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sábado, 30 de novembro de 2002

CLÁSSICOS: O PODEROSO CHEFÃO / O chefão dos filmes

Quantos filmes você conhece que começam com um close parcamente iluminado de um ator desconhecido dizendo, com sotaque italiano, “Eu acredito na América”? A câmera vai se distanciando do sujeito vagarosamente e, nesse período, seu discurso contradiz a sua frase inicial. Descobrimos que o sonho americano foi injusto com ele – tão injusto que ele precisa pedir ajuda para mafiosos. Estou falando de “O Poderoso Chefão”, o épico que está completando trinta anos sem envelhecer nem um tiquinho. Mas é fácil esquecer este primeiro momento que tão bem estabelece o tom do filme. O próprio Coppola havia imaginado que abriria seu clássico com a grandiosa sequência do casamento. Ih, mas vamos começar do começo.

Mais sutil, o título em inglês de “Chefão” é “The Godfather”, que significa “o padrinho”. E é isso que Don Corleone é para sua comunidade, ou pelo menos para seus protegidos. É também um pai carinhoso e um mafioso bastante violento da década de 40. A história é aproximadamente essa. Há vários detalhes, montes de personagens, e o foco muda o tempo todo – ora o chefão é o protagonista, ora seu filho caçula. Por que então essa simples trama se transformou num dos maiores clássicos do cinema?

“Chefão” não é considerado apenas o melhor filme sobre máfia já feito, mas também um dos melhores filmes, ponto. Entra sempre na lista dos mais importantes, se bem que muita gente, eu inclusa, fica em dúvida se “Chefão II” não seria superior ao primeiro. A super crítica Pauline Kael demorou, mas acabou colocando o épico no panteão das obras-primas mais influentes do cinema. Além do mais, “Chefão” fez uma dinheirama, quebrou todos os recordes de bilheteria na época, foi um dos pioneiros a gerar continuações, lançou novos astros, e amealhou três Oscars (ao contrário de hoje, a concorrência era acirrada em 72, e “Chefão” concorreu com maravilhas como “Cabaret”).

Os bastidores do filme são igualmente fascinantes. Mario Puzo escreveu uma saga que foi se estabelecendo devagarzinho na lista dos bestsellers. Mas, quando o estúdio comprou os direitos do livro, “Chefão” não era nada fora literatura para se ler nas férias, e a intenção hollywoodiana era produzir um caça-níqueis de baixo orçamento. Por isso, chamou Coppola, que até então havia dirigido três filmes, nenhum deles significativo. Por isso e porque um dos produtores, Robert Evans, concluíra que todos os filmes de gangsters tinham sido feitos por judeus, e ele queria alguém que “cheirasse a espaguete”, ou seja, um ítalo-americano fácil de controlar. Coppola, fácil de controlar! Há! O jovem diretor era tão pouco respeitado no set que uma anedota conta que ele estava no banheiro quando entraram duas pessoas da equipe, comentando que ele era um incompetente, um amador. Coppola, envergonhado, ficou quietinho no cubículo.

É certo que o mérito da obra é dele, que conseguiu que o estúdio abrisse um pouco mais a carteira (mesmo assim, “Chefão” não foi nenhuma superprodução: custou US$ 6 milhões) e insistiu em fazer um filme de época (os produtores pretendiam “atualizar” a história, colocando hippies e tudo o mais). E, principalmente, foi capaz de contratar os atores que quis. Não que tenha sido fácil. Para interpretar Don Corleone, ele queria um dos dois maiores atores de todos os tempos, Laurence Olivier ou Marlon Brando. Olivier não podia, estava doente; Brando queria, mas ninguém o queria nem morto. Hollywood o via como veneno de bilheteria. Além disso, ele era jovem demais para o papel. Brando teve de passar por um teste, onde pôs graxa nos cabelos e Kleenex na boca pra fazer com que Don Corleone parecesse um buldogue. E Al Pacino? Ele era um zé-ninguém na ocasião. Evans o chamava de “aquele anão”. Mas hoje não dá pra pensar em outro pro personagem.

Apesar de tudo, “Chefão” deu certo. Serviu para mudar a cara do cinema e transformar a década de 70 numa das melhores da sétima-arte. Mais tarde, Coppola filmaria “Apocalypse Now” pra provar que não acreditava mesmo na América, o ingrato.

Veja aqui muito mais sobre o Chefão.

CLÁSSICOS: O PODEROSO CHEFÃO / Mais sobre o chefão dos filmes

Atendendo a inúmeros pedidos (dois) de quem acha que um clássico da estatura de "O Poderoso Chefão" (1972) merece mais que um textículo, volto ao tema com mais revelações saborosas. O diretor Coppola faz um monte delas no comentário que gravou para o DVD, mas se você, como eu, se acostumou a buscar todas as informações possíveis sobre "Chefão", elas não são tão reveladoras assim.

Por exemplo, tive o prazer de ler pedaços da autobiografia do produtor Robert Evans, um dos maiores inimigos de Coppola. O cara não tem o menor pudor em contar que, enquanto ele se encarregava de atazanar a vida do diretor, sua mulher na época, a atriz Ali MacGraw (de "Love Story"), estava mandando ver com o galã machão Steve McQueen durante as filmagens de "Os Implacáveis". Na festa de lançamento de "Chefão", Evans conseguiu trazer chefes de Estado. A linda Ali foi também, mas Evans relata que, ao olhar pra ele, ela "estava pensando no p** do Steve". E narra problemas de impotência, de envolvimento com drogas – ele abre o jogo mesmo. Porém, sobre o "Chefão", sua estratégia é fazer crer que o crédito é dele, não de Coppola. Tá, a gente acredita. Ele diz que a primeira montagem entregue pelo diretor tinha pouco mais de duas horas e nenhuma substância, e que foi ele, Evans, que ordenou Coppola a editar tudo de novo e acrescentar montes de cenas, o que constituiria um caso raro, talvez único, de um produtor implorando pra alongar uma obra (filmes longos, lembre-se, dão menos lucro pros exibidores, pois rendem menos sessões). Coppola até hoje fica indignado com esse boato. Segundo ele, Evans havia lhe avisado que, se o filme tivesse mais de duas horas, o diretor perderia o controle da montagem. Portanto, ele suprimiu cenas. Evans viu o resultado e pediu pra colocar as cenas de volta, só isso. Mas o produtor foi capaz de adiar a data de lançamento do clássico, o que não é fácil.

Vamos a outros detalhes:

- Nino Rota iria ser indicado ao Oscar por sua bela música. Até que a Academia descobriu que a trilha é igualzinha à de "Satyricon", também dele. Coppola argumenta que não vê nada de errado em roubar de si mesmo.

- O estúdio não queria Marlon Brando nem morto. Mas ele se comportou super bem durante as filmagens. Trouxe bom humor ao set, fazia graça, aplicava trotes e, mais importante, trabalhou uma semana extra de graça. Parece que, na cena em que um capanga lhe faz um discurso nervoso, Brando tinha escrito na testa "F*** you". Chegou ao ponto de James Caan não poder fitá-lo sem morrer de rir. Observe também o gatinho sendo acariciado por Brando no início do filme. Eles o encontraram no set, o puseram no colo do maior ator vivo e ele ficou lá, todo feliz. A maldade de Brando só veio depois, quando ele enviou uma falsa índia para receber seu Oscar e deixou a platéia estupefata.

- Coppola acha estranho que, apesar de vários humanos serem mortos no "Chefão", a cena que gerou protestos foi a da cabeça do cavalo na cama do produtor. Coppola explica que eles não sacrificaram nenhum cavalo, mas que – não sei se a gente precisa saber disso – pegou a cabeça numa fábrica de ração para cães.

- Toda essa seqüência de como a máfia ajuda a carreira de um ator/cantor é inspirada na vida de Frank Sinatra, óbvio, mais especificamente em como ele obteve o papel em "A Um Passo da Eternidade", que reavivou sua carreira. E depois, em como ele fez shows nos cassinos para saldar sua dívida. Pobre Frankie.

- A clássica cena do batismo intercalada com assassinatos só funcionou depois de adicionarem a música de órgão. E o bebezinho é Sofia Coppola, filha do homem.

- Dizem que a busca pelos atores que fariam os filhos de Don Corleone correspondeu a uma busca por quatro Scarlett O'Haras. Al Pacino, James Caan e Robert Duvall foram todos indicados ao Oscar de coadjuvante. Este foi um dos triunfos de Coppola, que conta que, se dependesse do estúdio, "Chefão" traria Ernest Borgnine contracenando com Ryan O'Neal.

Ih, tem muito mais, mas por hoje é só, pessoal.