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segunda-feira, 6 de fevereiro de 2023

THE WATCHER: A VIDA REAL JÁ É BEM ASSUSTADORA

Fui ver a série The Watcher, que anda fazendo o maior sucesso na Netflix, e me arrependi amargamente (veja o trailer).

São sete episódios (mas Ryan Murphy já está tramando uma segunda temporada). Eu até gostei bastante dos dois primeiros, e detestei os dois últimos. No começo, achei a série ousada por mencionar um tema que é tabu em tantas produções e livros: dinheiro. Certo, a gente não sabe qual é o salário de Dean (Bobby Cannavale) na empresa, nem quanto Nora (Naomi Watts) ganha com a venda de suas cerâmicas na exposição (muito menos quando ela tem tempo pra fazer essas peças). E o quanto eles pagam pela casa a gente só fica sabendo no sexto episódio (US$ 3.3 mi, 2 milhões a mais que na vida real). 

Em compensação, a série conta pra gente: 1) quanto custa instalar dez câmeras de segurança e um sistema de alarme na casa (US$ 7 mil dólares; isso é considerado uma pechincha e o instalador justifica dizendo que ele só tem 19 anos e está começando a empresa); 2) quanto esse mesmo instalador cobra pra passar a noite numa van vigiando a casa (US$ 20 a hora); e 3) quanto cobra a detetive particular (US$ 100 a hora, mas ela acaba fazendo pela metade). 

A série é baseada muito, muito vagamente num caso verdadeiro narrado por um artigo publicado na New York Magazine em 2018: uma família (na vida real o casal tinha três filhos na época, e o mais velho tinha 10 anos. Nada de menina de 16 anos) gasta todas as suas economias em 2014 pra pagar US$ 1.35 milhão por uma mansão de 6 quartos e 4 banheiros num subúrbio rico de New Jersey (a 45 minutos de Nova York). 

Três dias depois de comprar a casa, eles recebem uma carta anônima e bizarra praticamente ameaçando as crianças (celebrando a chegada de "sangue jovem"), assinada por "the watcher" (o vigia ou o observador). O casal compreensivelmente fica com medo, procura a polícia, que não faz nada, e nunca chega a se mudar pra sua casa dos sonhos. Tenta tudo que pode: contrata detetive particular e peritos do FBI, vai atrás de pistas (falsas) por conta própria, mas, até hoje, não se sabe quem é o "watcher" que escreveu as cartas (foram umas duas). 

A família tenta vender a casa, mas não consegue, nem baixando muito o preço, já que os potenciais compradores se assustam com a ideia de passar a ser os próximos alvos de algum maluco. Tenta também vender a casa para uma construtora, que a demoliria e faria duas residências no enorme terreno. Porém, mesmo que o terreno seja o maior da rua, há um limite mínimo de terra para cada casa, e o terreno não se encaixa nas exigências por alguns poucos metros. Uma reunião da comunidade proíbe.

Enquanto isso, a família se endivida cada vez mais -- além de ter que pagar a hipoteca (mortgage), as taxas de imposto com a casa são de 100 mil dólares, e uma reforma interna também custa mais ou menos isso. Finalmente, consegue alugar a casa, mas o valor não cobre nem a hipoteca. A família vai morar na casa dos pais, e mais tarde amigos emprestam uma casa na praia. Só mais recentemente é que foram capazes de vender a casa, por um valor muito menor do que eles tinham pagado (só US$ 959 mil). Não sabemos quanto receberam pelos direitos de terem sua história contada na série, mas não foi o suficiente para recuperar o prejuízo.

Mas o pior ficou pros novos donos da casa e pra vizinhança: com o sucesso da série, toda hora aparece gente pra tirar fotos posando em frente à casa, fazer lives, ver até onde podem entrar. Um inferno. E nem é a mesma casa! A da série é maior e está localizada em Rye, Nova York. 

Um dos meus principais incômodos com a série é como ela tenta fazer tudo mais sobrenatural e assustador do que realmente é, sem chegar a ser exatamente uma série de terror ou sobre uma casa mal assombrada. Na vida real não houve qualquer elemento paranormal. Certo, havia vizinhos estranhos (quem não tem?), mas nenhum bicho (ou pessoa) foi morto naquela casa. A casa é antiga (mais de cem anos), mas não tem fantasmas, nem existe um túnel subterrâneo unindo outras casas.  

Na série tem também o mistério de um cara que aparece na casa pra conversar com Dean e depois ele acha que era um sujeito que matou a família inteira em New Jersey e desapareceu. Um cara realmente matou a família inteira em New Jersey (em montes de outras cidades do mundo há casos assim), mas não foi naquela casa. E sim, na vida real ele fugiu e desapareceu durante 18 anos, mas depois foi capturado e hoje está preso. Nada fantasmagórico.

A subtrama que mais me aborreceu foi a do vídeo gravado (vários spoilers aqui do episódio 4). Descobrimos que o rapaz que instala as câmeras de segurança e alarmes na casa coloca também uma câmera no quarto do casal, para espioná-los (imagino que este seria o fim de qualquer empresa de segurança). E aí ele grava Dean na cama, sozinho, e uma jovem entra no quarto e se deita junto. Depois Dean percebe que a jovem usa a mesma camisola da adolescente que aquele cara que matou toda a família usava. Ou seja, ela está morta, é um fantasminha (ideia reforçada pelo cara das câmeras, que diz que checou todas as gravações e não registrou ninguém entrando ou saindo da casa), ou alguém a contratou para incriminar Dean (e aí ela entrou pelo túnel, suponho). Esse mistério nunca é explicado.

Pô, uma coisa é escrever uma carta ameaçadora. Outra coisa, bem diferente, é (atenção: spoilers do último episódio) entrar na casa sem arrombar nada, sem que os alarmes disparem, sem ser captado pelas câmeras de segurança, e aí matar o animal de estimação, encher a banheira, e acionar o dumb waiter (elevador para pequenas coisas -- nunca uma boa ideia num cenário de terror). E lembrando: absolutamente nada disso aconteceu na vida real.

Tudo bem tomar liberdades e adaptar a história como quiser, mas é repetitivo. Fica tentando enganar o espectador com um monte de enredo furado. Vários personagens aparecem e desaparecem sem nenhuma consistência (aquela outra subtrama absurda da filha fazendo um vídeo chamando o pai de racista é deixada pra trás rapidinho). 

O elenco todo está bom, mas o roteiro é péssimo. Eu preferiria ter visto algo mais pé no chão, mais próximo da realidade. Afinal, usar todo o dinheiro que tem para comprar uma casa e nunca habitá-la já parece bem aterrorizante pra mim. 

terça-feira, 16 de novembro de 2021

AMERICAN CRIME STORY: IMPEACHMENT, UMA SÉRIE SOBRE MULHERES SEM PODER

Semana passada encerrou a série de dez episódios Impeachment. É a terceira temporada de American Crime Story (a primeira foi sobre o julgamento de O. J. Simpson; a segunda, sobre o assassinato de Versace, ambas excelentes). Eu vi e vou contar pra vocês.

Pra quem viveu os anos 1990, Impeachment (trailer) é bem interessante. Difícil acreditar que mesmo quem não era nascido naquela década possa não ter ouvido falar de Monica Lewinsky, uma estagiária da Casa Branca que teve um caso com o então presidente Bill Clinton. Foi um escândalo internacional. Monica era uma  moça ingênua e bobinha de 21 anos de classe média alta que realmente se apaixonou pelo cara mais poderoso do mundo. E confiou numa amiga, Linda Tripp, também servidora pública, que a traiu -- gravou horas de telefonemas com ela e entregou tudo ao ex-juiz Ken Starr, obcecado em perseguir Bill e Hillary Clinton. 

Bill estava sendo processado por assédio sexual por Paula Jones, dos tempos em que ele ainda era governador de Arkansas. Ao ser chamado pra depor sobre esse caso, foi questionado sobre seu relacionamento com Monica. Arrogante e crente na impunidade, mentiu descaradamente. Se ele apenas tivesse admitido que sim, teve um caso com ela, nada teria acontecido (era 1998, quase vinte anos antes do MeToo, e termos como "assédio" ainda eram novos). Mas ele mentiu sob julgamento, cometendo perjúrio. Foi impeached na Câmara e absolvido no Senado. Não conseguiu eleger seu sucessor e marcou para sempre a carreira de Hillary. 

Embora Hillary mal apareça antes do episódio 7, a série -- que raramente mostra beijos e muito menos sexo oral entre o presidente e a estagiária (mostra um relacionamento consensual, troca de presentes e telefonemas) -- é muito mais sobre "as mulheres de Clinton" (como Juanita Broaddrick, uma senhora que acusou Bill de estupro em 1978, é chamada) que sobre o presidente, muito mais sobre os bastidores do que sobre o processo que por pouco não destituiu um líder. 

Sim, é verdade que a série usa a palavra "impeachment" menos que a palavra "charuto" (Monica, coitada, teve que contar em detalhes pro time de Ken Starr como Clinton uma vez colocou um charuto na sua vagina). 

Mas esse era bem o clima da época. E a gente que estava lá lembra de como a internet era pré-histórica em 1998. Os sites levavam horas pra carregar e caíam facilmente. É o tipo de coisa que a gente adora ver. Tem até close de alguém colocando um disquete na torre!

Uma das pouquíssimas qualidades de Bill Clinton (interpretado por um Clive Owen bastante convincente) é que, assim que ele é impeached, decide contar uma piada amarga a seus assessores (todos homens brancos). Ninguém ri. Alguém na série fala de seu "magnetismo animal" ao vivo, mas isso definitivamente não aparece. Ele é só um predador sexual e um menino mimado ao mesmo tempo, incapaz de autocrítica. Sua única preocupação aparentemente é ser abandonado por Hillary. 

O melhor dos dez episódios é sem dúvida o sexto, que mostra as angustiantes doze horas em que Monica é detida pelo FBI e os promotores de Starr num hotel num shopping. 

Poucos ainda sabem da sua existência, e eles oferecem imunidade e a garantia de que Monica não será processada (a alternativa, segundo eles, é pegar 28 anos de cadeia) se ela gravar Bill se comprometendo. Mesmo arrasada, pensando seriamente em suicídio, ela se recusa. 

A melhor cena desse episódio é esta, catártica. Monica finalmente fala com seu pai por telefone, na frente de todos os agentes do FBI (só tem homem). Ela já está lá, sendo enganada e ameaçada, há onze horas. Sua mãe finalmente chegou, e os caras quase a enganam a fazer Monica contar tudo e armar pro Clinton, até que a mãe cobra um documento por escrito. E como tudo que eles estão fazendo é ilegal,  não podem redigir o contrato. 

Em seguida, temos a maior propaganda que eu vejo de advogados em muito tempo. O advogado de família de Monica conversa afetuosamente com ela por telefone, e pede pra falar com o promotor. Dispara um monte de palavrões, e cobra que essa oferta de imunidade para Monica seja colocada num papel assinado. E o promotor enrola, diz que não tem máquina de escrever, que não tem fax (1998, sabe como é), e o advogado responde: "Sabe, eu conheço esse hotel. Já fiquei nesse hotel. Eles têm fax. É uma droga de Ritz-Carlton! Você é um pedaço de m*rda mentiroso! A verdade é que vocês não têm o poder de colocar nenhuma palavra no papel, não é?"

Mas pobre Monica. Sempre tive pena dela. Obviamente ela nunca quis nada daquilo. A Monica de verdade (que é muito mais bonita que Beanie Feldstein, que está ótima) sentiu-se mal ao ver que tinha se tornado uma celebridade com montes de fãs. Na sua noite de autógrafos em Londres, isso fica muito evidente. Quando seu nome se torna conhecido mundialmente, ela é descrita como uma stalker! Ela, uma jovem no seu primeiro emprego, é pintada como uma carente que foi atrás do homem mais poderoso do mundo, tadinho! Fico feliz que ela conseguiu dar a volta por cima, defendeu o movimento MeToo, se tornou uma porta-voz contra bullying e até uma produtora de uma série que também é sobre ela (ela é uma das produtoras de Impeachment).

Monica é tão graciosa que, apesar de ter dito “Eu odeio Linda Tripp” numa audiência, quando Monica ficou sabendo que Linda estava com câncer, duas décadas depois, desejou-lhe melhoras (a foto ao lado é de Monica hoje). 

Mas quem rouba todas as cenas é a genial Sarah Paulson como Linda Tripp, que durante os anos 90 virou uma das pessoas mais odiadas dos EUA (ninguém a perdoou por trair uma amiga). Paulson se submeteu à maquiagem e aplicações prostéticas por três horas antes de encarnar Linda. Engordou 15 quilos, usou "fat suit", estudou com um treinador de movimento. Ficou irreconhecível. Eu passei os dois primeiros episódios procurando a Sarah Paulson! 

Não fui a única que adorou o trabalho de Paulson. A filha de Linda na vida real, Allison, também adorou. Para ela, a representação de Paulson é cheia de empatia, e ela espera que a série traga alguma paz a Monica. Allison hoje trabalha como agente imobiliária, o mesmo emprego atual de Paula Jones. No começo da série, Linda não parece ter qualquer tipo de amizade com a Allison adolescente -- ela tem um relacionamento muito mais próximo com Monica. Mas, à medida que a série avança, Allison acaba sendo a única amiga de sua mãe. 

E lógico que a Allison da vida real é grata pela série representar Linda fisicamente de uma forma muito melhor do que ela era apresentada na época (por exemplo, John Goodman a interpretava no Saturday Night Live). Para Allison, Paulson está formidável: "Eu quase senti que minha mãe estava aqui. É estranho e surreal". Ela quer abraçar a atriz, e chora. "Ela ajudou a suavizar a imagem da minha mãe e permitiu que as pessoas tivessem outro ponto de vista do que realmente aconteceu". 

O motivo de Linda para fazer tudo o que ela fez (tirando as desculpas furadas de amor pelo seu país e as teorias conspiratórias de que o casal Clinton queria matá-la) é oferecido no último episódio, quando ela revela pra filha que o pai dela era um mentiroso e trapaceiro, com montes de casos extraconjugais antes de abandonar a família, e ainda assim todo mundo gostava dele. "Homens como Bill Clinton -- eles arruínam vidas, e eles se safam". 

Outra que rouba as cenas em que aparece é Cobie Smulders, que faz a jornalista de extrema-direita Ann Coulter. Coulter, uma pessoa hedionda na vida real (ela é contra mulheres poderem votar e já disse que só é estupro quando uma mulher recebe uma pancada de tijolo na cabeça), até que se sai bem na série. Seus comentários ridículos tornam-se divertidos. Pra expor seu desapontamento sobre Paula Jones ter posado nua pra Penthouse, ela diz, sem noção: "Ela era a nossa Rosa Parks". 

Porém, o diálogo mais engraçado da série é quando Linda Tripp conta pra editora que pode ser processada por gravar os telefonemas de Monica, já que em Maryland, onde Linda vive, isso é crime. "Não é todo mundo que vive em Nova York", reclama Linda, ao que a editora responde: "Sim, eu nunca entendi isso". 

Quem se sai pior em toda a história é sem dúvida Paula Jones. 
No último episódio, a série intercala Hillary Clinton (Edie Falco) sendo convidada para concorrer ao Senado e posar para a Vogue com Paula posando pra Penthouse por dinheiro, quase chorando (a série não conta que, duas vezes antes, em anos anteriores, a revista pornô publicou fotos nuas não autorizadas de Paula). A verdadeira Paula Jones, que apoiou Trump em 2016, não gostou da série. Ela acha que a atriz que a interpreta, Annaleigh Ashford, acertou no visual, mas que há muita coisa equivocada sobre ela. Eu, que não sabia quase nada sobre sua vida, fiquei com a imagem de uma mulher sem malícia ou poder algum (e com um marido detestável) que foi totalmente manipulada pela direita.

Ao contrário de tantas séries (e filmes) baseadas em fatos reais, Impeachment não coloca legendas no final (talvez tenha sido melhor assim: logo no início da season finale, a palavra "September", em letras garrafais, surge grafada errado) explicando, por exemplo, que Linda Tripp morreu de câncer ano passado, aos 70 anos (antes tendo se casado novamente e aberto uma loja de decoração natalina), ou que todos aqueles conservadores que fingiram ficar ultrajados com os escândalos de Bill Clinton apoiaram em 2016 (e continuam apoiando) um predador sexual ainda pior. O espectador tem que procurar essas informações por conta própria. 

Mas vale a pena. Com uma história dessas, de mulheres brigando umas com as outras, não tem como a série ser feminista, mas ela expõe o machismo dos anos 90, em que uma estagiária que faz sexo oral no presidente, a amiga que a delata, uma esposa traída, uma mulher que acusa um homem de assédio, são todas julgadas com rigor maior que um presidente assediador. Como diz a roteirista Sarah Burgess, a série é sobre mulheres sem poder. Não é uma vida fácil.

terça-feira, 26 de outubro de 2021

ROUND 6 DEVERIA SER JOGO DA LULA: SOCOS NO ESTÔMAGO DOS BRASILEIROS

Estou quase acabando de ver a série coreana Round 6, que no resto do mundo se chama Squid Game, ou Jogo da Lula. Estou gostando bastante. Sem dúvida meu episódio favorito é o quarto, aquele do cabo de guerra. O sexto, das bolinhas de gude, também é muito bom. 

Publico aqui um texto muito bacana da Naila sobre a série. Naila Castro é redatora, tradutora, blogueira, roteirista e designer.   

Mudaram até o título original

A série de maior sucesso atual na Netflix está mexendo com os brios dos brasileiros. Por uma série de motivos, a trama originalmente sul-coreana toca em pontos sensíveis aos quais muitos poderiam questionar se realmente se trata de entretenimento ou se basicamente não estamos vendo um retrato da vida atual.

O Brasil, um grande consumidor de séries em streaming, respondeu bem ao sucesso em evidência, mas também levantou uma série de paradigmas e polêmicas sobre o desenrolar da trama e sobre como de diversas maneira a vida real é retratada pela arte de maneira muito mais intimista do que a distância de uma tela.

1- Impossível não se identificar com a trama

Nos dias atuais, estamos sentindo na pele os efeitos da pandemia aliada à crise econômico-política que assola o país. A distopia brasileira tomou proporções tão reais que parece mesmo que estamos dentro de uma trama. Dívidas, desemprego, sopa de ossos para matar a fome. Idosos, crianças e mulheres evidenciam a disparidade.

Os personagens da série são extremamente humanos, no sentido amplo. Falham, insistem nos erros, demonstram amar os outros, mas primeiro a si mesmos. A história trata de sobrevivência. Também está em jogo que todos em algum nível demonstram suas fraquezas. Vence aquele que souber aceitá-las.

2- Para todo malandro existe um mané

A musica de Bezerra da Silva traduz bem o desenvolvimento da trama e porque ela remete bem à lei de Darwin ao estilo brasileiro: só o mais esperto sobrevive. Por outro lado, para entrar no jogo, todos têm que estar convencidos de que podem se dar bem. Durante a trama, há uma série de situações em que percepções e improvisos definem o jogo.

3- A trilha sonora é de matar

Toda a música da trama parece ser muito importante para o desenvolvimento. Temos música coreana para as cenas que envolvem o ambiente do país, música clássica para a chamada nos alojamentos e jazz raiz para cenas que envolvem luxo e sofisticação. Há ainda momentos pontuais como música infantil envolvendo o jogo.

4- Qualquer escolha é ruim

Com certeza, o jogo não foi feito para agradar os jogadores. O tempo todo ocorre a ilusão da amizade e união de personagens mas no fundo eles não podem esquecer que somente um será o vencedor. Por outro lado, poderiam decidir não entrar no jogo. E aí voltariam para a vida real e seus problemas sem soluções.

5- Dinheiro é uma promessa divina

O que move a trama é o dinheiro, mas não se trata de cobiça. É a motivação que leva os personagens até a promessa de recompensa. Todo esforço valerá a pena no final? O desespero é o gatilho emocional de todos e é nesse ponto que os personagens cativam os fãs da série. Na vida real, o dinheiro também se apresenta como solução final de todos os problemas.

6- A disparidade entre ricos e pobres

Se fosse uma novela do Walcyr Carrasco, já esperaríamos que “os humilhados serão exaltados,” o que costuma ser um clichê. Mas o que a série deixa bem claro é que tanto ricos quanto pobres buscam um objetivo e mesmo os que têm muito não parecem satisfeitos, enquanto os que não têm nada lutam pelo pouco que possuem: relações pessoais, teto, comida, liberdade. Dinheiro representa tudo isso que faz falta. O pobre sabe, mas o rico ambiciona uma plenitude que espera que o dinheiro cubra: a felicidade, os momentos que valham a pena ou simplesmente entretenimento exclusivo.

Uma curiosidade: por questão política, a série mudou de nome no Brasil

O nome original da série é Squid Game, o que significa o Jogo da Lula. O significado do nome é apresentado logo na primeira cena da série, uma referência a um popular jogo infantil sul-coreano. Porém, no Brasil, internautas apostam que a Netflix quis fugir do viés político, pela coincidência com o nome e a história do ex-presidente Lula.

Após ser acusado de uma série de crimes e ficar preso por 580 dias, o ex-presidente tem conseguido provar sua inocência na justiça e é o favorito para as próximas eleições. A Netflix, no entanto, nega. A justificativa da empresa para escolher Round 6 foi ser o nome original que mais aproxima a série do público gamer.

Em Portugal, prevaleceu Squid Game , de forma que o nome se aproxima da mesma forma ao público-alvo. Ainda assim, como o momento atual no cenário político é entremeado de incertezas, a Netflix deixou claro que não quer se envolver nos problemas dos brasileiros.

Vale a pena assistir, mas dói

Há momentos em que questionamos se todo entretenimento vale a pena. A trama da série nos dá o viés de acreditar que é fatídico que os mais ricos se divirtam com o sofrimento humano dos mais pobres. É brutal, mas ainda assim, a trama faz sucesso em todas as classes. A empatia explica. Embora grotesco, nos identificamos com a trama e os jogadores.