BOLSONARO QUER TE ENGANAR MAIS UMA VEZ

Em meio aos primeiros cinquenta dias um desgoverno cheio de denúncias de corrupção e de ligações com milícias, Bolsonaro foi hoje ao Congresso entregar sua proposta de reforma da Previdência.

O plano é aprová-la este semestre, enquanto o "mito" ainda tem alguma popularidade. Ele falará em cadeia nacional de rádio e TV para explicar que sacrifícios são necessários. Este discurso é o padrão sempre que se menciona a reforma da previdência. Não se discute que as empresas devem 450 bilhões de reais à previdência, o que talvez pudesse cobrir um pouco o tão conhecido rombo. 

Uma das categorias que custam mais caro aos cofres da Previdência é a base de governo de Bolso, os militares. Só os 318 mil militares inativos e pensionistas são responsáveis por um rombo de R$ 43,3 bi. 55% dos militares no Brasil se aposentam antes dos 49 anos de idade. Apenas com a pensão para as filhas de militares mortos são gastos 5 bilhões por ano. Bolso discursará na TV sobre cortar privilégios, mas -- adivinhe só -- nenhuma reforma está prevista para os militares. Nada também para a casta dos juízes.

A proposta é tão enganosa, e tão ruim para a enorme maioria dos brasileiros, que a campanha evitará usar o termo "reforma". Vai se chamar de "Nova Previdência". Afinal, estamos numa nova era, em que o melhor pra meia dúzia de engravatados é vendido como "melhor para o Brasil". 

A proposta de Bolso/Guedes de capitalização (o trabalhador deposita um valor para bancar sua aposentadoria) é similar à reforma implementada no Chile (durante a ditadura militar de Pinochet), Peru, Colômbia e México, que deu tão errado que está prestes a ser revista. O que aconteceu nesses países foi que hoje muitos aposentados ganham menos de um salário mínimo. É o que o "nosso" governo de extrema-direita quer fazer: desvincular o piso a ser pago do salário mínimo. 

No modelo atual da Previdência, quem está no mercado formal de trabalho (cada vez menos gente, principalmente depois da reforma trabalhista do ano passado, que não só não gerou novos empregos, como jogou mais gente na terceirização e na informalidade) custeia quem se aposenta. No sistema de capitalização como o do Chile, cada trabalhador tem uma conta individual e se responsabiliza pelos aportes. Um dos problemas -- fora que há gente miserável que não têm sequer como sobreviver, quanto menos poupar -- é que são empresas privadas (a maioria empresas dos EUA) quem administra os fundos. É comum negociarem na bolsa de valores. Na crise de 2008, perderam um mundo de dinheiro. 

Quer dizer, quem perde é o trabalhador. O resultado desse sistema desastroso que Bolso/Guedes querem para o Brasil é que hoje 90% dos aposentados chilenos recebem metade do salário mínimo do país. Não é à toa que o Chile tem o maior índice de suicídios do mundo entre pessoas acima de 80 anos. 

A proposta do governo é fixar a idade mínima de 65 anos para homens e subir para os 62 anos para mulheres, além de fixar um mínimo de 20 anos de contribuição. Ou seja, para receber aposentadoria integral, uma pessoa deverá ter que contribuir 40 anos (se já é difícil conseguir um emprego com carteira registrada, imagine se manter empregado durante quatro décadas da sua vida). 

As feministas e a maior parte das mulheres é contra a equiparação porque ainda estamos muito longe de termos direitos iguais. Apesar de trabalhar fora, as mulheres também exercem a jornada doméstica, quase sem a ajuda dos homens. A economista Marilane Teixeira explica que, hoje, 2/3 das mulheres brasileiras se aposentam por idade e recebem em média, R$ 1.178 (os homens que se aposentam por idade ganham R$ 1.396), enquanto 2/3 dos homens se aposentam por tempo de contribuição e recebem em média R$ 2.504. Segundo a economista, "Não há sentido em dizer que as mulheres se beneficiam mais da Previdência porque vivem mais alguns anos".

Hoje a hashtag #ReajaOuSua PrevidênciaAcaba esteve em primeiro lugar nos assuntos do Twitter durante boa parte do dia. Mas é pouco. Precisamos ocupar as ruas e mostrar aos congressistas que, caso aprovem esta aberração, seus nomes serão lembrados e não terão nossos votos. É preciso conscientizar a população que a reforma não combate privilégios e que fará com que os pobres, na prática, morram antes que possam se aposentar. 

O interesse maior da reforma é abrir as portas para o mercado financeiro, que está salivando com as novas oportunidades de negócio. Pense só quanta grana pode render o quinto maior país do planeta para os planos de aposentadoria privada, por exemplo. Por coincidência, sábado eu fui à uma palestra sobre investimentos e um dos palestrantes afirmou que existe consenso sobre a reforma, que não vai haver protestos, e que o mercado está alinhado com a sociedade. 

Todas essas afirmações estão erradas. Desde quando o que o mercado financeiro (que representa a elite da elite) quer combina com o que quer a sociedade? Só se ele estivesse falando de uma sociedade anônima e eu não entendi. 

Vamos mostrar a eles que tem muita luta, muita resistência. Que não vai ser nada fácil pra eles leiloarem nossos direitos. Não podemos deixar passar mais este retrocesso.