domingo, 12 de maio de 2019

GUEST POST: CARTA AO PARAQUEDISTA

Publico hoje uma crônica do educador social Marcos Levi Nunes, graduado em Filosofia pela UECE (Universidade Estadual do Ceará), mestre em Sociologia pela UFC (Universidade Federal do Ceará).
Marcos escreveu o texto no final de abril, logo depois do sinistro do MEC avisar que faculdades de Filosofia e Sociologia não iriam mais receber recursos (e antes de punir três universidades por "balbúrdia", voltar atrás, anunciando corte de 30%, e justificar o corte com chocolatinhos. É, o ministro tem tido uma agenda cheia!).

Acordei com a nefasta notícia, anunciada pelo presidente ignóbil, que reduzirão o orçamento para as áreas de filosofia e sociologia. Primeiro isso me dói por serem, exatamente estes dois, os campos de minha formação acadêmica. O fato também é nocivo por pensar no número de jovens que perderão a oportunidade que tive de ler e debater conceitos que são primordiais para a compreensão do mundo.
Gostaria muito, para começo de conversa, de compartilhar dois momentos: tive uma professora no curso de filosofia que dizia sobre a necessidade do exercício intelectual para a sustentabilidade da humanidade, que antes da técnica havia o conceito e sem ele, todo o sentido se esvazia. Esta semana, dialogando com 140 adolescentes, comecei me apresentando: educador social, graduado em filosofia, mestre em sociologia. Quando acabei de falar escutei um "vixi doido" de um menino que me olhava como se eu fosse um argonauta. Outro adolescente riu e disse "ei tio, é essa 'faculdade' aí que eu quero fazer". 
Meu tesão pelos meus cursos nada têm a ver com os homens brancos que fui obrigado a ler. Meu desejo, ao contrário, se relaciona com a felicidade íntima de conversar com a criança que tá na rua ou que tá na escola particular e com os dois querer exatamente o mesmo: descortinar o mundo. É sofrido imaginar que podemos perder ainda mais essa prática.
O capitão ignorante, presidente dos Bruzundangas, afirmou que os cortes orçamentários acontecerão para privilegiar cursos "que gerem retorno imediato ao contribuinte". É óbvio que o defectivo patriarca bolsão desconhece por completo qualquer teoria da ciência e o exercício intelectual, duas atividades desnecessárias para quem pula de paraquedas, mas talvez se ele usasse o twitter para além de suas curiosidades sexuais, poderia rapidamente descobrir: quantos cursos dependem diretamente da filosofia e da sociologia? Por acaso existiria pedagogia ou psicologia sem essas duas matérias? O curso de direito seria possível sem filosofia e sociologia? Cursos como economia, ciência política, letras, jornalismo, serviço social, seriam possíveis? 
Para quem acompanhou o raciocínio até aqui, peço desculpa por esse argumento pobre. É notório que filosofia e sociologia não precisam desses outros cursos para ter valor! Suas autoridades residem em si, tão somente. Baixo o nível do argumento a fim de me fazer entender pelo presidente eleito. Queria muito que ele compreendesse que estes dois cursos, para além do possível aprimoramento crítico e intelectual do país (que se julgado pelas últimas eleições está péssimo nesses quesitos), já geram retorno ao contribuinte.
Na verdade, se há a legítima preocupação com um retorno de divisas, aconselho humildemente que o capitão da reserva mire na taxação das grandes fortunas ou na dívida dos bancos com a união, por exemplo. Facilmente uma destas duas rubricas poderia suprir o pífio gasto do MEC com a sociologia e a filosofia. Talvez se o atual governante tirar um pouco dos quase 80 milhões gastos em propaganda apenas no primeiro trimestre de 2019 nós consigamos a proeza de manter a filosofia e a sociologia. Talvez pudéssemos eliminar o cartão corporativo da presidência, que no atual mandato já aumentou os gastos em 16%. 
Me pergunto: quanto teríamos economizado no aluguel com dinheiro público do apartamento que o presidente dizia usar para “comer gente”? Quem sabe o capitão que foi desleal ao exército pudesse mirar no auxílio aluguel, terno, gasolina que sempre recebeu quando era deputado. Posso garantir com certeza que isso geraria um retorno muito mais satisfatório ao contribuinte. A não ser que Brasília esteja com algum projeto em curso para retirar os direitos trabalhistas dos pobres, acabar com a previdência e a aposentadoria, destruir o poder de compra do assalariado, criminalizar o movimento social e tornar o povo ainda mais alienado e ignorante. Se esse for o projeto, então faz todo sentido (ontológico) reduzir os gastos com filosofia e sociologia.

11 comentários:

  1. As engenharias, agronomia, medicina, veterinária, arquitetura, física, geologia, desenho industrial, meteorologia, oceanografia, odontologia, design de games, ciência da computação, física, química, biologia, matemática, astronomia, ciências autorias, contabilidade, administração de empresa, logística, gestão financeira, teatro, dança, musica, arquivologia, gestão comercial, ... são exemplos dos cursos que não precisam da filosofia e nem mesmo da sociologia.

    São só os que eu lembro.

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    1. Ética, filhote. Ética é filosofia, pra dizer o mínimo! Por isso não faz falta pra esse tipo de gente.

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  2. Dica de leitura pra vc, comentarista não muito inteligente: "Do outro lado do buraco negro: quem não entende nada de ciência não sabe que, sem humanidade, a ciência não faz sentido". Leia que vai te fazer bem!

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  3. Dizer que sem a filosofia e a sociologia certas áreas do conhecimento que realmente importam não existiriam não significa muito. É como fizer que a alquimia foi importante na história da química.

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  4. Algumas pessoas não sabem o que significa Filosofia, só conhecem a caricatura do que seria um filósofo. Falhamos miseravelmente em educar o nosso povo. Paulo Freire e Darcy Ribeiro devem estar putos lá do outro lado!

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  5. Ética, filhote. Ética é filosofia... (anonomx 20:07).

    Ética não é a filosofia. A ética é objeto de estudo da filosofia.

    Uma confusão demoníaca entre o sujeito, aquele pratica a ação de estudar, com o seu objeto de estudo: a ética.

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  6. Filosofia é a busca da unidade do conhecimento na unidade da consciência, ou a "ciência" do saber.

    Arrogar-se que este conceito pertence somente aos acadêmicos de filosofia é de uma estupidez de tamanho. Matemáticos e não matemáticos podem fazer filosofia, advogado e leigos podem fazer filosofia, teístas e ateus podem fazer filosofia... enfim todos podem fazer filosofia.

    Filosofar é analisar um problema apresentando pela vida real e, mediante sucessivas analises, tentar apresentar um ponto de vista universalmente válido a respeito do problema. Esse tipo de estudo não é e nunca foi prerrogativa do curso acadêmico da filosofia.

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  7. Eu não to crendo nesses comentários.

    Dan

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  8. O sistema precisa que a maioria das pessoas não tenha acesso à educação, afinal, quem vai limpar a privada da madame por menos que um salário mínimo se não estiver desesperado? Quem vai aturar calado um patrão mimado, praticamente uma criança malcriada de bigode, que comete todo tipo de abuso contra os empregados? Ainda mais no Brasil, onde a elite ainda mantém pessoas em escravidão sem a menor vergonha e a classe média (o pobre que se acha rico pq ganha um pouco a mais que o porteiro do prédio) quer pagar de bacana com babá, faxineira e cozinheira mas não pode pagar nem o mínimo. Mais ainda, se gente o suficiente começar a questionar o sistema, ele termina ruindo e aí adeus boa vida dos parasitas que só sugam o trabalho alheio. Ignorância é fundamental pra perpetuação das injustiças.

    18:39 sem a sociologia e suas ramificações, como a tal da pedagogia, não haveria sequer professores pra ensinar esses cursos. Só porque você tem preguiça de aprender como os saberes se entrelaçam não quer dizer que a interdependência deles não exista.

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  9. "são exemplos dos cursos que não precisam da filosofia e nem mesmo da sociologia."

    Uma boa parte dos cursos que você cita precisa sim de alguma formação em lógica. E Lógica é disciplina do departamento de Filosofia.

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