Aconteceu na semana passada, com grande repercussão agora.
Na última sexta de julho, uma editora da Marvel postou uma selfie com suas colegas, todas tomando um milkshake. Uma foto inocente que não deveria gerar nada além de "Que demais!" recebeu um monte de comentários machistas de caras patéticos que não aceitam que existam mulheres no mercado de quadrinhos.
A gente sabe bem como é. Há uns dois anos, a jornalista Ana Freitas escreveu um texto perfeitamente ponderado sobre nerds e machismo. Ela passou os meses seguintes sendo atacada por nerds misóginos para provar que tinha razão.
Sobre o caso da editora da Marvel, um texto muito bacana foi publicado na Mary Sue, e a Ester, que "de dia trabalha criando estampas e desenvolvendo produtos pra sua loja pet, e à noite é uma feminista geek SJW que caça trolls no twitter, além de ser mãe de gatos, cachorros e da Gigi", se ofereceu para traduzi-lo.
Antes de ler o artigo, saiba que, mais uma vez, os trolls perderam (mas eles estão acostumados, né?). O assédio e insultos que as editoras receberam se transformou numa super campanha, #MakeMineMilkshake (algo como "Faça meu milkshake"), em que inúmeras pessoas posaram com milkshake mostrando seu apoio às mulheres.
(No post, não vou colocar imagens dos insultos. Apenas da linda reação a eles).
Editora de quadrinhos da Marvel sofre assédio por postar selfie com colegas de trabalho (o problema do sexismo na indústria de quadrinhos).
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Trolls não têm algo melhor para fazer com suas vidas? (A resposta é: não) |
Na sexta-feira, 28 de julho, Heather Antos, editora de The Unbelievable Gwenpool, postou no Twitter uma adorável selfie com as colegas de trabalho. E então, como qualquer pessoa emocionalmente bem ajustada faria, um grupo de homens -- em sua maioria -- decidiu assediá-la por tweets e DM. Por causa de uma selfie das amigas tomando milkshakes. Os comentários incluíam muitos dos xingamentos usuais e misoginia: “falsas geek” [geek; gíria para pessoas peculiares ou excêntricas, fãs de tecnologia, eletrônica, jogos eletrônicos ou de tabuleiro, histórias em quadrinhos, livros, filmes, animes e séries],“a mais assustadora coleção de SJW estereotipados que alguém poderia imaginar”[SJW: social justice warrior, guerreiro da justiça social, termo pejorativo usado para se referir a pessoas que possuem visões socialmente progressistas, incluindo feminismo e direitos LGBT], “Caramba, não consigo imaginar por que as vendas da Marvel estão na merda”. Essas foram as mensagens públicas. Outros atacaram Antos através de DMs.
Heather Antos comentou o assédio na sua timeline: “A Internet é um lugar medonho, horrível e nojento. Como eu ouso publicar uma foto de minhas amigas na internet sem esperar ser intimidada, insultada, perseguida e transformada em alvo? Hoje acordei com uma enorme quantidade de tweets e DMs de lixo. Por ser uma mulher. Dos quadrinhos. Que publicou uma selfie com suas amigas tomando milkshake.”
Nós já sabemos que os trolls reagem de maneira monstruosa quando as mulheres defendem a diversidade. Chelsea Cain, a autora de Mockingbird, abandonou o Twitter após ousar escrever o seguinte, inócuo e agora deletado, tweet: “Por favor comprem a Mockingbird #8 esta quarta-feira. Envie para a @marvel a mensagem de que há espaço nos quadrinhos para histórias de super-heróis sobre mulheres adultas.”
Zainab Akhtar encerrou seu site de crítica de quadrinhos, indicado ao prêmio Eisner, o Comics and Cola, por causa de ataques racistas, sexistas e islamofóbicos. Anita Sarkeesian recebeu ameaças de bomba por investigar o sexismo nos vídeo games. Leslie Jones foi perseguida por racistas no Twitter e hackeada porque ousou interpretar uma mulher negra em Ghostbusters.
Quando esse tipo de assédio acontece, os advogados do diabo surgem do nada, dizendo que os assediadores estão reagindo a mudanças em seus personagens favoritos ou legitimamente criticando as posições políticas da mulher, ou então, simplesmente expressando suas opiniões. Esta é a sempre óbvia tentativa de proporcionar uma desculpa mais palatável para a misoginia desenfreada e/ou racismo. Mas o assédio em torno da selfie de Heather Antos torna ainda mais descaradamente óbvia qual é a verdadeira motivação. É assédio por existir. Por ousar sorrir e gostar de fazer quadrinhos quando se é mulher. É um assédio alimentado por pura raiva ao ver um monte de mulheres editando quadrinhos e se divertindo em seu trabalho.
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Esta vai para todos os bebês- chorões adultos que se sentiram ameaçados por mulheres se divertindo. Que vocês calem a droga da sua boca |
Quando falamos sobre o sexismo generalizado nos quadrinhos, é isso que queremos dizer. Queremos dizer que alguns "fãs" são tão misóginos e se sentem tão ameaçados pela ideia de mulheres na indústria, que uma selfie desencadeia esse comportamento. Essa raiva é ainda pior se você for uma mulher trans, ou uma mulher negra, ou uma mulher com deficiência. Não há nada que as mulheres possam fazer para se proteger -- modificar nosso comportamento, ignorar os trolls, ou ainda tentar conversar -- que possivelmente satisfaça ou pacifique essas pessoas que odeiam a nossa presença. Porque a única coisa que realmente os acalmaria seria deixarmos de existir, publicamente e com alegria, em espaços nerd.
E não, nós não vamos fazer isso.