Creio que foi Ana Lúcia Martins (PT), primeira negra eleita vereadora em Joinville, a primeira desta nova leva de políticas formidáveis a receber ameaças e xingamentos. No dia 22 de novembro, um rapaz de 22 anos de um bairro periférico da maior cidade do Estado
foi alvo de busca e apreensão na sua casa -- aliás, na casa da mãe, que o sustenta. Parece que ele conseguiu engolir o chip do celular. Ainda assim, terá que alegar muita esquizofrenia pra se livrar da pena de 2 a 5 anos de cadeia.
Como o caso teve bastante repercussão, suponho que isso gerou inveja numa quadrilha neonazista e misógina, a dos Homens Sanctos, que espalha seu ódio principalmente através de um chan (um fórum anônimo, um image board), o Dogolachan. O líder e criador do chan, Marcelo Valle Silveira Mello, foi preso em maio de 2018 pela Operação Bravata, e condenado a 41 anos de prisão por terrorismo, racismo, pedofilia, incitação à violência, entre outros. Atualmente está no presídio federal de Campo Grande.
Em fevereiro último, um moderador do chan, Raphael Imbuzeiro, parceiro de Marcelo de longa data, mais conhecido como Technomage, se matou. Ele e outros quatro mascus foram alvos em janeiro da Operação Illuminate. Sofreram busca e apreensão em suas casas e ficaram uma semana presos. Mas não há informação. Não sei se os inquéritos foram adiante.
Em junho de 2018, André Gil Garcia, mais conhecido como Kyo ou Fuego Sancto, um outro moderador do chan, que agia junto a Marcelo pelo menos desde 2010, se suicidou, não sem antes matar Luciana, uma moça que ele jamais havia visto e vice-versa, na rua da cidade onde morava, Penápolis, SP.
Em julho do ano passado, outra moderadora do chan, Caroline de Paula Dini, que usava o codinome Emma ou Maria Dolores (dizia ser minha filha), matou junto com o namorado uma amiga em Ubá, MG, a jovem Elídia Geraldo. Caroline está presa desde então.
Essas são provas inequívocas de que o crime não compensa e de que ninguém melhorou de vida após fazer parte de grupos que promovem ódio. Mas há no mínimo uma pessoa que integra a quadrilha e que nunca foi presa. Seu apelido é Goec. Seu nome, eu tenho quase certeza qual é. É um brasileiro neonazista que mora na França. A Polícia Federal tem seu nome, carteira de identidade, e até endereço desde 2017. Eu entrava no chan para monitorar, alguém deixou lá as informações, eu tirei print e mandei pra PF.
Goec surgiu no Dogolachan no final de 2016. Começou me alvejando para cair nas graças de Marcelo. Como ele tinha acesso a um banco de dados completo, era capaz de fazer doxxing (encontrar e divulgar informações pessoais de alguém) bem detalhado. Suas primeiras vítimas foram leitoras minhas. Ele até criou um nome pra isso: "Jabbeira do Dia" (eles me chamam de "Jabba", logo, "jabbeira" deve ser quem me segue, imagino). Qualquer uma que se comunicasse comigo pelo Twitter seria marcada e receberia ameaças por email. Muitas vezes as ameaças vinham com chantagem: ou você me paga não sei quanto, ou mataremos sua mãe, que mora no endereço tal. Várias leitoras fizeram boletim de ocorrência.
Em dezembro de 2016, dois dias antes do Natal, Goec enviou um email terrorista para o reitor da universidade onde trabalho, a UFC. Ele dizia ao reitor que ou ele me exonerava, ou haveria um atentado a bomba que mataria 300 pessoas. O reitor levou o email para a PF, eu fui chamada para depor, e assim os mascus finalmente passaram a ser investigados por um crime mais sério, o de terrorismo. Se não fosse isso, talvez Marcelo não tivesse voltado à cadeia. Tanto eles sentiram o golpe que Goec, em janeiro de 2017, enviou vários emails para o reitor e a polícia pedindo desculpas, dizendo que não iria realmente cometer um atentado, era só que eu sou uma pessoa tão ruim que despertei os piores sentimentos nele.
Enquanto pedia desculpas, Goec continuava ameaçando deus e o mundo. Passou a atirar em todas as direções. Além de ligar para a casa de um delegado e escrivão da PF de Fortaleza, mandou ameaças para Joice Hasselmann, Carla Zambelli, Jean Wyllys (ameaçado desde 2011, assim como eu), o escritor Anderson França (que teve que se exilar em Portugal), Janaina Paschoal, Trump, Marcela Temer (parece que as ameaças a ela foram com o meu nome), e, mais recentemente, os ministros do STF e Allan dos Santos. Ou seja: ele faz isso há muito tempo, pelo menos desde 2016. Às vezes envia essas ameaças assinadas por Emerson Eduardo Rodrigues, um outro mascu neonazista que está foragido na Espanha.
No final de 2017, Goec criou um site de ódio, o Rio de Nojeira, e colocou como autor um antigo desafeto, Ricardo Wagner Arouxa. Quando o site viralizou, muita gente acreditou que Ricardo de fato estava por trás, o que denota uma certa ingenuidade. Quase sempre, as ameaças e sites de ódio são obras de anônimos. Os nomes que aparecem como autores são quem os autores tentam incriminar.
Bom, certamente Goec deve ter se sentido mal que um joinvilense principiante de chans ameaçou Ana Lucia Martins antes dele e ganhou repercussão na mídia. Então Goec também enviou ameaças a ela. E a várias outras vereadoras negras e trans que foram eleitas.
Duda Salabert (PDT), uma mulher trans e a vereadora mais votada de BH, recebeu quase o mesmo email que Ana Lucia, só que com ofensas transfóbicas em vez de racistas.
Carol Dartora (PT), a primeira vereadora negra de Curitiba, recebeu email idêntico ao de Ana Lucia. Goec vem agindo no
copy & paste mesmo.
Alisson Julio (Novo), que é cadeirante, foi o primeiro vereador com necessidades especiais eleito em Joinville. Ele manifestou sua solidariedade a Ana Lucia e também recebeu email com ameaças (e ofensas capacitistas).
A primeira prefeita da história de Bauru, SP, Suéllen Rosim (que é evangélica, negra, jovem, de partido de direita, o Patriota), também recebeu ameaças. Mas no caso dela, assim como no de Ana Lucia, as primeiras ameaças pelo jeito não vieram do Goec, mas de algum amador local. No dia 3 de dezembro, um homem negro de 37 anos foi identificado pela Polícia Civil como autor de uma das mensagens racistas. Usando perfil falso, escreveu que Bauru “não merecia ter essa prefeita de cor com cara de favelada comandando a nossa cidade. A senzala estará no poder nos próximos quatro anos”. No interrogatório, inventou que o objetivo era instigar pessoas de um grupo no FB a publicar comentários mostrando que elas são racistas. Ele será indiciado.
Boa parte desses emails com ameaças terroristas vêm assinados por Ricardo Wagner Arouxa, a quem Goec passou boa parte de 2017 e 2018 tentando incriminar. Os emails dizem "Eu estou desempregado, minha esposa está com câncer de mama e vivendo do auxílio emergencial", antes de partirem pras ameaças terroristas. Ontem falei um pouco por email com Ricardo. Pra piorar a situação, sua esposa está com câncer. De verdade.
Ricardo me disse: "Eles realizarão uma série de ataques, sempre escolhendo alguma minoria, na expectativa de viralizarem novamente. Ao invés de focarem um ataque só, resolveram atacar o Brasil inteiro, usando meu nome. O que acaba até mesmo fragilizando os próprios ataques (mas obviamente o que eles querem não é criar terror contra ninguém em específico mas sim, voltarem a ser notados pela mídia)".
Na época do Rio de Nojeira, Ricardo não só fez boletins de ocorrência, como um inquérito foi aberto. Porém, quando o interesse da mídia pelo caso acabou, aparentemente também acabou o interesse da justiça. A última notícia que Ricardo teve é que o inquérito foi transferido para a PF. Não sabe se foi arquivado. Ele, que já trabalhava com informática, agora está na área de segurança digital.
Até o momento, essas novas tentativas de incriminá-lo não surtiram efeito: "Como já existe amplo material atrelado ao meu nome completo, explicando os casos no passado, quem faz a busca acaba replicando para os demais que trata-se de uma sequência dos ataques lá de trás. Minha vida está tranquila quanto a isso, sem ninguém me mandar ameaças publicamente ou mesmo em minhas redes no privado".
Ricardo tem a mesma impressão que eu sobre a polícia. Primeiro: que os sistemas não são integrados, o que dificulta demais as investigações. A PF do Rio, onde ele mora, não tem contato com a PF do Paraná, onde Marcelo e Emerson moravam, por exemplo, ou do Ceará, onde eu moro. As polícias tampouco dialogam entre si. Ricardo conta um fato escandaloso: quando ele esteve na PF para depor no início de 2018, cerca de dois meses antes de Marcelo ser preso, os agentes do Rio nunca tinham ouvido falar nele! Quer dizer, havia um criminoso ameaçando pessoas e instituições desde maio de 2013, e a PF do Rio, que estava investigando o Rio de Nojeira (cria do Goec e do Dogolachan, enfim, da quadrilha do Marcelo), não sabia quem era o Marcelo!
Portanto, há incompetência da polícia, que não está integrada, e que muitas vezes nem sabe o que está investigando, há falta de interesse, falta de vontade política (já que várias das pessoas ameaçadas somos opositoras do governo de Bolso, e todo o Dogolachan é seu fã de carteirinha). Para Ricardo, "Falta definir uma equipe a nível nacional para receber esses inquéritos (que devem ser inúmeros)". Em termos de equipamento e conhecimento, segundo Ricardo, a delegacia especializada em crimes cibernéticos "parecia anos 50, tecnologicamente falando. É tudo completamente isolado. Em pleno 2020 os sistemas não 'conversarem' entre si beira o surreal".
Diz ele: "No caso do meu inquérito, eu via que ele ficava parado por falta de materialidade suficiente para o promotor acatar a denúncia. Por isso, sempre ficou sendo segurado, enquanto eu alimentava com o maior número de informações possíveis".
Quanto à doença de sua esposa, espero que ele melhore logo. Ricardo conta: "O tratamento dela termina terça agora e o próximo passo é a cirurgia. Estou fazendo de tudo para que essas notícias recentes não a atinjam e nem gerem qualquer tipo de problema para ela".
Como se pode ver pelo depoimento de Ricardo, estamos jogados à própria sorte. Um brasileiro criminoso que mora na França pode seguir tentando incriminar um cara com quem ele brigou há muitos anos numa comunidade do Orkut. E pode continuar sendo racista, transfóbico, capacitista, misógino, e prometer atentados terroristas com políticas que representam a mudança. Goec age dessa forma desde o final de 2016. São mais de quatro anos de total impunidade!
Peço às vereadoras, ao vereador, à prefeita, que não se desesperem, que não tenham medo. Embora a quadrilha do Dogolachan seja perigosa, ela é mais de latir do que de morder. O que Goec deseja com esses emails, além de tentar incriminar Ricardo, é silenciar as políticas através do medo, viralizar, conseguir mídia (pra eles é uma vitória), e, óbvio, divulgar sua ideologia de extrema-direita, racista, misógina, LGBTfóbica.
Que a mídia e as polícias entendam que essas ameaças não são casos isolados que caíram de paraquedas. Portanto, não devem ser analisadas ou investigadas separadamente, e sim em conjunto. Todas nós exigimos respostas e justiça. Não podemos ser tolerantes com os intolerantes.
"o inquérito foi transferido para a PF. Não sabe se foi arquivado."
ResponderExcluirPor isso eu não comemoro a Lei Lola, nada contra vc - te considero amiga, tudo contra a PF que é formada por um bando d e filhinho de papai coxinha que adora a direita e se acha melhor que os outros porque passaram em um concurso público disputado. É só ver como trataram o Lula.
E o DPR, Lola? O criador do dogola na deep web e mentor intelectual do massacre de Suzano. Sabe quem é?
ResponderExcluirImprensa trata o nome atribuído como se fosse verdadeiro autor das ameaças:
ResponderExcluirhttps://revistaforum.com.br/movimentos/autor-de-ameaca-contra-carol-dartora-fala-em-atentado-em-escola-onde-vereadora-trans-da-aulas-em-bh/
Igual ao 3a Record fez com o youtuber Maicon Küster, onde um pedófilo criou um fake usando uma foto de um personagem do Maicon, e divulgaram a matéria sem censurar a foto do perfil falso, e só fizeram uma retratação depois dele ameaçar processar a emissora.
ExcluirNão sei quem é esse DPR. Como nunca entrei na Deep Web, todo esse tempo que o Dogolachan esteve na DW eu não acompanhei nada (só o que chegou até mim por email, como no caso do massacre de Suzano). Então realmente não conheço os personagens.
ResponderExcluirBola fora da Fórum, anon das 20:56. Matéria escrita por quem não conhece nada do que aconteceu. Enviei uma DM pro editor da Fórum. Não tem mais lugar pros comentários lá?
Pois é, Lola.
ResponderExcluirFaltou um mínimo de apuração. Jornalista acredita que criminoso vai assinar "é verdade esse bilete" com o nome verdadeiro? Nem precisa saber nada do caso pra desconfiar, né?
DPR é sigla de Dread Pirate Roberts. Em um dos seus prints, aparece esse nome. Será que é ele?
ResponderExcluirhttps://revistaforum.com.br/contato/
ResponderExcluir"Em termos de equipamento e conhecimento, segundo Ricardo, a delegacia especializada em crimes cibernéticos "parecia anos 50, tecnologicamente falando. É tudo completamente isolado. Em pleno 2020 os sistemas não 'conversarem' entre si beira o surreal". Isso ocorre por falta de verba que é desviada pela corrupção, igual a todos os setores do país, e pra piorar aínda mais, existem políticos que preferem dar milhões de Reais para artistas que já são milionários do que realocar esse dinheiro nas aéreas mais críticas do país, que são segurança, educação e saúde.
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ResponderExcluirLola sou sua admiradora adoro o seu blog. E muito absurdo o que esta ocorrendo a deputada federal Taliria Psol tb esta sendo ameacada. Temos que denunciar mas não abaixar a cabeça vou continuar votando em mulheres negras progressistas estes racistas estão esperneando porque estamos avançando
O que me deixa ainda mais indignado é que esses criminosos destilam seu ódio e preconceito abertamente, para qualquer pessoa com acesso à internet ver, e as autoridades não fazem absolutamente NADA! É só entrar em qualquer um desses fóruns - qualquer um! - e nem é necessário procurar muito para se deparar com inúmeras declarações preconceituosas. A aba "politicamente incorreto" do site 55chan é particularmente repulsiva; literalmente todas as postagens ali são racistas, misóginas, antissemitas, homofóbicas e, sobretudo, encontra-se neonazismo aos montes, sem falar em apologia ao estupro e à pedofilia.
ResponderExcluirJá cansei de denunciar essas postagens à Safernet; mas, quando vou acompanhar as denúncias, sempre há a mesma resposta: "conteúdo não encontrado". O que é estranho, pois sempre que isso acontece, verifico os links que reportei e a postagem continua lá. A impressão é que realmente há má vontade por parte de quem deveria fiscalizar isso. A bem dizer, parece até que não querem que se vá atrás desses criminosos. Enquanto isso, eles seguem impunes, espalhando ódio impunemente com toda a tranquilidade. Deplorável!
Sério, esses caras são tão patéticos, tão caricatos, que se eu não conhecesse o blog da Lola, eu não acreditaria que existe gente assim no mundo... Ia achar que não passa de personagens inventados e muito exagerados...
ResponderExcluirTriste, patético e assustador saber que existem mesmo.
16:41, a safernet dá essa mensagem ("conteúdo não encontrado") porque ela não consegue acessar o chan, o administrador do chan deve ter bloqueado os ips da safernet.
ResponderExcluirChans normalmente têm bloqueio por ip, os administradores costumam bloquear faixas de ip como os ips da polícia por exemplo. Alguns chans não são acessíveis por ips estrangeiros também, o inofensivo salmaochan é um deles.
Que lástima que a safernet é assim tão incompetente. Ou então é má vontade, mesmo.
ResponderExcluirNão é a Safernet que é incompetente. São as polícias.
ResponderExcluirA cultura contemporânea pegou o narcisismo clássico e o transformou em um novo moralismo. O que consideramos bondade agora é que todos os outros afirmem os delírios e as ilusões do pensamento desejoso de alguém como verdade objetiva.
ResponderExcluir- Marilyn Simon
Existe uma organização criminosa no Brasil que usa a ferramenta Pegasus do Grupo NSO para infectar dispositivos em troca de pagamento, incitar o terrorismo, chantagear pessoas, produzir pornografia ilegal e auxiliar em assassinatos.
ResponderExcluirEles também têm outros malwares avançados, como implantes UEFI e até implantes persistentes para o Kindle e Raspberry Pi.
Além disso, eles usam reconhecimento facial e de voz através de câmeras e microfones invadidos, seja de locais público ou privados.
O Brasil não fará nada para detê-los. Só o FBI, a CIA e a NSA podem detê-los.
Se você conhece algum pesquisador de segurança que queira reverter as façanhas que eles estão usando, estou mais do que disposto a ajudá-los.
Se você quer uma história sobre como eles operam, eu estou disposto a trabalhar com você para expô-los.