Há várias datas que marcam o golpe de 2016, que completou cinco anos (hoje não resta muita dúvida de que foi um golpe -- até o principal golpista, Michel Temer, o chamou assim).
17 de abril vive na infâmia do país. Foi o dia em que 367 deputados federais aprovaram o relatório do impeachment, com todos aqueles discursos agradecendo a Deus e a família. Um deles saudou um torturador (um de seus métodos era enfiar ratos na vagina das prisioneiras). Outra dedicou o voto ao marido, prefeito mineiro que foi preso no dia seguinte por corrupção. Em 12 de maio, foi a vez do Senado votar o impeachment, o que afastou Dilma da presidência. Em 31 de agosto, Dilma perdeu definitivamente o mandato.
De 2016 pra cá, o país só afundou. Logo depois do golpe, o salário mínimo parou de se valorizar, a desigualdade social e a concentração de renda aumentaram, a fome e a miséria voltaram com força. Temer foi muito útil para a elite ao aprovar a reforma trabalhista, que tirou direitos do trabalhador e liberou a terceirização. A PEC do Teto dos Gastos Públicos, também conhecida como a PEC da Morte, congelou investimentos sociais durante vinte anos. Bolsonaro representa uma continuidade desse governo catastrófico, com pelo menos um agravante: o Brasil virou pária internacional. O mundo ri da gente (ou chora, porque é de dar pena mesmo o que aconteceu por aqui. O que está acontecendo). A negação em se combater a pandemia mais letal dos últimos cem anos deu um sentido ainda mais literal ao termo necropolítica.
Hoje o Brasil é a 12a maior economia do mundo. Com Dilma, era a sexta. Os investidores estrangeiros abandonaram o país. No final do ano passado houve uma leve recuperação, mas o Brasil está entre as últimas opções. O número de moradores de rua explodiu em todo o país (cresceu 140% entre 2012 e início de 2020). Literalmente empobrecemos: o PIB em 2020 era de R$ 35,2 mil, 11% menor que o de 2012 (R$ 39,6 mil). Não existe nenhum aspecto em que a nossa vida está melhor hoje do que estava em 2016. Se compararmos os índices atuais com aqueles dos governos Lula então, nem se fala.
O Brasil também está entre os dez países do mundo com a maior piora de um índice que mede a democracia. Como descreve o instituto V-Dem, sediado na Suécia: "O governante no poder primeiro ataca a mídia e a sociedade civil, polariza as sociedades desrespeitando oponentes e espalhando informações falsas, e aí então passa a enfraquecer as instituições formais". Parece familiar? Ah, o índice de liberdade acadêmica também despencou.
Nas palavras da própria Dilma, que foi inocentada de tudo que foi acusada, como no caso da venda da refinaria de Pasadena: “o Brasil passou progressivamente a viver uma sucessão de retrocessos que incluem inflexão econômica para o mais radical neoliberalismo na economia; conservadorismo e incentivo ao ódio e à violência na sociedade; ataques à soberania; degradação institucional e erosão da democracia”.
Enganaram o povo. Disseram que era só tirar a Dilma e o PT que a economia se recuperaria, que o dólar cairia, que o PIB cresceria, que o preço da gasolina baixaria. Tudo mentira. Ganha uma camiseta "A culpa não é minha: eu votei no Aécio" quem conseguir explicar sem rir o motivo alegado para o impeachment de Dilma. As tais pedaladas fiscais, lembram?
Cinco anos depois do golpe, um livro lançado nos EUA explica como o impeachment de Dilma foi machista. A reação contra a presidenta visou não apenas tirá-la do poder como também enfraquecer a participação das mulheres na política. Basta ver que o primeiro ministério de Temer não tinha uma única mulher (já Dilma nomeou dezoito, maior número já visto no Brasil). Para Pedro A. G. dos Santos e Farida Jalalzai, autores do livro Women's Empowerment and Disempowerment in Brazil: The Rise and Fall of President Dilma Rousseff, “Embora a misoginia não seja a única razão pela qual a presidenta foi derrubada, foi um elemento importante na tentativa de desempoderar a presidenta (colocando-a em seu lugar) e, consequentemente, enfraquecer as mulheres que buscavam entrar nos espaços masculinos na sociedade brasileira".
Lógico que o livro lançado agora está longe de ser inovador na sua denúncia da misoginia no impeachment.
O livro Golpe 16, lançado ainda no ano do golpe pela editora Fórum, trazia dois artigos com esse viés (um meu, outro da Cynara Menezes). Um livro publicado em 2018 pela UFBA, O Golpe na Perspectiva de Gênero, traz vários artigos interessantes, inclusive um de Marielle Franco. E, nesses cinco anos, foram defendidas várias teses e dissertações com o tema da misoginia no golpe. Por exemplo, na sua tese, a professora de Estudos Linguísticos da UFMT Perla Haydee da Silva analisou como Dilma foi tratada no Facebook do MBL -- como burra, louca, incompetente, e nojenta. Foi chamada até de prostituta. A maioria das ofensas eram referentes ao gênero de Dilma. Frases machistas como "volta pra cozinha" também apareciam com frequência.
Bolsonaro se descontrola e fica histérico todos os dias, mas não há capas de revista dedicadas a ele com a manchete "As explosões nervosas da presidente", como houve com Dilma -- uma presidenta que não foi covarde como Collor, que renunciou antes de ser cassado, e que não fez conchavos com deputados para se manter no poder (como Bolso fez ao comprar o Centrão por R$ 3 bilhões). Dilma não aceitou a chantagem de Eduardo Cunha. Por isso foi impeachada.
E, óbvio, ao se falar da misoginia no golpe, não se pode esquecer do indefectível adesivo da presidenta com as pernas abertas na bomba de gasolina. Algo asqueroso, uma ofensa a todas as mulheres.
Na sessão de julgamento do impeachment no Senado (em que a presidenta, sem esmorecer, passou 13 horas respondendo perguntas de senadores -- comparem com os ministros bolsonaristas na CPI da Covid), em agosto de 2016, Dilma admitiu: "Tem sempre um componente de misoginia e de preconceito contra as mulheres nas ações que ocorreram contra mim".
Dilma foi até agora a única mulher presidente. E olhem como foi tratada. Certamente este é um recado para as meninas que sonham ocupar o cargo máximo da nação.
É importante que tudo isso fique registrado, porque um dia esses tempos atrozes que vivemos vão passar. Um dia voltaremos a ter uma mulher de esquerda na presidência. Enquanto a hora não chega, só nos resta ter saudades de quando o PT destruía a nossa vida.
Excelente postagem. Lembrar do golpe 2016 sempre me deixa triste, pois Dilma nunca receberá desculpas por toda misoginia e desrespeito que sofreu por ter tido a ousadia e coragem de ser presidenta. Abraços fortes Lola.
ResponderExcluirO lamentável é mulheres endossarem todas as ofensas feitas a Dilma, lembro quando ainda tinha Facebook naquele tempo, ler mensagens em perfis de mulheres e não eram falsos, pois algumas eram conhecidas pessoalmente por mim, frases como :Vadilma, Putilma, etc, eu desde aquele tempo me afastei dessas pessoas, afinal quero distância de mulher capacho de macho escroto ou coprófaga de misóginos. É o tipo de mulher que vota em Mijair Merdias Bolsoshower sua prole asquerosa.
ResponderExcluirO mais triste é que Dilma acabou queimando o filme das mulheres perante a sociedade brasileira. Mesmo não tendo culpa. Triste
ResponderExcluirNão foi Dilma quem queimou o filme das mulheres. Queimaram o filme da Dilma e das mulheres
ExcluirVamos dar nome aos bois, Danilo Gentilli, Fernando Moura Cagni, Marcelo Brigadeiro, Arthur del Val, Kim Kataguiri, Joyce Hasellmann, Carla Zambelli, Luciano Hang, entre outros não só comemoraram, mas alguns são misóginos assumidos e outros escrotos mesmo, inclusive o adesivo asqueroso nas bombas de gasolina não duvido terem vindo dessas mentes torpes e perversas, afinal estes mesmos comemoraram, riram e ainda hoje tentam assassinar todos os dias a Marielle Franco. Existem os arrependidos quanto a Jair Bolsonaro miliciano e seus filhos milicianos gangsters? Sim, mas esse "arrependimento" é fachada para uma candidatura ainda pior e muito mais perversa, cruel e tirana. "Nada mostra mais o caráter de um homem do que aquilo que ele ri." Johann Goethe
ResponderExcluira) Lola sou sua fã adoro o seu blog.
ResponderExcluirb) Quando eu lembro do golpe covarde que a Dilma levou não consigo sentir pena da classe média pão com.ovo machista racista e homófobicas que apoiou o golpe porque queria tirar os direitos das minorias e que hoje está empobrecida. Estava lendo que o número de crianças deixando a escola privada e indo para o ensino público está aumentando.
Lola vc soube que Benny Brioly travesti eleita vereadora mais votada de Niterói teve que deixar o Brasil em razão de ameaças ela e do Psol
ResponderExcluirAmem
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