A PARTIR DE HOJE, VAMOS VER O BRASIL FELIZ DE NOVO

Eu estou super animada, respirando política! Parece que as eleições estão começando agora pra mim!

Primeiro foi ver pelas pesquisas que o atentado contra Bolso até pode ter lhe rendido alguns votos, mas não cortou seu gigantesco índice de rejeição. Segundo o Datafolha de ontem, sua taxa de rejeição (entrevistados que responderam à pergunta "Em quem você nunca votaria para presidente?") subiu de 39% para 43% pós-ataque. Pouca gente previu isso. Em geral imaginávamos que a facada gerasse alguma comoção, alçasse o candidato da extrema-direita para fora do seu limite de votos (entre 20 a 25%), e talvez fizesse quem não gosta dele xingá-lo menos. Não foi isso que aconteceu.

Como explicar esse fenômeno? Bom, pra focar num tuíte humorístico de um internauta, a população ficou p*ta que Bolso não morreu (piada, pessoal, já expliquei que o quero bem vivo pra perder e estar desempregado a partir de janeiro). O site de humor Sensacionalista cravou nosso alívio com esta manchete: "Depois de pesquisa mostrar que Bolsonaro não cresceu, Brasil já respira sem aparelhos". 

O mais provável é que a rejeição a Bolso já estava tão sacramentada que nada iria (ou vai) alterar o quadro. E está segmentada graças a nós mulheres (o grupo fechado no FB Mulheres Unidas contra Bolsonaro já está com 700 mil membras e hoje à noite deve chegar a um milhão, já que há solicitação de 10 mil mulheres por minuto; ontem tinha a metade), jovens, nordestinos, e pessoas com nível superior (esses são os grupos que dão a rejeição mais alta a Bolso). 

Mas não há dúvida que é maravilhoso constatar que o Brasil não é chegado a um fascista. Eu venho dizendo há anos que Bolso não tem chance, e boa parte do pessoal me responde dizendo "Queria ter o seu otimismo", ou "Você falava isso do Trump". E eu sempre dizia que ninguém com um índice de rejeição tão alto consegue ganhar, ainda mais num país em que existe segundo turno (a comparação certa não é com os EUA, mas com Marine Le Pen na França e Geert Wilders na Holanda, duas figuras da extrema-direita que causaram grande estardalhaço... e morreram na praia). 

Hoje o ministro Alexandre de Moraes dará o voto decisivo para desempatar o placar no Supremo Tribunal Federal e decidir se Bolso se tornará réu por racismo por conta do que ele falou contra quilombolas na palestra que ele deu no Hebraica Rio. Só bolsominion para não ver racismo na sua fala:

“Alguém já viu um japonês pedindo esmola por aí? Porque é uma raça que tem vergonha na cara. Não é igual essa raça que tá aí embaixo ou como uma minoria que tá ruminando aqui do lado.” e "Eu fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Nem pra  procriador ele serve mais". O discurso sobre a "fraquejada" ("Eu tenho 5 filhos. Foram 4 homens, a quinta eu dei uma fraquejada e veio uma mulher") também foi feito lá. 

Bolso já é réu em outras duas ações penais pelos crimes de injúria e incitação ao crime de estupro por ter dito à deputada Maria do Rosário (em duas ocasiões públicas e numa entrevista) que ele não a estupraria porque ela não merecia. 

Minha aposta é que Moraes, conservador que é, decidirá que Bolso não foi racista. De um jeito ou de outro, não muda nada na campanha.

A notícia mais importante do dia, do mês, do ano, é que o PT finalmente oficializará a chapa Haddad e Manu para a presidência. Eu e muita gente estávamos ansiosos e nervosos com a demora. 

Entendo que não se pode abandonar a luta por Lula Livre, entendo que o PT tinha que tentar esgotar todas as alternativas de defesa, entendo que a demora foi importante para provar que ele é um preso político num estado de exceção que desrespeita até determinação da ONU, entendo que os golpistas farão de tudo para tentar incriminar Haddad (ou qualquer outro candidato petista que fosse lançado), entendo que o PT confie no potencial de Lula como maior cabo-eleitoral para transferir os votos para Haddad. Mas não dá mais. Daqui a menos de um mês tem eleição, e o ex-prefeito de SP precisa se tornar conhecido no resto do país.

Outro bom motivo para lançar Haddad e Manu é dar tempo para que Manuela D'Ávila brilhe. No último mês ela tem estado ofuscada, embora tenha participado de todas as atividades da campanha. Mas ela era candidata a vice do vice. Agora será candidata a vice, e que vice! Reaças -- aqueles que se preocupam tanto com machismo -- até agora tentam tachar a aliança de machista, por "submeter" uma mulher a um homem. Ridículo. 

O PT, o maior partido de esquerda da América Latina, não iria lançar um candidato de outro partido de esquerda (como Boulos e Manu) como cabeça de chapa. Qualquer pessoa que tivesse sido lançada como pré-candidata à presidência pelo PCdoB (que não teve candidato próprio em nenhuma eleição desde a redemocratização do país em 1989) estaria na mesma posição de Manu. É uma questão de alianças. 

A oficialização da chapa será agora à tarde em Curitiba, quando os candidatos lerão um pronunciamento de Lula. E agora a campanha começa de fato. Haddad já tinha 9% no Datafolha de ontem, sem ser candidato. Qualquer analista político acredita que ele vai crescer muito. Meu palpite é que a chapa Haddad/Manu chegue ao início de outubro com 32% das intenções de voto nas pesquisas e que Bolso se mantenha como está, com uns 23%. Aí os dois disputam o segundo turno e Haddad vence por 55% contra 45%. Eu posso errar feio, lógico -- Ciro pode crescer mais que Haddad, ou Alckmin pode crescer e tirar Bolso do segundo turno (as duas possibilidades são bem improváveis, a meu ver). Mas estou otimista. A gente vai vencer esse retrocesso das trevas. 

Tem um lado simbólico da chapa Haddad/Manu ser oficializada hoje. É que hoje marcamos os 45 anos da morte de Salvador Allende. Em 1973, no 11 de setembro mais famoso da América do Sul, tropas do general Augusto Pinochet, amplamente patrocinadas pelos EUA, bombardeou a residência do presidente democraticamente eleito Allende e o Palácio de La Moneda, o executaram (ou ele se suicidou, dependendo da versão), e instauraram uma ditadura sangrenta e corrupta que torturou 30 mil pessoas e fez no mínimo 3 mil vítimas. 

Seu governo foi um laboratório para que um grupo de economistas chamados de "os Chicago Boys" pudessem implantar o neoliberalismo. Assim como no Brasil de Temer, todo tipo de direito foi tirado -- o que só acontece em governos que não dependem da aprovação popular (tipo uma ditadura). 

O que isso tem a ver com o Brasil? Ué, tudo. Temos um candidato à presidência que louva Pinochet e demais torturadores e que tem como seu principal economista um seguidor fiel dos Chicago Boys. Não que os outros candidatos de direita não defendam as mesmas políticas econômicas que nos fizeram afundar ainda mais nos últimos dois anos. Boulos está certo: há 50 tons de Temer.

Nas eleições mais conturbadas e ao mesmo tempo mais apáticas (até agora) das últimas décadas, vamos vencer o atraso, o retrocesso, o preconceito, o ódio, o medo. Eu quero ver o Brasil feliz de novo.