A equipe responsável por Green Book comemora
Boa tarde pra você que não tem que ler um ser acéfalo vindo comentar no seu bloguinho que o Oscar, aquele show de esquerdismo, "desprezou o talento para premiar cotistas".
Pois é, e você que pensava que o Oscar era uma cerimônia de divulgação de uma mega indústria cinematográfica! Bem-vindo à realidade!
Saudades do tempo em que reaças adoravam assistir ao Oscar e, quando ficavam entendiados, criavam memes de feministas (tipo eu) revoltadas com os vestidos e penteados das estrelas. Era mentira, óbvio, já que nunca gastei meio segundo do meu tempo falando da aparência das atrizes. Mas pelo menos os reaças tavam lá discutindo cinema. Agora tudo pra eles é financiado pelo Soros e demais "judeus globalistas". O planeta passando por uma onda nefasta do crescimento da extrema direita, e a gente aqui, "lacrando" no Oscar!
Como festa, não foi uma cerimônia marcante. Não houve discursos que serão lembrados, na minha opinião. O melhor, o mais politizado, foi sem dúvida o do grande diretor Spike Lee que, na sua longa e brilhante carreira de 42 anos, nunca havia recebido um Oscar (competitivo, só honorário). Ele ganhou o de roteiro adaptado pelo que deve ser o melhor filme de 2018, Infiltrado na Klan. E a cereja do bolo foi receber o prêmio das mãos de um dos atores que ele alavancou, Samuel L. Jackson.
Em seu discurso, Lee disse: "Diante do mundo inteiro, eu louvo nossos antepassados que ajudaram a construir este país, e também os que sofreram genocídios. [...] A eleição presidencial de 2020 está logo ali. Vamos todos nos mobilizar. Vamos todos estar do lado certo da história. Faça a escolha moral entre amor versus ódio. Faça a coisa certa!"
Mais tarde, Lee ainda brincou com a imprensa: "Toda vez que alguém tá levando alguém de carro pra algum lugar, eu perco", referindo-se a Green Book (que veio a ganhar melhor filme) e Conduzindo Miss Daisy, um filme bem aguinha com açúcar de 1989.
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Spike Lee comemora muito. Merecidamente! |
Algumas semanas atrás, Lee afirmou que sua primeira indicação ao Oscar de diretor devia bastante ao movimento Oscar So White (Oscar tão branco) que, em 2015 e 2016, protestou pela ausência de indicados não brancos. Entre os 40 lugares para atores e atrizes (principais e coadjuvantes), nenhum foi para um negro, um hispânico, um indígena. Ao contrário do comentarista reaça problemático, levantar a questão da falta de representatividade não tem nada a ver com cotas. É preciso reconhecer o talento de todos, ué. Se há 40 nomes indicados em quatro categorias e todos são de pessoas brancas, parece que as cotas existem, sim -- para os brancos.
Portanto, em 2017, graças à pressão do #OscarTãoBranco, houve mais indicados e vencedores que não fossem brancos. E agora em 2019 o recorde foi batido. Foram sete vencedores negros em seis categorias. Por exemplo, Ruth Carter foi a primeira negra a vencer na categoria melhor figurino (por seu trabalho espetacular em Pantera Negra). Hannah Beachler foi a primeira pessoa negra a ser indicada na categoria de design de produção. E ontem ela levou a estatueta por Pantera Negra.
Além do mais, três dos quatro prêmios de atuação foram para personagens LGBT (Freddie Mercury de Bohemian Rhapsody, interpretado por Rami Malek; a rainha Anne de A Favorita, interpretada por Olivia Colman, e o pianista Don Shirley de Green Book, interpretado por Mahershala Ali). É ótimo ter mais histórias sobre gente que não seja hétero, até porque permite trazer personagens cheios de nuances e defeitos, distantes dos estereótipos.
Alfonso Cuarón ganhou seu segundo Oscar de melhor diretor por Roma (e também fez história por ser o primeiro diretor a levar o Oscar de melhor fotografia). Ele agradeceu por reconhecerem "um filme protagonizado por uma mulher indígena. Como artistas, nosso trabalho é enxergar onde os outros não enxergam". Cada mexicano que ganha o Oscar de diretor (e foram cinco prêmios para diretores mexicanos nos últimos seis anos!) é um tapa na cara do presidente laranja que quer construir um muro.
Também foi bacana o discurso de Rayka Zehtabchi e Melissa Berton, que ganharam melhor documentário pelo curta Absorvendo Tabu (Period. End of Sentence): "Não posso acreditar que um filme sobre menstruação ganhou um Oscar! [...] Um ponto (period) deveria encerrar uma frase e não a educação de uma menina". É um trocadilho com period, que tanto pode significar ponto quanto menstruação. Na Índia e em vários outros países pobres (Brasil incluso), ficar menstruada faz com que muitas meninas parem de ir à escola, pois não têm acesso a absorventes.
Um momento que costuma ser chato, pelo menos pra mim, é a apresentação das cinco indicadas a melhor canção. Mas Lady Gaga e Bradley Cooper cantando "Shallow" (de Nasce uma Estrela) acabou sendo um dos pontos altos da noite. Ganhou merecidamente e Gaga fez um discurso comovente.
Outro momento bonito foi o discurso totalmente improvisado de Olivia Colman, genuinamente emocionada e surpresa. A estrela de A Favorita torceu para que seus filhos estivessem vendo a premiação, já que ela ganhar um Oscar não ia acontecer novamente. Foi realmente um choque. A favorita era Glenn Close, indicada pela sétima vez. Fiquei triste por Close!
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A dama Helen Mirren manda
indireta à sinistra Damares |
A entrega da estatueta de melhor filme surpreendeu um pouco, pois foi para Green Book. Talvez Roma tivesse um leve favoritismo. Apesar de Green Book ser um bom filme que condena o racismo, ele está longe de ter a mesma força de Infiltrado na Klan, ou mesmo de Pantera Negra. Mas, enfim, os prêmios foram bem distribuídos -- todos os oito indicados a melhor filme ganharam alguma coisa. Bohemian Rhapsody levou quatro estatuetas para casa; Pantera Negra, 3, Roma, 3 (incluindo uma inédita de melhor filme estrangeiro pro México), Green Book, 3, Infiltrados na Klan, 1, Nasce uma Estrela, 1, Vice, 1, A Favorita, 1.
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Vendo o pessoal me passar no bolão,
eu me senti a maravilhosa Yalitza
Aparicio nesta cena |
Quanto ao meu tradicional bolão do Oscar, foi bem emocionante também. No bolão pago, Geraldo saiu na frente, comigo na cola. Chegamos a empatar. Mas o que desequilibrou foi efeitos visuais para O Primeiro Homem (eu e Geraldo havíamos apostado em Vingadores). Claudemir, Júlio César e Joyce foram chegando perto e, no final, a vitória de Green Book deu a vitória do bolão para Claudemir, que acertou 16 das 20 categorias (Geraldo, Joyce e Júlio acertaram 15, e eu, 14).
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Claudemir, eu e Tatiana em
Floripa em 2013 |
Não tô chateada, já que Claudemir participa do meu bolão faz muitos anos (desde 2005!). Ele ganhou uma vez, em 2008, e agora vence de novo. Parabéns, Clau! Eu o conheci pessoalmente numa palestra na UFSC. Lembro quando ele morava em Pomerode e tinha que se deslocar até Blumenau para conseguir ver alguns dos indicados do Oscar. Valeu, Clau! Me manda a sua conta por email que eu deposito R$ 325.
No bolão grátis, que reuniu 258 participantes, os vencedores foram Maria Barros, Bruna Miranda, e Lincoln, também com 16 acertos cada. Tomara que vocês entrem no bolão pago em 2020!
Bom, gente ótima, ano que vem tem mais! Mais uma vez agradeço ao Júlio César pela organização do bolão! Este ano ele não escapa: vou conhecê-lo em Maceió!
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Venham pegar seu prêmio! |