ("Linda de Rosa"). E este é o meu poster misturado preferido de todos. A pose absolutamente icônica do Matthew Broderick em Curtindo a Vida Adoidado foi substituída pela do Patrick Bateman (o protagonista de Psicopata Americano, com Christian Bale num dos melhores papéis de sua carreira). O título original de Curtindo é Ferris Bueller's Day Off (a folga do Ferris Bueller?). Vira a folga do serial killer, com direito a manchinhas de sangue no rosto e tudo. A-do-rei. Mas ok, sei que não é todo mundo que curte humor negro...
Outro dia folheava um livro de inglês que estamos pensando em adotar pra Letras da UFC. O livro parece interessante, porque tem fotos e alguns textos da National Geographic, mas eu parei de pensar em qualquer coisa após me deparar com um pequeno artigo sobre... comer insetos. O texto dizia que gafanhotos são uma iguaria na China e em partes da Índia, e que formigas fritas são saboreadas nos cinemas sul-americanos como se fossem pipoca. Achei esta uma generalização grosseira, já que comigo não, violão, no Brasil não fazemos isso. Mas aí me lembrei da minha mãe (que é argentina) falando de comer formigas no cinema, e o maridão (que é brasileiro) meio que confirmou. Pensei: isso só pode ser hábito de gente muito, muito antiga. Hoje certamente ninguém mais come formiga frita. Só que, quando fui discutir com meus aluninhos na universidade sobre este assunto de suma importância para a humanidade, vários afirmaram que sim, aquelas formigas grandonas, aladas (sério?), caem bem fritas. E um aluno até perguntou: “Professora, a senhora não teve infância?”.
O mesmo texto dizia que pelo menos esses insetos citados são devorados de livre e espontânea vontade – da parte de quem os come, lógico, não do outro lado envolvido. Mas e todos aqueles bichinhos asquerosos que comemos sem saber? Como assim?, dialoguei com o texto, eu não como inseto nenhum! Fale por você! Mas ele jurou que extrato de tomate é feito com um bichinho pra colorir o troço (isso eu já sabia, tanto que quando li pela primeira vez, fiquei meses sem encostrar nesses enlatados). Enquanto o texto se referia a itens fúteis da nossa alimentação, tudo bem. Só que aí ele falou de um alimento que não dá pra viver sem: chocolate. Ele disse que uma barra de chocolate americano contém, em média, 60 pedacinhos de insetos a cada 100 gramas. Estou em estado de choque até agora. Obviamente o chocolate brasileiro é limpinho, certo? Certo? Não, parece que não. Outro dia, na maior transmissão de pensamento, o Vitor me mandou um email dizendo que cada barra tem em média oito patas de inseto. Mas este também é um número do departamento de saúde americano (e, fora as oito patas, há também um pelo de roedor, que eu deixo pra você também. Aliás, dei uma olhada na internet pra ver se encontrava mais informações, e não, não encontrei. Mas li um comentário hilário: "Quer dizer que se a gente cobrir um cachorro quente com chocolate, logo ele se transformará num novo animal?"). Enfim, o triste resultado de tudo isso: estou numa nova crise com o meu chocolate. Num próximo post eu conto tudo pra você.
Queria continuar só mais um pouquinho com o meu tema da semana passada, sobre o projeto do governo proibindo agressão às crianças. Primeiro que não aceitar punição física é totalmente diferente de não aceitar punição ou castigo para uma besteira que uma criança apronte. Nãoé tão difícil de entender: quando um adulto comete um crime, depois de julgado e condenado, ele não recebe punição física. Quer dizer, podemos supor que a restrição de sua liberdade, de seu direito de ir e vir, constitui uma punição física. Mas ele não será chicoteado. Tortura e pena de morte não fazem parte da na nossa constituição. Pessoalmente, não acho que um preso deva ser espancado, estuprado, torturado, “pra aprender”. Querer isso é fascismo, é o velho olho por olho, presente em países retrógrados, e até em alguns mais avançados, como os EUA (o único país desenvolvido no mundo, além do Japão, a adotar a pena de morte). Mas com criança é diferente, claro. Ninguém está pregando pena de morte pra criança (ou está? Tenho minhas dúvidas toda vez que se discute a alteração da maioridade penal). Só estou dizendo que punição física não é o único tipo de punição. Pais podem, e talvez devam, restringir a liberdade de uma criança. Castigos, privações, broncas e sermões, tudo isso é válido e necessário. Toda criança (e adulto) precisa conhecer seus limites. O que me espanta é que as pessoas pensem que só dá pra estabelecer limites através da violência!
Além do mais, a gente sabe que criança imita os pais. É contraditório: se você não quer seus filhos batendo nos coleguinhas (e aconselho atendimento psicológico pra quem quer, ou pra quem ainda confunde violência com masculinidade), vai ensinar-lhes que bater é feio... batendo?! Claro que gritar também não é educar. Muito menos xingar. Não sei, se educar é considerado um gesto de carinho (euma obrigação para os pais), como gritar, xingar e bater podem ser vistos como carinho? Entretanto, imagino que os mesmos pais fãs da agressão física como forma de educação reprovam a agressão verbal. Suponho que esses pais ficariam horrorizados vendo outros pais dizerem ao filho “seu traste inútil!”. Isso poderia traumatizar a pobre criança. E bater não? No post da semana passada, recebi diversos depoimentos de leitoras jovens, que ainda (ainda? Talvez não queiram ser nunca!) não são mães, que dizem se ressentir das palmadas que receberam. Para uma, palmada, tapa e puxão de orelha podem até não causar traumas, mas doem. Para outra, apanhar dos pais fez com que ela se afastasse emocionalmente deles, e perdesse o amor que tinha por eles. E também gerou desconfiança, porque ela percebeu que, quase sempre que apanhou do pai, foi por causa do descontrole emocionl e da falta de argumentação dele, muito mais que por qualquer “crime” que ela tenha cometido. Outra lembrou que bater é adestramento, não educação, como dar choque elétrico em ratinhos de laboratório para eles decorarem o caminho. Ainda outra leitora relatou sua história, que é um belo exemplo de como criança não tem voz alguma na nossa sociedade: ao tentar se defender de uma surra aos 12 anos, ela empurrou a mãe. Foi levada à psicóloga, pois onde já se viu bater na própria mãe?! Criança não tem nem direito à autodefesa, um comportamente intuitivo de tantos seres! Não é bem verdade que pais batem apenas com a intenção de educar. Muitas vezes batem para descontar em alguém suas frustrações. Como qualquer ser humano, pais nem sempre estão certos. Nisso não vai nenhuma santificação das crianças. Não simpatizo com criança que faz birra. Com criança que maltrata animais, então, eu me meto mesmo. Crianças estão erradas um monte de vezes, é inegável. Mas são crianças, seres que consideramos “em formação”. Pode ser que todos nós adultos sejamos seres “em formação”, mas eu, pelo menos, não tenho ninguém com autoridade absoluta e poder de vida e morte sobre mim. Imagine sua criança chorando, sofrendo, tendo que engolir a comida aos prantos, porque já apanhou e está ameaçada de apanhar de novo, se não comer tudinho. Eu vi uma das minhas melhores amigas fazer isso com seu filho, e juro, doeu em mim (engolir comida sofrendo é sempre deprimente, em qualquer idade). Ela acompanhou a dor de seu filho, a dor que ela causou. Agora, vamos imaginar que outra pessoa, que não ela, fizesse a mesma coisa com o filho dela. Imagino que, nesse caso, ela iria empatizar com seu filho e se revoltar contra a pessoa, fosse ela professora, amiga, líder religiosa, o que for. Então como é que se deixa de empatizar com alguém só porque foi você que julgou, condenou, e aplicou a pena? Num outro post que escrevi faz tempo, este sobre estupro (sim, por incrível que pareça pais e padrastos que abusam de suas filhas são também os que mais batem), recebi este comentário de uma leitora: “Já sofri muita violência física e psicológica por parte do meu pai. Já apanhei na cara duas vezes (uma aos 10 anos, outra aos 12). Aos 12 por conta de R$5,00. E o pior é que eu sempre ouvia da minha mãe que se eu fosse menos respondona, mais obediente, ele não faria isso. O velho mito da família burguesa que Marx já falava. Quer dizer, os filhos são propriedade dos pais e portanto estes podem fazer o que quiserem, pois tudo se justifica com um 'estou educando'. Enfim, já na adolescência peitei meu pai quando ele quis me bater e nunca mais ele teve coragem de levantar a mão pra mim. Mas novamente fui julgada pela minha família como a garota rebelde que não sabe respeitar pai e mãe. Detalhe: nunca falei um palavrão com ele, nunca tive comportamento difícil do tipo envolver com drogas, roubar, prostituir. E ainda que tivesse não acho que a violência seja o caminho pra consertar um pau que nasce torto.” Há também um paradoxo: apesar do que as pessoas dizem (de que não há mais valores hoje em dia blá blá blá que as crianças não respeitam mais os pais blá blá bom mesmo era quando os militares estavam no poder blá), creio que o comportamento dos brasileiros não mudou tanto assim ― eles ainda batem nos filhos e acham isso ótimo. Mas, se a maior parte enche os filhos de palmadas educativas, por que tanta criança cresce pra virar psicopata, serial killer, troll de internet? (diz aí, meu troll: seus pais batiam bastante em você, né?). Não é possível que todos os adultos estúpidos de hoje sejam os que não apanharam na infância! Selecionei alguns poucos comentários de leitores do Estadão pra registrar o nível de indignação contra o projeto do Lula. Perceba: a indignação não é contra crianças apanharem, mas contra o governo ousar sugerir que há formas mais saudáveis de educar seu filho: - “Lembro-me das palmadas e até correadas que levei dos meus pais, quando fiz por merecer. Hoje agradeço a eles por terem me corrigido, com a finalidade de tornar eu e meus irmãos, pessoas de bem.” - “Aqueles que não são a favor de tornar um corretivo dado pelo pai ou pela mãe, com amor e carinho, não sabem o que é educar um filho. Criem seus filhos com total liberalidade, que no futuro vocês terão a 'recompensa'...” - “[Menina lavando louça] é crime para esses loucos, exploração infantil.... Gente, isso é loucura, o fim DA FAMÍLIA decretada por estes discípulos de belzebú.” - “Este país sempre caminhou plenamente de acordo com a moral e os bons costumes, antes que os intelectuais se metessem na vida do povo. Eu levava meus tapas de meus pais quando fazia coisa errada...Meus filhos de mim e de minha esposa, e graças a Deus são formados, trabalhadores, e sem passagem pela policia. Realmente apanhar não deve fazer bem mesmo, mas apenas para quem não tem vergonha na cara...” - “O Lula não é nenhum expert educacional para opinar. Pelamor, espero que essa lei tenha, no mínimo, bases cristãs para não ser aprovada. Talvez Lula pense assim por ter origens nordestinas. Eu, como paulista, lembro-me quando nordestinos começaram a invadir e formar uma enorme favela aqui em SP, e como os pais eram extremamente agressivos com os filhos, por qualquer motivo, práticas que eram aberrações para a minha cultura de SP (nao quero generalizar).” - “Então, solta tudo, abram as penitenciárias, assim êles terão mais eleitores, novas brigadas, tipo FARC. É o que essa corja quer!” Onde que essa gente aprende essas coisas? (ninguém nasce assim!). Ah, já sei: no livro sagrado! Olha só alguns provérbios bíblicos: - "Quem se recusa a surrar seu filho o odeia, mas quem ama seu filho o disciplina desde cedo." - "Os açoites que ferem, purificam o mal; E as feridas alcançam o mais íntimo do corpo." - "Os castigos curam a maldade da gente e melhoram o nosso caráter." - "Castiga a teu filho, enquanto há esperança, mas não te excedas a ponto de matá-lo" Pelo menos a bíblia sugere moderação nas agressões físicas. Bata à vontade, mas não a ponto de matar, que se não interfere num outro mandamento aí. Devem ser essas as “bases cristãs” que a pessoa acima citou... Aparentemente todos esses comentaristas do Estadão apanharam na infância, e dá pra notar como funcionou para que se tornassem adultos tolerantes e livres de preconceitos. Pessoas com caráter! Se você bate no seu filho, você está do lado deles. E de um cara como o deste vídeo (Prates é conhecido em SC porque tem uma coluna no Diário Catarinense e no Jornal do Almoço, da RBS), que não apenas defende a “pedagogia da cinta”, como também a pena de morte e a ditadura militar. Quase nenhuma pedagoga, psicóloga, doutora em educação é a favor da palmada. Mas eles são. Continue com suas opiniões, desconte suas frustrações no seu filho, fique nessa ilusão que você está educando-o, mas saiba: você não é muito diferente de um Prates. E, se você fica com medo ao ver alguém alterado como um Prates (eu sei que eu fico), lembre-se que seu filho te vê assim quando você vem com o chinelo na mão pra cima dele. Ah, recomendo o post do Sakamoto.
Meu amigo Dudu me enviou uma música que ele fez, cantou, e ilustrou o vídeo, e eu achei tão fofa que decidi compartilhá-la com vocês. Sem falar que a melodia não sai da minha cabeça de jeito nenhum...
Sinto saudades do Dudu, que era mais ou menos nosso vizinho em Joinville (não na mesma rua, mas na mesma vizinhança). Ele frequentemente ia lá em casa jogar pôquer, e é uma alma boa. Foi o irmão dele que comprou nossa casa. Em maio, fiquei horrorizada: uma sobrinha do Dudu foi assassinada em Joinville. Eu não conhecia a Juliana (conhecia uma outra sobrinha), que tinha apenas 19 anos. Ela estava desaparecida havia uma semana, até que seu corpo foi encontrado por um homem que levava o cachorro pra passear. Estava num terreno baldio. Lembro bem desse terreno porque ele é enorme, e fica numa área nobre da cidade, no bairro América. Toda vez que passávamos por lá com a minha mãe, ela, sem noção que é, dizia que gostaria de presentear a gente com aquela terra, pra que pudéssemos construir uma casa. Não sei quanto custa aquilo, mas pela metragem, e pela localização, duvido que fique por menos de 2 milhões de reais. Juliana trabalhava no turno da noite como auxiliar num laboratório. Frequentava a Assembleia de Deus. E foi vista com vida pela última vez descendo no ponto de ônibus da Rua Blumenau. Era 9 da noite; ela estava indo trabalhar. Quase três meses após seu estupro e morte ainda não há suspeitos. Dizem que o terreno à noite é tomado por viciados em drogas. Todos os assassinatos são horríveis. Mas quando um acontece tão perto, parente de um amigo, parece ser mais horrível ainda. Parece que faz parte da sua família. E, se eu já sofro, só posso imaginar o sofrimento da família. Por isso, fico até feliz que o Dudu consiga compor uma música alto-astral dessas. Porque temos que continuar vivendo, apesar de tudo.
Mulheres são maioria entre o eleitorado brasileiro, mas apenas 21% dos candidatos a deputado estadual e federal este ano são mulheres. A cota de 30% como um número desejável de mulheres na política foi estabelecida em 1996, e nunca nem chegou perto de ser alcançada. Na maior cidade do país, São Paulo, há 55 vereadores. Quantas mulheres? Cinco. Essa discrepância se repete em todo lugar, e fica maior ainda se analisarmos que, pela primeira vez na história, temos a chance real de eleger uma mulher para presidente.
José Roberto de Toledo escreveu um ótimo texto para o Estadão sobre essa gritante falta de representatividade. Pelos dados que ele levanta, os partidos políticos se comportam como um verdadeiro Clube do Bolinha. É só ver quantas mulheres fazem parte da Executiva Nacional de cada partido:
No DEM, há 57 membros – 4 são mulheres. No PSDB, há 42 membros – 4 são mulheres. No PMDB, há 25 membros – 2 são mulheres. No PT, há 21 membros – 6 são mulheres. O PT é que o mais se aproxima da cota dos 30%, mas ainda falta. Segundo Toledo, “Fecha-se um circuito viciado: homens preterem mulheres no preenchimento das chapas partidárias, menos mulheres são eleitas, homens mantêm a maioria dos cargos de mando dentro dos partidos. Perpetua-se o machismo.” Se você acha que a situação tá ruim nessa falta de representatividade para deputado estadual e federal, saiba que para os outros cargos é ainda pior: para o Senado, apenas 13% dos candidatos são mulheres. Para governador de Estado, 11%. Esta desigualdade existe em quase todos os lugares do mundo, e todo país que se preza luta contra ela, inclusive o Brasil. Mas ela não parece diminuir por aqui. Na Argentina, primeiro país da América Latina a permitir o casamento de homossexuais, há três vezes mais mulhers no Congresso do que aqui. Não ter representantes mulheres é um grande problema, e não só pras mulheres, mas pra sociedade como um todo. Toledo cita um relatório das Nações Unidas, que deixa claro que as mulheres na política privilegiam a família e as crianças. Essas mulheres sugerem e aprovam leis mais voltadas ao fórum doméstico, que afeta a todos nós. E têm focos diferentes dos congressistas homens. Como, na pobreza, mulheres e crianças são mais afetadasque homens, se diminuirmos a desigualdade entre os sexos, automaticamente diminuiremos a pobreza. Uma das causas do sucesso do Bolsa Família, por exemplo, é que o benefício é pago diretamente para a mulher, e não para o homem. Mulheres têm maior capacidade de controlar o orçamento. Mais um bônus de ter mais mulheres na política: estudos “correlacionam o aumento da participação feminina no poder com menores níveis de corrupção”, segundo Toledo. Portanto, se há tantas vantagens para a sociedade como um todo (ou diminuir a pobreza não é uma vantagem?) em aumentar a participação das mulheres na política, por que isso não acontece? Bom, esta semana Serra deu sua explicação. Ele disse que gostaria de ver mais mulheres na política, mas "mulher não tem disponibilidade de tempo, tem a maternidade, vários fatores que complicam". E completa: "Diferente dos homens, em geral, elas têm três empregos: trabalham fora, cuidam das crianças e às vezes têm que cuidar do marido” (e o marido está liberado pra ter amantes, né, Serra?, desde que seja discreto). Pra fazer bonito na fita, Serra ainda disse: “Mas para a política brasileira, seria muito bom ter mais mulheres parlamentares sem dúvida nenhuma”. Note o detalhe: parlamentares. Mulheres presidentes, jamais! Tudo na nossa vida é simbólico. Toda a linguagem é simbólica. Quem acha que ter uma presidente mulher não afeta as meninas não sabe o que está dizendo. Se Dilma vencer (Marina não tem chances de verdade), será uma nova geração de garotas que vai crescer sabendo que o cargo máximo da nação não é só pra homens. Muitas que crescem com o sonho de virar top models ou arranjar um marido rico (as opções dadas às mulheres: usar sua beleza ou sua maternidade) podem mudar de sonho. E vislumbrar um cargo que lhes permita mudar a condição de outras mulheres. E homens. E crianças. Dilma não veio do nada. Ela foi a ministra mais poderosa do governo no segundo mandato de Lula. E tem como padrinho o presidente mais popular da história do Brasil. Mas, infelizmente, ela é um caso isolado. Com sua vitória, pode até acontecer de termos mais representantes femininas em outras áreas da política. Mas a gente precisa contribuir: analise bem tod@s @s candidat@s, principalmente para deputad@ estadual e federal. Veja o histórico de cada, o que ess@ representante aprovou, quais suas linhas de ação. Procure também votar no partido, já que inúmeras vezes, os congressistas votam fechado, de acordo com a determinação de cada partido. Mas analise bem, e veja se, no seu Estado, há opções de candidatas mulheres. Eu ainda não sei em quem votar (sou nova no Ceará) pra deputad@ estadual e federal, mas será numa mulher.